Índice de Capítulo

    Seol Jihu estava com tanta pressa que quase não percebeu. O lugar já era pouco iluminado e, por conta do tom escuro da pele, o homem lá no alto era difícil de enxergar.

    Mas, de perto, ficou muito mais claro. Um homem com a cabeça baixa estava suspenso no ar. E parecia que o Orc mutante estava tentando alcançá-lo antes de ter sua ação interrompida.

    — Hugo!

    Seol Jihu gritou, e sem nem perceber, acabou tocando no pé de Hugo.

    — Ku-ahh…

    No momento em que seu corpo oscilou levemente, Hugo jogou a cabeça para trás e soltou um grito. Não, sua voz rouca soava mais como um gemido de dor do que um grito de verdade.

    Só então Seol Jihu percebeu que Hugo estava suspenso no ar com um gancho atravessando suas costas.

    — M-Mas que diabos?! O que está acontecendo??

    Yasser Rahdi também avistou Hugo lá em cima. Ele estava alto demais e não podiam tocá-lo de qualquer jeito. Seol Jihu mordeu o lábio inferior e lançou um olhar ao rudium, que ainda emitia aquela fumaça negra. Seu tamanho tinha diminuído consideravelmente, mas… se fosse só por um instante, devia estar tudo bem.

    “Desçam o Hugo com o máximo de segurança possível.”

    Ao emitir essa ordem, quatro Orcs mutantes começaram a se mover ao mesmo tempo. Um deles sumiu na escuridão e, pouco depois, o som rangente de uma roldana girando ecoou pela câmara. O gancho começou a descer lentamente. Dois dos Orcs seguraram Hugo pelos lados, e o último retirou o gancho das costas do humano com cuidado.

    Keuh…

    — Hugo!

    Assim que a restrição foi desfeita, Hugo desabou, e Seol Jihu o segurou rapidamente. O brutamontes devia ter recobrado a consciência de algum modo, pois lutou contra a dor e forçou os olhos a se abrirem. Seu olhar turvo ainda carregava um leve brilho, uma fagulha de vida.

    — Euh, uh… Euh uh…

    Abriu a boca como se quisesse dizer algo, mas só sons agudos e fracos saíram. Bastava um olhar para perceber que ele estava completamente exausto. Seol Jihu segurou sua cabeça e sussurrou suavemente.

    — Vai ficar tudo bem. Viemos te resgatar. Vai ficar tudo bem.

    Hugo deve ter ouvido aquelas palavras, porque, mesmo parecendo atordoado e sem foco, os cantos dos lábios se ergueram. Ele fechou os olhos de novo e desabou sem forças nos braços de Seol Jihu.

    — H-Hugo?

    — Escuta, cara.

    Yasser Rahdi falou depressa.

    — Já deve ter passado dos cinco minutos. Eu entendo o que você tá sentindo, mas precisamos ir agora. Só poderemos curá-lo depois que reencontrarmos o resto do grupo.

    — Ah, certo. Tá bem.

    Apesar das palavras serem lógicas, a voz dele carregava uma urgência inquieta. Claro, ele não estava errado, então Seol Jihu apressadamente ergueu Hugo nos braços.

    Antes de voltarem pelo caminho de onde vieram, ele parou por um instante para olhar por cima do ombro.

    “Por que só o Hugo está aqui?”

    Mesmo com a cabeça cheia de perguntas, ele não parou de avançar. O importante era que Hugo tinha sido encontrado e ainda respirava de alguma forma. Não se sabia se sua constituição robusta era a responsável por essa façanha, mas ele definitivamente estava vivo. Só isso já era motivo para agradecer aos céus.

    Os dois levaram Hugo até a encruzilhada. No entanto, o grupo que foi pelo corredor da esquerda ainda não havia retornado. Esperaram por quase um minuto inteiro, mas não havia sinal nem de uma sombra. Quanto mais o tempo passava, mais agitado Yasser Rahdi ficava.

    — Droga! Por que eles ainda não voltaram?

    — Será que… aconteceu algo ruim com eles?

    — E-Eei! Dá pra pensar de forma mais positiva?! Você só fala essas coisas negativas.

    — Mm…

    Seol Jihu colocou Hugo no chão com cuidado.

    — Eu vou.

    — O quê?

    — Não podemos esperar aqui pra sempre. Eu vou dar uma olhada.

    Yasser Rahdi não parecia nada convencido. Estava visivelmente nervoso. Em filmes com situações parecidas, um dos dois acabava morto, com certeza. Não diziam que isso era uma ‘bandeira da morte’ ou algo assim? Mas, por outro lado, até ele sabia que ficar parado sem fazer nada era uma péssima escolha.

    — Droga. Volta rápido, tá ouvindo?

    Seol Jihu disparou em corrida imediatamente. O corredor à esquerda era igual ao da direita, com celas de prisão alinhadas dos dois lados. Ele lançou alguns olhares enquanto corria, mas, como já suspeitava, não viu nenhum prisioneiro lá dentro.

    Logo, porém, avistou três silhuetas ao longe. Quanto mais se aproximava, mais o ar ficava gelado, e a sensação espetava sua pele.

    Não sabia o que havia acontecido, mas o clima entre os três era claramente ruim. Ayase Kazuki estava com o rosto pálido, completamente enojado, enquanto Chohong parecia estar em agonia por algum motivo. Já Mary Rhine estava caída no chão…

    — Bleargh…!!

    …vomitando sem parar. E também chorava copiosamente.

    Talvez a presença de Seol Jihu tenha despertado Kazuki, que se apressou em abrir a boca.

    — Você… O que tá fazendo aqui?

    — A gente ficou esperando, mas vocês não apareceram.

    Kazuki soltou um suspiro exasperado e murmurou um ‘Droga’. Em seguida, agarrou Mary Rhine pela lateral e tentou levantá-la à força.

    — O que aconteceu? O que está havendo?

    — Interrompemos a busca.

    — Interromperam? Por quê?

    Agora que Seol Jihu olhava além do trio, conseguia ver uma porta de pedra. De uma fresta levemente aberta, escapavam fiapos esbranquiçados de ar frio. Ele finalmente entendeu por que estava sentindo tanto frio, o ar cortante estava saindo de dentro daquela abertura.

    — Não adianta procurar além deste ponto. Mesmo que encontremos alguém, não vai adiantar nada.

    O tom dele soava anormalmente calmo. Um pressentimento sinistro se enraizou em Seol Jihu. Era por causa do ar frio… ou pela maneira como o guia tinha dito aquelas palavras?

    — Do que você está…

    ‘…falando, afinal?’ Ele estava prestes a perguntar isso e a abrir a porta de pedra, mas então…

    Slam!

    Chohong a fechou com força.

    — Não olhe lá dentro.

    A voz dela podia até parecer um pouco emotiva, mas sua postura era firme ao dar sua opinião. Seol Jihu recuou ligeiramente. Chohong encarava com olhos cheios de uma frieza inesperada. Não, ao olhar mais de perto, parecia que ela franzia o rosto para conter as lágrimas.

    — …Chohong?

    — Você pode acabar traumatizado. Então, não olhe nunca além dessa porta.

    Ela chegou a se posicionar na frente da porta de pedra para bloqueá-la. Nesse meio-tempo, Kazuki fez uma pergunta.

    — E do seu lado? O que houve?

    Seol Jihu ainda estava atordoado com aquela reação inesperada, mas conseguiu se recompor o bastante para responder.

    — Encontramos um.

    — Encontraram alguém?

    — Sim. Encontramos o Hugo. Ele ainda está vivo.

    Chohong ergueu a cabeça de imediato. E então, sem dizer mais nada, disparou de volta pelo corredor. Kazuki observou com preocupação o vulto que se afastava antes de se virar para Mary Rhine.

    — Já se acalmou? Consegue se mover agora?

    — S-Sim. Me desculpe. Tentei segurar, mas…

    Ela conseguiu assentir de algum modo.

    — Certo. Também devemos ir. Ah, no caminho de volta, pode me contar o que viu? Encontrou mais alguém? Como estava a situação por lá?

    Como Seol Jihu também tinha muitas dúvidas, resolveu descrever em detalhes o que viu para, quem sabe, conseguir algumas respostas enquanto corriam de volta.

    — É a ‘infecção’.

    Kazuki assentiu, como se tivesse pensado em algo. Seol Jihu o encarou sem entender, então o japonês se explicou.

    — Já ouviu dizer que a infecção também tem uma taxa de sucesso?

    Ele nunca ouvira essa história antes.

    — Veja, um Parasita por si só não tem nada de especial. É como uma larva, fraco demais. Se o hospedeiro for um cadáver, a infecção acontece cem por cento das vezes, sem problema algum. Mas, se o hospedeiro ainda estiver vivo, a história muda completamente.

    Kazuki continuou:

    — Quanto mais forte for o corpo do hospedeiro, mais difícil é infectá-lo. É por isso que eles ficam pendurados nos ganchos. Para sugar toda a resistência da pessoa.

    Seol Jihu sentiu o estômago despencar. Apenas Hugo foi encontrado pendurado naqueles ganchos. O que significava que os outros estavam…

    — Hugo só aumentou força física e resistência feito um completo idiota. E isso salvou a vida dele.

    Kazuki falou num tom amargo. Seol Jihu perguntou com cautela:

    — Isso quer dizer que os outros estão…?

    — …Vai saber. Pelo menos, ainda não morreram. Afinal, para esse plano de produção em massa funcionar, eles precisam infectar hospedeiros vivos.

    Orcs mutantes também podiam ser fabricados a partir de cadáveres infectados, mas o número final acabaria limitado. No entanto, se o hospedeiro infectado não perdesse a capacidade reprodutiva, o número poderia crescer indefinidamente, era isso que ele queria dizer. Por mais que se pensasse no assunto, tudo aquilo ainda era um plano repugnante do início ao fim.

    — Hugo teve sorte dessa vez. Se os outros já foram infectados, então… Então, não tem mais nada que possamos fazer por eles. Vai ser melhor matá-los.

    — Não tem nenhuma chance de salvar um hospedeiro infectado?

    — Não é totalmente impossível, não. Depende de quão avançada está a infecção ou qual parte do corpo foi dominada, coisas assim. Mas, nove em cada dez vezes, não dá pra salvar. Não é à toa que precisamos incinerar todos os cadáveres, sabe.

    Mesmo explicando tudo isso, Kazuki parecia observar com atenção a reação do colega de equipe. Seol Jihu se sentia profundamente desconfortável, mas fez o possível para não demonstrar.

    Pouco depois, os três chegaram à encruzilhada. Assim que viu Hugo, Mary Rhine conjurou um feitiço divino de cura.

    — Cura de Ferimentos Massivos.

    Uma luz branca pura envolveu o corpo de Hugo, e seu estado melhorou visivelmente diante dos olhos deles.

    — Ótimo. Conseguimos encontrar uma pessoa.

    Kazuki verificou o rudium, agora com cerca de um quinto do tamanho original, e então desviou o olhar para Chohong, com o rosto pálido, e para Seol Jihu, que estava relativamente mais calmo. Em seguida, falou:

    — Chung Chohong. Você leva o Hugo de volta ao círculo mágico.

    — O quê?!

    — Como assim, ‘o quê’? Não combinamos que, sempre que resgatássemos alguém, uma pessoa o levaria de volta, desde que a situação permitisse?

    Havia vários motivos para essa decisão, mas o mais importante era garantir que os prisioneiros resgatados retornassem em segurança. Ninguém sabia o que poderia acontecer durante a missão, afinal. Além disso, se o número de pessoas a serem protegidas pelo rudium diminuísse, o consumo dele também cairia ligeiramente.

    — Eu sei disso! Mas por que eu?!

    — Porque você vai atrapalhar a missão.

    A voz fria e controlada de Kazuki a interrompeu.

    — E, além disso, ele é do seu grupo original. Não é como se você conhecesse os outros prisioneiros melhor do que qualquer outro aqui também.

    “Mas e o Dylan?”

    Seol Jihu inclinou levemente a cabeça antes de compreender o raciocínio. Afinal, havia dois membros da Carpe Diem presentes ali.

    — Não estou mandando você ir para lá fazer nada, também. Você sabe o quanto é importante o papel de quem retorna primeiro, não sabe?

    Aquilo fazia sentido. Era preocupante deixar Ian sozinho por muito tempo, uma linha de comunicação precisava ser aberta, e em caso de emergência, armadilhas tinham que ser preparadas para garantir a rota de fuga.

    — Isso é uma ordem do guia. Saiba que, quanto mais tempo você nos faz perder, mais problemas está nos causando.

    Chohong não podia continuar ali parada depois de ouvir aquilo. Estava fervendo de raiva, mas, no fim, pegou Hugo nos braços e se virou para partir. Seol Jihu falou com ela.

    — Tenha cuidado.

    O semblante de Chohong estava sombrio, carregado, mas ela não disse nada fora de lugar.

    — …Você também. Se puder evitar, apenas volte, tá?

    Com essas palavras de despedida, ela se afastou levando Hugo. Kazuki apontou para a frente sem demora.

    — Vamos prosseguir e continuar com a busca. Se não encontrarmos mais ninguém, desceremos para o segundo subsolo.

    O corredor à frente era diferente dos dois anteriores, sem celas de prisão. Em vez disso, a luz turva e fraca ia se tornando cada vez mais clara e intensa.

    Quando o corredor finalmente terminou, Kazuki se encostou na parede.

    — Não sinto nada se movendo, mas…?!

    Parou de falar de repente. Seol Jihu estava bem próximo ao Arqueiro e percebeu o leve estremecer de seus ombros. No instante seguinte, ouviu alguém prender a respiração com força. Ao olhar para trás, viu Yasser Rahdi correndo em disparada. Kazuki tentou segurá-lo, mas só conseguiu morder o lábio inferior antes de entrar na sala também.

    O espaço em que entraram era uma câmara enorme, com ares de laboratório. Diversas ‘mesas’ de madeira estavam dispostas de forma meio desorganizada, e o que parecia ser algum tipo de equipamento se encontrava alinhado em fileiras.

    Seol Jihu observava os Orcs mutantes parados, congelados em meio às tarefas que realizavam, quando teve a atenção desviada pelo som de um choro desesperado. Yasser Rahdi estava apoiado sobre uma das mesas, enquanto lágrimas desabavam em torrente.

    — Irmão…! O que é isso, meu Deus?! Nós lutamos juntos até o fim, demos tudo de nós…! E isso…!

    Seol Jihu olhou para a mesa onde o homem chorava, e seu queixo quase tocou o chão. Havia uma pessoa deitada ali.

    …Não, ele não tinha certeza se aquela ‘coisa’ ainda podia ser chamada de pessoa. O rosto, o torso, até a altura da cintura, ainda eram humanos. Mas os membros, braços e pernas, tinham desaparecido, substituídos por uma série de tentáculos que se contorciam de maneira repulsiva. Era como se alguém tivesse pregado tentáculos de lula no corpo de uma pessoa.

    “Mas que porra é essa…?!”

    Foi nesse instante que seus olhos se voltaram para onde vários Orcs mutantes estavam reunidos. E além deles, viu outra mesa de madeira. Cambaleou até lá como se estivesse hipnotizado, e o primeiro impacto foi o fedor acre de sangue.

    Seus olhos tremiam, as mãos tremiam incontrolavelmente. A incredulidade se espalhou por todo seu corpo como uma corrente elétrica.

    — Dylan!!

    Seol Jihu empurrou os Orcs imóveis e correu até lá. Quanto mais se aproximava, mais difícil era negar a realidade. Assim como o anterior, Dylan estava deitado sobre uma mesa, sem nenhum dos membros.

    — Meu Deus… Dylan, Dylan…

    Suas mãos trêmulas se estenderam e, de repente, ele percebeu que a superfície da mesa estava completamente molhada. Sentiu uma leve ardência nos dedos antes de eles ficarem dormentes. Havia um balde cheio de um líquido transparente no fim da mesa.

    — É um sedativo. Um bem potente…

    A voz era baixa, abafada. Kazuki se aproximara, com uma expressão profundamente contraída.

    — Dylan… Dylan…

    Dylan apenas encarava o teto, com os olhos arregalados. Era como se já estivesse morto.

    Todos os pensamentos na cabeça de Seol Jihu se embaralharam de uma vez. Ele não conseguia pensar, não sabia o que fazer. Mary Rhine o olhava com um certo pesar mas, quando seus olhos se encontraram, Seol Jihu sentiu que sua mente clareava de repente.

    — Um feitiço divino! Por favor, cure ele…!

    Kazuki estava prestes a dizer algo, mas Mary ergueu seu crucifixo e se aproximou para impedi-lo.

    — Só por precaução.

    — Como assim?

    — Há apenas duas pessoas aqui. E o estado do Dylan não está tão avançado quanto o do Ali. Ele pode saber onde estão os outros três.

    Kazuki não parecia muito convencido, mas também não tentou impedi-la. Apenas clicou a língua com raiva e foi até o ainda choroso Yasser Rahdi.

    — E-Espera. Eu, eu vou procurar os membros primeiro…

    Seol Jihu começou a vasculhar o laboratório em busca dos membros faltantes, mas a Sacerdotisa não esperou e lançou o feitiço.

    — E-Espere, espera!

    A luz branca e brilhante envolveu o corpo de Dylan. Ele estremeceu levemente naquele instante. Seus olhos, antes apagados e distantes, começaram a piscar. Seol Jihu correu até ele e bloqueou a visão do teto, o que fez Dylan abrir os lábios.

    — …Seol?

    — Dylan!!

    — Ah… meu Deus…

    Dylan soltou uma risada oca e balançou a cabeça.

    — Eu… ainda tô sonhando?

    — Não, isso não é um sonho. Viemos te resgatar. Viemos salvar você!

    Seol Jihu ficou com os olhos marejados no mesmo instante. Para ele, Dylan sempre foi alguém confiante, com sangue frio. Sempre. Mas ao ver aquela cena de partir o coração, as lágrimas ameaçavam escapar.

    — E o Hugo?

    Dylan parecia ter recuperado totalmente a lucidez agora.

    — Resgatamos ele. A Chohong levou ele de volta.

    — Que bom.

    Um sorriso cansado surgiu nos lábios de Dylan. Seus olhos vaguearam, como se tentassem entender a situação, até se fixarem na Sacerdotisa.

    — Você é a Mary Rhine, não é? Também veio nos salvar?

    — Tenho algo a te perguntar.

    Ela falou com a voz calma.

    — Pode soar confuso, mas escute mesmo assim. A senhorita Agnes e o senhor Ian voltaram em segurança. Também resgatamos o Hugo. E então, quanto a você e Ibrahim Ali, bem… uh, mm…

    — Se quer saber sobre os outros três, eu também não sei.

    Como esperado de Dylan, ele entendeu de imediato o que ela queria perguntar e respondeu.

    — …Entendi. Tudo bem. Então, vamos…

    Ela não conseguiu terminar a frase. Dylan assentiu.

    — Pode me dar um minuto?

    — Desculpe, mas não dá. Temos um limite de trinta minutos e já usamos metade disso. Ainda precisamos encontrar os outros, e considerando o tempo para voltar, não temos tempo suficiente.

    — Tudo bem. Eu não entendo tudo, mas se você diz isso, deve ser verdade.

    Seol Jihu olhava confuso de um para o outro. Do que eles estavam falando, afinal? Tudo não ficaria bem se levassem Dylan de volta à base?

    — Dylan, eu sei que você passou pelo inferno. Obrigado por ter sobrevivido até agora. Tudo bem, vamos…

    Assim que estendeu a mão, Mary Rhine puxou seu braço de volta. Então balançou a cabeça em silêncio.

    — M-Mas por quê? Ele ainda está vivo!

    — Eu sei.

    — Então por quê?

    — Já é tarde demais.

    Ela apontou para Dylan. Havia dezenas de larvas se contorcendo nas feridas onde antes havia membros.

    — Que merda é essa…!

    Ele tentou arrancar as larvas, mas a Sacerdotisa fez de tudo para impedi-lo.

    — Não toque nisso. As coisas podem se complicar ainda mais.

    — …Trinta segundos.

    Seol Jihu ia gritar, mas Dylan falou primeiro e o interrompeu.

    — Só nos dê trinta segundos. Eu faço ele entender.

    — …

    — Precisa entender. Esse amigo é meio sensível com esse tipo de coisa. Mas ele tem grandes habilidades e uma boa cabeça. Então, não o culpe.

    — …Eu sei disso.

    Mary Rhine soltou um suspiro resignado.

    — Se não fosse por esse cara, nem estaríamos aqui.

    — É mesmo?

    Dylan pareceu se interessar. Mas foi por pouco tempo. Permaneceu deitado, olhando para o jovem confuso, que suava em pânico sem saber o que fazer.

    — Seol, se tiver água com você, posso tomar um gole? Tô meio com sede, sabe.

    Seol Jihu tirou apressado o cantil e o levou até os lábios de Dylan, inclinando-o com cuidado. Dylan bebeu, engoliu mais um pouco, claramente saboreando o líquido refrescante.

    Keuh~! — exclamou baixinho.

    — Valeu. Quando eu estava pendurado nos ganchos, cada gota era preciosa.

    — Não se preocupe com isso. Quando voltarmos, você vai poder beber o quanto quiser.

    Dylan sorriu, sem som algum.

    — Mm… Seol? — ele continuou — antes de tudo… obrigado.

    — Dylan, tô te ouvindo, então vamos logo e…

    — Pra ser sincero, eu esperava que viessem me resgatar. Sabia que, quando você está preso num poço de desespero, aparecem uns pensamentos bem estranhos? Eu até sonhei que você viria me buscar.

    — Desculpa por ter demorado, mas mais importante, a gente…

    — Na verdade, eu não tinha medo de morrer. Mas, pensar que eu não estaria nem vivo, nem morto… isso me assustou.

    Seol Jihu parou de falar. Nem vivo, nem morto?

    — Eu quase desisti, mas aí… você apareceu assim. E eu tô muito grato por isso. É como se eu soubesse que você viria por nós, de algum jeito. Haha…

    Dois homens se aproximavam ao longe. Dylan lançou um olhar de reconhecimento a eles e voltou a olhar para cima.

    — Então, o que estou tentando dizer é…

    — D-Dylan.

    — Pode me ajudar a morrer?

    — O-O que foi que você disse?

    De repente, um cheiro de queimado invadiu o ambiente. Seol Jihu virou o rosto e viu Ibrahim Ali, com a cabeça separada do corpo, em chamas.

    — M-Mas por quê, por que morrer…

    Seol Jihu gaguejava. Dylan apenas abriu um sorriso leve.

    — E aí, Kazuki.

    — Faz tempo, senpai.

    Kazuki se curvou com elegância.

    — Você é o guia da equipe de resgate?

    — Sim, senpai.

    — Que alívio. Um Explorador do seu nível vai garantir que tudo corra bem.

    — Está me superestimando.

    — Superestimando nada. Em todo caso, termina logo com isso, pra vocês irem embora. Ouvi dizer que têm um tempo limitado?

    Kazuki exibiu uma expressão complicada.

    — Entendido. Obrigado pela compreensão.

    Então segurou com firmeza o cabo da espada.

    — Dylan!!

    Num instante, alguém agarrou os ombros de Seol Jihu e o empurrou para baixo. Tanto Yasser Rahdi quanto Mary Rhine se agarraram a ele e o contiveram.

    — Não, não o matem!!

    Ele entrou em pânico. Seus braços se debatiam, e ele lutava freneticamente. Mesmo assim, foi forçado a sentar no chão. Ainda assim, não parou de gritar.

    — V-Vocês não podem matá-lo, não!

    Temos que matá-lo.

    — E-Espera! Eu, eu não enten…

    — Não há tempo pra explicar. E você já sabe disso. Ou, pelo menos, tem uma ideia. Só não quer aceitar.

    Kazuki falou com frieza. Seol Jihu começou a balbuciar qualquer coisa que viesse à mente.

    — P-Por favor, só me escuta. Tudo o que eu tô dizendo é, não vamos matá-lo agora. E-E se tiver um Parasita de nível mais alto por perto e ele começar a suspeitar de alguma coisa??

    — Nenhum dos dois foi completamente dominado ainda.

    Kazuki rebateu.

    — Essa é a realidade da situação. Matá-los agora é o melhor para os dois.

    — Mas…!

    — Chega…

    Foi nesse momento que ele ouviu alguém chorando ao seu lado. Seol Jihu se encolheu e parou ao sentir um líquido quente escorrer por sua bochecha.

    — Eu entendo como você se sente, tá… Eu entendo, mas… A gente, a gente precisa salvar os outros também…

    Yasser Rahdi chorava. Seu rosto estava distorcido como uma ‘máscara hahoe’ de choro, com lágrimas grossas escorrendo dos olhos.

    Dylan falou com um tom digno e calmo.

    — Kazuki. Vai logo. O Seol não consegue me matar. Ele é esse tipo de pessoa. Então, você deve agir como o guia.

    Kazuki ergueu a lâmina.

    — Ainda sou grato por aquilo de três anos atrás.

    — Nem menciona. Vamos dizer que a gente fica quites se você fizer isso por mim.

    — Se for você, senpai, com certeza vai superar essa pena de morte.

    — Bom, deve ser melhor do que virar um fantoche dos Parasitas, sem poder voltar pra casa.

    Dylan soltou uma risada leve.

    — Ei, Seol? Obrigado. Por ter vindo me resgatar. De verdade.

    Ele falava com o rosto aliviado.

    — E também, se puder, diga adeus aos outros dois por mim, tá?

    E então, sorriu. No mesmo instante, a lâmina desceu.

    — Dyyylan!!

    No momento seguinte, tudo pareceu desacelerar.

    — Não ligue se o chá estiver meio sem gosto, beleza? Estou tentando aprender a fazer chá, mas não consigo melhorar.

    Ele não podia acreditar que isso estava acontecendo.

    — Mm. Eu entendo de onde você está vindo, mas concordo com a dedução que Seol fez lá fora. Quando penso no destino do time do Kahn, faz mais sentido não tocar no caixão.

    Isso tinha que ser mentira.

    — Não se preocupe com isso. Quando estiver pronto, vá em frente. Eu ajustarei o meu tempo ao seu.

    Tudo estava rápido demais.

    — Escute. Eu sou tecnicamente o líder do Carpe Diem, mas até eu acho difícil controlar esses dois idiotas. Então quero saber, gostaria de me dar uma ajudinha com isso?

    No mínimo, eles deviam ter conversado por mais tempo.

    — Hehe. Nesse caso, acho que essa missão é a chance perfeita pra você ‘estrear’. Pode parecer um trabalho simples, mas quando você estiver no comando, vai aprender muita coisa. Foi assim comigo também.

    Todas as lágrimas que ele segurava transbordaram de uma vez.

    — Uwaaaah!!

    Seol Jihu se levantou num rompante e ergueu a lança de gelo. Estava prestes a atacar um dos Orcs mutantes num impulso cego, mas Kazuki o conteve a tempo.

    Tumble!

    Ele caiu de forma desajeitada no chão.

    Alguns segundos de silêncio se passaram…

    — …Não pense assim.

    Kazuki embainhou a espada, o rosto pálido e sombrio.

    — Eu disse isso antes, lembra…? Se a infecção estiver no início, tudo bem, mas… Dylan estava no estágio intermediário. Ali já estava no final. Mais da metade do corpo dele já tinha sido dominada. Mesmo que a Filha da Luxuria estivesse aqui, duvido que conseguisse salvá-los.

    Seol Jihu não respondeu. Não podia. Tudo o que conseguia fazer era chorar, soltando ruídos engasgados de dor.

    Ele sabia disso. Pensava que estava preparado para o pior.

    Mas, sendo sincero, criou esperanças quando encontrou Hugo. Só queria que Dylan estivesse vivo, só isso. Não esperava que as coisas terminassem assim. Era como o pior dos piores pesadelos possíveis.

    — Não seria melhor deixá-lo morrer em paz do que deixá-lo assim? Pelo menos, assim ele poderia voltar pra Terra e…

    Kazuki falou até esse ponto e ateou fogo aos restos mortais. Observando Dylan virar cinzas lentamente, Seol Jihu abaixou a cabeça e encostou a testa no chão.

    Um grito de dor, semelhante ao uivo de uma fera, ecoou na câmara.

    Kazuki observava, com os olhos apagados e sem forças, até que seus ombros cederam ainda mais.

    — Yasser Rahdi, leve o Seol de volta ao círculo, por favor.

    Essa equipe foi formada para salvar os prisioneiros. No entanto, a dor de descobrir que eles já estavam mortos era indescritível. Ele tomou essa decisão porque entendia isso muito bem. Forçar alguém tão arrasado a continuar seria um fardo depois.

    — …Entendido. Me desculpe por isso.

    Yasser Rahdi tentou ajudar o jovem a se levantar. Mas Seol Jihu não queria sair do lugar.

    — Seol, a gente não tem tempo pra isso. Anda logo e me entrega o rudium…

    — …Eu vou.

    — O quê?

    — …Vamos juntos.

    Seol Jihu cuspiu as palavras aos poucos antes de se erguer do chão, cambaleando.

    Dylan estava morto. Suas emoções ainda não tinham se acalmado. As lágrimas ainda escorriam, e ele ainda não tinha aceitado essa maldita realidade.

    Mas ainda havia pessoas esperando para serem salvas. Esse propósito forçava seu corpo a seguir em frente.

    — Não dá. Do jeito que você tá agora, só vai atrapalhar. Eu conheço o rosto da Princesa, então você não precisa se preocupar, pode voltar.

    — Eu também conheço o rosto da Princesa.

    — Olha só, cara…

    — Faltam três prisioneiros. Precisamos de pelo menos três pessoas.

    Essas palavras estavam corretas. Kazuki olhou fixamente para o jovem antes de massagear a testa.

    — Yasser Rahdi, e você?

    — Me desculpa. Eu… não consigo. Não tenho mais confiança…

    — Tudo bem. Pode voltar. Nós três vamos descer.

    Yasser Rahdi assentiu, sem energia, e se virou para sair.

    — …Vamos.

    Pouco depois…

    Uma pessoa desapareceu pela passagem de onde vieram, enquanto as outras três desceram pela escadaria rumo ao segundo subsolo.

    “…Princesa.”

    Enquanto seus passos o levavam ao andar inferior, chamas frias e pálidas ardiam ferozmente nos olhos de Seol Jihu.

    Um pequeno gesto, um grande impacto!

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