Capítulo 93: Boa Vontade com Boa Vontade, Malícia com Malícia (3/4)

Os membros restantes da expedição correram apressadamente até a tumba, mas seus passos pararam abruptamente assim que avistaram Samuel diante dela.

A tumba estava a cerca de cinquenta metros de onde estavam. No entanto, eles perceberam que havia algo errado nos movimentos de Samuel. Seu rosto estava tingido pelas cores do puro terror, e lágrimas escorriam sem parar dos seus olhos. E, mais importante ainda, seu cabelo longo estava puxado para trás, suspenso no ar.

Era como se algo, ou alguém, estivesse puxando-o.

— M-Me s-salv…

Samuel tentou dizer algo em meio às lágrimas, antes de desabar no chão de costas. Enquanto se debatia, algo caiu de sua mão.

— Uwaaaahhh!!

Assim que todos recobraram os sentidos, Samuel foi sugado para dentro da tumba e desapareceu da vista deles.

Bam!!

A porta de ferro se fechou violentamente logo em seguida.

— Kuaaaaaaaaah!

E então, um grito ensurdecedor ecoou. Os cinco restantes correram para a frente em silêncio absoluto.

A entrada da tumba estava em completo caos. O altar que Alex havia levado dizendo que seria para comer estava virado de cabeça para baixo, com comida espalhada por todos os lados.

— Isso…! Esses imbecis!!

Pela primeira vez desde o início da expedição, Ian explodiu em fúria. Dylan lançou um olhar a Ian, que pisoteava o chão de raiva, antes de levantar sua besta.

— Chohong, Hugo! Vou dar cobertura.

Chohong e Hugo se posicionaram em cada lado da entrada da tumba. Eles se entreolharam e articularam silenciosamente um, dois, três antes de Chohong chutar a porta com força. E, no exato momento em que estava prestes a entrar…

— SAIAM DAAAAAAAAAAQUI!!!

Uma intenção assassina incompreensivelmente espessa, afiada o suficiente para dilacerar carne, atingiu e perfurou o cérebro de todos.

— U-Uwaaah?!

Chohong, que sempre se comportava como uma versão feminina de um machão, começou a vacilar, com o rosto tomado pelo medo.

O rugido do líder dos Lioners parecia brincadeira comparado à imensa aura maligna que jorrava do interior da tumba. Nem Chohong nem Hugo aguentaram; até mesmo Dylan e Ian desabaram no chão, ofegando por ar. O único que permaneceu de pé, inabalável, foi Seol Jihu.

Antes que qualquer um dos presentes pudesse recobrar a consciência, Seol Jihu ativou instintivamente os Nove Olhos e não pôde deixar de questionar seus próprios olhos.

“Está amarelo?”

Ou seja, ele precisava prestar atenção?

Mas, por quê? Nem Dylan, um Alto Ranker, conseguia resistir àquela força.

Seol não conseguiu entender, mas a situação piorava rapidamente.

O miasma corrompido, indistinto e turvo vazava da tumba e começava a envolver seus companheiros um a um. Seol Jihu olhou ao redor, sem saber o que fazer, até que um objeto cintilante no chão chamou sua atenção. Era uma pequena tiara com um brilho prateado brilhante.

Seol Jihu apressadamente pegou a tiara, e seus olhos trêmulos se voltaram novamente para a tumba. A indicação de Atenção Necessária não significava que estava absolutamente seguro, mas… ao ver Chohong agarrando seu pescoço com os olhos arregalados, Seol Jihu deixou de hesitar e correu para dentro da tumba.

Kwang!

Assim que entrou, a porta se fechou sozinha. Seol Jihu estremeceu, mas não parou de se mover.

Assim, atravessou a entrada e percorreu o corredor solitário. O que o aguardava na entrada da câmara funerária era um homem caído no chão.

Samuel olhava para o chão com olhos sem vida… com a cabeça separada do corpo. Não, talvez fosse mais correto dizer que a cabeça havia sido arrancada do corpo?

— Samuel…

E ele não era o único.

— …Alex!!

Alex, que segurava com tanto desejo o objeto que queria, estava ali com o pescoço torcido como um biscoito retorcido.

— G-Grace…

Enquanto isso, a cabeça de Grace havia sido rachada como uma melancia.

E, finalmente…

— …

A mandíbula de Seol Jihu caiu aberta ao avistar Clara, agora literalmente rasgada ao meio da cabeça até a virilha.

Seus restos exibiam o maior nível de brutalidade entre todos. Como se algo tivesse cavado seus olhos enquanto ela ainda estava viva, suas órbitas estavam vazias. Seus membros estavam torcidos em ângulos grotescos.

E não era só isso. A carne do pescoço estava amassada para dentro, como se algo a tivesse apertado com força excessiva. E, pelo estado de seu corpo, parecia que ela havia sido arremessada contra as paredes dezenas de vezes, pois agora se assemelhava a uma pasta de carne moída.

Seus companheiros, que estavam vivos e bem apenas alguns minutos atrás, haviam encontrado mortes horríveis. Ao perceber essa verdade arrepiante, Seol Jihu congelou como uma estátua no lugar.

— Por quê… por quê…

Tudo teria terminado bem se simplesmente tivessem escolhido voltar para casa em silêncio.

“Fuja!”, de repente, esse pensamento surgiu em sua mente. No entanto, ele não podia fazer isso. Seol Jihu olhou para trás e cerrou os dentes.

Não era Não Se Aproxime; como era Atenção Necessária, deveria haver algum tipo de solução para o que estava acontecendo lá fora. Pelo menos, mais opções deveriam estar disponíveis para ele em comparação a algo como Escape Imediatamente.

Mas só conseguia pensar em uma forma de sair daquela situação.

Com as mãos trêmulas, Seol Jihu estendeu os braços para os corpos. Recuperou o medalhão de Alex; pegou os brincos de Grace; e finalmente encontrou o colar de brilho azul próximo a Clara e o apanhou.

— !!

Então olhou para o sarcófago, e sua respiração se prendeu na garganta.

O sarcófago à esquerda estava completamente desalinhado. Além disso, a tampa estava meio aberta, e uma aura pálida azulada vazava lentamente pela abertura, preenchendo a câmara funerária.

Será que Samuel e sua equipe tentaram abrir o sarcófago também?!

Enquanto Seol Jihu permanecia paralisado pelo choque, percebeu que a câmara funerária de repente ficara mais escura.

O ambiente ficou assustadoramente silencioso. Por alguma razão, seus instintos gritavam para que ele não se movesse do lugar.

De repente…

— …Ah.

Seol Jihu sentiu ‘aquilo’.

Um olhar, fixo em suas costas. Alguém, ou algo, estava atrás dele. E então, o fedor nauseante e acre de sangue invadiu suas narinas.

A névoa que escurecia a câmara funerária começou a envolver Seol Jihu também. A aura maligna que ele havia sentido do lado de fora da tumba roçou sua pele, e ele sentiu como se cada célula do seu corpo tivesse despertado e estivesse gritando.

A única outra vez que ele havia tremido tanto foi durante o treinamento de inverno em clima frio, quando ainda estava no exército.

Mesmo tentando controlar os tremores, seu corpo ainda tremia descontroladamente. Não apenas por causa da aura gélida que vazava do sarcófago, mas também por outra coisa que o agarrava.

Seus instintos soavam alarmes em sua mente. Diziam para ele não olhar para trás. Que ele jamais deveria olhar para trás.

Subconscientemente, o pescoço de Seol Jihu rangeu como uma máquina enferrujada e começou a virar lentamente para trás, mas ele conseguiu fechar os olhos a tempo. De alguma forma, também conseguiu estender seus braços trêmulos. Era tudo que podia fazer naquele momento.

Depois de cinco minutos que pareceram uma eternidade, ele sentiu o colar deixando lentamente suas mãos.

— Uma lembrança da minha mãe.

Ele quase abriu os olhos quando uma certa ‘vontade’ invadiu sua mente.

— Este, um presente de alguém querido.

Em seguida, a tiara fria e lisa ao toque também desapareceu.

E então…

— Eu os avisei.

De repente, as palavras ficaram mais frias e cortantes.

— Eu odeio essas pessoas.

— Eu disse para não entrarem.

— Mas eles entraram mesmo assim.

— Eu ia suportar, mas esses dois…!

“Me desculpe.”

Seol Jihu abaixou a cabeça.

“Eu achei que iríamos apenas voltar para casa, mas eu não sabia que eles iriam…”

— Eu sei.

Quando ele desesperadamente falou em sua mente, a vontade dela respondeu.

— Essas pessoas tramaram em segredo.

— Eles mentiram.

— Aquele homem disse.

— Que eu não conseguiria persegui-los depois que cruzassem o limite.

O que Seol Jihu mais temia se revelou verdadeiro. Samuel e sua equipe não conseguiram abandonar sua ganância no final.

“É mesmo…?”

— É mesmo.

— Eu estava me despedindo de você, mas senti algo errado e os segui.

“Se despedindo de mim?”

—Un.

— Você prometeu vir me visitar de novo.

Antes que percebesse, ele já não tremia mais.

A aura maligna ainda era tão densa e pesada quanto antes. No entanto, Seol Jihu finalmente compreendeu que ela não estava direcionada a ele. Começou até a pensar que ela soava como uma criança emburrada, fazendo birra e dizendo que a culpa não era dela.

Quanto tempo passou assim?

O medalhão e os brincos ainda estavam em suas mãos, mas ele ouviu passos se afastando. Recuperando um pouco de calma, Seol Jihu respirou fundo e abriu os olhos.

A primeira coisa que viu foi um par de pés. Esperava ver pés apodrecidos e murchos de uma múmia, mas, na verdade, eram pequenos e belos.

“…Eh?”

Ela não deveria estar morta há muito tempo? Seol Jihu reuniu coragem e ergueu um pouco mais a cabeça.

E viu suas costas. O que avistou foi a silhueta de uma mulher, seus longos cabelos prateados ondulando suavemente até os tornozelos. Vestindo uma túnica branca adornada com cristais de gelo, ela entrou de bom grado no sarcófago e se deitou.

Ssssss…

Quando o som da tampa se fechando ecoou, Seol Jihu finalmente recobrou a consciência.

Sua mente agora estava silenciosa, sem mais nenhum traço da vontade dela.

— Uhm…

“Ela acabou de me poupar?”

Ele meio que esperava ser morto. No momento, sentia como se dez anos tivessem sido arrancados de sua vida.

Seol Jihu se virou rapidamente para ir embora, mas então notou o estado caótico da câmara funerária.

— …

E então… por algum motivo, começou a arrumar os bens funerários. Fechou a tampa do sarcófago corretamente e desenrolou o pano vermelho, colocando-o de volta sobre ele. Também recolocou a espada longa e o escudo nos seus devidos lugares.

O problema surgiu apenas quando estava prestes a terminar de arrumar tudo.

Plop.

— Mm?

Algo estranho aconteceu. Quando tentou colocar os brincos e a Prova de Castitas em suas posições originais, eles continuaram caindo. Não importava o que fizesse, eles se recusavam a permanecer nos seus lugares.

“O que está acontecendo?”

Ele só queria terminar de arrumar tudo rapidamente e sair dali, então isso era extremamente irritante.

— Argh…

— ?

Seol Jihu inclinou a cabeça de um lado para o outro antes de pensar cautelosamente:

“Por acaso, você está fazendo isso de propósito?”

— Você pode ficar com eles.

“…Perdão?”

— Obrigada.

— Foi a primeira vez.

— Uma pessoa me protegendo.

— Volte de novo.

“Não, espera aí. Eu só…”

Seol Jihu estava prestes a dizer algo em sua mente, mas então viu o sarcófago se afastando de repente.

Seu corpo estava sendo empurrado para fora. Não, parecia mais que alguém ou algo o arrastava, e antes que pudesse fazer qualquer coisa, ele deslizou pelo corredor. Logo, ouviu o som da porta se abrindo e o mundo escurecido se iluminou novamente.

Quando a porta se fechou com um estrondo, Seol Jihu olhou para trás.

Dylan, Chohong, Hugo e Ian estavam pacientemente esperando por ele.

Antes que Seol Jihu pudesse abrir a boca…

— Assim que você entrou, o miasma desapareceu.

Ian falou com voz suave.

— Ouvimos o que aconteceu. Ouvir a vontade de um espírito vingativo… foi realmente algo inesperado.

Ian parecia solitário e melancólico ao fechar os olhos. Parecia que o espírito vingativo também transmitira sua vontade para os quatro do lado de fora da tumba.

— Foi minha culpa que a equipe do Samuel tenha decidido agir separadamente assim. Se ao menos eu não tivesse falado daquela hipótese tão descuidadamente, então…

— Não, isso não é verdade.

Dylan falou com um tom formal.

— Todos nós tivemos a mesma oportunidade. Foram eles que a ignoraram. Eles não conseguiram controlar sua ganância e pagaram o preço por isso.

— É mesmo…

Ian soou resignado. Seu olhar se desviou para os acessórios nas mãos de Seol Jihu, a Prova de Castitas e um par de brincos sem nome. Em determinado momento, o destino de Seol e da equipe de Samuel se separou claramente.

O velho soltou uma risada amarga e olhou para o céu, parecendo um tanto desamparado.

— Boa vontade com boa vontade, e malícia com malícia… Aprendi muito durante esta expedição.

— Concordo. Afinal, os humanos não são a única raça que possui inteligência.

Dylan sorriu de maneira amarga antes de se virar. Seu Explorador havia morrido, mas ele também era um Arqueiro.

— Vamos voltar.

Logo, os membros restantes da expedição assumiram uma nova formação conforme as ordens de Dylan e partiram em silêncio dos arredores da tumba.

Onze haviam entrado, mas apenas sete deixavam a floresta.