Capítulo 87 - O Deus do Dinheiro Vs. O Ambientalista — Parte II
— Chega disso… Um deus não seria ferido por mim. — Em tom de deboche, Sam apontou para o ombro esquerdo de Alex, sangrando e, depois apontou para o seu próprio ombro esquerdo.
A provocação, simples e direta, tinha a precisão cirúrgica de um bisturi. Não era apenas sobre a ferida, era sobre a imperfeição que ela representava. Imponente e cauterizador de sujeira, Alex recém-saído dos destroços do restaurante chique, sentia-se sustentado pela aura dourada de 80% de sua Energia Externa que reverberava o peso de trilhões de transações globais, e permitiu que seu sorriso esmaecesse. Ele fixou os olhos em Sam, que, mesmo com a camisa rasgada no ponto de impacto do soco e o rastro de sangue seco escorrendo do canto da boca, exibia uma calma que beirava a insolência. Sam apontava para o próprio peito, o local onde o golpe de Alex havia atingido em cheio, e depois, com a mesma mão, indicava o ponto de sangue que manchava o ombro de Alex.
“A fraqueza não é a velocidade, mas a rigidez do valor,” a análise de Sam ressoava em sua mente, acelerada até o limite da compreensão. “Ele usou 80% de Energia Externa para me atingir como uma bala, mas o movimento dele, o chute, foi uma extensão mecânica e previsível da força material. Não havia a fluidez ou a instintividade de um portador que usa uma técnica não-humana, que é adaptável e caótica. O Dinheiro, por ser literal, impõe um limite de versatilidade na execução de um ataque puramente físico em curta-distância. A falha dele é a curta-distância…”
Alex manteve seu sorriso confiante e disse — Sam, seu tolo. Se a minha pele for rasgada, isso é um prejuízo que pode ser coberto. Eu sou o seguro de vida de mim mesmo, e o ativo principal de um mercado infinito que me torna um portador de nível Deus.
Alex levou a mão direita ao ferimento no ombro. E o sangue, que antes escorria escuro, tocou a aura dourada e, numa transmutação instantânea, coagulou-se não em crosta, mas em finíssimos fios de ouro que rapidamente se reabsorveram no tecido. O rombo feito pelo granizo afiado de Sam fechou-se com a naturalidade de uma ferida nunca aberta.
— Viu? Meu prejuízo acaba de ser liquidado com juros. E o seu… O seu ainda está em aberto. Você mal consegue respirar depois do meu soco. — Alex gesticulou em direção a Sam, com as palmas abertas e destilando de sua arrogância. O caos ambiental que controla não vence a ordem monetária que eu controlo. Veja ao lado, tudo aqui tem valor.
No entanto, Sam não demonstrou surpresa com a cura instantânea. Era esperado. O Dinheiro era a técnica de restauração final, desde que houvesse valor para ser pago. E o valor ali era a própria matéria biológica de Alex, transformada em lastro.
— Está certo. O caos ambiental nunca vence a ordem monetária, se essa ordem estiver em toda parte. — Sam respondeu, dando mais um passo lento, o olhar fixo no chão da rua. — Mas eu não uso o caos, Alex. Eu sou a matéria prima do ambiente. E, ao contrário da sua técnica que exige troca e recarga para evoluir, a minha exige apenas o ambiente.
Sam fechou o punho esquerdo, que estava ligeiramente sujo de poeira e detritos “Manipulação do Terreno Avançada!”, a cidade, agora, começou a reagir à sua presença. Não era mais sobre chuva e granizo. Era sobre a base. CRUUMM! CRACK-CRACK! A calçada sob os pés de Alex e a rua adjacente implodiram com uma precisão assustadora. Um círculo perfeito de dez metros de diâmetro ao redor de Alex começou a ceder, o asfalto, o concreto e a terra se liquefazendo em uma areia movediça super-densa e fria. O objetivo visava desequilibrá-lo e forçá-lo a agir de maneira ineficiente. A areia movediça era, na verdade, uma manifestação da habilidade Solo Reverso, elevada pela Manipulação do Terreno Avançada, que buscava anular a fundação de Alex, a base de sua solidez e arrogância.
Alex reagiu com a velocidade que os 80% de Energia Externa lhe concediam. Ele não afundou, pois o valor da estabilidade de seu corpo era superior ao valor da inconstância da terra. Em vez de lutar contra o Solo Reverso, ele o ignorou, levitando ligeiramente e efetuando um salto para trás, em direção à esquina, onde Sam o aguardava.
— Um truque barato de terra, Sam. Você deveria saber que eu posso comprar todos os terrenos dessa cidade!
No meio do salto, enquanto Alex ainda estava no ar, Sam acionou o segundo teste, o de percepção “Ilusões Ambientais Avançadas! — Espelho do Horizonte!”, a névoa do oceano, que se misturava ao ar salgado da orla, de repente se tornou palpável. E no meio do salto, Alex viu o ambiente se duplicar e distorcer. Não era uma ilusão de ótica simples. O mar, a orla, os carros em fuga e o próprio Sam se multiplicaram em milhares de miragens idênticas, refletidas e refratadas. O ambiente vivo de Sam agia como um caleidoscópio enlouquecedor. O propósito era claro — forçar Alex a usar seu Dinheiro para discernir a realidade, gastando preciosa energia interna para determinar qual dos Sam era real. O Dinheiro, em sua essência material, tinha de ser literal. A ilusão era, para Sam, a moeda de troca de Alex.
Alex franziu a testa. A confusão sensorial não era um problema físico, mas uma sobrecarga de dados para sua mente pragmática. Ele precisava de informação clara.
— Meus sentidos não são vendidos, Sam. — Alex demonstrava uma ligeira hesitação em sua voz. Ele não podia perder tempo.
Em vez de dissolver as ilusões com uma explosão de energia, Alex fez um movimento lateral com o braço. Um único, maciço, e perfeitamente lapidado lingote de ouro maciço surgiu do nada no ar, com a massa e o peso de um torpedo, e foi arremessado por Alex contra um dos Sam ilusórios. BA-FUUMM! O lingote, materializado pela técnica Dinheiro, atravessou a miragem. O Sam atingido não desapareceu, mas a área ao redor dele cristalizou-se em pequenos fragmentos de moedas de prata, revelando a instabilidade da ilusão. Apenas o Sam real, que estava parado na esquina, continuou inabalável.
“Ele não dissolve, ele avalia a ilusão e ataca a instabilidade dela com valor tangível, e força o ponto de ruptura,” Sam analisava. “Cada lingote e cada cristalização é uma despesa. Mas a despesa dele é o meu tempo de reação.”
Alex usou o momento em que Sam estava absorto na análise para fechar a distância — Se não quer ser afogado na inconstância do seu próprio clima, seja mais concreto, Sam. — Alex ironizou, agora a apenas trinta metros de Sam.
Sam sorriu, um sorriso fino e perigoso — O concreto é muito barato para mim. — Sam estendeu a palma da mão direita para o chão, com a Energia Interna fluindo como um rio caudaloso.
“Manipulação do Terreno Complexa! — Rocha Ígnea!”, a rua que já estava em colapso devido ao Solo Reverso, respondeu com uma violência geotérmica. Não era mais apenas terra ou asfalto. Uma muralha de rocha basáltica negra, quase vitrificada pelo calor e densidade, irrompeu do chão entre Sam e Alex. A parede tinha uns quinze metros de altura e dois de espessura, uma fortaleza instantânea, criada em menos de um segundo. A densidade era tanta que até mesmo a aura dourada de Alex hesitou em tocá-la.
O impacto da rocha ígnea, que deveria ter atingido Alex em cheio, foi absorvido por sua aura. O Alex de 80% de Energia Externa não hesitou. Ele não tentou contornar a muralha. Ele a viu como um mero obstáculo de custo baixo. POOOWW! Alex desferiu um soco, canalizando toda a força dos 80% de Energia Externa na ponta de seu punho esquerdo. O impacto não fez a muralha desmoronar, mas a pulverizou. Milhões de fragmentos de rocha negra, do tamanho de grãos de areia, foram lançados no ar como uma névoa de meteoritos, acompanhados por um som ensurdecedor que fez os vidros das janelas em um raio de cinquenta metros se estilhaçarem.
No meio da nuvem de pó basáltico, Alex se moveu. Ele viu Sam recuar ligeiramente, aproveitando a cobertura para se posicionar melhor. Sam já estava em um terreno ligeiramente elevado, um pequeno platô que ele havia criado na calçada oposta.
— Você está forçando o confronto físico, Sam. É a única coisa que eu não preciso recarregar no meio da luta, pois a Energia Externa é o cheque especial do meu corpo.
— E você está gastando valor para quebrar barreiras que não te dariam prejuízo se você desviasse. Você não é um deus, Alex, é um megalomaníaco preso à lógica. Você só usa a força bruta porque tem medo de um elemento que não pode comprar ou quantificar.
Sam, então, executou seu próximo movimento, o mais rápido e destrutivo até agora, visando exatamente a fraqueza que havia identificado: a reconfiguração instintiva do Alex em alta velocidade.
Contudo, Sam logo invocou “Alteração de Clima Extrema! — Vórtice de Fogo!”, a umidade da chuva anterior ainda estava presente no ambiente, mas Sam forçou a umidade a evaporar em milissegundos, criando uma zona de ar superaquecido. Do chão do platô em que Sam estava, uma chama azul-esverdeada, densa e faminta (graças à sua habilidade de Manipulação de Fogo de Segunda Classe), irrompeu e formou um mini-tornado que se dirigiu a Alex com a velocidade de um projétil supersônico.
O Vórtice de Fogo tinha dois objetivos; queimar a aura dourada de Alex, o que era ineficaz, mas custoso e, mais importante, negar o toque de recarga de Alex por proximidade. Alex teve uma reação que não era de medo, e sim de frustração calculada. Ele não podia deixar o fogo atingi-lo sem pagar um custo alto para transmutá-lo. O fogo, como a água, era um elemento natural e sem valor intrínseco de troca; para o Dinheiro anulá-lo, Alex teria que materializar um “anti-fogo” caro.
— Patético! — Alex bradou, mas sua voz não tinha o mesmo tom imperturbável de antes.
Alex recuou, mas dessa vez, não com um salto, mas com uma corrida lateral em zigue-zague, uma manobra complexa para esquivar-se do Vórtice de Fogo que o perseguia como um predador. O seu corpo, a 80% de Energia Externa, era rápido o suficiente para fugir, mas a manobra gastava energia de forma não-ideal. Ele estava se descapitalizando. No meio da fuga, Alex sentiu o dreno de energia. A luta, que ele havia iniciado com a arrogância de um deus, estava se tornando um problema de fluxo de caixa. O granizo, o soco bloqueado, a quebra da rocha e, agora, a esquiva do Vórtice de Fogo — tudo isso somado começava a pesar.
“O fluxo está negativo. A recarga da água foi apenas uma migalha. Eu estou em 80% e já sinto a fadiga da execução. O próximo grande movimento dele será decisivo. Preciso de uma recarga massiva. Imediatamente…” A mente de Alex funcionava como uma complexa calculadora financeira, e determinou a fonte de valor mais próxima e mais densa. Ele estava na orla da praia, rodeado por turistas fugindo com notas de baixo valor e telefones. Insuficiente. Seu olhar dourado se fixou no horizonte urbano. A poucas quadras dali, visível por entre as árvores da avenida, estava o Símbolo.
O Banco Central da Região Metropolitana. Um templo do Dinheiro. Uma montanha de valor.
A decisão foi instantânea, brutal e pragmática. Alex parou de correr do Vórtice de Fogo. Ele girou, encarando Sam, com uma expressão que não era mais de arrogância, mas de fome pura, a predatória necessidade de valor.
— Você me forçou a ir ao balcão, Sam. Eu não queria ter que gastar para me divertir, mas você tornou esse jogo entediante. — Alex estalou o pescoço.
Sam não entendeu imediatamente o significado, mas viu o brilho nos olhos de Alex e o ponto para onde ele olhava.
“O banco? Ele não vai…”

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