Capítulo 8 – Um jeito menos melancólico de um demônio levar a vida
De volta à clareira, a fogueira continua acesa, com Arielle e Helga sentadas em frente a ela. Suas mochilas e equipamentos estão sobre um tronco velho. Ao redor da chama, gravetos cravados no chão sustentam peixes assando nas pontas. Elas exibem sorrisos genuínos enquanto conversam, aguardando que os peixes cheguem no ponto ideal.
“Isso sim foi uma boa luta”, Helga comemora.
“Uhum”, concorra a meia-elfa. “E eu disse que a Rubi não ia nos entregar.”
“É. Pode até não ter acontecido, ainda”, ela enfatiza a última parte. “Mas é bom também não baixar a guarda da próxima vez. Podemos não ter a mesma sorte.”
“Mas não foi sorte. E é tão verdade que a Jenny também confiou nela.”
“Não vem com essa. Só você que ficou toda boba e deitada esperando a boa vontade da rosada. A Jenny confia na lógica, não na demônio. Pelo menos ela cogitou que ela pudesse virar a casaca e estava pronta para lutar.”
Um pouco afastado dali, a leste, ainda na clareira, estão de pé Jenny, Rubi e Thalgrim. O semblante de Jenny é semelhante ao de suas amigas, alegre. Thalgrim, ainda com seus olhos rosa, mantém seu sorriso confiante. Rubi, por outro lado, está pensativa e exibe preocupação. Os três observam os homens de mantos vermelhos que estão amarrados e bastante feridos no chão.
“Eles vão ficar bem?”, Rubi pergunta.
“É claro que vão, minha Lorde”, responde Thalgrim, confiante. “Não parece, mas somos muito fortes.” Ele ergue um de seus braços e faz uma pose na tentativa de exibir seus músculos.
A resposta de Thalgrim não traz alívio a Rubi. Não consigo confiar nele, ela pensa. Ele parece do tipo que teria batido nos próprios amigos mesmo sem estar sendo controlado.
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“Não exageramos um pouco?”, Rubi pergunta a Jenny, olhando-a nos olhos.
“Eu creio que não”, ela responde. “Seu admirador aí tem razão, os cultistas de Mael são bem difíceis de matar.”
“Respirando eles estão”, Rubi comenta. “Só não parecem bem das pernas, nem dos braços, nem da cabeça, nem de nada.”
“Você realmente está preocupada com eles?”, Jenny pergunta, curiosa.
Rubi confirma com um aceno de cabeça. “Não quero que eles morram”, ela responde.
“Que honra!”, exclama Thalgrim em voz alta. “Ter a Lorde da Ganância preocupado conosco, meros serviçais.” Abaixa novamente a cabeça para Rubi. “Não é irônico que o título do egoísmo tenha sido dado a alguém tão nobre?”
As palavras e os gestos de Thalgrim fazem uma pequena risada escapar de Jenny e uma onda de vergonha subir em Rubi. Não é possível que esse cara aja assim normalmente, pensa a demônio, irritada. Prefiro pensar que o encanto deixou ele com os pensamentos confusos.
“Eles vão ficar bem”, diz Jenny, tentando não rir. “Eles têm essa bênção esquisita deles.”
“É por isso que eles são tão resistentes?”, pergunta Rubi.
“Sim. Os membros do culto deles ganham essa bênção. Seus corpos ficam muito fortes, rápidos e se regeneram de feridas. É bem estranho. Eles são praticamente monstros.”
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“Devo acrescentar algo, o nome correto é Bênção de Mael”, pontua Thalgrim. “Embora não saber disso não seja sua culpa. É natural uma criatura inferior que não sabe o seu lugar não ter informações completas sobre esse tipo de assunto. Além disso, ressalto que não somos os monstros que você disse.”
O desgosto que Jenny exibe por Thalgrim fica claro em sua expressão. “Ainda bem que você disse isso para mim. Se fosse para Helga, ela ia testar até onde vai essa sua bênção”, ela diz.
Esse Thalgrim é bem chato. Será que eu devia testar se a benção dele é boa como a dos outros?, Rubi pondera brevemente. Melhor não, acho que já fiz demais com o Zorvax.
“Mael é um demônio?”, pergunta Rubi. “Vocês ficam falando esse nome.”
Thalgrim fica perplexo com a pergunta. “Ele é o primeiro demônio”, ele diz, soando incrédulo em suas palavras. “Pensei que minha Lorde o conhecesse pessoalmente.”
Jenny se aproxima dos ouvidos de Rubi. “Eu acho que eles também pensam que você veio do abismo”, ela sussurra bem baixinho.
Rubi concorda acenando com a cabeça. “Então, eles vão ficar bem, né?”, pergunta a demônio, tentando mudar o assunto.
“É, basicamente eles só morrem com um ferimento muito pesado, como arrancar a cabeça ou o coração”, responde Jenny.
“Embora, devo ressaltar que essas sejam táticas usadas por grupos bárbaros que não compreendem a magnificência de nossas ações”, pontua Thalgrim, desgostoso. “Grupos como o de vocês.”
Depois do encanto, esse lado presunçoso dele piorou muito, Rubi pensa. Pelo menos com o Zorvax ele disfarçava melhor. Eu devia ter atirado em você ao invés dele.
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“Rubi, por que não vamos ali falar com as meninas?”, propõe Jenny, querendo sair de perto de Thalgrim. “Só a gente.”
Rubi acena, concordando com a proposta. “Thalgrim, pode ficar de olho neles?”, ela pede.
“Como quiser, minha lorde.”
Rubi e Jenny se encaminham para onde as outras estão sentadas. Rubi vê Helga e Arielle conversando, rindo, calmas como se não tivessem preocupações. Algo a incomoda ao ver essa cena. Rubi para de andar e Jenny, ao perceber, também para.
“Algo errado?”, pergunta Jenny.
“Como vocês conseguem?”, Liz pergunta, um pouco perturbada. “Quase matei duas pessoas. E se algo desse errado, vocês podiam ter morrido mesmo. Isso não é um jogo, é? Eu deveria ficar como? Relaxada? Preocupada? Eu… não sei.”
Além disso, nem hesitei em fazer as coisas que fiz com Zorvax. Nem me arrependo de ter feito, só não quero que ele morra, ainda mais por minhas mãos, pensa a demônio. Sinto que me arrependo mais de não ter mandado o Thalgrim para o abate do que do resto. Eu devia? Eles me invocaram sem permissão, mas ainda assim… parece frio da minha parte.
Jenny olha para Rubi por alguns segundos antes de falar. Está pensativa, procurando as melhores palavras para responder a demônio. “Essa é uma pergunta difícil”, ela diz.
“Talvez tenha sido uma pergunta ruim”, diz Rubi arrependida. “É melhor deixar pra lá.”
“Ruim não, só difícil. Mas eu penso que, pelo menos para o meu grupo e para os idiotas de vermelho ali atrás, existe uma resposta”, diz Jenny, com a mão no queixo. “Cada um sabe seus objetivos, e que a qualquer momento algo horrível pode acontecer. Se você vai se concentrar nessas coisas o tempo todo ou vai parar para ver as outras partes do caminho durante o processo, depende de você.”
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“É assim que vocês pensam?”, questiona Liz.
“No nosso caso. Como aventureiras, não sabemos quando será a última refeição. Podemos morrer a cada meia-hora. E francamente, aqueles caras não sentiriam remorso em ter nos matado”, continua Jenny. “Eu prefiro poder parar, descansar e rir um pouco depois de cada vitória, do que ficar pensando em como eu quase morri ou preocupada se vai ter um monstro na moita ao lado.”
A demônio ri ouvindo essa última parte. “É um jeito menos melancólico de levar a vida, não é?”, ela questiona.
Ela está certa, não quero ficar sofrendo por isso, Rubi conclui. Ainda vem mais coisas pela frente.
“Não ri não”, diz Jenny. “Eu prefiro dizer que sei aproveitar as pequenas vitórias.” Ela ri também.
Nesse momento de descontração, Jenny pensa, Até que ela é legal… pra um demônio.
“Ei, vocês!”, exclama Helga. “Vão ficar de conversinha aí? Os peixes estão prontos.”
Depois disso, Rubi e Jenny caminham juntas até onde estão as garotas, com Rubi agora exibindo um semblante mais alegre. Ao chegarem, sentam-se bem em frente à fogueira.
“Achei que não fossem vir”, diz Helga.
“A maioria dos peixes já assou”, diz Arielle. “Eles devem ter gastado um tempão pescando.”
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“Deveríamos ter demorado um pouco mais”, diz Helga, com um espeto de peixe assado em sua mão. “Aí eles teriam pego aquele javali pra gente.” Ela morde um grande pedaço e o mastiga com vontade.
“Teria sido bom”, concorda Arielle, enquanto retira um dos peixes assados para si e o assopra.
O cheiro chama a atenção de Rubi. Isso até que cheira bem, ela pensa, encarando os peixes ao redor da fogueira. Será que eu como? Será que consigo? Parte da cauda da demônio escapa por detrás de seu manto e começa a balançar mais e mais conforme o interesse de Rubi aumenta.
Helga percebe isso. “Vai, pega um”, ela diz sem terminar de mastigar. “Eu quero ver aquela careta de novo.”
Sem questionar ou retrucar, Rubi pega um dos peixes mais assados e o encara bem antes de mordê-lo. Não parece dos melhores, ela pensa, e então o morde em sequência. É bom, muito bom. Sem que perceba, sua cauda balança ainda mais vigorosamente.
“Sem careta?”, diz Helga decepcionada ao ver Rubi comer.
As três ficam observando curiosas enquanto a demônio devora peixe após peixe. Em pouco tempo, restam apenas espinhas nos espetos ao lado dela.
“Achou bom assim?”, pergunta Jenny, intrigada com a animosidade da demônio.
“Sim”, responde Rubi, pegando mais um espeto da fogueira. “Fizeram o que neles?”
“Nada, não fizemos nada”, responde Helga. “É só um peixe no espeto. Seu padrão que é meio baixo.”
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“Até que está bom”, diz Arielle, conformada. “Mas não acho que seja o melhor que já comi.”
“Eu ia até arriscar o peixe”, diz Jenny. “Mas vocês duas me fizeram mudar de ideia. Arielle, vou pegar mais uma daquelas barras na sua mochila, tem problema?”
“Pode pegar”, diz Arielle.
“Não está perdendo nada”, diz Helga com a boca cheia de comida.
“Mais pra mim”, diz Rubi, pegando mais um peixe da fogueira.
“É só você que come? Pensa nos outros também, sua egoísta”, diz Helga, brava e com a voz abafada por estar com a boca cheia de comida.
As demais riem da maneira como a voz de Helga soa.
Eu acho que foi isso o que a Jenny quis dizer com aproveitar as pequenas vitórias, conclui a demônio, tranquila.
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