“De onde eu a conheço…?”
    — A. L.

    1.

    Um ponto surpreendente, aquela mansão apertada e deslocada de seu ambiente, possuía um belo e espesso jardim naquele pequeno espaço, Melissa e Caio observavam-no à medida que seguiam o mordomo até a porta de entrada da residência. A construção era antiga, porém bem cuidada, e dispunha de um ar velho, mas charmoso.

    Mesmo situada em um bairro de classe baixa, aquele recanto não se destacava tanto quanto se poderia esperar. Exibia a imponência de ser uma enorme casa, claro, com um jardim um pouco desleixado, sim, porém sua idade — que muitos ali encaravam como pré-histórica — fazia a maior parte dos vizinhos descartar a beleza daquele ponto do mapa, como se fosse apenas mais uma estrutura esquecida ou de pouco valor.

    Algumas plantas trepadeiras se uniam às paredes da velha construção, subindo sem ordem definida e contribuindo com uma cor exótica para o todo. As telhas irradiavam um tom desbotado quando o sol as agraciava com seu brilho, denunciando o peso dos anos sem necessariamente parecer abandono.

    Os três andaram alguns passos até finalmente colocarem o pé na sacada. Subiram os degraus e, ali, puderam ouvir o pequeno ranger da madeira sob os pés — um som discreto, mas presente.

    A entrada principal, uma porta dupla, com uma pequena janela de vidro com desenhos adornados elegantes, o contorno metálico trazia mínimos detalhes em ouro, o suficiente para servir como uma pequena antecipação do que estava por vir.

    Quando as portas se abriram, depararam-se com o salão de entrada, não era algo muito grande, mas era bonito: alguns vasos de plantas davam-nos as boas-vindas dos dois lados, como bons guardiões. Um relógio majestoso ocupava um dos cantos da sala, ele permanecia ao lado de um arco que se seguia para outro cômodo. Do centro, partia uma dupla escada em espiral que levava ao segundo andar, onde diversos livros se alinhavam pelas prateleiras, acompanhando o corredor superior.

    Caio e Melissa ficaram surpresos, mas se esforçaram para não demonstrar, os quartos eram apertados, mas apresentavam uma densidade de beleza incrível. Seus olhares corriam pelos cantos do salão, tentando captar cada detalhe que ainda não perceberam.

    O mordomo se virou, percebendo a expressão que faziam. Seu rosto demonstrou certo descontentamento — não explícito, mas claro o suficiente — antes de dizer:

    — A senhorita Anna está se preparando para seu ensaio. Gostariam de me acompanhar ou preferem se deter no salão principal?

    Caio se voltou para o mordomo, enquanto Melissa ainda observava o ambiente ao redor.

    — Podemos acompanhar, sim — disse Caio.

    — Excelente. Sigam-me.

    2.

    E assim, os passos voltaram a ecoar pelos corredores e cômodos da residência.

    O interior da casa era tão bem cuidado que facilmente se poderia supor um certo luxo por parte de seus moradores — e também de seus servos. À medida que caminhavam, passaram pelo que parecia ser um salão destinado a convidados: dois grandes sofás ladeavam uma mesa central, tudo visivelmente preparado para receber visitas a qualquer momento.

    Os sofás, poltronas e cadeiras, além de elegantes, aparentavam um conforto tentador. Em Caio, despertaram uma vontade súbita de se deitar e aproveitar um breve cochilo, ideia que precisou ser rapidamente afastada.

    Ao percorrer o ambiente com o olhar, tornava-se evidente que o elemento que mais se destacava era um magnífico piano, repousando com imponência em um dos cantos da sala.

    Uma breve passagem pelo lugar, mas cada cantinho expressava sua peculiaridade.

    Por fim, alcançaram o cômodo onde a proprietária se encontrava. Ela estava posicionada ao centro do quarto, sendo medida por três empregadas, enquanto comia algumas uvas oferecidas por uma quarta.

    A primeira impressão da dupla foi imediata: ela parecia muito mais jovem — e menor — do que lhes haviam dito.

    O mordomo parou logo após entrar, curvou-se em uma breve reverência e anunciou:

    — Senhorita, eles chegaram.

    A proprietária virou-se na direção da voz e comentou:

    — Estão atrasados.

    — Tivemos alguns problemas — explicou Caio, adiantando-se —, mas nós—

    — Hum — interrompeu ela, levando à boca a última uva. — Podem sair. Quero ficar a sós com eles.

    As empregadas trocaram olhares, hesitantes.

    — É sério, podem ir — reforçou a proprietária, assumindo uma expressão que oscilava entre o sério e o quase infantil.

    — Como desejar, minha senhora — responderam quase em uníssono, após se levantarem e realizarem uma breve reverência.

    Recolheram os tecidos espalhados pelo chão, junto de linhas e fitas, e deixaram o quarto em silêncio.

    A proprietária bateu uma palma e voltou o olhar para os dois que permaneciam ali.

    — Finalmente vocês chegaram — fez uma breve pausa. — Espere. Não havia mais um?

    Melissa lançou um olhar rápido para Caio e, em seguida, voltou-se para a anfitriã.

    — Houve alguns imprevistos nos últimos dias, e ele não conseguiu vir. Mas nós adaptamos o plano. Vai dar certo apenas com a gente, se me permit—

    — Não permito — interrompeu-a de imediato. — Hmmm… acho melhor conversarmos em outro lugar.

    Após dizer isso, a proprietária dirigiu-se até um criado-mudo próximo, pegou um pequeno sino e o tocou. Em seguida, passou por Caio e Melissa — que a observavam em silêncio — e atravessou a porta do cômodo.

    Percebendo que seus convidados permaneciam imóveis, ela parou, virou-se e disse:

    — Vamos para a sala. Lá é um lugar melhor. Vamos — terminou fazendo um sinal com a mão para eles a acompanharem.

    E eles a seguiram. Melissa sentia um leve incômodo por ter sido interrompida de uma forma tão rude, mas optou por relevar.

    No meio do caminho, uma empregada aproximou-se da proprietária. Ela inclinou-se discretamente e cochichou algumas palavras ao ouvido da subordinada enquanto caminhavam. A reação foi imediata: a empregada interrompeu o passo, fez uma reverência e tomou outro caminho.

    Caio e Melissa trocaram olhares enquanto seguiam aquela que agora liderava o trajeto. A proprietária caminhava com confiança, classe e uma beleza contida. Por um breve instante, ambos se perguntaram como alguém que se portava daquela maneira podia viver em um lugar que não parecia refletir nada daquilo que era.

    Quando finalmente alcançaram o salão principal, aquela a quem seguiam se ajeitou e se sentou em um dos sofás, logo em seguida realizou um gesto com uma de suas mãos, indicando para se sentarem naquele a sua frente.

    — Sentem-se — disse.

    Caio e Melissa se olharam novamente e se sentaram em sequência.

    A proprietária sorriu e continuou entoando cada palavra com um breve sorriso meigo e inocente — Agora, sim, podemos começar.

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