Ei, você é curioso? Se for, que bom, deixo saberem o quanto quiserem de mim! Pra começo de conversa, eu sou um sapo mágico, tá ligado? Eu sei que minha foto de perfil engana, mas é sério! Infelizmente, estou preso no fundo do poço, minha sabedoria não pode sair desse lugar, mas você pode sempre vir aqui e jogar uma moedinha ou perguntar ao sapo do poço sobre sua sabedoria.
De qualquer forma, esse sapo já foi autor de outras coisas, sabia? Ele também ensina e faz trabalhos relacionados a escrita! Bizarro? Com certeza é um sapo mágico, oras! Agora, se encante com minha magia e leia todas as minhas histórias (e entre no discord), simsalabim!
Capítulo 6: Ressentimentos de Um Pequeno Monstro
O sumiço de Justi virou um assunto muito falado no vilarejo. Já que o diabinho não tinha pais, era dada pouca relevância para sua presença, pois de fato ninguém gostava dele arranjando problemas para todos. Como era uma criança, relevavam as punições, o que levou a alguns moradores crerem que seu desaparecimento foi uma benção disfarçada.
O conjunto de brincadeiras maldosas e o temperamento ruim daquele encrenqueiro o tornou extremamente odiado, assim somente uma pessoa lamentou pela tragédia: a irmã Zana. Ajoelhada em frente a uma cruz de madeira, a moça orava em silêncio pela alma do menino, seus dedos apertavam uns aos outros, usando a dor de suas unhas cortando a pele para evitar lágrimas de caírem.
Há muito tempo seus avisos eram direcionados a Justi, no entanto, as palavras entravam por um ouvido e saiam pelo outro, culminando em um terrível destino. Ela perguntava ao próprio coração se poderia ter feito melhor, duvidando que se tivesse sido mais atenta e complacente, nada disso ocorreria. As teorias iam e vinham como uma bomba prestes a detonar, causando dores à mente cansada por noites sem sono. Ela esperou dias para que um menino loiro aparecesse nas planícies, mas isso jamais aconteceu.
Zana ergueu-se, batendo nas bordas da roupa para tirar terra. Seus olhos caíram sobre a cruz, a representação de uma memória, uma marca imposta na terra que prevaleceria por meses sem fim, e que perderia o significado quando ela morresse. Um suspiro fugiu da boca, as mãos limparam os olhos marejados e sua cabeça virou para trás, em direção ao casarão no topo da colina.
Abaixo da árvore ao lado da entrada, uma criança com cabelo preto em forma de tigela lia um livro grosso e de capa dura. Um par de bengalas estava ao seu lado, os pés possuíam inúmeras faixas e seu rosto estava tão pálido que seria confundido com um cadáver prestes a ser enterrado. Zana se aproximou de Liane, que abaixou o livro e a encarou com a cabeça inclinada para o lado.
— O que foi, irmã?
— Liane, eu sei que você e o Justi interagiam muito, e sei que ele foi muito traiçoeiro contigo, eu só vim te pedir para não agradecer pela desgraça dos outros. — Ela pegou nos dedinhos do garoto e os esfregou em suas mãos. — Eu também descobri sobre sua rixa com ele, sobre como brigaram escondidos e como você nutriu muita raiva dele por ser um garoto tão maldoso… Eu só queria te pedir que… não alimente nenhuma satisfação por isso, tudo bem?
— Uhum. — Ele fechou o livro e pôs um graveto para marcar a página em que parou. — Eu não penso nisso, irmã Zana. Você sempre foi legal comigo e sempre ficou ao meu lado quando precisei, então desde que você continue cuidando de mim, tá tudo bem. Eu te amo, irmã Zana.
Um sorrisinho surgiu na face do garoto, que beijou a mão da mulher e agarrou seu pulso para afagá-lo. Ela suspirou de alívio, o peso em seus ombros diminuiu só de ver aquela linda feição. Sim, desde que aquele pequenino continuasse bem, talvez pudesse se desculpar pela sua negligência. Ainda era triste pensar em como poderia ter mudado o destino de Justi, no entanto, as coisas passaram, e seus olhos deveriam focar em quem estava consigo naquele momento ao invés de lamentar por quem partiu.
A fé de que o coitado estivesse vivo e perdido entre as árvores permaneceu no seu coração, rezar era o que poderia fazer agora. Depois de beijar Liane na testa, Zana se levantou e deu um último carinho nele antes de retornar ao orfanato, onde daria as preparações para o almoço.
O garotinho deixado atrás, por outro lado, ficou com uma expressão amarga quando ela se foi. Não era porque estava indo embora, mas por mentir tão descaradamente e sair impune. Se suas mentiras eram tão fáceis de perceber, por que não recebeu uma punição? Por que a irmã ignorou suas palavras de crocodilo? Ele mordeu o lábio de frustração, fazer as coisas erradas eram apetitosas na primeira instância, no entanto, o gosto amargo dos fatos se desenvolvendo à sua frente mudavam isso.
Bastante eloquente, pequenino. Até mesmo eu acreditei no que você disse.
— Não é a melhor hora, Erika… — Seus olhos perfuraram as costas da moça já distante. — Ela não sabe o que sinto, e eu não tenho coragem de confessar o que fiz. Justi morreu e eu estou vivendo como se nada tivesse acontecido… A irmã até mesmo chorou pela morte dele, você entende?
Eu não entendo. Não funciono de forma igual a vocês, mortais. A única vida que me importa é a sua, pois dependo de você para tudo. Para mim, é mais benéfico que aquele moleque suma do que ficar ao seu lado. Não preciso dizer de novo sobre a chance de você morrer perto dele, certo?
— É, melhor ficar quieto… As coisas vão melhorar daqui para frente…
Antes daquela cruz ser posta na estrada, Er’Ika e Liane investigaram a floresta em busca de Justi. Na sua mente eram vividos os sons dos grilos e passarinhos abaixo da luz do sol nascente, uma manhã linda para um dia romântico, até ambos acharem um pedaço de um pé humano no meio do caminho. Aquilo serviu como prova definitiva da morte do garoto, o que deu um alívio imenso para Liane, ao mesmo tempo que gerou uma série de ressentimentos se havia feito o certo.
Ele se livrou do problema, sua vida agora era muito pacífica, mas vivia questionando se havia outra forma de contorná-lo. A criança fungou, seus olhos estavam parcialmente molhados e a visão embaçou. Queria chorar por ser pior que aquelas bestas sanguinárias dentro da floresta, por não sentir absolutamente nada pela morte do outro, por enganar a pessoa mais especial de sua vida, para colaborar com uma insanidade de outro mundo.
Liane, você fez o certo. Não chore e não deixe pensamentos frívolos tomarem sua cabeça. Escolhas brutais são necessárias para sobreviver. Se você não as fizer, a sua morte e daqueles ao seu redor virá. Não fraqueje, isso foi o melhor que pudemos seguir.
Liane escutou aquelas palavras e tentou apagar qualquer arrependimento. Era melhor somente ouvir, esquecer os pensamentos que afligiam a mente. Era mais fácil obedecer, mais fácil seguir alguém comandando seus passos. Um olhar pesaroso recaiu sobre a cruz, a criança cerrou os dentes, ergueu-se e retornou para dentro do casarão, com o livro por baixo do braço.
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