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    Rubi, montada na garupa do cavalo de Arielle, passa pelos portões da cidade conhecida como Gramina. A demônio logo nota como a trilha de terra batida é instantaneamente substituída por uma rua pavimentada com pedras. À esquerda e à direita, há casas e outras construções feitas com tijolos, com as entradas estampadas por placas e letreiros cujas letras Rubi não consegue identificar.

    Nas ruas à frente, há outras pessoas circulando por aquele local, algumas a pé, outras a cavalo e outras em carroças. Assim como o grupo de Jenny, todas as pessoas na rua parecem apenas se preocupar com seus próprios afazeres. Mesmo assim, Rubi, temendo ser reconhecida, evita contato visual com as pessoas que passam próximas a ela, embora não pareça haver nenhum curioso interessado.

    Rubi sente o cheiro de vários tipos de comida e ouve pessoas convidando outras para seus estabelecimentos. Conforme avançam pela rua, surgem construções com vitrines e tendas nas calçadas, ambas expondo os mais diversos produtos.

    Tem tanta coisa!, pensa Rubi, deslumbrada por um momento. Eu queria poder ver… Logo em seguida, desiludindo-se.

    Em sua visão desiludida, ela percebe que por mais que haja comércios e pessoas na rua. Uma boa quantidade das construções que aparentam ser lojas estão fechadas e que há muitos andando naquele local com rostos fechados e de alguma forma aflitos. 

    Sem pausas, o grupo continua avançando pela rua. Elas seguem até o centro da cidade, onde finalmente encontram seu destino, um prédio grande, com três andares e uma grande porta de madeira. Na frente, há alguns cavalos amarrados, uma carroça de madeira com barris atrás e algum tipo de mural com papéis pregados, onde pessoas estão paradas os lendo.

    Esses que olham os papéis exibem um semblante angustiado enquanto examinam os folhetos expostos. 

    “Eles não parecem bem”, a demônio de cabelo rosa murmura no ouvido da meia-elfa. “Igual aqueles lá atrás,”

    “Aquele é o mural de notícias”, ela explica, bem baixinho. “Devem ter algum parente que foi para o conflito no leste… Ou só querem saber se o Senhor do Abismo foi invocado ou não.” 

    Esse clima de guerra não fez bem para ninguém, ela conclui. Vão ficar felizes quando souberem que já acabou.

    O grupo ignora a entrada da frente e começa a dar a volta no prédio, encaminhando-se para uma porta dos fundos. Rubi fica um pouco curiosa com essa escolha.

    “Por que não fomos pela frente?”, ela pergunta.

    “Bem, aqui é a central de trabalhos da cidade”, Jenny responde. “Lá é cheio de aventureiros como a gente.”

    “Alguns mais fortes, mais experientes e com equipamento bem melhor”, Arielle pontua.

    Helga fica sentida com o comentário da meia-elfa. “Na minha opinião, isso é só no papel”, completa.

    “Tem alguma chance de alguém lá dentro te reconhecer”, comenta Jenny.

    “Isso… definitivamente não seria nada bom”, diz Rubi, com bastante descontentamento ao imaginar essa possibilidade.

    Helga começa a gargalhar alto pensando nessa cena. Ela ri a ponto de algumas lágrimas escorrerem.

    Rubi se impressiona com essa reação. “Você parece gostar até demais dessa possibilidade”, ela diz, incomodada. 

    “Não, não. Não faz meu tipo de briga”, Helga nega, enquanto seca com o dedo uma lágrima no canto do olho. “Mas a confusão que ia acontecer seria muito engraçada.”

    “Eu prefiro não pensar nisso”, diz Rubi.

    “Chegamos”, diz Jenny, interrompendo a conversa.

    Elas param próximas a uma porta na parte traseira do prédio, onde há um guarda portando uma lança e usando uma armadura. Jenny desce do cavalo primeiro e vai sozinha falar com o guarda. Helga também desce e vai até o cavalo onde Edric está e começa a desamarrá-lo.

    Rubi e Arielle são as últimas a descer. Enquanto a demônio aguarda, a meia-elfa pega os arreios dos quatro cavalos e os prende em um toco de madeira próximo à parede do prédio.

    Jenny e o guarda conversam por alguns minutos, e quando param, Jenny faz um sinal com o braço, chamando o grupo. As demais vão em sua direção e as quatro entram no prédio juntas.

    Na sala onde entram, há várias caixas empilhadas espalhadas por todo o local. A maioria está lacrada, embora haja uma aberta, onde o mau cheiro e as moscas denunciam que se trata de uma lixeira.

    Em cada parede da sala há uma porta, e Jenny se encaminha para a porta que fica do outro lado da sala. Arielle e Rubi a seguem enquanto Helga vai para a porta da esquerda.

    “Vou levar o presunto aqui até a Jaula lá embaixo”, Helga afirma, se separando do grupo.

    A porta em que Jenny entra dá acesso a uma escada circular feita de metal escuro.

    Parece uma escada de incêndio, pensa Rubi.

    As três sobem três andares de escada. Antes de passar pela porta que dá acesso ao terceiro andar, Jenny dá uma rápida olhada no corredor, checando se não há ninguém. “Podem vir”, ela diz, ao confirmar que é seguro.

    Elas vão até uma porta grande no final do corredor, uma porta dupla, com madeira vermelha e uma plaquinha dourada com algumas letras estranhas que Rubi também não consegue ler.

    Jenny se aproxima, mas não a abre, apenas bate na porta. “Silvana, está aí?”, ela pergunta.

    “Opa!”, uma voz masculina suave responde do outro lado. “Jenny? Estou sim, pode entrar, está aberta.”

    “Eu vou falar com ele primeiro”, Jenny afirma. “Aguardem um pouco.” Ela entra e tranca a porta.

    Alguns minutos se passam, ninguém aparece no corredor, Rubi e Arielle não conversam, tentando prestar atenção na conversa que se desenrola na sala. Porém, devido às grossas portas de madeira, ouvem apenas ocasionais gritos abafados do homem lá dentro.

    “Vocês encontraram quem?!”

    “…”

    “Eles conseguiram o quê?!”

    “…”

    “Espera aí! Então…”

    “…”

    “Ela fez o quê?!”

    “…”

    “Graças aos Deuses!”

    “…”

    “Trouxeram ele?! Vocês são as melhores!”

    “…”

    “Espera! Trouxeram ela também?! Vocês são loucas?!”

    “…”

    “Ela está onde!?!”

    “…”

    “Puta que pariu!”

    “…”

    A cada grito, Arielle esboça um sorriso que não passa credibilidade alguma e acena com a cabeça, tentando tranquilizar Rubi, que está inquieta, considerando fugir correndo dali antes que alguém apareça ou que o homem lá dentro decida sair e a ataque.

    Após um tempo, a sala fica quieta e a porta é destrancada pelo lado de dentro. Jenny aparece, um pouco sem graça. “Podem entrar”, ela diz. “Até que ele reagiu bem.”

    Isso foi bem?, Rubi se pergunta.

    Sem muitas opções, a demônio decide entrar. Ela está cautelosa e, pela fresta aberta, dá uma rápida conferida na sala antes de entrar completamente.

    A sala tem as paredes pintadas em amarelo claro, e nelas estão penduradas bandeiras coloridas, armas dos mais diversos tipos e pedaços de monstros emoldurados como se fossem troféus de caça. À esquerda, há uma grande janela com uma cortina vermelha e à direita fica um armário de madeira vermelha com garrafas e copos na parte de cima.

    Em frente à porta há uma escrivaninha feita com madeira da mesma cor do armário, com cinco cadeiras na parte da frente e uma do outro lado, sendo essa última onde está sentado um homem. Ele possui cabelos loiros, uma barbicha no queixo, usa uma camisa branca de mangas tão largas quanto as de um robe e, por cima da camisa, um colete preto.

    Seus braços repousam sobre a mesa com as mãos cruzadas em uma posição elegante. Ele olha Rubi com um sorriso amigável. “Pode entrar”, ele convida com sua voz suave.

    Rubi entra na sala vagarosamente, com um pouco de receio, e é seguida por Arielle.

    “Primeiramente, gostaria de desejar uma boa tarde a vocês duas”, ele diz.

    “Boa tarde”, responde Arielle, com alegria ao ver que aquele homem as recebe.

    “Boa tarde”, responde Rubi, bem desconfiada.

    Pelo que falaram dele, não é bom dar brecha, ela analisa.

    “Acredito que já falaram sobre a minha pessoa, mesmo assim vou me apresentar”, ele diz, com a eloquência de um nobre. “Meu nome é Silvana Don Bacci, o Machado de Cormim, um Braço de Eldória e, não menos importante, Mestre da Guilda de Gramina.”

    São muitos nomes pra um cara só, Rubi pensa.  

    “Pode me chamar de Rubi. Obrigada por me receber”, a demônio se apresenta, ainda demonstrando cautela. 

    “Não seja por isso. Pode se sentar”, diz Silvana. Ele olha para Jenny. “Já me explicaram um pouco do que aconteceu no sul e fui… pego de surpresa.” Ele soa desconcertado nessas últimas palavras. “Minhas desculpas se eu me exaltei. De antemão, agradeço pela ajuda que nos proporcionou. Não sei como estariamos hoje se não fosse por isso.”

    Será que ele é outro espalhafatoso igual ao Thalgrim?, Rubi se questiona enquanto se acomoda. Não, é algo diferente. Ele parece muito calmo diante de um Lorde demônio.

    Assim que a demônio se senta, Silvana começa a encarar Rubi diretamente nos olhos. “Não vejo motivos para trivialidades, então vamos direto ao ponto”, ele diz de forma concisa e séria. “Você quer anistia, não é?”

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