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    Protótipo de capa Volume 1 – Ironia Divina

    Capa Volume 1

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    “Já estive aqui antes…?”

    O pensamento não era uma certeza, apenas uma sensação que rastejava pela pele como um sussurro esquecido. Algo nela reconhecia aquela vastidão líquida, aquele frio úmido que a envolvia como um casulo sufocante. 

    Mas quando? Em sua vida anterior do Grande Vazio? Ou algum resquício de sua vida solitária que estava deixando passar? 

    Estava tão fundo.

    Tão quieto.

    Tão… azul.

    A imensidão era sufocante. A pressão, esmagadora. Cada célula gritava que ela estava afundando em um infinito oceano, que o mundo acima desaparecia pouco a pouco, que o oxigênio escapava de seus pulmões como um último segredo.

    Mas sabia. Sabia que era um sonho.

    Há tempos os sonhos não tinham poder sobre ela. Há tempos sua mente se recusava a ser enganada por ilusões noturnas. Isso era… irritante.

    Queria se perder neles. Queria esquecer. Queria aquela maravilhosa fuga da realidade que só um sono verdadeiro proporciona.

    Mas não. Nos sonhos, era lúcida.

    Pareciam uma extensão do dia, um espaço onde seus pensamentos continuavam a girar, a estudar, a aprimorar. Não conseguia evitar, então que ao menos fosse útil.

    Mas esse sonho? Esse desgostava ainda mais.

    Está fundo demais.

    Tudo ali era um vazio absoluto. Tão intenso, tão vasto. Fechou os olhos, tentando silenciar aquela sensação brutal.

    Então… ouviu. Era um pequeno som, quase imperceptível.

    Ali, onde nada mais deveria existir, o silêncio se partiu com um delicado chiado, um som sibilante que não podia enganar os ouvidos bem treinados de Ana.

    Uma serpente.

    Virou-se, os pulmões se contorcendo na agonia do afogamento, a água comprimindo sua carne como um abraço cruel.

    Nada. Apenas azul. Apenas o mar sem fim.

    Mas o chiado persistia, enrolando-se em seus ouvidos, rastejando por sua mente como uma corrente invisível.

    Por fim, após um breve piscar de olhos, algo realmente apareceu.

    Gigante.

    Tão grande que não via seu começo, nem seu fim. Apenas um vulto imenso, uma presença que tornava o oceano ao seu redor insignificante. Sentiu a pele arrepiar, a espinha se curvar em um reflexo primitivo.

    Não via olhos, não via boca, não via nada além de uma sombra no azul infinito.

    Mas sabia. Aquilo estava sorrindo.

    E então, bruscamente, despertou.

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    Ana estava ofegante, sugando o ar como se houvesse emergido de um afogamento. O peito subia e descia rápido demais, e por um segundo, tudo que sentiu foi desorientação pura.

    Sentia algo em sua pele, um tipo de desconforto que não era dor, mas também não era inofensivo. Como uma coceira dentro dos ossos, como um peso invisível empurrando-a de dentro para fora.

    Ana cerrou os dentes, apertando as próprias têmporas, como se isso fosse conter a sensação. Não era exatamente ruim — mas era tão estranho.

    Seu corpo inteiro parecia estar trabalhando contra ela. Ou talvez apenas trabalhando de verdade pela primeira vez em décadas. Depois de tanto tempo estática, de tanto tempo sem sentir o roçar do tempo sobre si, agora ele estava ali. 

    Tudo dentro dela se movia.

    Era algo implacável, sussurrando mudanças minúsculas, mas que quando somadas, forçaram sua existência a se remodelar a cada segundo.

    Sentia cada pequena merda de modificação. Sentia-se definhar.

    Acho que ficarei louca se isso continuar.

    O pensamento veio seco, direto, como uma conclusão inevitável.

    Era isso que os humanos enfrentavam? Essa inquietação incessante, essa necessidade de se manter em movimento para não sentir a ferrugem da própria existência? Era extremamente assustador. 

    Não se sentir morrendo, mas sim saber que, a partir de agora, cada segundo contava.

    — Desgraçado… — Por puro instinto, passou os dedos pelos lábios. Aquele toque — o toque de Gabriel — foi o gatilho. O início de tudo.

    Não podia gastar sua vida ali. Precisava se levantar. Precisava abrir os olhos.

    E assim o fez.

    O chão sob seu corpo era áspero, coberto de folhas secas e terra fria. O ar carregava umidade e um cheiro forte, algo entre musgo e seiva recém-aberta. A luz se infiltrou em sua visão como uma lâmina, cortando sem piedade a penumbra em que sua mente flutuava. 

    Ana piscou, e a paisagem à sua frente desmoronou sobre ela de uma vez só.

    — Altas demais.

    As árvores a cercavam como colossos silenciosos — porque, sim, estava em uma floresta —, seus troncos tão largos que pareciam ter devorado séculos inteiros. A copa era tão densa e distante que o céu se escondia atrás de um teto de folhas entrelaçadas, permitindo apenas rachaduras tímidas de luz filtrada, verdadeiras muralhas vivas. 

    E o formato das folhas… não reconhecia. Algumas eram largas demais, outras pareciam torcer-se sobre si mesmas como espirais vegetais. Nada daquilo fazia sentido. Havia algo implacável naquela floresta. Algo que a fazia se sentir menor do que deveria.

    Mas não era o desconhecido que fez seu coração acelerar.

    Foi o familiar. Um esquilo.

    Pequeno, ágil, de olhos espertos. O rabo peludo se ergueu enquanto ele a observava por um instante, e logo passou correndo por sua frente, tão mundano que a cena pareceu uma anomalia. Ana sequer teve tempo de processar antes de ouvir o canto inconfundível.

    Um bem-te-vi.

    Ana virou bruscamente a cabeça para o som, sentindo o sangue martelar nas têmporas. Era ele. Aquele mesmo tom estridente e inconfundível. O pequeno pássaro pousou em um galho baixo, as penas amarelas destacando-se no verde-escuro da floresta. Também virou a cabeça para ela, curioso.

    A jovem apoiou as mãos no solo e se ergueu em um único movimento, os músculos respondendo com um leve protesto. Nada havia além dela. Apenas ela, sua faca e sua armadura — ambos os itens caídos ao seu lado, como se tivessem sido cuspidos junto com seu corpo para aquele lugar estranho.

    Franziu a testa. Sua mente fervilhava, processando mil e um cenários, buscando uma lógica inexistente. Mas não havia explicação. Apenas o agora. Apenas a necessidade instintiva de agir.

    Pegou a armadura primeiro, deslizando-a pelo braço esquerdo com familiaridade. O metal frio se ajustou à sua pele com um clique mecânico, as alças apertadas ao redor do antebraço. O peso era reconfortante. Concreto.

    A faca, por outro lado, permaneceu firme em sua mão, os dedos se fechando ao redor do cabo com força controlada. O pulso girou, sentindo o equilíbrio, testando a lâmina. Não sabia o que esperava, mas sabia que esperava algo.

    Balançou a cabeça devagar. Não doía, mas latejava de uma forma incômoda quanto mais tentava absorver o novo ambiente. Precisava de algo definitivo. Algo que a colocasse de volta no controle.

    Sem mais hesitação, os olhos correram pelo ambiente e encontraram seu objetivo: uma árvore.

    Seus dedos encontraram o primeiro ponto de apoio, áspero e irregular, mas firme. A faca permaneceu presa com firmeza em sua mão direita enquanto a esquerda se fechava sobre a casca rugosa. Subiu um metro. Depois outro. A cada avanço, sentia a armadura bem ajustada ao braço, uma extensão metálica de si mesma, algo que lhe pertencia de um jeito que poucas coisas no mundo pertenciam.

    O vento assobiava entre as folhas, trazendo com ele os cheiros de terra úmida e vida selvagem. Ana não olhava para baixo. Não precisava ver o chão para saber que ele já estava longe.

    Deixou o instinto tomar o controle, e sem notar, logo a folhagem do topo cedeu sob a pressão de seu corpo. Emergiu da escuridão sufocante da floresta para uma clareira suspensa, um espaço entre as copas das árvores onde o céu se abria pela primeira vez.

    E que céu.

    Respirou fundo, o ar frio preenchendo seus pulmões como se estivesse respirando de verdade pela primeira vez desde que acordou.

    — Então ainda estou na Terra…

    A constatação veio crua.

    O que estava acima de si era vasto, profundo, e ainda que tivesse algo de estranho, meio deslocado, era o mesmo céu que sempre estivera ali. As estrelas brilhavam como velhos conhecidos, apenas ligeiramente… erradas.

    Distorcidas, talvez. Ou mais distantes. Enfim, ainda familiares.

    Virou a cabeça para a direita e encontrou Órion, seu formato ainda claro, e as Três Marias, alinhadas como sempre, marcando o céu como uma cicatriz brilhante. À esquerda, o Cruzeiro do Sul, menor do que lembrava, inclinado em um ângulo estranho, mas presente. 

    E mais acima, solitária, distante, sempre observadora, Sirius, a estrela mais brilhante do céu.

    Por um longo momento, Ana apenas olhou. Sentiu.

    E então, seus olhos desceram, encarando o mundo ao redor dela. O que viu não era apenas floresta.

    No horizonte, onde deveria haver o recorte familiar das cidades vizinhas, havia apenas uma vastidão verde. A natureza parecia cobrir cada centímetro como um tapete infinito, mas algo chamou sua atenção.

    Cortando o emaranhado de árvores, o que restava de uma antiga estrutura se erguia, como um monumento antigo que não deveria estar ali. Ana o reconheceu de imediato: a ponte Antônio Macedo — ou pelo menos o que sobrou dela. 

    Apesar de agora não passar de uma carcaça inclinada, não foram poucos os anos que a observou através das janelas de suas muitas casas. Cruzava imponentemente o rio Tietê, ligando o afastado bairro de Alphaville ao centro da cidade, da qual antes, se recusara a sair.

    Suspirou. Estava de volta em Barueri.

    O alívio deveria vir. A certeza deveria acalmá-la.

    Mas não acalmou.

    Porque se ainda estava na Terra… então que porra de floresta era essa?
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