Kalamera limpou as mãos sujas de fuligem e se afastou do telescópio de infravermelho recém-finalizado. O projeto, que levara semanas para ser concluído, finalmente estava pronto para os testes.

    — Está tudo exatamente como você pediu. — disse ela, cruzando os braços. — O espelho principal é feito de bronze polido com precisão, as lentes foram moldadas pelos melhores artesãos de vidro de Ayas-Kin, e os filtros que impedem a passagem da luz visível foram feitos com os vidros tingidos com sais minerais e óxidos que filtram apenas a parte que queremos.

    Marco sorriu, inspecionando o equipamento.

    — E o sistema de detecção?

    Kalamera apontou para um compartimento metálico abaixo da lente principal.

    — Usei placas metálicas sensíveis ao calor. Quando a radiação infravermelha incide sobre elas, há uma variação térmica mínima que é amplificada por pequenos termopares feitos com ligas metálicas. Isso gera uma resposta que pode ser traduzida em imagens térmicas.

    Marco assentiu, satisfeito.

    — E o resfriamento?

    Ela bufou, como se não fosse grande coisa.

    — Esse foi o mais fácil de se resolver.

    Ela cruzou os braços, um leve sorriso de orgulho surgindo em seu rosto. Ela aponta uma runa no meio do telescópio.

    — Com essa runa, o sistema mantém uma temperatura ideal para evitar interferências térmicas externas. Dessa forma, só captamos a radiação infravermelha real das estrelas e não o calor ambiente.

    Marco analisou a runa entalhada no corpo do telescópio e sorriu.

    — Isso significa que podemos observar mesmo em noites quentes sem distorções.

    Kalamera assentiu.

    — Exato. O resfriamento rápido garante que as leituras sejam precisas e contínuas.

    Marco olhou para o telescópio com admiração renovada. Com aquele sistema, poderiam mapear o céu como nunca.

    — Mas como vamos registrar os dados?

    Ela abriu uma caixa de metal ao lado do telescópio e revelou um dispositivo compacto.

    — Essa é a impressora portátil que eu projetei. Ela funciona com placas sensíveis ao calor, que reagem à energia detectada e registram a imagem como uma espécie de desenho térmico. Depois, o papel tratado fixa os traços para que a imagem não se degrade.

    Marco pegou uma das folhas já impressas, vendo as variações térmicas marcadas em diferentes tons.

    —Isso vai revolucionar nosso estudo do céu…

    Kalamera o observou por um instante antes de perguntar:

    — E onde pretende montar tudo isso?

    ***

    Com o telescópio de infravermelho e a impressora portátil devidamente montados na copa de uma árvore alta, Marco e Kalamera estavam prontos para o primeiro teste real do equipamento. O ar fresco da noite soprava entre os galhos, e as estrelas cintilavam no céu límpido de Ayas-Kin. Ao lado do telescópio recém-construído, Marco também havia trazido seu telescópio óptico, que Kalamera aprimorara com espelhos mais bem polidos e lentes de vidro refinadas.

    — Vamos começar com algo simples — disse Marco, ajustando o telescópio óptico. — Olhe ali.

    Kalamera se aproximou e inclinou o rosto sobre a ocular. O brilho azulado de Maera surgiu diante de seus olhos, a luz refletida da estrela central realçando a superfície do planeta distante.

    — É lindo… — ela murmurou, fascinada.

    Marco sorriu e então ajustou a posição do telescópio.

    — Agora olhe para esta região.

    Kalamera inclinou-se novamente e franziu a testa. Tudo o que via era escuridão total.

    — Não vejo nada — disse, confusa.

    — Exato — Marco explicou. — Essa área do sistema está coberta por nuvens cósmicas. O telescópio óptico não consegue atravessá-las.

    Ele então se dirigiu ao telescópio de infravermelho, ajustando suas coordenadas para o mesmo ponto.

    — Agora tente com esse.

    Kalamera trocou de posição e olhou pelo visor do telescópio especial. Assim que seus olhos se adaptaram, ela soltou um leve arquejo.

    — Eu… eu não vejo as nuvens — disse, surpresa. — Mas há algo enorme!

    Marco ajustou a lente para ele mesmo e olhou. Seu coração acelerou. Ali, onde antes havia apenas escuridão, agora se revelava um novo planeta. Uma esfera pálida brilhava sob a visão infravermelha, delineada por emissões sutis de calor que escapavam das densas nuvens ao seu redor.

    — Descobrimos um novo planeta… — Marco sussurrou, a empolgação transbordando em sua voz. — Isso é incrível!

    Ele se virou para Kalamera com um sorriso.

    — Você pode escolher o nome.

    Ela ficou em silêncio por um instante, contemplando a grandiosidade do que acabaram de encontrar. Então, com um tom resoluto, respondeu:

    — Wynrae.

    Marco assentiu, gravando o nome na memória.

    — Bem-vinda ao universo, Wynrae.

    ***

    Alguns dias haviam se passado desde a descoberta de Wynrae. Marco e Kalamera estavam imersos no estudo das imagens térmicas que haviam capturado com o telescópio de infravermelho. Cada nova captura revelava detalhes antes ocultos: padrões climáticos, possíveis formações geológicas e variações de temperatura que poderiam indicar a presença de atmosferas. Mas, para Marco, aquilo ainda não era o bastante.

    — Precisamos de imagens visuais também — ele comentou enquanto observava os registros térmicos sobre a mesa da oficina de Kalamera.

    — Imagens visuais? — Kalamera franziu a testa. — Você já mencionou essa ideia de máquina fotográfica antes. Como exatamente ela funcionaria?

    Marco abriu um sorriso. Esse era um dos momentos que ele mais gostava: compartilhar conhecimento.

    Enquanto Marco se preparava para responder, a voz animada e metódica de Nova surgiu em sua mente.

    “Recomendo um design baseado na câmara escura! Para capturar imagens, vocês precisarão de uma lente convexa para focalizar a luz em uma superfície sensível. O material ideal para isso seria uma chapa revestida com sais de prata, pois eles reagem à luz e escurecem em diferentes intensidades conforme a exposição!”

    Marco assentiu ligeiramente, absorvendo as informações e traduzindo-as para Kalamera.

    — Precisamos de uma caixa selada, uma lente convexa e um material que reaja à luz. A melhor opção seria usar sais de prata, pois eles escurecem quando expostos à luz, criando a imagem.

    Kalamera cruzou os braços, pensativa.

    — E como fixamos essa imagem?

    Nova respondeu antes que Marco pudesse sequer formular um pensamento.

    “Solução simples! Usem uma segunda substância química para interromper a reação da prata à luz. Sugiro um banho em tiossulfato de sódio ou, se não tiverem esse material, uma infusão de ervas alcalinas pode funcionar como estabilizador”.

    Marco repetiu a explicação, adaptando-a para um contexto mais familiar para Kalamera.

    — Depois que a imagem for capturada, precisamos mergulhá-la em uma solução estabilizadora para evitar que continue reagindo à luz. Podemos tentar criar algo semelhante ao tiossulfato de sódio ou testar algumas misturas alquímicas para ver qual funciona melhor.

    Kalamera coçou o queixo, já imaginando o processo.

    — Parece viável. Vai levar um tempo para encontrar os sais certos e testar as soluções, mas se conseguirmos…

    — … vamos poder registrar imagens reais dos planetas — completou Marco com entusiasmo.

    Nos dias seguintes, Kalamera trabalhou na estrutura da câmera enquanto Marco, com a orientação discreta de Nova, refinava a composição das placas fotossensíveis e das soluções de revelação. O primeiro teste bem-sucedido capturou uma imagem rudimentar do telescópio óptico sobre a mesa de trabalho. Mesmo que imperfeita, foi o suficiente para comprovar que estavam no caminho certo.

    O passo seguinte era adaptar esse sistema para os telescópios.

    — Se conseguirmos integrar essa tecnologia ao telescópio óptico e ao de infravermelho — Marco disse, estudando um dos diagramas que havia desenhado —, poderemos capturar imagens detalhadas do espaço e estudá-las sem depender apenas da observação direta. Poderemos comparar essas imagens ao longo do tempo para identificar mudanças na superfície e na atmosfera.

    Kalamera sorriu, empolgada com as possibilidades.

    — Mas ainda precisamos de telescópios maiores para captar mais detalhes. Se aumentarmos o diâmetro dos espelhos e aperfeiçoarmos as lentes, poderemos ver além do que já conseguimos.

    Marco assentiu, já visualizando o próximo grande projeto. Ele abriu um novo pergaminho e começou a desenhar novos projetos.

    — Um telescópio óptico com um espelho maior e um telescópio infravermelho fixo. Precisamos encontrar o local perfeito para instalá-los.

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 0% (0 votos)

    Nota