Capítulo 111 - Garra-cinza
O ambiente quieto e calmo da floresta que ruma ao entardecer contrasta com o clima quente entre Byron e a ave cinzenta.
A criatura encara o demônio sem se mover, com bico fechado e olhar centrado. As penas eriçadas e as garras fixas no chão aguardam a próxima ação como armadilhas prontas para disparar.
Byron sente a ferida no peito latejar com a mão repousando acima. Um brilho de euforia reside nas pupilas que, ao mesmo tempo, refletem seu inimigo. Aquele ataque… não foi igual ao dos outros. Tinha algo diferente, ele analisa. Esse pássaro é como um guerreiro velho que sabe lutar.
Ele aperta o cabo da espada com força, com um sorriso sinistro estampado na face. A senhorita disse que essa luta seria mais desafiadora, mas eu não esperava que pudesse ser tão divertida, ele pensa, com ânimo. Hora de duelar de verdade.
A grama sob os pés do demônio começa a secar ao mesmo tempo em que os galhos próximos encadeiam-se em laranja. As linhas alaranjadas no corpo dele ficam mais intensas, incandescentes e irradiando calor.
Entre a mata, entocada entre árvores e arbustos, Rubi acompanha a cena com olhos atentos, como quem assiste a um espetáculo. Caramba, ele ficou mesmo animado, ela pensa, vendo o ambiente esquentando ao redor de Byron. Só espero que ele não coloque fogo em tudo.
Ela desvia o foco para a criatura cinzenta, examinando-a de cima a baixo, com a cauda serpenteando de um lado para o outro.
Mas talvez seja mesmo necessário ele lutar com tudo o que tem. Apesar de parecer muito, aquela coisa é bem diferente de uma garra-branca comum. Pelo tamanho, dava para supor que era mais forte, mas não que teria habilidades muito diferentes, ela analisa. Acho que vou chamar essa variação de… garra-cinza. O que será que ela fez antes?
Adiante, a ave percebe a temperatura do ambiente aumentar, sentindo uma chama acesa em sua frente.
A aura quente que emana do demônio cozinha lentamente tudo ao redor, fazendo a pele sob suas penas arder e seus instintos dispararem em alerta.
A criatura, cautelosamente, abaixa o pescoço e flexiona as pernas, preparando-se para saltar.
O demônio não dá chance e imediatamente ataca com a espada, em um movimento aberto pela lateral.
A garra-cinza vibra as penas, trazendo de volta a sensação nauseante a Byron. Seu olhar vacila, mas o braço não. A lâmina continua firme, cortando o ar, direcionada à ave.
A criatura tenta se erguer para esquivar-se, mas a ponta da espada ainda a acerta no peito, cortando penas e abrindo um rasgo na carne. Além de ferir, o ataque também queima como fogo vivo, fazendo a carne arder.
As penas cinzas na região do toque ficam com as pontas pretas, queimadas, e acabam manchadas pelo sangue que escorre.
Em fúria, a ave devolve o ataque, lançando novamente suas garras contra o peito de Byron.
Dessa vez, ele volta a se focar a tempo e, apesar do incômodo em olhar para aquela criatura, consegue ao menos colocar a mão direita na frente.
Mais uma vez as unhas longas e afiadas cortam por meio de sua pele, mas a garra-cinza não sai ilesa. No instante em que o toca, chamas surgem nos pontos de contato, queimando brutalmente as patas da ave.
A ave recua aos tropeços, soltando fumaça saindo das unhas. Ela bate pisando no chão repetidamente, tentando resfriar a queimadura batendo o pé na terra úmida.
Suas penas acinzentadas se aquietam e Byron enxerga com clareza o estrago causado no peito dela. Uma queimadura limpa nas penas e na carne, que o faz arregalar um sorriso fascinado.
Mesmo com essa arma, ainda consigo queimar da mesma forma que as minhas garras, ele constata, surpreso. Lutar com essa espada pode ser bem melhor do que pensei.
Byron, impassível, segue erguendo a espada para desferir um novo ataque. De repente, a silenciosa ave abre o bico na direção do demônio e crocita da mesma forma que uma garra-branca. Um som estridente e agudo, que se dissipa como uma onda, fazendo até as folhas ao redor tremerem.
Parente ao ruído estrondoso, Byron range os dentes, sentindo aquele barulho reverberar dentro de si. Até as centelhas que caem das asas chacoalham com o choque.
“Por um momento, até cogitei que você não gritaria como as outras”, resmunga o demônio, balançando a cabeça.
A garra-cinza avança e, mesmo sentindo a aura de Byron queimando-a só de aproximar-se, o ataca sem medo.
Vendo uma brecha, ela pula, lançando uma perna ao alto, mirando no peito do demônio.
Byron tem reflexos o bastante para bloquear erguendo a espada e travando o golpe. O impacto faz faíscas se espalharem. Os olhos da criatura se arregalam, surpresa com a defesa.
Já suportei gritos demais para ficar abalado com cada um deles, pensa o diabo, furioso.
Ele a repele num empurrão brutal com a lâmina, arrancando-a do chão. A ave cambaleia, asas abertas, tentando recuperar o equilíbrio.
Byron avança em estocada. A garra-cinza vibra as penas, distorcendo sua visão em ondas nauseantes.
A plumagem vibrante ainda turva a visão de Byron, mas, apesar de sentir um tremendo incômodo, ele mantém a espada firme.
Mesmo conseguindo afetar o diabo, a garra-cinza, sem equilíbrio, não consegue se esquivar e é acertada pela espada.
A ponta penetra pela base do pescoço e sai pelas costas, queimando toda a carne no meio do caminho. Byron mantém a lâmina fincada, pressionando-a para baixo, prendendo a ave como carne no espeto.
Com as forças que lhe restam, a garra-cinza solta pios roucos enquanto as patas golpeiam o ar e o chão, buscando uma maneira de escapar. Byron logo agarra a cabeça dela, travando o bico com o polegar e impedindo qualquer ruído de escapar de lá.
As penas da cabeça dela fumaçam entre seus dedos.
Ele contempla o cheiro de carne queimada enquanto encara os olhos vidrados da criatura, refletindo agonia e fúria impotente. Um sorriso sombrio se abre em sua face.
Então, fecha a mão. O crânio estala, os ossos cedem em um estourar seco que reverbera pelo silêncio da floresta. O corpo treme uma última vez e, logo depois, pende inerte.
Do fundo, Rubi assiste à execução com um olhar que oscila entre fascínio e apreensão. Um pouco brutal… mas foi bem legal ver ele lutando com tudo o que tem. O potencial dele para a espada é excelente, ela pensa, com um meio sorriso. Agora, só resta uma coisa a resolver por aqui…
Rubi baixa ligeiramente o queixo, lançando um olhar atento à direita da mata, um lugar que se mostra calmo e vazio.
Porém, no interior de uma moita onde a luz do sol não penetra, olhos avermelhados, atrelados a uma silhueta pálida e ocultos nas sombras, também observam em silêncio a queda da ave.
Por que… tem mais gente com magia sombria aqui?, a voz nas sombras se pergunta.
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