Capítulo 60: Guerra sem palavras (5)
Os olhos de Takeshi se voltaram para Anika.
Anika apenas balançou a cabeça em silêncio — uma negação curta, quase frágil, como se pedisse para ele acreditar nela.
O colar trazia a figura de um cão branco, esculpido com detalhes delicados. Pequenos fragmentos de vidro vermelho decoravam a peça, refletindo a luz em brilhos suaves. O cordão que o sustentava era de um tom roxo profundo, contrastando com a leveza.
Lucius limpou a garganta, devagar. Um sorriso fino se abriu, daqueles que não alcançam os olhos.
— Como pode ver…
Lucius olhando diretamente para Takeshi, embora inclinasse o queixo na direção de Anika
— Ela está mentindo para você.
Seus olhos, afiados como uma lâmina pressionada contra a pele, se prenderam nela.
— Então, chefa… — Lucius com a voz baixa, tranquila, quase gentil demais — O que nós vamos fazer com ela?
A mulher apertou a mão.
O vidro estalou.
O colar se estilhaçou e os cacos roçaram a madeira — uma gota de sangue escorreu junto.
— Eu não vou aceitá-la — declarou, abrindo a mão por completo.
Os cacos deslizaram pelos seus dedos e pousaram sobre a madeira, junto a uma gota de sangue que escorria lentamente pelo corte em sua palma.
Takeshi puxou a máscara do rosto e a deixou sobre a mesa. O abafamento, a respiração presa — estava tudo começando a irritá-lo.
“Ela não vai aceitar de jeito nenhum.” Seu olhar vagueou entre os presentes até pousar em Lucius.
Takeshi com a expressão calma e o corpo levemente inclinado para trás, ele observava tudo sem dizer nada.
“Então é isso… às vezes parece que ele é o verdadeiro líder.”
Marlon levantou a mão sem erguer a cabeça.
— Tem algum problema se eu sair?
Um riso alto cortou a sala, deslocado.
— Hahaha! Ei, velho… isso é importante. Aguente só mais um pouco e eu te faço o café do jeito que gosta.
Marlon desviou o olhar, como se aquele esforço fosse grande demais.
— Se vocês querem tanto o garoto, por que simplesmente não o aceitam logo?
A mulher respirou fundo, ainda encarando os cacos diante de si. O sangue pingou na madeira.
— Por causa da garota — respondeu, firme.
Seu sangue escorreu um pouco mais pela mão, pingando silenciosamente sobre a mesa.
A atmosfera ficou pesada.
Ninguém falou por alguns segundos.
Takeshi apenas observava — atento.
A mulher se levantou da cadeira em um movimento calmo e seguro.
Sua camisa, decorada com pequenos pontos amarelos, brilhava suavemente sob a luz, lembrando constelações dispersas. As mangas largas caíam com leveza, conferindo-lhe um ar quase etéreo. Já a calça preta, longa, possuía discretos reflexos que acompanhavam o passo dela, como se a luz escolhesse segui-la.
— Eu entendo que você está cansado… mas, Marlon, você sabe o que esse grupo fez. Não se lembra?
Marlon cerrou o punho até os nós dos dedos doerem. O ar lhe escapava em rajadas, quase descontrolado.
Levantou-se num só gesto e a palma encontrou a coronha; o clique do tambor ecoou como um anúncio.
O cano do revólver alinhou-se com a têmpora de Anika. — Eu a mato.
Os presentes estreitaram os olhos, surpreendidos com a rapidez do gesto.
A mulher sorriu suavemente e pousou a mão sobre o ombro de Lucius.
— Obrigada. Mesmo tendo ficado conosco por semanas, você ajudou mais do que imagina. Você será promovido, Lucius.
Lucius apenas sorriu.
— Agora, você. — Ela voltou o olhar para Takeshi, firme e direta. — Podemos retomar o nosso acordo?
Takeshi andou e pousou a mão sobre o revólver.
Anika inclinou a cabeça, fechou os olhos — já não tremia; parecia apenas ceder ao que vinha.
— O que você está fazendo? — Marlon arrancou a mão de Takeshi e recolocou a arma junto à cintura.
— Já disse: se matarem ela, eu não aceito. É melhor ouvirem. — A voz de Takeshi saiu firme, curta.
Marlon agarrou-lhe o pulso.
— Eu vou ter que machucar você se entrar nisso — murmurou, entre dentes.
Takeshi não recuou. O antebraço de Marlon empalideceu e logo ficou vermelho, como se uma pressão invisível o apertasse.
Takeshi cerrou os dentes; os olhos moviam-se rápidos, calculando cada possibilidade.
Lucius aproximou-se; o olhar tornou-se sério.
— Vamos nos acalmar um pouco. — disse, com voz contida.
Marlon moveu a mão; Takeshi soltou o pulso. Os dois trocaram um olhar tenso por alguns segundos antes de se recolherem aos seus lugares.
—….
O silêncio pesou sobre a sala; todos permaneciam se encarando, imóveis.
—….
Lucius sentiu um arrepio percorrer a espinha e deixou escapar um suspiro contido, como se tentasse soltar a tensão acumulada.
— Bem… antes eu estava—
— Eu não aceito isso.
O sorriso dela era água fria; as veias do pescoço se arqueavam. — Acho que você não entendeu—
— Já entendi. — Takeshi com firmeza, embora a voz traísse um cansaço. — Não tenho medo de vocês. Se querem uma “negociação” justa, então façamos uma.
As pernas de Takeshi fraquejaram; ele respirou fundo, ajeitou-se na cadeira e buscou uma postura estável.
— Vocês querem meu conhecimento sobre certas coisas, mas eu quero entender: por que confiaram tão facilmente em mim?
A mulher levou a mão ao queixo, riu com leveza e um brilho incontrolável nos olhos. — Porque, quando Lucius encontrou você, ele achou duas coisas. A primeira parecia um vagalume — Ela gargalhou, como se a palavra lhe escapasse — e a segunda, uma esfera dourada.
“Agora faz sentido porque Lucius acreditou em mim.”
Marlon lançava olhares breves para Anika antes de voltar a fitar Takeshi. Anika se mexia levemente, inquieta.
— Certo. Eu aceito, mas com algumas condições. — Takeshi começou, a voz firme. — Minha identidade deve permanecer segura. E Anika também.
— Você já repetiu isso — Lucius comentou, limpando o suor da testa.
— Ainda não terminei. — Takeshi fechou a mão e ergueu um dedo. — Primeiro: quero informações sobre todas as organizações envolvidas.
Ergueu um segundo dedo. Lucius abriu os lábios, incrédulo.
— Segundo: quero que encontrem duas pessoas para mim.
Por fim, levantou um terceiro dedo.
— E terceiro: quero respostas claras sobre as habilidades. Todos aqui são obrigados a tê-las ou não?
Lucius ergueu as sobrancelhas quando viu os lábios de Takeshi se moverem.
— Calma… ainda não terminei. — Takeshi voltou o olhar para a mulher; sua expressão permanecia tranquila, embora os punhos estivessem cerrados com força. — Eu posso garantir sua vitória contra as outras organizações que estão em conflito com vocês. Posso até usar ela para melhorar os resultados. — Ele apontou para Anika.
“Esse cara… Como ele consegue se manter tão calmo? Eu achei que ele só tentaria sobreviver.”A cabeça de Lucius latejava.
A mulher tamborilava os dedos sobre a mesa, avaliando.
— Eh…
Lucius levantou a mão, a voz tremendo ao tentar intervir.
Takeshi o cortou sem hesitar:
— Não, Lucius. Deixa a sua chefe falar. Ela é quem manda aqui, não é? Ou vai me dizer que você não consegue resolver suas próprias decisões sozinho?
A mulher apenas acenou a mão em direção a Lucius.
— Kakakaka. Isso foi bom. — Ela sorriu, o tom divertido porém cortante. — Você nem me deu tempo de apresentar minhas próprias condições. — Seus dedos cerraram-se lentamente enquanto ela se inclinava para frente. — Quero que trabalhe oficialmente para nós. Seus benefícios serão meus: seu dinheiro, suas conquistas, tudo passa por mim. E, claro, também quero saber o nome do seu modificador.
Takeshi engoliu seco, um arrepio subindo pela coluna.
— Sua amiga continuará viva, — continuou a mulher, agora com o olhar se estreitando — mas ficará sob nossa proteção. Não podemos correr o risco de ela fugir ou pedir ajuda. Portanto, ela ficará comigo.
Seus olhos brilharam em um amarelo intenso, ameaçador.
— Se você não aceita, a garota morre e cada um aqui perde algo, então como quer resolver isso? — a voz dela cortou o ar, doce e afiada.
Takeshi remexeu as pernas, inquieto, como se cada movimento fosse um pequeno pedido de tempo.
“Droga. Qual é a melhor opção agora?”
O suor de Lucius secou; a mão que tremia ficou imóvel. Marlon observava, impassível, como quem conta os minutos.
“Não vejo a hora de sair daqui.”
Takeshi buscou o centro da respiração, inspira, expira — o som do vento parecia sussurrar ao seu ouvido, criando um ritmo que o obrigava a pensar.
— …
“Qual seria a melhor escolha?!”
Levantou-se e fitou todos à sua volta.
— Ace—
Antes que pudesse terminar, um estrondo de vozes e batidas ecoou pelo corredor; os gritos eram um horror a dilacerar o silêncio.
— Veja o que está acontecendo, Marlon.
Marlon ergueu-se, abriu a porta e, segundos depois, voltou a escancará-la com força. — Preciso que veja isso, agora.
A mulher também se levantou; Takeshi e Lucius seguiram-na até a saída. Lá fora, o cenário era de pânico: pessoas corriam em todas as direções, gritando, atropelando-se umas às outras.
— Acabou para a gente!
— Vamos morrer!
Marlon segurou um homem que soluçava no chão, o corpo tremendo.
— O que está acontecendo? — a voz firme por cima do caos.
O homem, entre lágrimas e tremores, repetiu como se precisasse convencer a si mesmo.
— Acabou para a gente…
A mulher sentiu um leve formigamento percorrer o corpo, como se a situação finalmente tivesse peso.
O homem agarrou a roupa de Marlon com força. Todos ali permaneceram imóveis, atentos, quando sua boca enfim se abriu e as palavras saíram, trêmulas:
— Roubaram todos os alimentos… não sobrou nada.
Todos arregalaram as sobrancelhas, sentindo a garganta apertar ao mesmo tempo. O ar pareceu ficar mais pesado, difícil de engolir.

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