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    Após aquele dia, Carl teve que subir mais seis vezes até a base militar. Ao todo, eles estavam explorando as Tumbas de Kiescrone há mais de dois meses. Tanto caminharam que, na última vez onde Carl saiu, eles estavam abaixo de um bosque além da fronteira civil de Kiescrone.

    A partir da terceira vez, Bastien e Malcolm também acompanharam Carl até a superfície, pois eles precisavam tomar um pouco de sol.

    Estavam praticamente saindo do reino, e, ainda assim, não haviam encontrado a fonte de energia. Nem mesmo o epicentro que causou aquela onda frenética.

    Todavia, os dados continuaram intensos a cada novo receptor, o que confirmava que eles estavam indo na direção correta.

    Para a sorte dos agentes, eles pararam de encontrar bestas de mana perdidas nas tumbas há onze dias. Lutar no escuro em um local tão claustrofóbico era uma desvantagem colossal para eles, então, a ausência de bestas foi um motivo para festejar.

    Além desse motivo, claro, isso representava que os agentes estavam ainda mais próximos do objetivo: a ausência de bestas também significa uma presença ainda mais predominante de mana.

    Assim como é uma fogueira alta em meio a floresta, que espanta os ursos, uma presença forte de mana pode afastar quaisquer besta irracional que possa sentir. As bestas racionais, portanto, apenas mantêm distância.

    Com a diminuição da presença de bestas ao longo dos dias, eles concluíram que logo chegariam ao objetivo… Mas durou algumas semanas para isso acontecer.

    — Como é Alsuhindr no seu mundo? — perguntou Malcolm, iluminando um corredor sem fim.

    — Não sei dizer… — retrucou Bastien. — Mas, Kiescrone não existe. É um enorme terreno íngreme e sem influência humana…

    — Por quê? — indagou, desta vez, Carl, segurando as alças da mochila.

    — O império não permite…

    Carl se espantou.

    A maior diferença política entre os dois mundos é a independência dos reinos. Enquanto no domínio os reinos têm autoridade própria, com liderança própria e economias, culturas e ética independente, no mundo real é completamente o oposto.

    Ducados, reinos, condados… Todos obedecem ao Estado que, portanto, obedece fielmente ao império.

    A ideia inicial de que Kiescrone é um reino independente e, ainda assim, possui tanto poder e influência global, foi um fato que assustou toda a Quinta Legião a princípio.

    Entretanto, conforme os dias se passaram, eles entenderam parcialmente as vantagens daquele método.

    — Acho que iremos permanecer nesse ciclo por mais alguns dias…

    ***

    Museu de Kiescrone, centro da capital.

    O elevador velho rangia as engrenagens à medida que descia os andares. A luz vazava pelas brechas das paredes, quebradas e devastadas pela força do tempo.

    Metzerai, de braços cruzados e escutando os ruídos frequentes do elevador, ficou escorado na parede enquanto a luz escapando das brechas iluminavam sua expressão tediosa.

    “Croy, espero que seja importante…”

    A impaciência de Metzerai cresceu durante o último mês. Afinal, seu irmão havia prometido um ambiente caótico em Kiescrone, uma verdadeira guerra e mares de sangue.

    Mas não aconteceu até agora…

    Durante esse tempo, o Emissário do Céu esteve com Nik’Hael nas expedições sádicas do pequeno anjo. Embora não adotasse a sede de sangue, Metzerai quis analisar a evolução de seu irmão pequeno.

    Desde o confronto com Theo, há mais de um mês, Nik’Hael recebeu a ordem direta de Bvoyna para sua própria liberdade.

    A liberdade é algo que todos os Emissários desejam: poder saírem das suas correntes e jaulas para fazerem o que bem-quiserem. Fora Nik’Hael, nenhum dos filhos de Bvoyna receberam essa dádiva.

    Nesse período, Hael cometeu tudo o que vinha à mente. Ele não recebeu restrições de força, então entrou em treinamento recluso junto de Metzerai.

    O pequeno anjo chegou a deixar uma raça de bestas de mana à beira da extinção (algo que se não fosse os cristais arcanos teria acontecido), apenas para evoluir sua Evidenttia.

    Ter sido arrancado dessa reclusão para um ambiente tão esquecido e ignorável, fez com que Metzerai se irritar profundamente com seu irmão.

    Após estalar a língua, Metz se lançou para frente com um empurrão sobre a parede, ficando de frente à porta do elevador.

    A máquina velha finalmente chegou ao chão, se cravando nas placas defeituosas.

    Passando para fora, Metzerai bateu os olhos sobre um enorme salão coberto de sangue; corpos estavam lançados entre os móveis quebrados, alguns escondidos naturalmente, como se tivessem morrido daquela forma.

    Porém, nenhum emanava energia. Nem mesmo a energia comum que resta no corpo de humanos normais… Não havia sinal de que eles existiram, senão, claro, seus cadáveres.

    Manchas de sangue pintavam as paredes, até mesmo sobrepondo as antigas obras de artes.

    Ainda assim, não havia sinais de luta.

    Metzerai ficou intrigado com a cena e aquela sensação.

    — Metz, estamos aqui! — exclamou Metcroy, após sentir a presença de seu irmão.

    Caminhando entre o local esquecido pela luz natural, ele subiu num pequeno palco no centro do saguão, onde Croy e Amira estavam.

    O Emissário da Força, sentado apoiadamente numa cômoda velha, estava sorrindo intensamente enquanto Amira estava sentada nos degraus do palco com os dedos entrelaçados.

    — O que foi?

    — Tá estressado? — Metcroy retrucou franzindo o cenho.

    Metzerai havia esbanjado uma voz profunda e rouca, além de monótona.

    Ele fechou os olhos e deu de ombros, dando ordem para seu irmão dar um motivo para não ficar irritado.

    Então, com um sorriso no rosto, ele anunciou:

    — Cento e quarenta e oito… — disse Metcroy, num idioma que Amira não pôde compreender. — Foi o total de vítimas que fiz no último mês. Foi mais que o suficiente para preencher o vazio entre meus dentes, e para começar o ritual para Belial…

    — Parabéns, quer um tapinha nas costas? — Metzerai retrucou no mesmo idioma, entendendo a preocupação em Amira descobrir do que se tratava.

    — Não… — Ele sorriu. — Eu quero que notifique ao Pai e nossos irmãos, que está na hora. O Pai começou a assimilação há um mês, não foi?

    — Uhum.

    — Então, perfeito… Pendaculos marcou um discurso político no centro de Kiescrone para o fim desta semana, em resposta ao movimento dos cidadãos. Eles estão pedindo a abominação do sistema monárquico e aristocrático, para a adoção de um regime totalmente democrático…

    — Estão pedindo a própria ruína? Pend não planeja apoiar, certo?

    — Claro que não. Ele irá forçar uma resposta de Marelia a essa situação. E, obviamente, quando ela negar ou apenas não responder, ele irá iniciar os ataques verbais e confrontos armados no reino…

    — Ele quer uma intervenção militar…

    — Sim, sim. Desde a rebelião no Presídio de Alfmorg, onde alguns líderes militares de Marelia cometeram uma série de negligências e genocídio em massa, os civis estão pedindo arduamente por uma intervenção militar externa.

    Metzerai gargalhou.

    — Bando de animais confusos… Querem uma democracia e uma ditadura ao mesmo tempo? — Ele comentou descontraído.

    — Vai entender. Enfim… Com o lance no clã Nerai, devo conseguir o suficiente para alimentar Belial e fazê-lo abrir os portais…

    — O Pai realmente deseja fazer isso?…

    Metzerai estava desconfortável com aquela decisão, mas entusiasmado pelo desfecho.

    — Sim… A Assimilação de Mundos… A união entre este domínio e o que eles chamam de mundo real… Chegou a hora de renunciar; seremos os desafiantes dessa vez.

    — O que precisamos fazer? — Metzerai disse em nome de todos os Emissários.

    — Atrair… Precisamos nos livrar daquele maldito djinn e da Imperatriz de Alsuhindr, tal como sua filha e os desafiantes do Pai. Deixe que eu, ao lado de nosso Pai, cheguemos até o Tesseract de Arcduth e traremos a verdadeira Assimilação a este mundo.

    — E quanto à Legião dos Retentores? Eles estão pressionando demais os casos que você criou na Catedral…

    — Bom… Nosso pequeno Nik’Hael tem alguns problemas com o General deles, não é? Force-o a fazer seu acerto de contas.

    — E quanto à garota? — perguntou sorrindo de canto.

    — Bom… Tenho que concluir logo os meus planos e me livrar dela… Ela está sendo motivo de preocupação após eu forçar o desenvolvimento de sua habilidade…

    — Por quê?

    Metcroy olhou para Amira intensamente. Apenas com aquela troca de olhares, a princesa do Clã Nerai compreendeu imediatamente do que se tratava.

    Passos esmagadores fugiram pelo saguão. Pequenos tremores balançaram o prédio, derrubando pequenos destroços e contorcendo a estrutura por inteiro.

    Encantando com o que estava a sua frente, Metzerai soltou um suspiro profundo e sem intenção, denotando sua surpresa com clareza.

    Atrás de Amira, ergueu-se um enorme fóssil ancestral, incomum há milhões de anos. O maior dos carnívoros que o planeta já deu à luz. O maior assassino de todas as eras… Um ser sem igual.

    Sentada numa poça de sangue, atrás da princesa Nerai, iluminado por partículas de luz fracas escapando do andar superior, revelou-se um enorme fóssil de um Tyrannosaurus rex.

    Uma energia pálida emanava do esqueleto antigo, acompanhando seu rugido mais fervoroso que balançou ainda mais a estrutura.

    — Essa garota… — murmurou Metzerai, admirado com aquela sensação. — Dominou a necromancia…

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