Índice de Capítulo

    Jenny vai até a porta e a abre para que Helga entre, e ela, ao entrar, logo nota o estado da mesa de Silvana. “Que bagunça vocês fizeram, hein”, ela diz. “Rolou uma briga aqui?.”

    “É, dá pra dizer que foi isso”, responde Silvana, logo voltando sua atenção para Rubi. “No entanto, creio que já estamos resolvidos quanto a isso, não é?” Ele pergunta, esboçando um sorriso cínico. 

    Rubi não responde de imediato. Ela encara Silvana inconformada com aquela ousadia. “É. Estamos”, ela responde.

    A sala fica quieta devido ao clima de desconfiança que os dois passam. Helga, sem se importar muito, puxa uma cadeira e se senta. “O bom e velho Silvana nunca decepciona”, diz ela, quebrando o silêncio. “O homem que faz um demônio ficar de olho aberto.”

    “Foi meio tenso mesmo”, Arielle comenta. 

    “Dá pra ver. Então… já resolveram? Vão matar um ao outro? Não tem jeito? Se não tiver, melhor ainda. Já podemos ir embora?”, ela pergunta, deixando claro seu descontentamento por estar ali.

    “Ainda não”, Jenny responde, para a tristeza de Helga. “Qual seria a outra opção para Rubi?”

    “A maneira difícil”, ele responde, exibindo seu desânimo, como se já estivesse cansado só de pensar naquilo.

    “Que seria?”, Rubi pergunta, desconfiada. 

    Silvana empurra sua cadeira um pouco para trás, coloca os pés sobre a mesa e começa a olhar para cima, adotando uma postura descontraída. “O jeito honesto”, ele responde. “Você precisa de uma permissão da CREMEA.”

    “Eles podem fazer esse tipo de coisa?”, Jenny questiona, curiosa.

    “O que é isso?”, pergunta a demônio.

    “É o Conselho de Regulamentação de Monstros, Espíritos e Animais”, explica Arielle. “Daí vem o nome, Cremea.”

    “Isso é tipo uma organização do governo ou algo do tipo?”, Rubi pergunta. 

    “Mais ou menos”, Silvana responde, fazendo um gesto balançando a mão esquerda. 

    “É o que gerencia as Guildas de missões tipo essa”, Jenny diz. “Ela define algumas regras para caça e missões.” 

    “Eles também dão regulamentação para ter alguns animais exóticos e mágicos como mascotes ou familiares”, a meia-elfa complementa. 

    “Ou como companheiros de caça e montarias”, pontua Helga. 

    “É mais um pouco que isso”, Silvana continua. “Ele é um dos dois braços militares do Sul de Eldoria, ao lado da Guarda Militar. A Cremea também tem jurisdição sobre criminosos fora de cidades e qualquer região de Magia Densa.”

    “Disso eu não sabia”, comenta Jenny.

    “Por isso tem cartazes de bandidos de estrada nos murais?”, Arielle pergunta. 

    “Sim. Criminosos no geral são responsabilidade dos dois braços militares”, responde Silvana. “Se um bandido foge de uma cidade para uma floresta, ele passa a ser responsabilidade do conselho.”

    “Mas já vi patrulhas de guarda fora da cidade, isso está certo?”, Jenny pergunta. 

    “Patrulhas de estradas são responsabilidade da guarda, normalmente. A não ser que sejam em lugares com monstros”, ele responde. 

    “Nunca pensei neles dessa forma”, Arielle comenta. “Só com eles protegendo a cidade.”

    “Mas esse é o certo, eles ficam a maior parte do tempo pelas cidades mesmo. Os guardas se preocupam mais com criminosos urbanos e deixam os fugitivos aos cuidados da gente ou de caçadores de recompensa”, Silvana explica. “Se houver algum monstro na cidade, os guardas também têm jurisdição para agir. Nesses casos, a diferença é mais sobre quem vai preencher a papelada no final.”

    “E quem regula a situação sobre demônios é esse conselho de monstros, não é?”, Rubi pergunta. 

    “Sim, ele é quem diz os monstros em que podemos bater”, diz Helga. “Tipo você.”

    “Tecnicamente, um demônio é categorizado como um corruptor corpóreo”, Silvana complementa. “Independentemente de ser diabo ou daimon.”

    “E o que é isso?”, Rubi pergunta, curiosa.

    “Seria equivalente a uma criatura semi-espiritual”, Arielle responde.

    Eu sou um espírito?… Ou quase isso?, Rubi se questiona. 

    “É esse conselho que decide se algum monstro é perigoso ou não, bem como decide se algum tipo de criatura pode conviver em sociedade ou não”, acrescenta Silvana. “Todos os monstros que tiveram anistia nos últimos séculos, tiveram a benção da Cremea para isso.

    “Então esse é o jeito honesto?”, Rubi pergunta. “Convencer essa tal Cremea?”

    Arielle se vê confusa com a forma como Silvana falou. “Não entendi o problema”, diz a meia-elfa. “Você fala como se o jeito certo fosse ruim.”

    Silvana tira os pés da mesa e volta a se sentar normalmente. “Ora bolas, Arielle! Ela venceu Edric e impediu o renascimento do Príncipe do Abismo. Não acha que a Lorde Demônio merece ser recompensada por isso?”, ela pergunta de maneira eloquente, alegre e bastante irônica. 

    “Sim!”, Arielle responde com entusiasmo. 

    “Já entendi o problema”, diz Rubi, compreendendo uma parte do desânimo do homem. 

    “Pronto, só precisamos de umas cinco Arielles no concelho das Guildas”, Silvana diz com um tom irônico. “Pessoas são complicadas, ainda mais com demônios. A decisão vai ficar pela opinião delas.” 

    “Na teoria, se eles pensarem usando a lógica, não é tão difícil”, Jenny comenta. 

    “Talvez três Arielles e duas Jennys também aceitem”, diz Silvana, mantendo sua ironia. 

    “Isso é balela”, diz Helga. “Eu não duvido que ataquem a chifruda sem nem ouvir nada.”

    “Eu diria que com três Arielles, uma Jenny e uma Helga ainda é possível obter a bênção”, diz Silvana. “Mas se tiverem mais Helgas que isso, não tem conversa.”

    Rubi já se vê descrente com a analogia de Silvana. Eu tô é ferrada, ela pensa.Independente de serem Jenny, Arielles ou Helgas, as três me atacaram assim que me viram. Imagine se as três fossem como a Helga? Se lembrando de seu encontro com as garotas. Mas se bem que… quem me atacou primeiro foi a Arielle e quem parou pra me ouvir foi a Helga. Então, qualquer coisa pode acontecer.

    “E na sua opinião, quais são as minhas chances?”, a demônio questiona, buscando clareza.

    Silvana pensa um pouco, considerando as possibilidades. “Cinquenta por cento, assim como tudo na vida”, ele responde. “Depende muito do que vai acontecer no leste nas próximas semanas. Se der certo, vai ser bom pra todo mundo.”

    “Até pra você?”, Arielle pergunta. 

    “Ele vai ser o Homem que convenceu a Lorde Demônio a lutar por Eldória”, Jenny supõe. “Não é?”

    Silvana exibe um sorriso. “Exato”, ele diz com confiança. “Até soa bem.”

    “Isso soa é mal”, diz Helga. 

    “Se der errado, vai ser ruim para você também”, afirma Rubi. “Você vai ser o homem que jogou a Lorde Demônio na frente do concelho.”

    “Errado”, ele corrige, ainda exalando confiança. “Vou alegar que você me controlou ou algo do tipo, a mesma coisa para proteger as meninas.”

    “Parece que só eu me ferro nisso”, afirma Rubi cabisbaixa. 

    “Essa parte aí pode dar certo”, diz Helga.

    “É meio cruel da sua parte”, diz Arielle. “Mas vai evitar alguns problemas para a gente, então eu não discordo.”

    A demônio sente o comentário de Arielle como uma pontada em seu coração. Até tu, Arielle?, ela pensa. 

    “Isso com certeza vai falhar”, diz Jenny. “Se você marcar uma reunião com a Rubi, ao invés de um conselho, eles vão mandar um exército.”

    “É, mas não vou marcar uma reunião para a Rubi”, diz Silvana.

    “Como assim?”, Rubi pergunta. 

    “Bem, graças a vocês temos um procurado de alto valor aqui”, Silvana responde. “Meu pedido vai ser que pelo menos um membro do conselho apareça para buscá-lo.” 

    “Isso…”, diz Rubi. “Não parece tão ruim.”

    “Você pode tentar convencer esse membro”, Afirma Silvana. “Como vai ser só uma pessoa, eu posso intervir sem me comprometer muito.”

    “Você quer dizer que vai poder mentir sem se arriscar”, Rubi corrige.

    “É a mesma coisa.”

    “Não é nada mal”, diz Jenny. 

    “E não vai ter um exército”, diz Arielle.

    Silvana olha para Jenny e diz, “Inclusive, é provável que vocês recebam uma promoção e uma boa recompensa em dinheiro.”

    “Promoção? Isso é interessante”, Jenny comenta, com algum entusiasmo.

    “Eu diria que vocês podem pegar uma promoção para a classe Avançada.”

    A meia-elfa se surpreende, ela fica alegre e esboça um sorriso genuíno. “É sério?”, ela questiona.

    Helga quebra sua postura desgostosa e também demonstra contentamento com aquilo. “Até que enfim uma boa notícia”, ela comemora. 

    Não estou entendendo nada, Rubi pensa. Ela olha para Jenny e vê que, diferente das amigas, ela se demonstra cética. “Tem algo errado? Isso é muito?”, Rubi pergunta para ela, curiosa.

    “Vamos pular uma divisão inteira”, Jenny responde e se volta a Silvana. “Isso não é meio exagero? Não somos um grupo tão experiente assim.” Ela exibe muita incredulidade.

    “Normalmente seria, mas não há muitos aventureiros desse nível por aqui. O único que me lembro foi o Jovem Herói. É claro que vai depender de como for a reunião. Vão querer seguir dessa forma?”

    “O que você acha, Rubi?”, Jenny questiona. “É arriscado.”

    Tem muita coisa em jogo nisso, Rubi analisa, sentindo o peso da situação recair sobre ela. 

    Apesar do que sente, ela mantém uma postura segura. “Eu quero tentar”, a demônio responde com firmeza. 

    E se der errado, ela pensa. Eu também já sei o que vou fazer.

    “Ótimo”, diz Silvana. “Vou falar com meus contatos.”

    “Só tenho mais uma pergunta”, Rubi fala em um tom sério. “Como eu não vou saber que no dia da reunião não vai aparecer um exército? Na minha opinião, você teria bastante a ganhar me entregando.”

    “O Silvana não faria isso”, diz Arielle. “Ele faria Jenny?”

    “Eu… queria poder dizer que não”, diz Jenny, hesitando. “Mas depois da história do nome, não coloco a mão no fogo. A Rubi tem razão, por que ela deveria confiar em você?”

    “Assim vocês me magoam”, ele fala em ironia. “Não vão confiar no bom e justo, Silvana?”

    O silêncio volta a ocupar a sala, declarando que ninguém compadece da brincadeira de Silvana. Arielle olha para ele esperançosa, querendo não acreditar que ele trairia alguém. Jenny e Rubi estão sérias, aguardando uma resposta de verdade. Enquanto Helga está de braços cruzados, olhando para a janela, não mostrando muito interesse naquilo. 

    Silvana, por fim, cede a pressão. “Tá bom, então”, ele diz, relutante. “Sabe como fazer um Pacto Demoníaco?”

    Tais palavras chamam a atenção de Jenny e Arielle. Até Helga fica desconfiada, perguntando se ele está falando sério. 

    “É um Pacto literal? Tipo mágico? Eu não sei fazer uma magia assim.”

    Uma expressão de alívio aparece na face de Silvana. “Que pena hein”, ele diz. “Então não tem como você ter certeza se eu estou mentindo ou não.”

    “Você ia mesmo fazer um pacto?”, Jenny pergunta, desconfiada. 

    “Sim”, diz Silvana. 

    “Corajoso”, diz Arielle, impressionada. 

    “Se você não pretende quebrar um pacto, não há por que ter medo dele”, Silvana afirma. 

    “O que acontece se você quebrar o pacto com um demônio?”, Rubi questiona. 

    “Depende do pacto, mas no geral é algo como perder a alma”, diz Silvana. “Eu imaginei que os Lordes demônios soubessem fazer esse tipo de coisa. Não é o tipo de coisa que um humano pode ensinar.”

    “É, existe muita coisa que eu não sei”, diz Rubi.  

    Ser demônio podia vir com um manual, ela pensa, em frustração. 

    “Eu estou tranquilo”, afirma Silvana. “Não seria a primeira vez que eu faria um pacto com um diabo.”

    “Por que é que eu não estou surpresa?”, Helga se pergunta. 

    “Quando alguém faz o que eu faço, tem que saber enxergar as oportunidades e as intenções que todo tipo de pessoa tem a oferecer, independente do que ela seja”, diz Silvana. “Enfim, não há como eu te mostrar que você pode confiar em mim. A escolha é sua.”

    “Pelo tipo de sujeira que eu ouvi e vi de você, não me parece que você sai por aí entregando a bagunça dos outros. Tá bom, então”, ela diz, em descontentamento. “Eu vou acreditar em você de novo.”

    “Ótimo. Vou entender isso como um elogio. E no seu lugar. Eu não me preocuparia muito com um exército, não creio que haja alguém por perto que possa te matar de verdade”, diz Silvana.

    Isso é bom ouvir, Rubi pensa, aliviada.

    “Pode ficar tranquila”, ele continua. “Podem falar muita coisa de mim. Que eu sou excêntrico, meticuloso…”

    “Que é cruel…”, acrescenta Arielle.

    “Que é confuso…”, acrescenta Jenny.

    “Que é um vagabundo…”, acrescenta Helga.

    “Que é um aproveitador…”, acrescenta Rubi

    “Já deu pra entender”, diz Silvana, interrompendo as garotas. “Mas eu nunca traí ninguém em um acordo.”

    “Isso é verdade”, diz Jenny. “Ele sempre cumpriu o que falou.”

    “E esse é um bom plano”, diz Silvana, despreocupado. “Se der certo”, ele murmura em sequência. “Além disso, Rubi, talvez no fundo eu só seja um bom homem tentando ajudar um diabo em necessidade.”

    “Não cai nessa”, adverte Helga. “Ele tá te ajudando porque algum dia ele vai cobrar algum favor de você. Tem gente devendo esse cara por todo o continente.”

    “Também é possível”, diz Silvana. “Ter amigos, nunca é demais.” 

    Rubi percebe as interações ácidas de Helga e Silvana. Esse cara é mais diabólico do que eu, pensa Rubi. A Helga é tão hostil com ele, quanto é comigo. Deve ter algum padrão.

    “Enfim, agora temos um problema menor”, Silvana comenta. “Vai levar algumas semanas para a reunião acontecer. Onde você vai ficar durante esse tempo? Você não pode ficar zanzando por aí, nem ficar numa hospedaria.”

    “Boa pergunta”, diz Rubi. 

    “É verdade”, Jenny completa. “Seria o caos pela cidade.” Pensando no que aconteceria se alguém avistasse Rubi. 

    Rubi se vira para Jenny. “Eu não poderia ficar com vocês escondida?”, ela pergunta.

    Jenny exibe um olhar receoso. “Você não pode ficar na nossa casa. É… problemático”, ela responde sem jeito.

    “Deve ter algum beco disponível”, provoca Helga. 

    “Bem, eu poderia lhe ajudar”, diz Silvana. “Você poderia ficar na minha…”

    “Não, obrigado”, Rubi o interrompe. 

    Silvana fica decepcionado com a resposta imediata. “É uma pena”, ele diz, desencantado. “Você é a succubus mais bonitinha que eu já vi.”

    Olha que safado. Ele queria mesmo me…, pensa Rubi. Espera…, um detalhe na frase de Silvana chama sua atenção. 

    “Você sabe que eu sou uma Succubus?”, a demônio pergunta curiosa. 

    Jenny se espanta um pouco. “Eu não cheguei a comentar isso com ele”, ela diz.

    “Não foi muito difícil”, Silvana explica. “Dá pra saber pela pele e pelo tamanho da cintura e dos seios.”

    “Pra isso, ele é bom”, pontua Helga.

    “Rá! Eu falei pra vocês que dava para saber”, afirma Rubi de braços cruzados, vangloriando-se. 

    Embora a demônio pareça confiante, ela se encontra em um dilema interno. É isso que eu queria? Ser reconhecida como uma succubus é bom ou ruim?, Rubi pensa, questionando seus ideais. Mas pelo menos ele disse que eu sou bonitinha. Isso é o que importa.

    “Não é esquisito que você saiba essas coisas sobre demônios só olhando pra um?”, questiona Jenny, com estranheza. 

    “Eu sei muita coisa. E eu olho para todo mundo”, diz Silvana com muita tranquilidade. “Todo mundo.” Ele enfatiza. 

    “Cruel”, diz Arielle, incomodada, chegando sua cadeira um pouco para trás. 

    “Já imagino que tipo de acordo ele fez com o outro demônio”, Helga afirma. 

    “Voltando ao assunto”, diz Silvana. “Jenny, esqueci de lhe avisar, mas sua irmã está fora da cidade. Saiu há dois dias.”

    “Como isso é voltar ao assunto?”, Rubi pergunta confusa. “Não tem nada a ver.”

    “Ela foi para onde?”, Jenny pergunta.

    “Foi para o Leste. Não sei o que foi fazer por lá, mas pediu para te avisar”, diz Silva. “Disse que vai ficar fora por um mês ou dois.”

    “Ela deve ter deixado um recado lá em casa”, Jenny supõe e começa a divagar sobre algo. “Mas se ela não está em casa, quer dizer que…” 

    Os olhos de Arielle brilham. “Sim!”, ela exclama empolgada.

    Helga bafora, exibindo seu descontentamento. “Que ótimo”, diz ela com sarcasmo. “A chifruda vai ficar lá em casa.”

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