Capítulo 113 - A presa branca
Aquele trecho movimentado se acalma enquanto o corpo, praticamente sem cabeça, da ave cinzenta dá seus últimos espasmos no chão.
O diabo a encara, até ter certeza de que tudo está acabado. Quando ela para de se mover completamente, o corpo do demônio musculoso se envolve em chamas.
Tão rápido quanto apareceram, as labaredas cessam e delas emerge Byron em sua forma humanoide, cravando a espada no chão e ajeitando seus trajes negros sobre o corpo.
Afastada dali e escondida em uma moita, a raposa branca observa tudo, com sua cauda felpuda enrolada ao redor das pernas como um ninho de algodão.
O que foi aquilo?, ela se pergunta. Pareceu que alguém jogou fogo nele, mas acho que ele só virou outra coisa. Lembra a Senhora Mãe e o Senhor Ootav.
A criatura examina o demônio, percorrendo o olhar dos chifres à cauda. Ele ficou bem diferente, só que ainda não é um elfo e ainda tem os chifres, ela constata, pensativa. As narinas dela se abrem e fecham, conforme ela fareja o ar. Ainda cheira a magia sombria… Talvez deva ser o que chamam de demônio. Mas o que ele faz aqui?
A raposa move a atenção para a criatura morta aos pés dele. Ele parece perigoso… Eu devia ir embora…, ela pensa. As patas dianteiras dela tremem, hesitando em um movimento. Ou… eu deveria… ir até lá?
“Senhorita?”, diz Byron, olhando para trás, chamando por alguém.
Tem outros com ele?, se indaga a vulpina. Ou ele está procurando por alguém? Se for alguém que estava por aqui… a essa hora já está na barriga de um pássaro.
O questionamento do demônio se perde pela floresta. Ninguém o responde. Byron fica quieto, olhando para trás com um semblante pensativo.
Acho que ele não é daqui. Talvez ele esteja perdido… quem iria vir para cá se não estivesse? Ele pode precisar de ajuda. É. Se eu guiar ele… quem sabe ele não me ajude também?, a raposa pondera, com a confiança crescendo.
Mas ela logo balança a cabeça, recusando a ideia. Ele vai me devorar se eu for lá. Ou me cortar com aquela espada, ela pensa, receosa. Que outra escolha eu tenho? Ficar por aqui até um pássaro me comer ou esperar para decair quando a magia densa dessa terra for embora.
Mas… se aquele demônio fosse perigoso para a floresta, o Senhor Ootav já teria feito algo, não teria?, a criatura branca se pergunta, tentando se convencer.
Enquanto a vulpina divaga, algo se move em silêncio atrás da moita. Alguém passa em meio às árvores, com passos calculados entre as folhas no chão úmido, que passam despercebidos a ela.
Novamente a criaturinha balança a cabeça, desistindo da ideia. O Senhor Ootav pode ter tentado e virou jantar… eu posso esperar até aparecer outra pessoa, conclui ela, certa. Mas…
De repente, o arbusto que a encobre começa a se abrir, deixando escapar uma fenda de luz pelo meio.
Atrás dele, Rubi afasta as folhas com as mãos, dividindo-as em duas metades como quem desembrulha um presente, revelando a criaturinha escondida.
A raposa olha para cima, com os olhos arregalados de surpresa. Ein?!, ela se questiona, sem reação, ao ver a succubus a encarando com um sorriso gigante.
“Olha só que coisinha fofa!”, Rubi exclama, encantada como uma criança que acaba de receber um novo brinquedo.
Ainda bem que eu não atirei nela, pensa a diaba, contemplando com os olhos a criatura diante dela. Ela é quase uma nuvenzinha.
De onde ela veio? Eu nem a ouvi chegando, pensa a raposinha assustada.
Byron, metros afastado, percebe Rubi. Ele reconhece imediatamente a expressão de empolgação em seu rosto. “Vejo que encontrou algo interessante”, ele comenta.
O diabo começa a caminhar na direção dela. O som das passadas amassando e pisando folhas é suave e sem pressa, mas, para a raposa, é como se cada uma fosse o rufar de um tambor, que prenuncia uma sentença.
Eu tenho que fugir!, pensa ela, quase em desespero. Seus olhos e as pontas dos membros brilham em um vermelho intenso por alguns segundos.
Como uma névoa rala que toma forma, uma segunda raposa surge ao lado, caminhando com calma em direção à diaba à frente.
Agora é só correr, ela pensa. A vulpina original se vira imediatamente contra a diaba, preparando-se para escapar correndo.
Mas, antes de dar o primeiro salto, Rubi, com a agilidade de um felino, a agarra no meio do corpo com as mãos.
Ein?!, pensa a criatura, confusa.
Os dedos da succubus se fecham firmes por baixo das patas dianteiras, erguendo a pequena raposa branca da moita com facilidade. A criaturinha gela no mesmo instante, tomada pelo toque sinistro da diaba.
Mesmo por meio das luvas, aqueles dedos transmitem uma estranheza fria, algo que não parece natural. Ela… é cheia de magia sombria, constata a vulpina.
Onde essa fofura acha que vai? E o que foi aquele brilhinho todo?, a diaba se pergunta. Será que ela usou alguma habilidade?
A raposa trava, em choque, o coração acelera as batidas. A ilusão não deu certo? Ela… sabia que não era real?, ela se pergunta. Seus olhos se viram para baixo e avistam sua cópia, sentada aos pés de Rubi, sendo desconsiderada. Por quê?
Byron vê a criatura branca sendo erguida como um tesouro recém-encontrado. Suas sobrancelhas se arregalam de surpresa. “Que interessante”, ele diz, fascinado, com um sorriso se curvando nos lábios.
A pequena raposa se debate, balançando e tentando empurrar as mãos delas com suas patas traseiras, mas, perante sua força, aqueles dedos parecem imóveis como rocha.
“Calminha. Calminha… eu não vou te machucar”, pede Rubi, porém, a raposa se foca apenas nos dentes afiados na boca dela, se abrindo e fechando.
É inútil… Eu vou morrer, pensa a vulpina, desistindo. Seu corpo fica mole e ela para de se debater.
Rubi sente a musculatura da criatura em suas mãos relaxar. Ao menos ela não é agressiva, me poupou de usar o charme, ela pensa.
Agora, mais próximo, Byron também enxerga a pequena criatura sentada abaixo de Rubi.
“Duas?”, ele pergunta.
A diaba a atenção da raposa e o olha, com curiosidade.
“Tem outra dessas? Onde?”, ela pergunta.
O diabo aponta para ela. “E essa outra aos seus pés?”
Rubi instantaneamente olha para baixo, ansiosa e curiosa. Ele vê folhas, gravetos, seus próprios pés e a ponta de sua cauda, mas não enxerga nenhuma outra criatura viva.
“Não tem nada aqui”, ela afirma.
Enquanto os dois conversam, uma terceira voz se junta.
“Por favor, não me comam”, clama a raposa, sem mover a boca. Exibindo a voz fina de uma dama que ecoa dela como uma brisa vinda diretamente de seus pensamentos.
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