Capítulo 62: Leite Derramado (2/4)
Assim que chegou ao Cassino Seorak Land, Seol Jihu pediu aos seguranças que o banissem permanentemente do local.
Com medo de encontrar alguém que o reconhecesse ali, passou rapidamente numa casa de penhores próxima para recuperar o carro. Os juros haviam se acumulado bastante, mas ele ficou satisfeito só de conseguir o carro de volta. Sua irmãzinha vivia falando sobre dirigir, então seu pai comprou esse carro para ela quando passou numa universidade bem famosa. Pode não ser um modelo caro, mas tinha valor sentimental.
Agora que estava com um carro, não precisava mais de táxi. No caminho de volta à casa da família, parou numa loja de informática e comprou o notebook mais recente e de última geração também.
Seol Jihu estacionou o carro num lugar aceitável e caminhou até o portão da casa da família com o coração disparado.
Viu a campainha, mas suas mãos não queriam se levantar.
Por um instante, considerou a ideia de deixar tudo ali e ir embora antes que alguém o visse. Não tinha pensado na possibilidade desse encontro acontecer, mas agora que estava ali, já não tinha mais confiança para encarar sua família.
Passou dezenas de minutos parado em frente à casa. Suas mãos se erguiam em direção à campainha e caíam de novo. No fim, porém, Seol Jihu respirou fundo e bateu na porta.
Talvez sua batida tenha sido fraca demais, pois não houve resposta.
“Será que não tem ninguém em casa?”
Engoliu em seco e digitou devagar o código da porta. Logo ouviu o portão se destrancar.
Entrou cautelosamente no prédio, mas precisou parar abruptamente. Um homem de óculos estava na escada para o segundo andar, olhando para ele com uma expressão nada amigável.
— H-Hyung.
Era Seol Wooseok, seu irmão mais velho.
— V-você ainda não saiu pro trabalho…?
— …
Seol Wooseok lançou um olhar penetrante antes de se virar em silêncio e subir as escadas de novo.
Slam!!
Logo em seguida, o som de uma porta se fechando com tanta força que fez Seol Jihu estremecer ecoou pela casa.
“…Claro.”
Suas expectativas acabaram de levar um golpe, mas, convenhamos, ele não estava em posição de esperar outra coisa. Ainda assim, queria pedir desculpas. Achava que o melhor seria terminar o que precisava fazer e ir embora o quanto antes.
Colocou um envelope cheio de dinheiro em frente ao quarto de Seol Wooseok e foi direto ao quarto da irmãzinha.
Encontrou Seol Jinhee dormindo profundamente na cama, vestindo apenas uma regata e roupa íntima. Estava até babando.
“É… pular as aulas de segunda de manhã era um ritual sagrado pra ela, né.”
Apesar disso, ela tinha sentidos aguçados. Seol puxou cuidadosamente os lençóis para cobri-la, colocou o notebook em cima da escrivaninha, tirou as chaves do carro e ₩5 milhões e os colocou dentro da bolsa dela. E, quando estava prestes a sair de fininho do quarto…
— Você.
A voz ainda soava sonolenta, mas com certeza nada amigável.
— O que você quer?
Ao som de tecidos se mexendo, Seol Jinhee chutou os lençóis e se sentou. Seol Jihu deu um leve pulo.
— V-Você estava acordada?
— Quem você pensa que é pra entrar no meu quarto sem permissão?
Ela se levantou da cama e foi até ele. Então, seus olhos pousaram na escrivaninha.
— Eu estava me perguntando o que você estava fazendo… Veio aqui pra me dar isso?
— Hã? U-uh, é…
Seol Jinhee começou a franzir a testa como se só de ver o rosto dele já sentisse enjoo.
— Que piada.
De repente, agarrou o notebook e o atirou com força. Ele caiu no chão com um estrondo e quicou.
— Pega essa porcaria e desaparece.
— E-Espera. Jinhee…
— Jinhee uma ova. Não quero saber, então vaza daqui, agora!!
Ela avançou contra Seol Jihu e o empurrou com raiva. Ele não pretendia resistir, então recuou várias vezes até cair de bunda no chão.
Sem nem se importar se ele estava machucado ou não, ela bufou com desprezo e pegou a bolsa.
— Que piada de merda. O quê? Finalmente ganhou algum dinheiro no cassino? Por que mais um ladrão como você ia pensar na irmãzinha do nada?
Seu rosto continuava zombeteiro enquanto dava uma olhada dentro da bolsa…
— ??
Viu o maço de notas totalizando ₩5 milhões, além das chaves do carro, e arqueou uma sobrancelha. Piscou algumas vezes e então ergueu a cabeça.
— Oppa?
Ela não estava falando com Seol Jihu.
Sem que ninguém percebesse, Seol Wooseok entrou no quarto com o envelope nas mãos.
Ele estava preocupado que Seol Jihu causasse algum problema e veio rapidamente até ali, mas ao se deparar com uma cena que era o completo oposto do que temia, tudo que pôde fazer foi alternar o olhar entre os irmãos.
— …O que é isso?
Sua voz soava firme e severa. Ele atirou o envelope no chão, espalhando as cédulas. Os olhos de Seol Jinhee se arregalaram.
— O que, o que diabos?! Quanto tem aqui?
Ela começou a contar e quase ficou de queixo caído.
— 50 milh…
E então, olhou de novo para dentro da bolsa.
— 55 milhões?!
A lembrança das chaves do carro e do notebook também voltou.
— Ha… então você ganhou na sorte grande, é isso?
— Jinhee, devolve tudo pra ele.
Quando Seol Wooseok falou com um tom frio, Seol Jinhee lançou um olhar furioso para ele.
— Por quê? Ficou louco?
— É óbvio. Ele conseguiu esse dinheiro apostando.
— Mas ainda é dinheiro, não é? Não! Não vou devolver!
Seol Wooseok estendeu a mão para arrancar o dinheiro das mãos dela, mas ela puxou a bolsa e o envelope, enfiou os dois por baixo da blusa e os abraçou com força.
— Seol Jinhee!!
— O quê?!
— Você realmente quer esse dinheiro sujo?
— Sujo ou não, esse dinheiro pertence a esta família! Era nosso desde o começo, você não entende? Não sabe o quanto o pai e a mãe estão lutando pra sobreviver atualmente?
Quando as emoções dos dois irmãos Seol começaram a se exaltar, Seol Jihu se apressou em intervir e os separar. Ele não tinha vindo ali pra ver os dois brigando. Ao menos precisava esclarecer esse mal-entendido antes de qualquer coisa.
— Hyung, Jinhee, vocês estão enganados. Eu não consegui esse dinheiro apostando.
Seol Jinhee parou de discutir com o irmão mais velho e virou a cabeça na direção dele.
— Sai daqui.
Ela bufou, como se a ideia inteira fosse uma piada.
— Se fosse pra mentir, então que fosse uma mentira melhor, né? Ah, ou será que você roubou isso? Assaltou um banco, foi?
— Eu tô dizendo a verdade.
Seol Jihu implorou, com uma expressão frustrada no rosto.
— Eu parei de apostar. Já pedi ao cassino pra me banirem de entrar lá. E esse dinheiro é de uma comissão… Não, de um trabalho.
— Você parou de apostar?
— Banimento vitalício do cassino?
Seol Wooseok e Seol Jinhee perguntaram ao mesmo tempo.
— Parei de apostar faz mais ou menos um mês. E hoje, vim direto aqui depois de pedir ao Seorak Land que me proibisse permanentemente de entrar naquele lugar. Por favor, acreditem em mim.
Seol Jihu explicou da forma mais clara que conseguiu. No entanto, não era uma questão de compreensão, mas sim de confiança.
— Então, o que você tá dizendo é que parou de apostar, pediu voluntariamente pra ser banido pra sempre, e esse dinheiro é legítimo, é isso?
Como se achasse a ideia completamente inacreditável, Seol Wooseok perguntou de novo.
— Para de desperdiçar meu tempo, tá? Acha mesmo que vou cair nas suas mentiras outra vez?
Seol Jinhee retrucou com desdém.
— Ah, então quando a gente te implorou pra pedir o banimento, você nem fingiu que ouviu. E quando tentamos fazer isso por você, não deu um chilique? Agora quer que a gente acredite?
— Jinhee…
— Hah? Como você ousa fazer essa cara pra mim?! O quê? Achou que só porque trouxe um pouco de dinheiro pra casa eu ia me derreter toda por você ou algo assim? Que eu ia voltar a te chamar de Oppa? Para de sonhar, seu desgraçado. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Esse dinheiro é algo que já pertencia à nossa família desde o começo!
Seol Wooseok a interrompeu ali.
— …Eu vou confirmar.
Seu olhar estava cheio de suspeita enquanto ligava o celular. Três, quatro toques depois, Seol Wooseok abriu a boca.
— É do Seorak Land? Sim, sim. Eu gostaria de pedir o banimento de uma pessoa da… Ah, eu sou o irmão mais velho dele. O nome dele é Seol Jihu… Como é?
A voz de Seol Wooseok foi ficando mais alta com o tempo.
— Ele pediu pra ser banido permanentemente? Hoje? Pessoalmente?
Seol Jinhee, ouvindo quieta do lado, ficou atônita.
— N-Nesse caso, tem como verificar a última vez que ele esteve aí… Sim, a última vez… Foi dia dezesseis de março?!
Pouco depois, Seol Wooseok desligou. A atitude de Seol Jinhee havia suavizado um pouco, mas ela ainda lançava olhares fulminantes para Seol Jihu.
Seol Wooseok falou, como se ainda não estivesse convencido.
— …Ainda não consigo acreditar nisso.
— Hyung. Sério, eu…
— Não, espera. Beleza. Vamos supor que esteja dizendo a verdade. Então, de onde você tirou esse dinheiro?
— Hã? Isso, isso veio de…
— Ouvi dizer que a Seonhwa te deu dois milhões no mês passado.
“Ele sabia disso?”, Seol Jihu só conseguia abrir e fechar a boca, sem conseguir dizer nada.
— Também ouvi dizer que você devolveu tudo naquela mesma noite… Você não tinha um centavo no bolso. Como conseguiu ganhar tanto dinheiro em um mês sem recorrer às apostas? E além disso, trouxe um notebook e uma chave de carro.
As perguntas eram bem incisivas. Até Seol Jinhee achou estranho depois de ouvir.
— Espera, esse aqui é aquele notebook gamer super caro…
Ela começou a analisar melhor o notebook que havia jogado no chão e, com certeza, sua desconfiança aumentou.
Foi aí que Seol Jihu percebeu seu erro. Seria justo dizer que seus desejos falaram mais alto? Ele se lembrou de que a irmã adorava jogar, então desembolsou mais de ₩3 milhões1 pra comprar o melhor notebook gamer da loja. Quem diria que aquilo acabaria sendo uma dor de cabeça?
“O que eu faço agora?”
No fim, não teve escolha a não ser improvisar. Se hesitasse e perdesse tempo, eles acabariam suspeitando de algo completamente diferente.
— É por isso que vim aqui hoje, pra falar com vocês sobre o que está acontecendo.
Ele escolheu cada palavra com extremo cuidado. Se dissesse qualquer coisa aleatória, eles pegariam as brechas da história num piscar de olhos. Por isso, Seol Jihu escolheu com cautela o que iria revelar.
— Fui indicado pra um trabalho por uma pessoa que eu conheço. Paga bem.
— Que tipo de trabalho paga tanto assim?
— Ah, isso. Eu tive sorte, só isso. Aconteceu algo grande e recebi um bônus gordo.
— …Corrida de cavalos? Ou apostas esportivas?
— Hyung.
— Loteria?
Seol Jihu esfregou o rosto. Confirmou mais uma vez o que sua família pensava dele. Mas como culpá-los? Ele merecia.
— Esse dinheiro não tem nada a ver com apostas.
— Você. Consegue repetir tudo isso na frente do pai e da mãe?
Fazer isso fazia parte do plano original de Seol Jihu, mas agora havia mudado. Seu hyung ou sua irmãzinha talvez não percebessem as falhas na história, mas já conseguia imaginar o pai fazendo perguntas bem desconfortáveis.
— Eu gostaria, mas preciso ir.
— Ele vai chegar logo.
— É que eu tô muito ocupado. Estava trabalhando fora do escritório hoje, por isso consegui passar aqui. Então, por favor, falem com o pai por mim. Pode ser?
— O que quer que eu diga pra ele?
— Em breve, eu vou sair da cidade por um tempo. Pode durar um mês, talvez mais de dois. Não vão conseguir entrar em contato comigo nesse período, mas não se preocupem comigo.
Conseguiu explicar, ainda que com dificuldade. Tanto o hyung quanto a irmãzinha pareciam confusos, mas não havia o que fazer. Mesmo que quisesse, Seol Jihu não podia contar nada concreto.
— Eu tenho que ir. Já tô atrasado. Da próxima vez, venho pra cumprimentar direito o pai e a mãe.
Seol Jihu forçou um sorriso e se despediu. Abriu a porta, desceu as escadas e abriu a porta da frente.
Mas, até fechar a porta…
Nem pensar em alguém tentar impedi-lo, ele sequer ouviu seu nome ser chamado. Claro, ele usou a desculpa de estar ocupado, mas mesmo assim…
— …
Por algum motivo, sentia que toda a energia estava deixando seu corpo.
— Achou que só porque trouxe um pouco de dinheiro pra casa eu ia me derreter toda por você ou algo assim?
As palavras da irmã, ditas num momento em que sua mente estava confusa demais para ouvir, finalmente atingiram seu golpe fatal.
Como se soubessem que ele merecia aquilo, o golpe acertou fundo e com força.
“Eu só queria… pedir desculpas direito…”
Estava tão ocupado inventando desculpas que nem conseguiu dizer um simples ‘desculpa’.
Seu primeiro passo não saiu como queria, mas ainda restava mais uma pessoa a quem pedir perdão.
Com a cabeça baixa, Seol caminhou lentamente até a estação de metrô mais próxima.
Seus ombros também estavam completamente caídos.
- R$12.000,00[↩]
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