Capítulo 43: Um Mal-entendido (1/5)
Yun Seora. Idade atual, 20 anos.
Uma jovem que foi convidada para o Paraíso após ser recrutada pela Farmacêutica Sinyoung.
A chamada ‘mulher exigente e arrogante’, como foi apelidada pelo falecido Yi Hyungsik.
Junto com outro Convidado, Kang Seok, ela era vista como a principal promessa da Área 1 no período de recrutamento de março.
Ela sempre demonstrou o hábito de ‘pensar primeiro, agir depois’ em tudo o que fazia; suas decisões nunca eram influenciadas por emoções e, por causa de sua personalidade, não se interessava pelos assuntos alheios.
Tais características lhe proporcionaram certa vantagem durante o Tutorial, mas, após perder o braço direito, sua situação mudou drasticamente para pior.
Ela estava plenamente ciente de sua fraqueza dentro do contexto da Zona Neutra, onde a cooperação com os outros era essencial.
Por isso, durante um mês inteiro, concentrou-se exclusivamente em recuperar seu braço direito. Infelizmente, ao descobrir que seu total de PS, 317 pontos, não era nem de longe suficiente para curar seus ferimentos, foi forçada a revisar sua estratégia e focar no fortalecimento de sua condição física.
Como uma Convidada, já possuía um entendimento razoável do funcionamento da Zona Neutra antes de chegar lá. Por essa razão, antes de despertar sua Classe, decidiu priorizar o aumento de seus atributos físicos. Sabia que, se conseguisse se tornar uma Maga ou até mesmo uma Sacerdotisa, seu problema estaria resolvido.
Yun Seora não soltou aquela tênue esperança, mesmo estando presa em uma situação sem saída. No entanto, tudo isso foi brutalmente arrancado quando sua Classe foi definida como Guerreira.
Ela deixou a Câmara do Despertar como se estivesse sendo expulsa. E, como esperado, em seu estado atual, simplesmente não havia nada que pudesse fazer.
Já havia gasto todos os PS que possuía. Até mesmo teve que vender a bolsa que recebeu como bônus inicial por um preço irrisório.
Mesmo que quisesse ganhar alguns pontos, ninguém queria uma Guerreira com um braço inutilizado em sua equipe.
Ter um dormitório adequado tornou-se um luxo inalcançável. Não conseguia nem se dar ao luxo de comer uma refeição por dia, e sua saúde começou a dar sinais alarmantes. Privada dos nutrientes essenciais, seu corpo ficava cada vez mais fraco a cada dia que passava.
E com um corpo debilitado, nem sequer conseguia tentar as missões Básicas, que ao menos concediam uma pequena quantidade de pontos como recompensa.
Sua determinação já havia se esgotado há muito tempo, e até mesmo sua resistência, sustentada apenas por pura malícia, acabou atingindo o limite. Se não fosse pelos irmãos Yi, que vinham visitá-la dia sim, dia não, Yun Seora já teria morrido de fome.
Contudo, sabia que os irmãos também estavam lutando desesperadamente. Por isso, não podia depender deles para sempre.
Percebendo o desconforto de Yun Seora, Yi Seol-Ah falou cuidadosamente:
— Que tal falarmos com ‘Orabeo-nim’? Ele é honesto e trabalhador, não nos abandonaria sem mais nem menos.
Seria mentira dizer que Yun Seora não se sentiu tentada com aquela sugestão. No fim, porém, balançou a cabeça e recusou.
Se ele lhe devesse um favor, a história poderia ser diferente. Sim, ele salvou sua vida, mas, em troca, ela lhe deu a poção de Ressurreição. E, para ela, o relacionamento deles terminava ali.
Não se importava se os outros a chamassem de orgulhosa mesquinha. Na verdade, naquele momento, estava envergonhada demais para ir até ele.
Ainda assim, recusar a sugestão de Yi Seol-Ah pesava em sua mente. E, não querendo incomodar mais os irmãos, mudou de esconderijo discretamente, sem avisá-los.
No entanto, naquela noite, Yun Seora passou por uma provação terrível e sufocante.
Ela abriu os olhos no meio da noite e viu três homens ocidentais. Dois deles seguravam seus braços, enquanto o terceiro estava sentado em cima dela.
Não importava o lugar, sempre parecia haver desgraçados como Kang Seok.
Enquanto resistia ferozmente, o rosto do homem sobre ela se aproximou e sussurrou:
— Ei, ouvi dizer que você é uma aleijada.
— Quer continuar vivendo assim? Não quer ir para o Paraíso?
— Apenas se comporte. Vamos te alimentar bem e te arranjar uma cama quente para dormir.
— Quem sabe até alguns pontinhos…
Pontos de Sobrevivência. No instante em que ouviu essas palavras, toda a força abandonou seu corpo. Naturalmente, sua resistência também enfraqueceu.
Quando percebeu seu erro, sentiu o frio tocando suas nádegas. Quando recobrou a consciência, percebeu que sua roupa íntima já havia sido puxada até os tornozelos.
E quando o homem tirou as próprias calças, com um sorriso lascivo e repulsivo no rosto, Yun Seora tremeu como um celular vibrando ao receber uma chamada.
Ela estremeceu violentamente, como se alguém tivesse despejado um balde de água gelada sobre sua cabeça em pleno inverno rigoroso.
Como as palavras de uma serpente sussurrando em seus ouvidos, o homem lhe ordenou que abrisse a boca.
Um objeto hediondo e asqueroso se aproximava de seu rosto, mas seus lábios permaneceram firmemente cerrados. Pensou que, no momento em que cedesse ali, tudo realmente chegaria ao fim.
Não, um simples ‘fim’ não seria tudo. Temia cair ainda mais fundo em um abismo infinito…
E assim, ela não abriu os lábios.
Mas gritou com tudo o que tinha. Mordeu tudo o que conseguiu alcançar e usou o corpo inteiro para lutar.
Suas recompensas foram xingamentos ásperos, além de socos e chutes. Mesmo assim, Yun Seora não cedeu em sua resistência frenética.
Eventualmente, os homens se cansaram e desistiram dela, deixando uma cuspida grossa em seu rosto.
Ela ajeitou as roupas e, cambaleando, retornou ao salão do quinto andar. Então, caiu no chão e se encolheu.
Uma única gota do líquido quente e salgado que vinha segurando finalmente escapou de seu olho. As lágrimas que antes só derramava por dentro começaram a escorrer, e, por fim, ela irrompeu em soluços incontroláveis.
“Seria melhor se eu simplesmente morresse.”
Estava com medo de dormir novamente depois do ocorrido, mas ainda assim forçou os olhos a se fecharem. Pensou que, se morresse ali, daquele jeito, talvez não tivesse arrependimentos.
Já não se importava mais com nada.
E assim, Yun Seora caiu em um sono inquieto. Mas então…
— …Senhorita Yun Seora?
Justo quando estava prestes a pagar ao barqueiro para atravessar o rio Estige…
— Senhorita Yun Seora.
…Ela olhou para trás.
E, então, o viu claramente.
— Você está bem?
Viu um certo jovem estendendo a mão para ela.
Enquanto Seol cuidava de Yun Seora, Yi Seol-Ah e Yi Sungjin chegaram aos seus aposentos.
Os irmãos entraram hesitantes no quarto e ficaram boquiabertos diante da grandiosidade da mobília luxuosa, que mais lembrava um palácio. Contudo, logo se recuperaram do choque ao ver Yun Seora gemendo baixinho sobre a cama e se aproximaram dela com expressões carregadas de preocupação.
— Ela não estava tão mal dois dias atrás…
— Sério?
— Sim. Por que ela piorou tanto…?
Yi Seol-Ah parecia ansiosa. Seol levou a mão ao queixo, pensativo.
“O que pode estar causando isso?”
Bastava um olhar para perceber que Yun Seora estava muito doente. Mesmo depois de trazê-la para seu quarto, o suor continuava a escorrer pela testa dela, e sua respiração ficava cada vez mais irregular.
Ele achava que a situação atual era um pouco melhor do que quando ela nem respondia ao ser balançada suavemente. No entanto, por não ter conhecimento médico adequado, permaneceu sem respostas. Só sabia que ela precisava de ajuda.
Seol disse aos irmãos que voltaria em breve e saiu do quarto. Diante de um problema que não sabia resolver, só havia uma pessoa em quem poderia confiar.
Após ouvir sua explicação, Agnes rapidamente chamou outra empregada para acompanhá-los.
Para sua surpresa, a pessoa que respondeu ao chamado foi ninguém menos que Maria. A empregada loira caminhou até eles com arrogância, e quando Agnes apresentou sua Classe a Seol, ela ergueu uma sobrancelha, talvez desaprovando a revelação.
Descobriu-se que Maria era uma Sacerdotisa de Nível 4.
Mais do que isso, ela era uma Sacerdotisa da cura que percorreu um longo caminho, de Sacerdotisa de Nível 1, Diácono de Nível 2, Clériga de Nível 3, até alcançar seu atual Nível 4 como Alta Sacerdotisa.
Seol retornou imediatamente aos seus aposentos com as duas empregadas.
— Isso está… simplesmente maravilhoso.
Depois de examinar o estado de Yun Seora, Maria soltou uma avaliação curta.
— Está tão ruim assim?
— Esqueça o braço direito dela, parece que está se deixando morrer de fome há mais de um mês. Além do corpo e do sistema nervoso estarem enfraquecidos a esse ponto, ainda foi espancada bem feio, então sim. Está ruim.
— Ela foi espancada?
— Sim. Sério agora… Não sei quem bateu nela, mas esse desgraçado realmente a destruiu.
Maria soltou uma risada vazia. Ao ouvir a verdadeira causa do agravamento do estado de Yun Seora, Yi Seol-Ah cobriu a boca, chocada.
— Você fez bem em trazê-la para cá. Sem os efeitos deste quarto, ela já poderia ter cruzado o Rio Lete e estaria erguendo a taça do Esquecimento neste momento.
— Como podemos curá-la…?
— Se quiser, posso fazer isso. Mas, falando estritamente, não há necessidade. Se ela passar os próximos dias aqui, comendo e descansando bem, se recuperará completamente.
— Isso significa que o braço direito dela também será curado?
Maria de repente ficou em silêncio e encarou Yun Seora. Agnes também analisou o braço direito inutilizado dela por um tempo antes de falar.
— Seis perfurações no braço… Parece que foram causadas por uma adaga curta, mas afiada. O agressor ainda torceu a lâmina em duas das feridas.
— Quanto tempo faz?
— Mais de dois meses. Será difícil mesmo com um Moderado ou Massivo?
— Por que perguntar algo cuja resposta já conhece? Leve teria sido suficiente se a ferida tivesse sido tratada imediatamente, mas… Agora já é tarde demais. Você sabe que, quanto mais tempo uma ferida fica sem tratamento, mais difícil é curá-la. Se for um Colossal, talvez seja possível, mas não tenho certeza.
Agnes soltou um suspiro leve.
Enquanto isso, Seol não conseguiu esconder sua surpresa diante das duas empregadas, que conseguiram deduzir o que aconteceu há dois meses apenas com um olhar.
Ao mesmo tempo, um certo sentimento de ansiedade começou a florescer no canto de seu coração.
Ele não compreendia o conteúdo da discussão, já que várias palavras relacionadas à profissão de Maria foram mencionadas, mas ainda assim entendeu que restaurar o braço direito seria extremamente difícil.
Maria ficou ereta e balançou a cabeça antes de desviar o olhar para Seol.
— Esse braço está tão bom quanto morto. Já passou do ponto de um simples feitiço de cura, agora exigindo algo no nível de Ressurreição. Em vez de deixá-lo como está, recomendo a amputação.
— …O quê?
— Não tem jeito. Não estamos no Paraíso. Você não encontrará um Sacerdote mais habilidoso do que eu dentro da Zona Neutra. E mesmo para mim, curar esse braço é difícil.
Seol tinha esperanças, mas, como esperado, essa lesão não podia ser curada na Zona Neutra. Maria não tentou suavizar a situação e simplesmente falou a verdade.
E as más notícias não paravam por aí. Ainda faltava cerca de um mês até o prazo final, e o braço direito de Yun Seora poderia piorar ainda mais nesse tempo.
— Existe… alguma outra maneira?
Seol não esperava ouvir impossível como prognóstico e só pôde morder o lábio inferior em frustração.
Foi então que…
— Existe outra maneira.
Uma voz calma pareceu ajudá-lo a recuperar os sentidos. Agnes se levantou da cama após concluir o exame do braço de Yun Seora.
— Como Maria disse, apenas um Alto Ranker de Nível 5 pode curar essa lesão. Mas acontece que a Classe Sacerdote é a mais próxima dos deuses.
— …
— Eu te disse que, ao alcançar o Nível 5, você precisará escolher um deus para servir. Você se lembra?
Seol assentiu com a cabeça.
— Colossal é um feitiço sagrado muito poderoso que um Sacerdote pode aprender ao atingir o nível 5.
— Mas a senhorita Maria não é nível 4?
— Sim, normalmente ela não poderia usá-lo… Mas existem exceções.
— Agnes? Você deveria calar essa maldita boca agora.
Maria começou a fuzilar Agnes com o olhar. No entanto, a empregada apenas lançou um breve olhar em resposta e continuou falando.
— Um Sacerdote que segue um único caminho sem receber o auxílio de outros deuses recebe o título de Alto Sacerdote. Ao se tornar um Alto Sacerdote, é concedido um privilégio especial.
— Um privilégio especial?
— Sim. O poder de realizar uma Cerimônia. É como implorar aos deuses para permitir o uso de um feitiço de alto nível.
Maria fechou os olhos com força. O som de seus dentes rangendo podia ser ouvido. Seol achou que ela até murmurou alguns palavrões.
Ele finalmente abriu a boca enquanto olhava para ela.
— …Com licença…
— Ah, não! De jeito nenhum! Nem fodendo!
— S-Senhorita Maria?
— Não estou ouvindo nada…Lalalala… Ebebebebeh…
Maria repetidamente tapava e destapava os ouvidos com as mãos.
— N-Não pode nos ajudar? Por favor! Eu imploro!
Yi Seol-Ah não conseguiu mais ficar apenas observando e implorou, mas…
— Porra, cala essa matraca.
Maria cuspiu as palavras, furiosa, fazendo Yi Seol-Ah dar um salto de susto e se esconder atrás de Seol. O acesso repentino de raiva e palavrões da empregada deixou a garota tão nervosa que ela nem conseguia fechar a boca aberta de choque.
Seol sinalizou para que a garota, agora com lágrimas nos olhos, ficasse em silêncio e, então, começou a se aproximar lentamente de Maria. O corpo inteiro da empregada começou a tremer.
— Não vem pra cá! Não se atreva a chegar perto de mim!!
— Senhorita Maria, só uma palavra, por favor.
— Ah, merda! Me solta agora!
Como ela deu sinais de que fugiria, Seol segurou delicadamente os braços dela para impedi-la. Maria então começou a socá-lo em resistência. Os golpes atingiram seu peito, mas, percebendo que não doíam tanto, ele concluiu que ela não estava tentando machucá-lo de verdade.
— O que seria necessário para que nos ajudasse?
— Que diabos? Você é surdo? Se estivesse ao meu alcance, talvez eu ajudasse se você me pagasse um monte de PS, mas estou dizendo que não posso fazer isso!
— E quanto à Ceri…
— Foda-se a Cerimônia. Nem mencione essa merda de novo! Só estou sendo educada porque a senhorita Foxy te trouxe até aqui. Só por isso! Se não fosse por isso, eu já teria esmagado sua cabeça.
Seol quase soltou um ‘Isso é você sendo educada?!’, mas conseguiu engolir as palavras. Ele achava que, finalmente, começava a entender mais ou menos por que ela praticava o voto de silêncio, mas isso não era o mais importante no momento.
— Eu sei que estou te pedindo muito. Mas só você pode fazer isso, senhorita Maria.
— E por que eu deveria?!
Maria retrucou, ainda o encarando furiosa.
— Você acha que uma Cerimônia é só rezar algumas orações e se ajoelhar algumas vezes? E as oferendas certas? De onde elas viriam? E por que eu deveria oferecer os recursos que acumulei com suor e lágrimas por uma vadia que eu nem conheço? Nem sou afiliada à Sinyoung! Acha que isso é tudo? Você ao menos sabe o tipo de efeito colateral negativo que eu tenho que suportar depois de realizar uma única Cerimônia?
Como se suas emoções estivessem saindo do controle, ela continuou despejando suas palavras com raiva. Havia até vislumbres de loucura em sua expressão, e Seol sentiu um leve temor, mas ainda assim a encarou.
“Implorar sem um plano não vai funcionar.”
Não, ele precisava convencê-la primeiro.
— Existe um certo versículo na Bíblia.
Maria olhou para ele com uma expressão que claramente dizia ‘Que merda você está tentando dizer agora?’, enquanto arfava, ofegante.
— Portanto, tudo o que quiserem que os outros lhes façam…
— …Façam também a eles. Livro de Mateus, versículo 7:12. Evangelho de Lucas, versículo 6:31. Eu já conheço isso.
Maria o cortou rapidamente e então soltou uma risada vazia, como se não acreditasse no que estava ouvindo.
— Sério, eu estou completamente sem palavras. Então, você está dizendo que essa inútil vai me dever um…?
— Não é só a senhorita Yun Seora, no entanto.
Dessa vez, Seol a interrompeu.
— Eu também ficarei grato a você, sem mencionar uma certa senhorita Kim Hannah.
O tom sério em sua voz fez Maria se calar e estudar o jovem. Ela ainda o encarava com raiva, mas sua expressão suavizou ligeiramente, como se tivesse sido pega de surpresa pelo que ele disse.
— O que você disse? Quem vai?
Como ele suspeitava, mencionar o nome de Kim Hannah foi a escolha certa. Vendo uma pequena luz de esperança surgir, Seol continuou.
— Você ouviu que a senhorita Kim Hannah passou pela Zona Neutra, certo?
— Sim.
— Ela veio me pedir esse favor pessoalmente. Sim, diretamente da boca dela.
— Ah, merda. Meu Deus. Ó, Luxúria…
A cabeça de Maria caiu lentamente para frente até sua testa encostar no peito de Seol. Ela permaneceu assim por um bom tempo sem se mover.
Seol ficou ali parado, preocupado que ela percebesse seu coração disparado. Então, a pequena mão dela se levantou lentamente até seu campo de visão, fazendo um gesto com o dedo indicador.
— Me dá um cigarro. E solta meus braços também.
— Ah.
Seol rapidamente a soltou e puxou um cigarro para ela. Até acendeu para ela.
— Fu-wooo…
Maria soltou a fumaça devagar pelo nariz e pela boca, então seus olhos começaram a brilhar com um brilho perigoso e frio.
— Pelos próximos cinco minutos, todos vocês calem a boca. Já estou me sentindo uma merda, então é melhor ninguém soltar um pio. Entendido?
Ela se recostou na parede e começou a encarar o teto. Era como se o cigarro fosse seu suporte vital, pois ela continuava tragando e soltando a fumaça constantemente. Também não se esqueceu de encher o silêncio com diversos palavrões coloridos. Seol, é claro, pacientemente esperou que ela terminasse.
E, eventualmente…
Ela jogou a bituca de cigarro no chão e cuspiu ao lado. Usou o calcanhar para apagar a brasa restante, fazendo Agnes franzir levemente o cenho, mas a outra empregada optou por não comentar. Agnes sabia muito bem dos perigos e sacrifícios que um Sacerdote precisava suportar para realizar uma Cerimônia.
— Haaaaa… Puta que pariu…
Maria passou os dedos pelos cabelos com raiva antes de abrir a boca.
— 82.010 pontos. Não, já que me deu um cigarro, 82.000.
— M, Maria?!
Diferente de seu comportamento habitual, Agnes gaguejou em surpresa. Sua expressão demonstrava choque total, com a boca escancarada e tudo.
Ignorando completamente essa reação, Maria apenas se focou em Seol.
— Vamos ver… Seu total de Pontos de Sobrevivência é… Muito menor do que o necessário. De qualquer forma, se quiser consertar o braço daquela garota, é melhor conseguir 82.000 pontos e me pagar adiantado. Depois disso, eu faço, seja uma Cerimônia ou qualquer outra coisa.
Yi Seol-Ah soltou um suspiro trêmulo. Para alguém que já ficava aflita com 200 pontos, um número como 82.000 era algo que ela nem conseguia conceber.
Maria pareceu desgostosa com isso, pois levantou o dedo do meio para Yi Seol-Ah. E então…
— Isso encerra nossa conversa. Não se esqueça, quero exatamente 82.000 pontos.
…Ela rosnou ameaçadoramente e se virou para sair.
SLAM!!
Logo depois de Maria bater a porta com tanta força que quase a estilhaçou, Yi Seol-Ah murmurou em estado de choque.
— 82.000 pontos… Isso é loucura. É caro demais.
— Você está errada. Não é nada caro.
Agnes a corrigiu.
— Considerando os materiais envolvidos, esse preço não é nada absurdo. Na verdade, acredito honestamente que Maria pediu o menor valor possível.
— É mesmo…?
Seol perguntou de volta, com um sorriso indefeso.
— Eu não faço ideia do que realizar uma Cerimônia envolve, mas há algum motivo para a senhorita Maria detestá-la tanto?
— Hm… Digamos apenas que ela tem muito a perder.
Basicamente, uma Cerimônia era um tipo de ritual onde se orava aos deuses enquanto se fazia oferendas adequadas. Quanto maior o desejo, maior a necessidade de oferendas de alta qualidade; se alguém orasse por algo que não estivesse ao seu nível, sofreria uma penalidade imediata.
Por exemplo, se Maria desejasse lançar o feitiço Colossal, que era o feitiço supremo de um Sacerdote de Nível 5, ela ficaria confinada na cama por sete dias, sofrendo com febre alta. Além disso, ficaria impossibilitada de lançar qualquer feitiço por duas semanas.
— Muito provavelmente, assim que realizar a Cerimônia, ela deixará a Zona Neutra.
— Ela vai embora?
— Sim. Se for ao templo principal do deus que serve, poderá reduzir pela metade a duração da restrição. Mais importante ainda, ao oferecer orações e recuperar seu corpo lá, aumentará significativamente as chances de evitar a redução dos próprios atributos físicos ou até mesmo a perda da capacidade de lançar feitiços.
— …
— E isso não é tudo. Apenas o ato de sair da Zona Neutra já causará grandes perdas para Maria.
O fato era que as empregadas encontradas na Zona Neutra não eram voluntárias trabalhando de graça. Trabalhar na Zona, assim como os sobreviventes gastando seus pontos, rendia às empregadas sua própria parcela de Pontos de Sobrevivência. Depois de deixar a Zona, elas podiam trocar esses pontos por algo chamado ‘registros de conquista’. Se Maria saísse antes do fechamento da Zona, naturalmente, teria que abrir mão desses benefícios.
Portanto, se realizasse a Cerimônia agora, teria que engolir todas essas perdas.
— Esse preço de 82.000 pontos deve cobrir apenas as oferendas necessárias para a Cerimônia e nada mais. Você pode dizer que isso é resultado do orgulho dela como Sacerdotisa, suponho. Se, mesmo depois de eu esclarecer a posição dela, ainda acreditar que esse valor é alto demais, então não há mais nada que eu possa dizer.
O tom firme e objetivo de Agnes fez Yi Seol-Ah abaixar a cabeça em vergonha.
Enquanto isso, Seol refletia cuidadosamente sobre algumas questões. No momento, ele possuía 38.580 pontos. Isso significava que precisava ganhar mais 43.420 pontos.
“Isso não vai ser fácil.”
Ele havia decidido não fazer mais missões de dificuldade Difícil. E, para completar missões de dificuldade Muito Difícil, precisaria se preparar adequadamente, o que naturalmente significava gastar pontos nisso. Mesmo que saísse agora para encontrar parceiros adequados, as recompensas seriam divididas entre os participantes, o que reduziria seu ganho individual.
“Por que isso só aconteceu depois de eu ter comprado coisas na loja VIP…?”
Que evento incrivelmente inoportuno. Se ao menos soubesse disso antes, quando ainda tinha mais de 120.000 pontos.
Agnes observou Seol lamentando sua má sorte em silêncio, antes de se curvar educadamente.
— Independentemente do que decidir fazer a seguir, desejo-lhe boa sorte.
Ela então deixou o quarto, restando apenas os quatro ali dentro.
Yi Seol-Ah começou a murmurar um pedido de desculpas, seu rosto envergonhado.
— Me desculpe… Por minha causa, você…
Seol não podia deixar de concordar. Afinal, ele não era um santo, nem um homem virtuoso. Enquanto suportava os ataques histéricos de Maria, várias vezes se perguntou por que estava se dando ao trabalho de fazer isso.
Porém, sempre que isso acontecia, ele se lembrava da velha história de Liu Bei e do velho homem, e continha sua impaciência. O momento em que desistisse, tudo o que havia feito até então teria sido em vão. Mas, se perseverasse até o fim, os benefícios seriam o dobro.
“O Mandamento Dourado… É bom que isso não acabe sendo uma perda de tempo.”
Além disso, a história poderia ser diferente se ninguém tivesse contado a ele. Mas ele sabia. E, como já havia começado essa jornada, pretendia levá-la até o fim. Não queria olhar para trás com arrependimentos mais tarde.
Com esses pensamentos em mente, Seol transferiu mais 300 pontos para Yi Seol-Ah.
— O, Orabeo-nim?!
— Por enquanto, fiquem e descansem aqui. Comprem algo para jantar com esses pontos. Quando a senhorita Yun Seora acordar, comprem algo para ela também. Algo fácil de digerir, como um mingau ou algo assim.
Os irmãos Yi ficaram completamente sem palavras diante da consideração de Seol por eles.
— E-E você…?
— Vou sair para ganhar alguns Pontos de Sobrevivência. Não se preocupem comigo e esperem aqui.
Eles o observaram, ainda atordoados, enquanto ele pegava sua lança.
Se ele ativasse seus Nove Olhos naquele momento, talvez tivesse se assustado. No entanto, ele estava tão focado em ganhar os pontos que simplesmente não pensou nisso. Apenas abriu a porta e saiu.
Descendo para a praça do primeiro andar sem um plano concreto, como esperado, não encontrou nenhuma solução pronta à sua espera.
A única ideia que lhe ocorreu foi continuar fazendo missões Difíceis. Havia dez missões disponíveis, e cada uma ainda tinha nove tentativas restantes.
Se continuasse nesse ritmo, poderia ganhar 40.000 pontos. No entanto…
“Por favor, parem de me olhar assim…”
Os olhares das outras pessoas não eram brincadeira. Ninguém dizia nada em voz alta, pois não tinham nada a falar no momento, mas, se ele tentasse mais uma missão Difícil, sem dúvida começariam a cochichar novamente.
“Maldição, a culpa é de vocês por não tentarem essas missões desde o começo!”
“Desculpem, mas eu também estou numa enrascada aqui.”
Seol firmou sua resolução. Mas, antes que pudesse pegar um pergaminho de missão, alguém cutucou suas costas, fazendo-o se virar para ver quem era.
— Então, pode me dar um tempinho para um chá hoje?
Assim que se virou, uma voz melodiosa como o canto de um rouxinol entrou em seus ouvidos como uma canção agradável. Uma garota vestindo um vestido azul olhava para ele com olhos cintilantes.
Era Odelette Delphine, uma das duas pessoas que Kim Hannah recomendou que ele se aproximasse.
— Ou vai recusar de novo?
Ela perguntou com tanta inocência que Seol não conseguiu rejeitar.
— Não, tenho tempo.
— Ótimo! Vamos para aquele café ali. Todo mundo está te esperando.
Seol ficou brevemente confuso com essa afirmação, mas, ao ser arrastado até o café por ela, entendeu o que queria dizer. Quatro pessoas estavam sentadas a uma mesa, esperando por sua chegada. Três desses rostos ele conhecia vagamente.
— Hã?
Seol olhou para o homem magro usando um turbante e exclamou alto.
— Você achou que eu tinha morrido?
O homem, que parecia ser indiano, esboçou um sorriso fino enquanto falava.
— Sim. Naquela hora, você…
— Todos disseram a mesma coisa quando voltei. Tudo graças a um certo alguém.
Delphine sorriu brilhantemente antes de soltar um ‘Oops’ e mostrar a língua.
— Acontece que morte não é o único resultado possível ao falhar naquela missão em particular. Quem diria.
— Você morre ou volta ao início e tenta de novo.
— Você não retorna à praça para começar tudo de novo, certo?
— Exato – apenas volta ao começo do labirinto. Achei que ia realmente morrer tentando escapar daquele lugar maldito… Mas, bem, isso foi há dois meses.
Era fácil perceber, pela conversa, o quanto Seol estava alheio ao que acontecia na Zona Neutra, a menos que envolvesse seu regime de treinamento.
Sentando-se no lugar que Delphine indicou, Seol lentamente observou os rostos que o encaravam.
— De qualquer forma, bem-vindo. Pode me chamar de Tong Chai.
O homem que disse isso era Tong Chai, da Área 5.
— …Leorda Salvatore.
Da Área 2, com um par de olhos cinza-acinzentados e afiados como os de um lobo, Leorda Salvatore.
— Prazer. Sou Hao Win.
O homem que saboreava lentamente seu cigarro enquanto descansava os pés na mesa era Hao Win, da Área 7.
“Esse cara é…”
Esse era o outro sobrevivente mencionado por Kim Hannah. Ele não era um chefe de uma organização criminosa clandestina? Era das Tríades ou algo assim? Com sua aparência limpa e composta, ele não parecia nem um pouco um bandido.
E então…
— Finalmente!! Meu sonho está prestes a se tornar realidade!
Odelette Delphine, da Área 2, a única Maga e a segunda colocada da Zona Neutra, sorriu radiante.
Com exceção de uma pessoa, todos ali eram nomes que Cinzia mencionou no primeiro dia, no teatro.
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