Nas sombras de um laboratório profano, uma cápsula de vidro, conectada a um maquinário colossal, estava inundada por um líquido vermelho, brilhante e translúcido.

    Submerso da cabeça aos pés, encontrava-se Jasper, ou, naquela época, apenas um ser vazio.

    Do outro lado da sala, Skarneth analisava a situação de seu projeto por meio de um terminal ligado à cápsula por diversos cabos pulsantes. Sua mandíbula insetoide estalou em clara demonstração de decepção.

    — Quarenta e nove por cento de absorção… — rosnou, arrancando a tela com fúria e arremessando-a contra a parede. — Se essa lentidão continuar, vou levar anos para obter os resultados de que preciso.

    Era uma incógnita para Skarneth o fato de aquele “Filho do Vazio” continuar resistindo à Corrupção, uma energia ainda mais diabólica que o próprio Miasma, responsável por causar o estado de Frenesi nos Undeads.

    Porém, havia outro detalhe além da expansão explosiva de poder em alguém infectado pela Corrupção: ela também retirava o domínio sobre suas vontades, tornando-o suscetível a ser manipulado por qualquer Amaldiçoado.

    Ele se certificara de manter o experimento isolado de qualquer contato social, para que não desenvolvesse sentimentos, apenas a sede insaciável por destruição.

    No entanto, algo parecia estar interferindo nesse processo. Caminhou lentamente em direção à cápsula; a cada passo, as juntas de seus membros estalavam, enquanto os cabos que se arrastavam atrás dele lembravam víboras famintas.

    Parou diante do tanque onde Jasper boiava, olhos fechados, imóvel como um cadáver suspenso.

    — Você realmente está se divertindo em me irritar, não é? — Sua voz reverberava em camadas de distorção, como se muitas bocas falassem em uníssono.

    O Amaldiçoado ergueu a mão, fazendo uma esfera de energia corruptiva surgir, e a conectou à base do tanque, de forma que toda a estrutura estremecesse.

    — Muito bem, já que sua resistência é tão forte, está na hora de acelerar as coisas. A próxima dosagem vai devorar o que restar da sua vontade.

    O líquido dentro da cápsula começou a borbulhar, tingindo-se de um vermelho mais escuro. Fios de energia se entrelaçavam como veias ao redor do corpo submerso, e a Corrupção finalmente penetrou na carne de Jasper.

    Seu corpo se arqueou, os músculos se contraindo em espasmos violentos. Bolhas de ar escaparam de sua boca entreaberta, enquanto o sangue se misturava ao fluido, formando redemoinhos carmesins.

    Não… desta vez, eu preciso resistir!

    Seus olhos se abriram no presente, ausente ao caos que se formava no subsolo do Deserto de Sonata, durante o processo de Sincronização, mas agora tudo o que importava era vencer a Corrupção acumulada dentro de si.

    A energia corruptiva rasgava suas veias por dentro, queimando. Era como se algo tentasse reescrever seu ser, arrancando fragmentos de sua alma e substituindo-os por algo monstruoso.

    Próximo dali, o Caçador de Ossos observava a cena ao lado de Kaern, que parecia prestes a se lançar no meio da confusão para salvar o garoto, mas seu líder colocou-se à frente, impedindo-o.

    Será que devo deixá-lo se corromper por completo, só para ver o verdadeiro Vulto Negro… ou permitir que tudo vire um caos? pensou, divertindo-se com a própria dúvida.

    Por outro lado, Jasper lutava com todas as forças, mas não conseguia conter tanta energia corruptiva de uma só vez. Então, uma ideia desesperada surgiu em sua mente.

    Se o que estou fazendo não está funcionando, então tentarei o completo oposto!

    A pressão dentro de seu corpo rompeu-se de uma só vez, e uma onda de Corrupção explodiu a partir de seu peito, varrendo o templo de Narhma em todas as direções.

    As colunas se partiram, os vitrais se estilhaçaram, e o ar foi tomado por um miasma denso e vibrante. Ecos distorcidos preencheram o espaço.

    Kaern e o Caçador de Ossos foram arremessados para trás, protegendo-se instintivamente do impacto. A energia se espalhou pelas paredes, subiu pelas pilastras e se infiltrou nas fendas do solo.

    Quando a luz começou a se dissipar, Jasper caiu de joelhos, ofegante. O fluxo cessara. Ele havia resistido. Nenhum eco de Skarneth em sua mente; nenhuma voz tentando controlá-lo.

    Mas, ao olhar para si mesmo, sentiu o peso de uma derrota silenciosa. A armadura, que antes reluzia em tons prateados e azulados, agora voltava à cor escura e metálica de sempre.

    A Sincronização não fora concluída, ainda faltava algo para que pudesse acessar todo o poder de seu Núcleo de mana.

    — Falhei… — murmurou, observando o vapor subir de suas mãos trêmulas, até que se ergueu, cerrando os punhos. — Mas, pelo menos, ainda sou humano.

    Soltou um longo suspiro, os ombros finalmente relaxando, mas o instante não durou muito. Um tremor intenso percorreu o subsolo, fazendo Jasper se desequilibrar.

    Do teto rochoso, imensas centopeias começaram a irromper, destruindo pedras como se fossem argila. Elas se contorciam e caíam entre as colunas despedaçadas.

    O impacto de seus corpos fazia as rochas despencarem junto, levantando nuvens de poeira e fazendo detritos voarem por todos os lados.

    Entre o caos, bandos de abutres bestiais emergiram das fendas abertas, batendo as asas freneticamente. Não mais buscavam carcaças ou restos de Núcleos, seus olhos agora queimavam em um vermelho doentio, famintos por presas vivas.

    A Corrupção que escapara de Jasper espalhava-se como um vírus, impregnando tudo o que tocava. Os Undeads do Deserto de Sonata, antes apenas espectros famintos, agora sofriam em um estado de Frenesi.

    As centopeias avançavam umas sobre as outras, gritando em chiados cortantes; os abutres se chocavam no ar, dilacerando-se em meio a gritos de fúria animalesca.

    Um novo tremor percorreu o subsolo, mais intenso que todos os anteriores, fazendo o templo estremecer como se o próprio deserto estivesse prestes a ruir.

    Do coração da pirâmide tecnológica no centro da câmara, sons metálicos e ensurdecedores ecoaram, batidas violentas contra o aço revestido reverberavam por toda a estrutura.

    Linhas luminosas começaram a se projetar pelas paredes, formando fórmulas, runas e códigos em uma sequência frenética. Era o sistema de contenção tentando reagir, sobrepondo algoritmos e selos de restrição para impedir o inevitável.

    Mas nada poderia conter o despertar de Narhma.

    Com um rugido subterrâneo, a criatura colossal rompeu as últimas camadas da barreira do local que deveria proteger, destruindo uma das poucas lembranças de Osiris.

    Suas placas obsidianas se abriram, cuspindo vapores corrosivos; centenas de olhos se acenderam ao longo de seu corpo segmentado, refletindo a luz rubra da Corrupção que pulsava em seu Núcleo Mutante.

    Tomada pela mesma sede de destruição e catástrofe que consumira seus semelhantes, Narhma libertou-se, e o templo desabou ao seu redor, selando o fim do legado do Ceifador.

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