Capítulo 231: Ao Menos (2/2)
Embora tenham ido em carruagens até lá, na volta tiveram que ir a pé.
A atmosfera do grupo da Aliança estava relativamente silenciosa. Mas isso era inevitável.
Afinal, não estavam apenas com alguém famoso — estavam com uma Executor, uma das Terrestres mais poderosas do Paraíso, que havia criado inúmeras lendas ao lado de um homem chamado Sung Shihyun.
Por isso, todos estavam bem cautelosos ao redor dela. Até mesmo Kazuki tinha dificuldades para interagir com ela.
No entanto, embora Seo Yuhui pudesse parecer distante, não era uma mulher que gostava da solidão por natureza.
Na verdade, não seria estranho se alguém da sua posição se visse como especial e privilegiada. Ela não era apenas exaltada entre os humanos — até mesmo os Parasitas reconheciam sua existência como algo singular. Em primeiro lugar, a Filha da Luxuria era uma classe privilegiada.
Apesar de tudo isso, Seo Yuhui não agia com arrogância. Na verdade, comportava-se como qualquer outro Terrestre.
Como sempre tratava os outros com carinho e gentileza, ela se entrosou com o grupo em apenas um ou dois dias.
No jantar, voluntariou-se pessoalmente para ser a cozinheira. E mesmo com ingredientes simples, preparou pratos que exalavam aromas profundos e sabores ricos. Sua habilidade era realmente de nível magistral.
— Keu! Provar uma comida feita à mão pela filha da Luxuria!
Sakamoto Jun estava profundamente comovido e fez o maior escândalo. Seo Yuhui respondeu com um sorriso gentil.
— Coma o quanto quiser.
— Ah, posso repetir!?
— Eu também! Eu também!
Hugo gritou como se não quisesse ficar para trás. Quando estendeu o prato em competição, Seo Yuhui serviu mais sopa com um sorriso resignado.
Somando os dois, já tinham comido mais de dez pratos, mas como cozinheira, Seo Yuhui não podia deixar de se sentir feliz.
— Hm…
Seo Yuhui mexia a concha lentamente quando avistou um certo jovem.
Seol Jihu comia em silêncio. Embora movimentasse a colher mecanicamente, às vezes parava e ficava encarando o vazio.
Depois de observá-lo em silêncio por um tempo, Seo Yuhui abriu a boca com cuidado.
— Hm…
— …
— Não está do seu gosto?
Era raro Seo Yuhui demonstrar interesse em alguém primeiro. Naturalmente, toda a atenção se voltou para os dois. Seol Jihu ainda encarava o espaço à sua frente com um olhar vazio.
Só quando Kazuki o cutucou com o cotovelo é que respondeu.
— ?
Quando Seol Jihu ergueu o rosto entorpecido, viu Seo Yuhui com uma expressão um pouco constrangida.
— Parecia que não estava gostando da sopa…
— Ah.
Não era isso. Era só que…
— Está boa.
Seol Jihu forçou um sorriso e começou a tomar colheradas uma após a outra. No entanto, o olhar preocupado de Seo Yuhui não se afastou dele tão facilmente.
E ela não era a única preocupada.
Depois do jantar, Sakamoto Jun e Hugo terminaram de montar a tenda e foram conversar com Seol Jihu.
— Seol! Você mandou bem! Aprendi umas coisinhas com você!
— Aprendeu o quê?
— Não se faça de bobo! ‘Mesmo que você seja uma mulher incrível, eu sou diferente~’ Não estava tentando chamar atenção agindo todo reservado?
— …
— É aquele tipo, né? O cara frio e misterioso.
Hugo deu risadinhas enquanto cochichava no ouvido de Seol Jihu. Mas o jovem apenas o encarou em silêncio.
Meio sem graça, Hugo continuou:
— Enfim, pode esperar por hoje à noite.
— Esperar pelo quê?
— O Jun e eu montamos só uma tenda. Jogamos o resto fora.
— Por quê?
— É óbvio, né? Vamos dormir na mesma tenda que a Filha da Luxuria! Vamos dividir a cama!!
Hugo gritou animado e cruzou os braços triunfante.
— Só pra constar, eu fico no meio. Isso já tá decidido. Sem discussão.
— …Vai em frente.
Seol Jihu assentiu com a cabeça, sinalizando que não se importava. Vendo isso, Hugo piscou os olhos e falou, hesitante:
— Hm… Seol.
— Sim?
— Tá preocupado com alguma coisa? Aconteceu algo?
— Não, só estou com a cabeça cheia. Não é nada demais.
Hugo estalou os lábios. Como Seol Jihu disse que não era nada, só pôde aceitar suas palavras ao pé da letra.
Durante todo o caminho de volta, Seol Jihu mal disse uma palavra. Passou a maior parte do tempo encarando o vazio, e sua expressão pouco mudou.
Embora respondesse prontamente quando alguém puxava conversa, havia uma diferença enorme comparado ao Seol Jihu de antes — que sorria com brilho no rosto, fazia piadas e pregava peças.
Pode-se dizer que a aura ao redor dele havia mudado.
— Desculpa preocupar vocês. Estou mesmo bem.
Embora tenha dito de forma amável, no fundo estava mandando todos embora, dizendo que queria ficar sozinho. Até mesmo Hugo entendeu a indireta.
— Mmm…
Hugo se virou com uma expressão desapontada.
O tempo passou e começou o acampamento.
Como o grupo era composto por sete membros, uma pessoa precisava fazer a vigília noturna sozinha. Embora todos quisessem ficar de dupla com Seo Yuhui, Seol Jihu se ofereceu para fazer a vigília sozinho.
Um dos benefícios era ser o primeiro da noite, mas o verdadeiro motivo era que queria pensar sem ser incomodado.
Noite silenciosa.
Seol Jihu encarava fixamente o vazio mais uma vez. Embora pudesse parecer assim para quem visse de fora, na verdade, ele estava olhando para sua Janela de Status.
Mais precisamente, estava refletindo sobre seus Nove Olhos.
【Sua Habilidade Inata, Nove Olhos, está evoluindo.】
【A direção da direita (1) de sua Habilidade Inata, Nove Olhos, foi desbloqueada: Azul: Escolha do Destino.】
A primeira direção da direita – Escolha do Destino.
Ele não conseguia entender o que aquilo significava. Ou melhor, o significado era ambíguo demais.
Pensando bem, foi o mesmo quando o Mandamento Dourado foi desbloqueado.
Embora pudesse investigá-lo diretamente como sempre fazia…
— ⟅Você. Nunca se esqueça.⟆
— ⟅A decisão que você tomou hoje…!⟆
A voz de Ira ainda ecoava em seus ouvidos.
Não era qualquer um que dizia aquelas palavras. Quando dita por uma deusa, a palavra ‘nunca’ carregava um peso muito maior.
Ele não conseguia deixar de pensar que havia um significado mais profundo por trás do aviso para não tomar a direção da direita de forma leviana.
E ao lembrar-se de Gula dizendo ‘ele não está pronto’ e tentando impedir Ira com veemência, sua convicção aumentou.
Não era como se estivesse completamente sem pistas.
Claro, tudo não passava de uma teoria, algo que ele não tinha como provar no momento. Mas o mesmo pensamento já havia lhe ocorrido quando foi provocar a Medusa no Vale Arden.
Que os Nove Olhos estavam de alguma forma relacionados à Visão do Futuro.
【Sua Habilidade Inata, Visão do Futuro, está respondendo ao despertar da nova habilidade!】
Caso contrário, essa mensagem não teria aparecido durante o primeiro despertar dos Nove Olhos.
Além disso, por meio do Banquete, ele experimentou o que podia considerar como uma evidência. Isso era o que conseguia deduzir até agora.
Assim como as direções esquerda e inferior estavam conectadas, a direção direita Escolha do Destino e a direção superior Mandamento Dourado também estavam relacionadas. Os lados esquerdo e direito também envolviam ‘escolhas’. Havia simplesmente perguntas demais sem resposta.
Mas o que podia fazer? Os Nove Olhos, como habilidade, eram extremamente cruéis ao não oferecer explicações detalhadas.
Quando Seol Jihu lançou o cigarro fora com um peteleco, faíscas brilharam no ar. Ele puxou as pernas para si. Abraçando os joelhos, encarou as chamas da fogueira sem parar.
Enquanto o fogo ardia com vigor, o rosto de Oh Rahee surgiu de repente em sua mente. Em seguida, vieram Lara Wolff, a garota da faixa branca, o homem corpulento, Audrey Basler e o cara do cabelo lambido.
O mesmo valeu para a dupla de homem e mulher.
Seol Jihu encarou os rostos contorcidos da dupla dentro das chamas que tremeluziam.
— Por que vocês tiveram que matar?
Sua voz contida…
— Por que não foram simplesmente até o portal? Não teriam sido convocados para o Estágio 3.
…soava assustadoramente calma.
Não se sentia nenhuma emoção.
— Realmente valeu a pena…?
Mesmo sabendo que estava vendo uma alucinação, continuou falando.
Até que os rostos da dupla desaparecessem.
Fitando a fogueira, Seol Jihu tirou outro cigarro. Seu olhar desceu lentamente e parou sobre a mão que procurava o isqueiro.
Até o Banquete, ele nunca havia matado um ser humano. Houve momentos em que deixou pessoas morrerem mesmo podendo salvá-las. Mas nunca tinha matado alguém pessoalmente.
E, no Estágio 3, experimentou seu primeiro assassinato.
Seol Jihu observou sua mão com um olhar indiferente.
A mão não parecia diferente do normal. Não tremia, ele não a fitava inconscientemente e tampouco estava tendo pesadelos.
Ele os matou porque fizeram por merecer. Além disso, era algo que já esperava vivenciar em algum momento.
Mesmo tentando atribuir algum tipo de significado àquela experiência, era só isso que sentia. E isso era o que mais o incomodava.
Não fazia sentido do ponto de vista comum.
Um rapaz de vinte e seis anos, que mal sabia o ‘assa’ de ‘assassinato’, estava bem depois de matar duas pessoas?
A sensação de cortar o pescoço da mulher ainda estava vívida em sua mente. O mesmo valia para quando perfurou o estômago do homem que lutava e o empalou na parede.
Ainda assim, ele realmente estava bem.
Um pensamento repentino lhe passou pela cabeça.
Seol Jihu pensava que o futuro estava mudando, mesmo que só um pouco, de forma insignificante. Ainda acreditava nisso agora.
“Mas… e ‘eu’?”
“Será que eu também estava mudando junto com esse futuro em transformação?”
“Ou estava seguindo na mesma direção que a Visão do Futuro mostrou?”
Não podia chegar a uma conclusão precipitada. Mas se tratasse esse incômodo como algo sem importância, sentia que seria a segunda opção.
No momento em que reconhecesse e aceitasse essa insensibilidade, sentia que se tornaria o monstro que viu em seu sonho… aquele que se enfurecia nos campos de batalha como um demônio e se deliciava em se banhar com sangue.
Se ele realmente mudasse daquele jeito, deveria ficar feliz? Ou deveria ficar em alerta?
Seol Jihu fechou os olhos, mergulhado em pensamentos profundos.
Aquele foi seu ‘primeiro’ assassinato.
E ainda por cima, matou duas pessoas.
Elas deviam ter suas próprias vidas. Talvez tenham tomado aquela decisão extrema por não conseguirem superar o muro à frente delas.
— …
Seol Jihu enterrou o rosto entre os joelhos.
Ele realmente queria… que ao menos sentisse um mínimo de culpa.
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