Capítulo XXV (25) - Qual o Plano?
Corri pelo pátio principal da Ilha, quase vazio, a maior parte da multidão visitante estava espremida na arena para os duelos. Os poucos guardas me olhavam com suspeita, mas nada fizeram para tentar me parar, ainda não haviam sido alertados.
Coloquei a mão no casaco, pronto para sacar uma carta. Pensei por um momento, antes de decidir qual seria meu próximo passo.
— “A Torre” — proclamei, ao remover a carta escolhida do meu bolso.
As bordas brilharam no ar, com um feixe de luz dourado. A ilustração da carta mostrava uma imponente torre medieval, erguida em meio a uma tempestade violenta. No topo, duas baterias antiaéreas apontadas contra o céu, disparavam contra bombardeiros que cruzavam as nuvens iluminadas por explosões.
Essa carta é especial por vários motivos, é uma das poucas cartas do baralho que não é voltada para combate direto. Em vez disso, ela é uma excelente habilidade de suporte, com ela, posso me movimentar facilmente e sair das mais complexas enrascadas.
Quando a luz cessou, um molho de chaves antigas e enferrujadas apareceu na minha mão. Corri até a primeira porta que encontrei, um depósito da seita, sem tranca aparente, e aproximei as chaves. No mesmo instante, uma fechadura se materializou na porta lisa de madeira. Sem hesitar, enfiei uma das chaves e a girei.
O que se revelou do outro lado não era o depósito esperado, mas meu quarto de hóspedes na casa dos Wen Qishu. Atrás de mim ouvi passos apressados: guardas se aproximavam. Fiz uma continência sarcástica, puxei a chave da fechadura e entrei no cômodo.
— Gostou da luta? — questionou Lefkó, ao mover a cabeça para o lado e me encarar.
Fiquei em silêncio. Ainda refletia sobre todos os acontecimentos na ilha.
A morte de Lingxin pelas mãos de Renyan me deixou um gosto estranho na boca. No primeiro momento, senti apenas indiferença. Mas agora, eu sentia traição.
Jiahao havia mesmo me vendido para os Hua Yuling?
Eu não havia falsificado nenhuma moeda, isso eu tinha certeza. Eu possuía um artefato, parte da coleção imperial, chamado de “a Bolsa de Midas”. Uma habilidade única de reproduzir com perfeição a última moeda ou nota depositada em seu interior. Cada cópia saía idêntica ao original: mesmo peso, mesma liga metálica, até as imperfeições microscópicas eram replicadas.
Era um artefato único, capaz de transmutar o ar em outros minerais através de fusão nuclear. O principal uso desse pequeno artefato era o de copiar uma moeda simples e fornecer renda ilimitada durante minhas viagens a outros mundos e planetas.
O método de cópia era refinado demais para ser confundido com uma falsificação barata.
— O que você acha Lefkó? O que eles querem? — Sentei na cama, e coloquei a mão no rosto, pensativo.
— Sua bolsa de moedas, quem mandou se exibir? — respondeu, de forma ríspida. Ela subiu pelo meu pescoço. — E agora? Qual o plano?
Soltei um longo suspiro, e peguei uma carta do bolso.
— “O Louco”…
Uma névoa negra começou a sair da minha boca, e em pouco tempo, preencheu todo o cômodo. Uma silhueta se materializou na névoa, a silhueta de um guerreiro vestido com uma armadura de placas.
— Relatório — Cruzei os braços, e o encarei diretamente.
— O porto está mais agitado que o cotidiano, vários soldados e guardas locais estão caçando um criminoso perigoso chamado de “Nasha Lyu”, pelas características apresentadas, o senhor parece se encaixar nessa descrição, mestre. — O guerreiro gesticulava com as mãos.
— É claro que parece, sou eu! — murmurei, e massageei a têmpora, um tanto irritado. — Nasha Lyu… não podiam ao menos falar meu nome certo?
— Há patrulhas no porto? — Lefkó questionou, enrolada no meu pescoço.
— Não, jovem mestra — respondeu o espectro.
— Fugimos agora pouco; eles ainda não entenderam como eu desapareci por detrás de uma porta — Com um bocejo, eu deitei na cama. — Devem estar ainda me procurando na ilha. Ainda temos algumas horas antes de precisar sair correndo…
— Vamos correr com o rabo entre as pernas? — provocou Lefkó.
— Claro que não! — Bati a punho cerrado na cama, e fiquei em silêncio por um instante, ainda pensativo sobre o assunto. — Vou bolar alguma coisa criativa.
— Qual é o plano? — ela insistiu, e acomodou-se sobre meu peito.
Olhei para a silhueta e decidi:
— Envie uma mensagem para Hua Yuling Renyan, marque um duelo com ele em um lugar afastado. Mande ele vir sozinho.
— Qual o plano? — repetiu Lefkó.
— Matar Renyan, e atrair o resto do clã para uma armadilha.
— Vai matar todos eles? — Ela espantou-se um pouco com as minhas palavras.
— Daria muito trabalho — respondi, ao estalar os dedos. — Só aquele patriarca e o Jiahao está ótimo para mim. Isso é sobre passar uma mensagem.
— Tem algo de errado nisso tudo, Thomas, você não acha melhor reavaliar o caso e pensarmos com calma? — Lefkó tentava ser a voz da razão naquele momento.
Levantei-me, e sentei na borda da cama, os braços cruzados.
— Não tem nada a ser reavaliado.
— Não vai atrair atenção demais?
Virei, e encarei seus olhos vermelhos.
— Nem vou dar ao trabalho de responder.
Bati palmas uma vez, seco. A névoa negra que revestia o quarto começou a se dispersar como fumaça. A silhueta espectral, ainda sólida por um instante, curvou a cabeça num gesto respeitoso.
— Será feito, mestre… — murmurou antes de se dissolver em um sopro frio.
Levantei-me da cama, sem pressa. Em um movimento acrobático, retirei e invoquei o poder da carta do mágico. No mesmo instante, todas as minhas coisas desapareceram.
Preparei-me para sair, um tanto despreocupado.
De repente, um tumulto lá fora: vozes estridentes, passos apressados, o estrondo seco da porta sendo arrombada. Os servos dos Wen Qishu bradavam coisas confusas aos invasores, mas uma coisa eu conseguia entender com clareza, eles me procuravam.
Mal fazia cinco minutos que eu usei a habilidade da “Torre” para fugir, eles não deviam ter me encontrado tão rápido!
Sem hesitar, puxei a carta da Carruagem e conjurei o revólver prateado. Pressionei o meu corpo junto à parede de madeira, para sumir do campo de visão de quem entrasse de relance.
Os passos subiram as escadas, chegaram até o quarto de hóspedes, e sem nenhuma preparação, eles abriram a porta e entraram no quarto. Era um dos guardas da cidade de Tianhang, pela sua postura desleixada, eles não tinham a mínima ideia da minha presença, o que era um alívio e tanto.
— Mas não tem nada aqui… — murmurou ele para os outros, no corredor, antes de virar o olhar e encarar o cano da minha arma.
— Surpresa! — Apertei o gatilho com um sorriso.

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