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    Quanto à localização do Ducado de Delphinion, podia-se dizer que ele ficava logo ao lado do Reino de Haramark. O laboratório, especificamente, estava situado no extremo nordeste do território do Ducado, e não ficava tão longe assim das fronteiras de Haramark.

    Foi um golpe de sorte imenso que Seol Jihu conseguiu escapar ao lado de Teresa Hussey. Ela podia não ser uma Arqueira, mas, felizmente, conhecia bem a topografia local, então não havia risco de se perderem no caminho.

    — Não temos muito tempo.

    Ela propôs que tomassem a rota mais curta até o Vale Arden. Como ficava na região da fronteira, era perto. Mais importante ainda, havia a Fortaleza Arden lá. Como uma nova estrutura estava em construção, o local estava bem abastecido, e devido ao incidente anterior, forças de combate de alto nível estavam destacadas na área.

    Teresa recomendou que marchassem até lá, afirmando que, se caminhassem sem parar, chegariam ao destino no quinto dia, ou no mais tardar, no sexto.


    O primeiro dia transcorreu sem problemas.

    Embora estivessem apenas na periferia, Seol Jihu teve a chance de ver como eram as regiões controladas pelos Parasitas. E sua avaliação depois de andar o dia todo? Um ‘mundo morto’.

    Não havia o menor traço de vitalidade ou vida. O solo acinzentado sob seus pés já não se desfazia em pó, e sim endurecera como pedra. Toda a grama que via era amarelada e seca. Nas raras vezes em que avistava uma árvore, ela era fina e ressecada, como uma maçã roída por um rato.

    Teresa o alertou para não tocar em nada de forma imprudente, por precaução. Mas também comentou que a situação no Ducado de Delphinion ainda era relativamente melhor do que em outros lugares. Disse que as mudanças ocorridas no Império, agora servindo como centro dos Parasitas, eram simplesmente inimagináveis, e deixou escapar um suspiro.

    Seol Jihu decidiu se concentrar apenas em caminhar. Só queria sair daquele lugar o mais rápido possível.


    Quando o segundo dia chegou para saudá-los, Seol Jihu acrescentou mais um item à sua avaliação: as mudanças de temperatura entre o dia e a noite eram extremas, para dizer o mínimo.

    Quando a noite caiu, a temperatura despencou. Estava frio demais. Saía vapor branco sempre que abriam a boca.

    À medida que a noite avançava, o frio se intensificava. Estava tão gelado que, pela primeira vez em sua vida, Seol Jihu passou pela experiência de não conseguir dormir por causa do frio.

    Durante seu tempo no exército, ele participou de treinamentos de sobrevivência no inverno, em plena montanha congelada. Mas nem aquilo se comparava a esse frio.

    O ar gelado não apenas se infiltrava em seu corpo, como também parecia roer seus ossos e escavar até a medula. Ele chegou a ter uma alucinação em que sofria de gangrena e via os próprios dedos dos pés se soltarem sozinhos.

    Na madrugada daquela noite, os dois se encolheram juntos em desespero, sem saber ao certo quem tomou a iniciativa. Não tinham escolha. Diante da real necessidade de sobreviver, coisas como vergonha ou honra eram facilmente jogadas pela janela.

    Os dentes de Seol Jihu batiam involuntariamente por causa do frio cortante, mas ele forçou os olhos a se fechar e tentou descansar.

    Estava à beira da insanidade. O único fio de consolo era o calor tênue transmitido pela pele pressionada contra a sua e as sensações suaves envolvendo seu pescoço e suas costas.


    Terceiro dia.

    Teresa continuava a incentivar o jovem, dizendo que estavam quase lá, que só precisavam se esforçar mais um pouquinho. Seol Jihu sabia que ela estava passando por momentos ainda mais difíceis do que ele, então fez o máximo para não demonstrar suas dificuldades.

    Infelizmente, o temido evento aconteceu por volta do meio-dia. Pela primeira vez durante a jornada, seus Nove Olhos retornaram uma cor amarela no horizonte distante. Considerando que ainda estavam em território inimigo, havia uma grande chance de essa cor se tornar ainda mais severa.

    “O que fazemos agora?”

    Enquanto ele ficava parado, refletindo, a região amarelada de repente se expandiu. Não, melhor dizendo, parecia estar se aproximando. Logo, o tom amarelo mudou para laranja, e então se transformou em um vermelho carmesim quase instantaneamente. Seol Jihu entrou em pânico e agarrou a mão de Teresa.

    — Princesa!

    — S-Sim?

    — Precisamos recuar, agora.

    — Recuar?!

    Teresa fez uma expressão confusa, como se dissesse: ‘Do que você está falando?’

    Ele não tinha tempo para explicar, então simplesmente a puxou e os dois se esconderam atrás de uma enorme pedra. Ela ainda parecia sem entender, mas sua expressão logo ficou tensa ao ouvir o zumbido de asas batendo. Seol Jihu apontou para o céu.

    — …Oh, Deuses…

    Os olhos de Teresa se arregalaram como sinos. Criaturas voadoras estranhas, cobrindo o céu como um enxame de gafanhotos, avançavam na direção geral deles. Como se estivessem apenas patrulhando a área, o enxame deu uma volta e voou rapidamente em direção ao oeste.

    Eles nunca imaginaram que seria fácil, mas agora que tinham visto com os próprios olhos o que estavam enfrentando, aquilo ia muito além de suas expectativas.

    — …Cometi um erro.

    Teresa murmurou, atônita.

    — Achei que, com o laboratório destruído, não haveria patrulhas na região da fronteira…

    Era exatamente o contrário. O número de patrulheiros tinha aumentado ainda mais.

    — …Mesmo assim, vamos continuar.

    Seol Jihu apertou o rudium pendurado em seu pescoço. Restava só um fragmento do tamanho de uma unha, mas ainda estava lá, e ele podia usá-lo.

    — A partir daqui, deixe comigo.

    Ele também decidiu manter os Nove Olhos ativados o tempo todo.

    Teresa lançou um olhar curioso para ele. Como ele tinha percebido a aproximação dos inimigos? Ele nem era um Arqueiro.

    Sua curiosidade se aguçou, mas em vez de perguntar, ela apenas assentiu com a cabeça.


    Quarto dia.

    A água deles finalmente acabou. Já estavam feridos desde o início, e agora, com a marcha forçada, seus corpos exigiam hidratação com mais frequência do que o normal.

    No começo, davam pequenos goles apenas para umedecer a garganta quando a sede apertava. Mas isso fazia o estoque diminuir rápido demais, então combinaram de apenas bochechar a água e cuspi-la de volta no cantil. Eventualmente, passaram a só umedecer os lábios, e nada mais.

    Tentaram o máximo possível conservar a água, mas, no fim, a garrafa ficou seca. Agora, realmente não tinham mais nada para comer ou beber.

    — Que droga…

    Teresa estalou os lábios, irritada, por um tempo, antes de dizer que voltaria em alguns minutos. Logo retornou e entregou o cantil a ele, que emitiu o som típico de líquido se mexendo lá dentro.

    — Aqui.

    Seol Jihu estava prestes a perguntar ‘Que tipo de magia você usou?’, mas então…

    — Seol, você também devia fazer suas necessidades no cantil. Não desperdiça.

    — Hein?

    — Xixi. Você sabe, urina.

    …Ele entrou em pânico ao ouvir aquelas palavras.

    — U-Urina?

    — …Para de me olhar assim.

    As bochechas de Teresa ficaram levemente vermelhas, mas suas palavras foram firmes e decididas.

    — Se quisermos continuar vivos, por enquanto, não temos escolha a não ser beber isso.

    — Ainda assim… não acho que seja muito bom pro corpo…

    Seol Jihu fez uma expressão contrariada.

    — Claro que não é bom. Mas, dito isso, o primeiro xixi é o mais suportável. Não é tão horrível quanto você pensa.

    — …Parece que você fala por experiência.

    — Sim.

    Teresa admitiu sem hesitação.

    — Foi quando fugi da Capital, eu acho. Estava vagando pelo deserto, completamente sozinha, e com muita sede… Então eu urinei, bebi aquilo, urinei de novo, bebi de novo… Foi assim que sobrevivi, de qualquer forma.

    — …

    — Mas não é algo que dá pra continuar fazendo. No fim desse ciclo, chegou uma hora em que eu simplesmente não consegui mais beber.

    Enquanto ficava incrédulo por dentro com a determinação dela de sobreviver, ele fez uma expressão de puro desgosto.

    — De qualquer forma, não vou te forçar a beber. Mas mesmo assim, não mija no chão e desperdiça, ok? Deixa que eu bebo.

    Diante disso, ele não teve escolha.

    No fim, teve que se aliviar mirando na pequena abertura do cantil. Segurar aquele recipiente morno deixou nele uma mistura estranha de emoções sujas e confusas.

    “Falta muito pra gente chegar?”

    O sol ainda estava alto no céu, mas o dia parecia mais sombrio do que o esperado, como se nuvens espessas tivessem avançado de repente. Seol Jihu suspirou enquanto fitava o céu escurecido.

    Um pequeno gesto, um grande impacto!

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