Capítulo 128: O Lamento de Maria (2/3)
A equipe desmontou o acampamento e pegou a estrada de volta para a Vila Ramman.
Havia um problema, no entanto. Chohong ainda não havia recobrado a consciência.
Mikhail ainda se sentia culpado pelo ocorrido e fez uma sugestão gentil: ele se ofereceu para carregar Chohong, mas Seol Jihu recusou a proposta na hora. Mesmo com sua resistência ainda não totalmente recuperada, o jovem a carregou nos braços o tempo todo sem reclamar uma única vez. A verdade era que se sentia desconfortável em deixar outro homem tocar nela.
A equipe precisou de cerca de duas horas para retornar à vila. A primeira coisa que fizeram ao chegar foi alugar o maior quarto da estalagem. Outros poderiam estar bem, mas Maria e Chohong estavam em um estado que exigia descanso imediato e adequado.
Mikhail saiu dizendo que procuraria uma carruagem, enquanto Veronika saiu à procura de uma refeição saborosa, conforme instruído por Maria.
Seol Jihu também deixou a estalagem. Ainda havia uma última pendência que precisava resolver antes de deixar aquela vila para sempre.
Bateu em uma porta familiar e ouviu uma voz o convidando a entrar. Ele entrou e avistou o idoso dono da casa. Era ninguém menos que o chefe da vila.
— Como vai o pedido?
Ele nem sequer se deu ao trabalho de se virar na cadeira ao fazer a pergunta.
— Foi resolvido. Os mutantes não vão mais aparecer.
O jovem não deixou de notar que, por um breve instante, a expressão do chefe da vila ficou consideravelmente rígida.
— …Devo agradecê-lo. No entanto, faz só um ou dois dias desde nossa última conversa, e ainda assim você parece tão mal. Suponho que os mutantes fossem bastante fortes?
— Você não viu nossa luta, mas parece saber bem o que aconteceu.
Seol Jihu sorriu e manteve o olhar fixo no chefe da vila.
— Bom, um mago famoso como o senhor provavelmente já imaginava tudo desde o começo.
O chefe da vila permaneceu impassível. Continuava sentado, olhos fechados, como se estivesse navegando por um mar turvo de pensamentos.
Não se moveu nem emitiu um som por muito tempo. Justo quando Seol Jihu começava a sentir como se o tempo tivesse congelado, o velho finalmente quebrou o silêncio.
— …Você o matou?
— Sim.
De forma inesperada, a reação do velho foi tranquila. Ou talvez fosse uma mistura de alívio e tristeza. Até parecia que um peso fora retirado de seus ombros.
— Entendo.
Até o modo de falar dele havia se tornado mais direto. Mas a mudança foi tão natural que Seol Jihu não se sentiu incomodado.
— Na verdade, já suspeitava disso. Quando você começou a falar sobre os centros de pesquisa, comecei a desconfiar. Talvez estivesse apenas testando as águas porque já havia descoberto minha identidade.
— Não vou negar.
— Como descobriu? Informações sobre minha identidade deveriam ter sido todas apagadas.
— Antes de responder isso, quero fazer uma pergunta.
O chefe da vila se manteve em silêncio. Seol Jihu puxou uma cadeira ao lado do velho e se sentou.
— Antes de mais nada…
O jovem organizou os pensamentos por um instante e então fez sua pergunta.
— Aquele lugar era o quê, exatamente? Um laboratório?
— Um laboratório, você diz… De certo modo, pode-se dizer que sim. Mas, na verdade, está mais para um esconderijo.
Seol Jihu assentiu. Chamar de esconderijo fazia mais sentido mesmo.
— Chefe da vila, o senhor criou um esconderijo para um Ninho perto da vila.
— Eu disse que um lugar assim precisava ser construído. Mas não fui eu quem o construiu pessoalmente. É mais correto dizer que foi construído para mim.
— Foi… construído para o senhor?
Seol Jihu inclinou a cabeça. Aquele velho estava tentando enrolá-lo?
— Na verdade, o esconderijo foi construído pelos próprios moradores desta vila.
O que ele queria dizer com aquilo?
— Está dizendo que os moradores da vila são seus cúmplices?
— Cuidado com as palavras. Essas pessoas estavam tentando encontrar um jeito de sobreviver. Como isso pode ser visto como crime?
O velho protestou de forma simples. Um jeito de sobreviver, ele havia dito. Seol Jihu refletiu sobre essas palavras e reorganizou seus pensamentos.
— Então o senhor fugiu do ducado depois que o projeto foi encerrado e se estabeleceu nesta vila. Depois disso, continuou com sua pesquisa. Os adultos da vila descobriram a verdade e decidiram ajudar nos experimentos.
— Você é esperto. Gosto de gente esperta como você.
O chefe da vila sorriu de forma calorosa.
— Nossos interesses se alinharam perfeitamente, foi isso.
Ele então soltou um suspiro suave e continuou.
— Eu queria alcançar algum resultado concreto e fazer um retorno glorioso. E os moradores queriam um meio de defender esta vila contra possíveis invasões inimigas. Entende agora?
A Vila Ramman estava localizada bem próxima à região de fronteira. Resumindo, os moradores queriam algum tipo de força de combate que pudesse protegê-los contra uma invasão dos Parasitas a qualquer momento. Pensando por esse lado, Seol Jihu até conseguia entender o ponto de vista deles, mas…
— Mesmo assim, ainda me surpreende que os moradores tenham ajudado de forma tão voluntária. Especialmente com tantas crianças por aqui.
— O que posso dizer. Vivemos tempos difíceis.
O velho prosseguiu.
— Não existe certo ou errado quando o assunto é sobrevivência. Neste mundo, seja você justo ou cruel, precisa se unir sob uma mesma bandeira e reunir recursos para sobreviver. Isso vale mesmo hoje.
— Mas eles não poderiam simplesmente ter se mudado?
— É difícil abandonar a terra que você chama de lar há décadas… Bom, não vou dizer algo tão clichê assim.
O velho formou um sorriso amargo.
— Mas o fato é que eles não têm para onde ir. Não vivemos aqui no meio do nada porque gostamos disso.
— A entrada na cidade foi recusada?
— Se for só entrar, não é tão difícil assim. O problema é se estabelecer. Bom, não é algo para causar revolta. Afinal, independentemente do castelo ou cidade, sempre há um limite de quantas pessoas podem acolher. Já é uma tarefa gigantesca acomodar todos vocês, Terráqueos… Como poderiam ter energia para cuidar de gente como nós?
A voz do velho soava amarga aos ouvidos de Seol Jihu.
— Mas isso não significa que pretendemos morrer sem lutar. Se você é humano, vai querer sobreviver a qualquer custo. Os moradores desta vila não são exceção. É por isso que me aceitaram.
O modo como ele falava parecia mais como alguém tentando proteger a vila do que culpar seus moradores. Seol Jihu fez a próxima pergunta:
— O senhor conseguiu êxito nos experimentos?
— Não. Fracassei.
O velho respondeu na hora. Sua voz carregava um peso de arrependimento.
— O Império sabia quais eram os problemas do projeto. Não, eu também sabia. Mas me enganei, alimentando um sonho vazio, achando que não podia deixar tudo acabar assim.
— Problemas, você diz…
— Não era só uma ou duas coisas. Levaria bastante tempo para que um Ninho se tornasse uma força de combate confiável, e além disso, havia um limite para o quanto se podia controlá-lo. Diria que a eficiência era ruim?
O velho respondeu até ali, antes de jogar uma pergunta de volta.
— Você me perguntou isso, não foi? Por que o nível da equipe que solicitei continuava aumentando?
— Sim.
— Fiquei um pouco assustado quando você disse aquilo, na verdade. A resposta é simples. Eu queria que ele aprendesse.
— Aprendesse?
— Um Ninho recém-nascido não é diferente de uma criança ignorante. Os Parasitas possuem uma estrutura de comando única, com a rainha no topo da hierarquia servindo como o centro de tudo. Todo o sistema é como a teia de uma aranha. Os papéis são claramente designados e as informações transmitidas entre si, mas por mais que tenhamos pesquisado, nunca conseguimos desvendar o funcionamento interno da organização deles.
Pensando bem, os mutantes nascidos do Ninho eram muito mais parecidos com humanos em aparência, bem diferentes de como eram a Medusa, os Insetos ou até as Baratas. Sentindo-se genuinamente curioso, Seol Jihu continuou com a pergunta.
— Nesse caso, não parece que o experimento tenha sido um fracasso total, certo? Agora está provado que o Ninho é capaz de aprender. Se o Império investisse seriamente nisso, não seria possível encurtar o tempo de gestação?
O velho piscou os olhos, como se não esperasse ouvir algo assim do jovem. Mas logo, formou uma expressão amarga.
— Eu não disse? Há um limite para o quanto conseguimos controlar.
Ele se levantou lentamente da cadeira e pegou uma pequena caixa de algum lugar.
Click.
Abriu a tampa, revelando uma pedra escura e turva do tamanho de um punho infantil.
Seol Jihu a observou com certo interesse. Achou que parecia uma gelatina escura.
— Isso é?
— Isto é ‘rudium’. Pode-se dizer que é a essência da alquimia. Bom, pense nisso como o minério central usado para controlar o Ninho.
— Algo assim realmente era possível?
Os olhos de Seol Jihu brilharam. Talvez por achar seu interesse bem-vindo, o velho começou a rir baixinho.
— Se quiser saber, então bem, eu conto. Se seu conhecimento em engenharia mágica for ao menos um quarto do meu, tenho confiança de te ensinar tudo em sete dias.
— …E se eu não tiver nenhum?
— Tenha piedade deste velho. Não quero dar meu último suspiro tentando te fazer entender.
O velho respondeu na lata. Olhou para a caixa e soltou um suspiro baixo.
— E já está ficando pequeno assim… Eu tentei economizar ao máximo…
— É impossível controlar um Ninho sem esse minério chamado rudium?
— Sim. Além de o processo de fabricação ser extremamente difícil, o mais importante é que o minério base necessário é como tentar colher estrelas do céu. E, pra piorar, nem é um item de uso permanente… é consumível…
A voz do velho foi se apagando até ele fechar a boca. Mas Seol Jihu não precisava ouvir o resto para entender o que significava. Ainda assim, insistiu:
— O senhor usou o que restava desse rudium para controlar o Ninho e continuar sua pesquisa.
— Está certo.
— E por nossa causa, a esperança da vila desapareceu agora.
— Não, não é isso.
O velho balançou a cabeça.
— A pesquisa fracassou há muito tempo. Não estou culpando vocês por nada.
— Mas o senhor ainda não desistiu disso.
— Se eu não tivesse escolha, tudo bem. Mas eu odiava a ideia de desistir depois de ter chegado tão longe. Pode me ridicularizar por ser um teimoso. Esse era meu motivo, afinal.
— …
— Esse negócio de autopiedade não funciona e só me deixa mais patético ainda, então por favor, me poupe disso. Há mais alguma coisa?
— Tenho mais duas perguntas.
O velho sinalizou com o queixo: ‘Diga’.
— A entrada escondida nas colinas não mostrava sinais de uso há anos. Mas meu Arqueiro disse que havia marcas de atividade dentro da caverna.
— Simples. Nunca pensou na possibilidade de uma entrada secreta levando à caverna, projetada para evitar os olhos de um Arqueiro?
O velho sorriu e bateu com o pé nas tábuas do chão da casa.
— E a outra?
— O que o senhor pretendia fazer quando o rudium acabasse?
— Pretendia me entregar ao reino. No entanto, achei que ainda dava para mais um ou dois usos.
O velho respondeu sem esconder nada.
Seol Jihu achou que já tinha ouvido o suficiente. Levantou-se, apenas para ver uma pequena bolsa voando em sua direção. Ao pegá-la, ouviu o tilintar de moedas. Era a recompensa pela solicitação.
— Achei que devia te pagar primeiro.
O chefe da vila falou com seriedade em seguida:
— Então, o que vai acontecer comigo agora?
— …Hmm, boa pergunta.
— Vai me matar? Ou talvez vá me denunciar aos nobres para que emitam um mandado de prisão?
Seol Jihu observou o velho que ria baixinho. Para ser honesto, tinha ido ali apenas para satisfazer sua curiosidade, e nem havia pensado sobre o que faria depois. Claro, Chohong havia se ferido gravemente, mas para ele, era difícil colocar a culpa disso naquele velho.
O jovem ponderou suas opções por um momento antes de fazer uma última pergunta.
— Chefe da vila. Na verdade, tem uma coisa que eu quero muito saber.
O velho soltou um longo suspiro.
— Garoto. Por acaso as pessoas ao seu redor te acham meio irritante?
— …
— Tsk. Tá bom, fala.
— Por que fez isso?
— Hm?
— O Império e o Ducado de Delphinion já foram destruídos. Ninguém está mais perseguindo o senhor. Com seu nível de conhecimento, teria sido bem recebido em qualquer reino, então por que decidiu permanecer nessa vila pequena?
O chefe da vila apertou os lábios. Suas mãos estavam entrelaçadas agora, os dedos indicadores batendo levemente nas juntas. Depois de um momento de silêncio, respondeu:
— Porque este lugar precisava de mim e da minha pesquisa.
Um sorriso suave surgiu em seus lábios.
— Aqui, eu tenho um lugar onde posso ficar.
Um lugar que precisava dele, onde ele podia permanecer. Essas palavras tocaram o coração de Seol Jihu.
— …Faz sentido.
O jovem assentiu em concordância e se virou para sair. Aquela resposta bastava para decidir o destino do velho.
— Vai embora?
— Sim. Ah, aliás. O senhor me deve uma por isso.
— Como assim, te devo?
— Eu vou manter a boca fechada sobre esse assunto.
— Mas eu já te paguei.
— Eiii, qual é. Aquilo foi pela solicitação. Vamos ser honestos: é pouco demais, não é?
O velho caiu na risada com aquela resposta bem-humorada.
— Não me importo que seja exigente com contas, mas se for assim, também quero saber uma coisa.
— ?
— Sua identidade. Como descobriu tudo?
— Eu chutei.
— Para com esse papo furado.
Seol Jihu demonstrou certo desconforto por ser colocado na parede.
— Mm… Só contar assim não me soa certo. Tive que me esforçar bastante para resolver esse mistério, sabe?
— Vai fazer isso com um velho?
— Que tal isso? Eu te dou uma dica pra você descobrir sozinho.
O velho sorriu como se achasse a ideia do desafio ridícula.
— Hah! Apresentando um enigma para mim, o maior gênio do Ducado de Delphinion… Interessante. Tudo bem.
— Sem voltar atrás agora, hein.
— Vai, manda logo.
— Quando há nove olhos, o que será?
— Nove… o quê?
O velho fez uma expressão abobalhada, então.
Agora que sua curiosidade havia sido saciada, Seol Jihu lançou um sorriso revigorante ao velho, acompanhado de um leve aceno com a cabeça, e deixou a casa.
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