Capítulo 17 - Rumo aos portões de Gramina
Arielle e Rubi seguem conversando até os primeiros raios de sol surgirem do leste, o que coincide com o momento em que Jenny e Helga acordam. Elas fazem uma rápida refeição com as barras de frutas de Arielle e com as sobras do javali. E prontamente, as quatro desmontam o acampamento e voltam a seguir viagem em seus cavalos.
Avançando por algumas horas na mesma direção, elas deixam a grama alta das planícies e entram em uma estrada de terra batida. No chão, marcas de rodas, pegadas de humanoides e rastros de animais indicam que há algum movimento de civilização naquele local, mesmo que pouco.
Depois de adentrarem na estrada, Jenny se aproxima do cavalo de Arielle e entrega um pano preto para Rubi.
“Que isso?”, Rubi pergunta, não entendendo o motivo daquilo.
“É para você cobrir sua cabeça”, Jenny responde.
“Por quê?”
“Pra esconder seus chifres”, Helga responde, de forma seca. “Se você aparecer assim, vão brotar guardas ao nosso redor em um estalo.”
Rubi leva a mão esquerda até a sua cabeça e segura um de seus chifres. Ah! Eu esqueci deles, ela pensa. Parando para pensar, não me incomodei em nenhum momento. Já me acostumei e nem percebi isso.
“Seu cabelo também é rosa”, Jenny alerta. “Não é muito usual. Se é que me entende.”
“Tá bom. Vou colocar isso”, diz Rubi.
Com as duas mãos, ela mexe em seu cabelo e o enrola em um coque. Em seguida, pega o tecido e o envolve ao redor de seus cabelos e seus chifres. Ao final do processo, apenas parte de seu rosto fica à mostra. “Ficou bom o bastante?”, ela pergunta.
Jenny circula ao redor do cavalo de Arielle, observando o disfarce de vários ângulos. “Já deve servir”, ela responde. “Se não olhar muito de perto, parece um gorro do seu casaco.”
“Ficou parecendo uma turista, isso sim”, comenta Helga. “Pode funcionar.”
A simplicidade do disfarce e a confiança das duas deixam Rubi cética. Só isso é o bastante para um demônio entrar numa cidade?, ela se pergunta. E se eu quisesse entrar lá e destruir tudo?
“Na entrada não vai ter uma vistoria ou algo do tipo?”, pergunta a demônio, desconfiada.
“Até tem”, Arielle responde.
“São um bando de guardas chatos”, Helga complementa, revirando os olhos.
“Mas como trabalhos para o Silvana, eles fingem vista grossa para o nosso grupo”, Jenny completa em um tom levemente embaraçado.
De novo? Por que esse cara parece cada vez mais suspeito?, Rubi se questiona. Já é a terceira bandeira vermelha.
“Se vocês acham que vai dar certo, não vou discordar.”
Helga se aproxima do cavalo de Rubi pela esquerda e nota a cauda dela à mostra. “E vê se deixa esse rabo quieto”, ela adverte.
“O quê?!”, a demônio questiona, surpresa.
“Se você ficar abanando essa coisa pra lá e pra cá, alguém vai ver e vamos ter problemas”, Helga explica.
Rubi fica ligeiramente irritada com as palavras de Helga. “Eu não fico abanando minha cauda!”, ela pontua.
“Abana sim”, Helga afirma.
“Na maior parte do tempo, não dá para ver a cauda escondida nesse seu casaco”, Arielle diz, entrando no meio da conversa. “Mas dependendo do seu humor, ela balança mais ou menos e pode acabar escapando.”
“É sério?”, a demônio pergunta, quase sem acreditar.
“Sim”, Arielle responde.
“Nem percebi”, ela diz, enquanto observa a cauda, que está visivelmente exposta por ela estar montada no cavalo. Consigo controlá-la. Só que o movimento dela é tão natural que eu não fico pensando nele, ela reflete e, com um esforço sutil, a cauda se recolhe com a mesma fluidez e naturalidade com que ela moveria um dedo.
“Bem melhor”, Helga afirma.
É como ficar de dedos cruzados., ela pensa. Se eu não me distrair vai ficar tudo bem.
Depois desse momento, Jenny se aproxima de Rubi novamente, dessa vez com uma expressão séria. “Eu queria te pedir outra coisa”, começa a falar.
Pelo tom da garota, Rubi logo entende que é algo importante. “Pode falar, se eu puder fazer, eu faço”, ela responde
“Por favor, não brigue com ninguém na cidade”, Jenny pede.
Rubi acha o pedido de Jenny muito estranho. “Acha que começaria uma briga?”, ela questiona, cismada.
“Não é sobre isso”, Jenny explica. “É bem provável que qualquer um que te ver sem disfarce, vai se assustar e talvez te atacar. Lá é cheio de outros aventureiros e guardas.”
A demônio compreende onde Jenny quer chegar. “Vai ficar difícil resolver as coisas se eu sair revidando qualquer coisa, não é?”
“Ainda mais se alguém se ferir”, completa Jenny.
“Especialmente se você matar alguém”, Helga pontua.
“Se estivermos por perto, podemos tentar intervir e explicar”, diz Arielle.
“Tá bom. Prometo não revidar ou tentar machucar alguém”, Rubi concorda. “Mas eu não vou ficar parada esperando me atacarem.”
“Obrigado”, diz Jenny, aliviada.
“É o suficiente”, diz Helga, resmungando. “Não faça a gente se arrepender mais do que nós já vamos.”
“Vou tentar não fazer”, diz Rubi.
O grupo caminha mais um pouco até avistarem uma árvore que faz sombra sobre a estrada. Lá, fazem uma rápida parada, onde Jenny vai até o cavalo no qual Edric está amarrado e cobre o homem com um tecido similar a um cobertor. Tentando mascarar, ao menos minimamente, que estão carregando uma pessoa naquele animal.
Poucos quilômetros depois desse ponto, o grupo entra em uma estrada maior, por onde pessoas em carroças já transitam, indo e vindo. Nenhuma por lá demonstra alarde ao avistar o grupo de Jenny e todos seguem normalmente, como qualquer outro grupo de viajantes.
Em pouco tempo, os muros da cidade de Gramina surgem à frente. Antes da cidade, a estrada principal por onde seguem, junto a outras pessoas, se bifurca em uma rota menor para a esquerda, em que ninguém mais parece seguir.
O grupo adentra pela bifurcação e se dirige a outra região dos grandes muros de pedra. Ao final daquela rota há um grande portão de madeira.
Rubi fica em alerta ao avistar que em frente à entrada estão guardas armados com lanças. As demais garotas não demonstram nenhuma preocupação, como se passar por aquele local fosse algo rotineiro.
“Não tem muita gente por aqui, não é?”, ela murmura para Arielle.
“A Jenny gosta de dizer que aqui seria uma entrada mais direta e sem fila”, Arielle responde. “Não é qualquer um que tem autorização para entrar ou sair por aqui.”
Ao se aproximarem, um dos guardas logo reconhece a líder do grupo e se aproxima dela. Em sua mão está uma prancheta de madeira com um papel, onde ele anota coisas com um lápis.
“Bom dia. Estão voltando hoje daquela mesma missão no outro dia?”, pergunta o guarda.
“Bom dia, Fahbo. É isso mesmo, sofremos um… atraso e levamos um dia a mais”, Jenny responde.
“E aquela ali com a Arielle. Quem é?”, Fahbo pergunta.
“É uma amiga nossa, Rubi. Encontramos ela no caminho e demos uma carona”, Jenny responde. “Ela vai falar com o Silvana.” Ela diz aquele nome com bastante ênfase.
“Humm. Entendi”, ele responde, demonstrando compreender as entrelinhas das palavras de Jenny. “E no outro cavalo? Algo que eu deveria saber?”
“Creio que não”, Jenny responde. “Também é assunto do Silvana. Mas tenho certeza de que você vai ter notícias do que é em breve.”
“Certo, certo”, ele diz e anota algumas coisas no papel. “Vou pedir para liberar vocês.”
Jenny acena com a cabeça. “Obrigado”, ela agradece.
O guarda acena de volta e se vira na direção de outro que está no portão. “Abram o portão para as Damas da Floresta!”, ele exclama.
Jenny segue para dentro da cidade, liderando o grupo. Arielle, empolgada ao ouvir o nome do grupo ser falado em voz alta, vai logo em seguida com Rubi. Enquanto isso, Helga segue atrás deprimida.
A demônio, vendo a reação de Helga, desfruta do momento com um sorriso no rosto.
“Não devíamos ter apostado o nome do grupo com uma moeda”, Helga lamenta.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.