“Eles estão nos flancos! Atravessaram o perímetro! Estamos sendo massacrados! Recuar! Recuar para…!”, gritou a voz do Tenente Cornelio pelo canal de comando geral, antes de ser abruptamente cortada por um chiado agudo de estática final. Silêncio.

    O canal de comando geral era agora um pandemônio inútil, uma cacofonia de gritos, orações desesperadas à Deusa-Imperatriz ou Adel, sons de vômito dentro de capacetes e o som agudo de estática final à medida que mais e mais sinais vitais desapareciam. A disciplina quebrou. Soldados corriam sem rumo, disparando às cegas contra as sombras dos Messores que dançavam, apenas para serem apagados por trás.

    “Jax, recue agora! Anya, cubra a retirada deles! Retornem para a câmara principal!”, gritou Zeon, seu Kation girando e desintegrando um Messor que se aproximava.

    Mas era tarde demais. A formação defensiva havia entrado em colapso total. A “Tartaruga de Aço” era agora apenas uma carcaça quebrada e sangrando. Era cada soldado por si. A batalha degenerou numa carnificina desesperada e caótica, um redemoinho infernal de plasma azul, energia púrpura, metal retorcido e a poeira silenciosa da entropia. Dos doze mil soldados de elite, restavam agora talvez menos da metade, um punhado de almas aterrorizadas lutando em pequenos bolsões isolados de resistência condenada.

    Zeon viu com horror um Kation familiar da classe ‘Gladiador’ ser cercado por Declinationes. Suas foices de energia púrpuras desmembraram o kation peça por peça com uma eficiência fria e horripilante, ignorando a blindagem, enquanto o piloto gritava em agonia e terror pelo canal aberto até que a estática o silenciou. Mais um.

    O trio de elite agora era apenas uma pequena ilha sitiada num oceano de morte entrópica. O ‘Martelo’ de Jax era uma ruína fumegante. A blindagem de seu ombro esquerdo havia sido arrancada, revelando músculos de metal retorcido e cabos faiscantes. Seu canhão de plasma estava inoperante, e ele empunhava seu martelo sísmico com a fúria cega de um animal encurralado. A fé fervorosa em seus olhos havia sido completamente queimada, substituída por uma fúria desesperada e primal.

    “Eles não param! Eles simplesmente não param!”, ele gritou, seu martelo pulverizando um Declinationes, apenas para ter sua perna direita perfurada novamente pela foice de outro. “Por Adel, eles não param nunca!”.

    Das sombras acima, o ‘Vidente’ de Anya não era mais um caçador, mas a presa acuada. Messores apareciam em flashes rápidos ao redor de sua posição, forçando-a a se mover constantemente, seus tiros de rifle Gauss não mais cirúrgicos, mas apressados, defensivos. “Pouquíssima munição cinética restante, Capitão!”, ela relatou, sua voz tensa, a calma profissional finalmente estilhaçando-se. “Mudando para os canhões de pulso secundários! Minha precisão será severamente comprometida!”.

    O ‘Espectro’ de Zeon não estava muito melhor. O corte profundo em seu ombro sangrava fluido hidráulico, e múltiplos alertas de danos críticos piscavam em seu visor. Sua mente tática, sua maior arma, estava sobrecarregada, reduzida a uma única e brutal equação de sobrevivência: matar o que está na sua frente, tentar salvar quem está ao seu lado, sobreviver mais um maldito segundo.

    E foi no auge daquela batalha desesperada, quando a esperança já parecia uma memória zombeteira, que o universo decidiu que o desespero deles ainda não era profundo o suficiente.

    Um silêncio súbito caiu sobre o campo de batalha. Não um silêncio de som, pois o caos continuava, mas um silêncio de alma. Uma pressão mental avassaladora, fria e pesada como o vácuo infinito, desceu sobre o corredor como uma mortalha invisível. Zeon sentiu isso dentro de seu cockpit, uma força estranha que silenciou os alarmes em sua mente, que sufocou sua raiva, deixando para trás apenas um terror primal, infantil e gelado que ele não sentia desde… desde Europa.

    Os Nictis pararam. 

    Os Resonats baixaram seus rifles. Os Declinationes recuaram. Os Messores fecharam seus portais. Todos se viraram em uníssono, não como soldados recebendo uma ordem, mas como devotos em reverência silenciosa.

    Lá, no centro do corredor, o próprio espaço pareceu adoecer e se dobrar sobre si mesmo. Um portal, visivelmente maior, abriu-se lentamente, não como um buraco negro, mas como uma ferida gangrenada no tecido da realidade, sangrando escuridão e uma sensação palpável de errado.

    Dele, emergiu uma figura solitária.

    Era inegavelmente Nictis, mas num nível de existência totalmente diferente. Com quase quatro metros de altura, sua forma não era apenas metal; parecia ser escuridão solidificada, uma silhueta esculpida no próprio vácuo, flutuando silenciosamente acima do chão manchado de poeira. Era adornado com apêndices adicionais que se assemelhavam a asas de inseto dobradas, que se moviam com vida própria, e ornamentos complexos de um metal pálido adornavam sua cabeça alongada e ombros largos. Um manto esvoaçante de metal segmentado flutuava atrás dele, desafiando a física local.

    Em uma de suas mãos esqueléticas, ele segurava uma foice de guerra colossal. Sua lâmina era um arco perfeito de energia púrpura-escura que não emitia luz, mas parecia ativamente sugar a luz ambiente, criando um halo de vácuo luminoso ao seu redor.

    Seus olhos não eram o brilho opaco dos outros; eram duas estrelas moribundas distantes, pulsando lentamente com uma inteligência antiga, vasta e profundamente indiferente. Não era malevolência; a malevolência implica paixão. Isso era uma presença fria, matemática e final.

    A pressão psíquica na mente de Zeon intensificou-se, tornando-se quase física, e com ela veio uma certeza fria, absoluta e sufocante. Não era uma tática de intimidação. Era uma declaração final. A certeza inescapável da anulação. A certeza de que eles já eram cadáveres ambulantes, apenas esperando o golpe final. O desespero era tão absoluto que era quase uma forma distorcida de libertação. Não havia mais tática. Não havia mais esperança. Apenas a aceitação fria e resignada do fim.

    Uma onda de silêncio psíquico emanou da figura régia, e a batalha parou completamente.

    No comunicador de Zeon, a voz de Anya soou, não mais calma, não mais tensa, mas um sussurro quebrado e frágil, o som de uma alma se rendendo ao inevitável.

    “Capitão… as leituras de energia… elas não existem. Estão fora de qualquer escala conhecida. A distorção espacial… ele é a distorção. Oh, Deus-Imperador… é um Nemesor.”

    Um Lorde Nictis. Um dos generais do apocalipse. E ele viera pessoalmente para o massacre.

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