Capítulo 392 - Cidade de Cina
Em toda a Cordilheira Divisória da Terra, no Continente Sagrado, havia a Cidade da Coroa Sagrada. Era onde vivia a realeza anã. Exceto pelos anões, ninguém mais tinha permissão para entrar nessa cidade, construída no topo da Montanha da Coroa Sagrada. Era a única cidade anã que proibia a entrada de outras raças.
Segundo os mitos, todo o interior da Montanha era oco. Diziam que, além da cidade, não havia mais nada por ali. A cerca de oitenta quilômetros de distância, em ambos os lados da montanha, havia montanhas menores: uma chamada Montanha Moga, e a outra, Montanha Cina. Para proteger a Cidade da Coroa Sagrada, que era a capital, os anões construíram duas cidades nessas montanhas. Deram a elas os nomes dos locais onde foram erguidas: assim surgiram a Cidade Moga e a Cidade Cina.
A Cidade Cina foi construída como uma estação de vigilância. Ainda assim, era também a sede principal da União dos Ferreiros do Continente Sagrado. Na verdade, era onde se concentrava o maior número de mestres ferreiros de todo o continente. Inclusive, um grão-mestre ferreiro viveu ali por vários anos, o que só demonstrava a prosperidade da região.
Como metade das armas de alto nível do Continente Sagrado era produzida em Cina, as medidas de segurança do local eram extremamente rigorosas. O mesmo valia para a Cidade Moga. Ambas contavam com círculos mágicos de defesa superdimensionados. Eram os maiores de todo o continente, grandes o bastante para impedir até os guerreiros mais poderosos de incomodar as autoridades locais.
Se alguém quisesse arrumar confusão na Cidade, que fosse para o estádio de lutas resolver seus problemas. Era exatamente para isso que aquele lugar existia, e sempre havia anões de sangue quente ocupando todos os espaços disponíveis.
Abel não estava andando muito rápido em cima do Vento Negro. Bartoli montava um cavalo de guerra que Abel comprou por um bom dinheiro quando viu uma caravana humana a alguns quilômetros no meio do deserto. Foi até engraçado: ele pretendia trazer um cavalo de guerra de Miuah, mas o pobre animal desmaiou assim que viu Nuvem Branca e a Chama Voadora.
No momento, Abel tinha um corvo morto-vivo voando ao redor da sua mão esquerda, que segurava seu escudo pequeno com formato de meia-lua. Assim como seus feitiços de mago, a técnica ataque com escudo estava registrada na sua árvore de habilidades. Obviamente, pertencia a um ramo diferente do de suas magias.
Quando ativava a técnica ataque com escudo, uma luz branca era disparada contra o corvo morto-vivo. O corvo caía no chão, atordoado com o golpe, mas logo se recuperava e voltava a voar em direção a ele — pronto para ser atingido de novo.
Abel estava “treinando” assim por um bom motivo. Quando firmou o contrato espiritual com o corvo morto-vivo, o acordo era que ele o ajudaria a elevar uma técnica ao nível máximo em troca de um frasco da poção da alma. Como a técnica não fora especificada no contrato, o corvo estaria preso a ele até que todas suas técnicas estivessem no nível máximo.
Que mestre esperto. No momento, sua “técnica de ataque com escudo” estava no nível três. Ainda faltava um longo, longuíssimo caminho até que o corvo pudesse se ver livre do contrato espiritual. E como era uma criatura morta-viva, nem a morte poderia libertá-lo daquela maldição a que fora forçado. Por sorte, era imune a praticamente tudo, então sempre voltava a voar até Abel sempre que precisava.
Havia uma única possibilidade de o corvo morto-vivo morrer: se ficasse preso em algum lugar e não conseguisse retornar ao mestre. Nesse caso, o mestre poderia simplesmente invocar outro corvo morto-vivo, e o original morreria automaticamente.
“A Cidade Cina está logo ali, Mestre!” Bartoli avisou Abel. Mesmo depois de ele ter lhe dado o bastão mágico com o padrão rúnico Leaf, ela ainda carregava o bastão de fogo negro. O bastão rúnico era simplesmente avançado demais para aquela era, então era melhor mantê-lo escondido até que fosse realmente necessário.
Abel inclinou a cabeça. Estava tão concentrado no treino que mal percebeu o tempo passar. “Já chegamos?”
Ao ver o imenso forte à sua frente, recolheu o corvo morto-vivo e o escudo de meia-lua, depois ajeitou as roupas amarrotadas. Estava prestes a encontrar algumas pessoas. Como corvos mortos-vivos eram criaturas normalmente associadas aos druidas, o melhor seria agir de maneira mais discreta dali em diante.
Quanto mais se aproximava da Cidade, mais compreendia o nível da segurança local. Na parte externa da Fortaleza de Cina, havia seis torres mágicas, cada uma com mais de dez andares. A mais alta tinha dezoito, mais do que Abel já tinha visto em toda a vida.
Por um momento, ficou completamente hipnotizado com o que via. Era como se estivesse ali para visitar um super-herói. Pelo que sabia, magos avançados de nível 18 eram raros. Até o Mago Cliff era apenas nível 16… então o quão fora do comum alguém de nível 18 deveria ser?
No topo das muralhas de cinquenta metros de altura, grandes tubos metálicos apontavam para fora da fortaleza. Provavelmente havia uma porção de balistas ali em cima. Só os anões tinham habilidade para fabricar tantas em um único lugar. E o poder devastador daquelas coisas… nem mesmo os magos sobreviveriam a uma daquelas flechas.
Ao apresentar sua insígnia de mestre ferreiro na entrada principal, Abel viu um homem de meia-idade correr em sua direção. Ele vestia uma longa túnica branca e o saudou com um gesto típico da nobreza.
“Bem-vindo à Cidade Cina, Mestre Abel,” disse o homem. “É uma honra tê-lo aqui. Meu nome é Rawl, da equipe da União dos Ferreiros.”
Abel respondeu com uma leve reverência: “Você me conhece?”
Pelo que ele sabia, muita gente ainda não o conhecia. Afinal, era jovem, e aquela era sua primeira vez participando de um evento de grande porte. Mesmo depois de ter se tornado mestre ferreiro há bastante tempo, quase nunca aparecia em público.
Rawl respondeu com cuidado: “Não, mas reconheci sua montaria. É muito raro ver um humano montado em um lobo selvagem. Além disso, Thorin já nos informou sobre sua chegada. Pediu que eu o aguardasse aqui.”
“Ah, é verdade. Obrigado,” Abel sorriu, agradecido. “Muito bem, então. Pode me mostrar o caminho.”
Por algum motivo que ele não compreendia bem, a União dos Ferreiros estava levando sua chegada muito a sério. Quando olhou ao redor, ficou ainda mais confuso com o tratamento que recebia, pois ninguém mais era recepcionado por um membro da equipe usando túnica branca.
De qualquer forma, seguiu Rawl até o enorme castelo à frente. A partir dali, todos os caminhos subiam. Os prédios ao redor pareciam dormitórios separados, com escadarias que continuavam subindo, sem parar.
A criatura que Rawl montava se chamava chocobo, uma espécie de ave típica da Cordilheira Divisoria da Terra. Era uma das montarias preferidas pelos magos humanos, principalmente pela facilidade que tinham em subir escadas. Obviamente, Rawl não tinha status suficiente para possuir seu próprio chocobo. Aquele era propriedade da União dos Ferreiros.
Por outro lado, o cavalo de guerra de Bartoli não estava se saindo muito bem. Nunca antes tinha andado em terreno inclinado. Já o Vento Negro era o rei das feras, o ângulo do chão não fazia a menor diferença para ele.
“Ei, Rawl,” Abel não conseguiu conter a curiosidade enquanto subia. “Notei uma coisa. Quanto mais alto subimos, mais grandiosos os prédios ficam.”
Rawl explicou da melhor forma que pôde: “Como sabe, Mestre Abel, a Cidade Cina é uma cidade pacifista. Muitos humanos, elfos e anões amantes da paz veem este lugar como um refúgio seguro. Há também os que vieram para cá fugindo de seus inimigos.”
“Com o tempo, isso criou um problema. À medida que mais habitantes chegavam, surgiram hierarquias e desigualdades. Quanto mais baixa a altitude da sua casa, menor o seu status; quanto mais alta, mais poderoso e nobre você deve ser.”
“Há algo importante a lembrar, Mestre Abel: é preciso ser um grande contribuinte da cidade para ser reconhecido. Quem vem pela primeira vez só consegue uma moradia temporária. Sem o nível adequado de ‘contribuição’, não se recebe o direito de viver aqui permanentemente. Tampouco o direito de adquirir uma propriedade.”
“Uma cidade pacifista, hein,” Abel murmurou com um suspiro. “Só mesmo um círculo mágico gigantesco seria capaz de algo assim.”
Quase nenhuma cidade humana era protegida por círculos mágicos de defesa em escala urbana. Em primeiro lugar, os humanos não lidavam muito bem com mana. Por isso, os magos sempre construíam suas torres nas bordas das comunidades.
Mas uma cidade pacifista era realmente algo diferente. Nem mesmo os elfos tinham alcançado algo assim. Havia três grandes cidades élficas protegidas por círculos mágicos enormes, mas nenhuma se comparava à Cidade Cina. Afinal, bastava não ativar sua mana ou seu qi de combate para atravessar as barreiras defensivas das cidades élficas. Já em Cina… era outra história.
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