Planeta Finalia, 1º de março

    Finalia era um planeta de atmosfera em tons de marrom e roxo, predominantemente quente e abafado. O lugar agora servia de base para Ayami, que permanecia sentada em seu divã. Observava através das paredes de vidro, como se estivesse planejando seus próximos passos.

    Ela havia acabado de receber seus serviçais neste ambiente e agora se via sozinha. Sua solidão não durou tanto tempo e logo alguém bateu na grande porta dupla, chamando-a.

    — Grande Ayami. Peço sua permissão para entrar — disse uma voz feminina.

    — Entre! A que devo sua visita, Rosália? — cumprimentou Ayami.

    Ayami vestia um exuberante vestido dourado e prata, de chiffon, que reluzia com a luz. O decote realçava seu colo, enquanto um detalhe de lenço no pescoço dava um ar sofisticado ao conjunto.

    Seu tecido leve se espalhava pelo assento, enquanto contemplava a névoa roxa do planeta através das paredes de vidro. A sala refletia sua personalidade imponente e sofisticada: um imenso espelho barroco se estendia do teto ao chão. No centro, uma mesinha com frutas frescas, do outro lado, um sofá chaise luxuoso repousava sobre um tapete de pele.

    Rosália atravessou a porta daquela sala luxuosa. Era uma mulher de estatura média baixa, mas de presença marcante. Seus cabelos eram longos e ondulados, na cor roxa. Seus olhos de cor esmeralda possuíam longos cílios com um pequeno adorno de bolinha de pluma nas pontas, dando um ar de mistério. 

    — Detectei a energia do núcleo de Potentia na Terra. Gostaria da permissão da senhora para investigar — pediu Rosália.

    — Como disse?! — Ayami se virou para ela, surpresa. — Permissão concedida. Vá imediatamente!

    — Sim, senhora.

    Rosália saiu da sala através de um portal arroxeado que surgiu.

    Planeta Terra

    A praça do centro da cidade era cercada por grandes prédios de alto padrão, envidraçados, com fachadas de mármore, revelando ser uma das zonas mais caras da cidade. Nele havia um parque com muitas árvores, onde era possível sentir o cheiro da vegetação. Havia brinquedos infantis que estavam sempre cheios, os bancos eram usados por estudantes do período matutino e casais. E perto havia um lago artificial, onde habitavam tartarugas, como um ponto turístico inusitado do local. 

    Em uma das árvores, um portal se abriu e Rosália o atravessou, chegando à Terra. Ela vestia um vestido rosa que ressaltava suas formas. Bordados de pérolas percorriam o comprimento da saia em camadas, emanando feminilidade e graciosidade.

    A mulher saiu e analisou o novo ambiente; observou bem seu entorno e, num tom de desprezo, indagou:

    — Que lugar mais… sem graça.

    Casa de Sayuri

    Naquele mesmo dia, no horário do almoço, estava Sayuri, que trabalhava em casa. Ela havia preparado e servido a refeição, e chamou todas.

    Megumi se mostrava elegante, vestindo um tailleur estilo corset, moderno com detalhes em renda. Sua maquiagem era impecável, com delineado preciso e batom vermelho. 

    Toda aquela produção sugeria que ela tinha planejado algo, e quando todas já estavam sentadas e servidas, Megumi decidiu fazer o convite:

    — Meninas, estava aqui pensando que talvez seja hora de nos integrarmos à sociedade. Então achei que seria bom irmos passear um pouco no centro. 

    Ao terminar sua fala, nenhuma das meninas demonstrou reação, com exceção de Naoko, que a conhecia melhor e questionou de maneira direta:

    — Por que não diz logo que quer fazer compras?

    Megumi deu um sorriso amarelo, como se tivesse sido desmascarada. Olhou para Naoko e fez uma expressão fofa, pedindo.

    — Ah, sim! Mas vamos, não é?

    Miyu e Naoko acharam boa a ideia de sair e Akiko ficou animada de ter a possibilidade de comprar novos jogos. Sayuri ficou em casa pois tinha compromissos, e Matsui foi para sua aula, que era no turno da tarde.

    Centro da cidade

    O centro estava movimentado para uma segunda-feira. O barulho dos passos, das sacolas das pessoas fazendo compras, dos casais namorando pelos bancos das praças e das famílias passeando. Ecoando por entre essa bagunça sonora, o som do salto plataforma de uma garota apressada para resolver seus compromissos.

    “Todas as contas pagas. Agora preciso comprar o que a mãe pediu.” Yukino tentava organizar mentalmente suas atividades daquela tarde, para não se esquecer enquanto corria.

    Contrastando com o uniforme masculino daquela manhã, Yukino agora usava um vestido de cetim roxo profundo bastante feminino. Curto e assimétrico, cheio de camadas e drapeados. Corria com suas sandálias plataforma pretas. A meia-calça preta tirava o ar romântico do conjunto, revelando sua rebeldia.

    Não distante do local, passeando pelas vitrines das lojas estavam Megumi e as meninas.

    Megumi percebeu que as meninas olhavam as lojas, mas não mostravam interesse.

    — Não fiquem com vergonha! Hoje eu posso gastar — Megumi anunciou sorrindo para todas.

    — Megumi! De onde tirou tanto dinheiro? — questionou Naoko, com seu look streetwear em jeans, incomodada. — Assaltou um banco por acaso?

    — É segredo! — Megumi soltou uma risadinha.

    — Mas… 

    Naoko ficou em choque, ainda mais preocupada com a situação, já que não sabia quais trabalhos sua amiga estaria fazendo para conseguir dinheiro em tão pouco tempo naquele planeta.

    Naoko não teve espaço para mais questionamentos, Megumi deu as costas e se afastou, para não falar sobre o assunto.

    As outras duas ficaram totalmente alheias à discussão. Akiko, de casaco lilás e seu vestido vermelho com saia de plumas, estava muito focada vendo uma vitrine de uma loja de jogos. Miyu, com seu vestido verde de organza, observava o movimento nos arredores, sem buscar nada em específico. 

    Foi quando Miyu percebeu que uma garota da escola se encontrava no mesmo local e avisou, tocando nas costas de sua amiga:

    — Ei, Akiko. Aquela lá não é a Yukino?

    — Onde? Vamos chamar! 

    Akiko se virou para procurar e a avistou ao longe. 

    — YUKINOOOOOO!! — gritou.

    — Para de escândalo! — Miyu ficou envergonhada com a atitude dela.

    O grito foi tão alto que chamou a atenção de Yukino, que parou de correr e se virou, avistando as duas colegas.

    Yukino parou o que estava fazendo e foi em direção às duas. Distraindo-se e não percebendo que, neste momento, Rosália a acompanhava de longe. A mulher havia terminado de tirar suas conclusões e chamou a atenção da garota:

    — Você! Espere aí! 

    Percebendo que era ela que estava sendo chamada, Yukino se virou para ver quem era a pessoa.

    — O que você é? Me diga, agora! — questionou Rosália.

    A jovem Yukino não entendeu o que aquela mulher insinuava.

    — Se revele! Qual é sua Potentia? — perguntou Rosália, com mais agressividade, mas antes que pudesse continuar os questionamentos, um muro de água rapidamente se formou entre as duas.

    Aquele poder sendo lançado de maneira abrupta causou estranhamento em Rosália. Yukino ficou atônita e não se moveu, apenas observou a estranha massa de água que se mantinha constante.

    — CORRE LOGO DAÍ! — gritou Naoko ao fundo. 

    Naoko estava com os braços envoltos em uma espécie de luvas de água que se estendiam e formavam o fenômeno que presenciavam.

    Yukino não conhecia nenhuma das duas, não sabia se era uma armadilha e acabou ficando na dúvida sobre que atitude tomar.

    Rosália encarou Naoko e logo decidiu seu próximo movimento. De suas mãos começaram a sair faíscas, os sons dos pequenos raios ecoavam alto e foram se tornando maiores em tamanho e forma. 

    “Eletricidade?”, pensou Naoko, surpresa ao perceber a natureza da Potentia da mulher à sua frente. 

    Aproveitando a condução da eletricidade na água, Rosália lançou seu golpe de maneira veloz. Os raios percorreram a água, misturando-se a ela. Naoko foi veloz o bastante e cortou o caminho de água, acabando com a condução elétrica.

    Aliviada, ofegante e com ferimentos leves, Naoko se tranquilizou ao perceber que conseguiu cortar a massa de água a tempo de evitar danos maiores. 

    Akiko acabou se preocupando com o ataque súbito e foi verificar se estava tudo bem.

    — Vamos nos preocupar com sua amiga, não comigo — respondeu Naoko em um tom seco.

    Os ataques de água e raios acabaram por deixar a população comum alarmada. Os civis começaram a se juntar pois achavam que era uma encenação amadora com efeitos especiais, não fazendo a mínima ideia do perigo que corriam. 

    Megumi logo se atentou às pessoas e, para evitar possíveis acidentes, levantou a mão ao alto, gerando feixes de luz quentes e fortes o suficiente para incomodar os olhos dos que se encontravam no perímetro. Revelando-se como uma Potentia de Luz.

    A ardência foi sentida pelos olhos de Rosália, que ficou com dificuldade de enxergar qualquer coisa à sua frente. “Duas com Potentia? Mas a energia é diferente da menina.” pensou, achando estranho aqueles poderes aparecerem de repente.

    Ao mesmo tempo em que agonizava com a forte luz, ervas daninhas tomaram forma ao seu redor, rapidamente formando um muro verde e firme.

    — O QUE É MAIS ESSA AGORA? 

    Rosália percebeu que a situação apenas piorava e se via em uma luta desbalanceada de três contra uma, sendo que apenas havia conseguido ver uma delas com clareza.

    O muro de ervas daninhas vinha de Miyu, que revelou possuir a Potentia de Plantas. 

    Vendo que era sua amiga que utilizava o poder, e avistando Akiko ao lado, Yukino sentiu segurança e aproveitou para correr e sair do alcance de Rosália.

    — AKIKO, O QUE TÁ ACONTECENDO!? O QUE É ESSA MULHER? — questionou Yukino, com urgência.

    — Amiga… Não faço ideia — respondeu Akiko, em um tom relaxado.

    Ao mesmo tempo em que as duas conversavam, Rosália, que se encontrava em uma jaula de folhas, começou a tramar alguma maneira de sair daquela armadilha sem ficar de mãos vazias.

    “Três… Três com Potentia bem diferentes… Não esperava por nada disso…”, pensava com indignação. Por um momento, achou que não haveria mais o que fazer, mas logo voltou a si e começou a se preparar para atacar, aproveitando a distração das Potentia que estavam ali. Ela então começou a gerar uma nova esfera de raios. 

    “Vou tentar pegar pelo menos a menina… Vou me guiar pela energia dela e tentar atingir por cima das plantas.” Rosália se via cercada pelas laterais, o único jeito seria enviar os raios por cima, mas seria necessário controlar a energia para capturá-la e ser certeira em seu alvo.

    Naoko, a mais atenta, percebeu que um ataque estava por vir e alertou a todas para que não se distraíssem. 

    Todas prestaram atenção no local onde Rosália se encontrava e perceberam que a mulher preparava um novo ataque de eletricidade, e que poderia ser mais perigoso que o anterior.

    Yukino percebeu que a situação estava para piorar, e por algum motivo, usando sua intuição, levantou sua mão em direção à Rosália, presa no muro de plantas. Um frio percorreu todo o seu corpo, era a mesma sensação estranha da noite mal dormida de 12 de novembro do ano anterior.

    Ela se deixou guiar por aquilo que seu corpo a pedia para fazer, transferindo essa energia fria para a mão, de onde se formaram diversas estalagmites que foram disparadas velozmente, atingindo o muro de plantas em cheio, e quase acertando o pescoço de Rosália.

    “Água, luz, plantas, gelo, quatro Potentia juntas…”, Rosália ficou apavorada com o que tinha acabado de presenciar. “Eu não tenho como lidar com nada disso.”

    Transtornada com a situação, decidiu que não ficaria mais ali. Cercada pelas plantas, discretamente abriu seu portal para poder sair e voltar ao seu mundo. O portal se formou e tanto ela quanto o muro de plantas sumiram, não deixando nenhum rastro.

    — Ela sumiu — comentou Yukino ao se deparar com o lugar vazio, não sabia bem o que pensar, sua respiração pesada, seu olhar atônito deixavam transparecer sua confusão. — O que aconteceu agora?

    — Amiga! A gente não faz a mínima ideia, mas fique bem tranquila, a gente vai descobrir isso juntas! — respondeu Akiko, se apoiando nos ombros da amiga, tentando manter a situação sob controle, à sua própria maneira.

    “Como vou ficar tranquila?” — pensou Yukino, um pouco incomodada, ainda sem nenhuma explicação para tudo aquilo que estava fora da normalidade.

    Miyu, que sabia que tudo aquilo era muito diferente para sua colega, se colocou para explicar:

    — Yukino, acho que seria melhor nos acompanhar. Temos alguém que pode responder suas dúvidas.

    Por um momento, hesitou e ponderou sobre o convite, após pensar um pouco, Yukino respondeu:

    — Tá, vou só comprar algo e então vamos juntas.

    As meninas acompanharam Yukino em seus compromissos e a levaram até a casa em que moravam.

    Finalia

    O portal reabriu no planeta de névoa e Rosália surgiu com um semblante tranquilo, aliviada por estar segura e de volta. A calma inicial logo se dissipou, dando lugar à ira que a impulsionava a acertar contas com sua mestra.

    A porta da sala de Ayami, que estava fechada, foi aberta abruptamente por Rosália, que não se importou em pedir permissão para entrar.

    — AYAMI, COMO OUSA? VOCÊ MENTIU PARA NÓS! — gritou Rosália, entrando e acusando.

    — Como ousa você, Rosália, chegar em minha sala me acusando?

    Ayami não era uma pessoa paciente com esse tipo de atitude, mas se conteve para escutar a reclamação de sua subordinada. Ao menos mantinha sua postura de soberana.

    — Você me chamou para uma missão de reconhecimento… Disse que era simples, que não havia delas neste planeta. Mas eu só cheguei e fui atacada por quatro ao mesmo tempo. — indagou Rosália.

    — Ah, por favor, Rosália, não se faça de inocente. Você foi muito bem avisada de que na Terra possuem armas. — respondeu Ayami, com desdém.

    — Não estou falando daqueles armamentos que você mostrou. Eu fui atacada por quatro Potentia diferentes. — Rosália ficou ainda mais incomodada por causa da maneira que ela respondeu.

    — COMO? EXPLIQUE ISSO IMEDIATAMENTE! 

    Ayami não conseguiu disfarçar seu espanto. Sua subordinada explicou o ocorrido, reclamando que não queria passar com aquilo e que não era o combinado.

    A soberana rangeu os dentes e se demonstrou bastante incomodada, a única coisa que conseguiu foi pensar sobre a mulher de longos cabelos cor de rosa que apareceu no dia em que visitou Utopia.

    “Ela deve estar brincando comigo…”

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