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    O sol que banha os céus com luz começa a rumar no horizonte. A floresta permanece serena acima das árvores, mas, abaixo delas, uma movimentação se desenrola. 

    Entre troncos e arbustos, ouve-se o som de passos desenfreados, causados por um ser oculto que passa entre as folhas. 

    Cadê ele?, a criatura se questiona, com aflição tomando seus pensamentos. 

    Uma dezena de metros atrás, é possível escutar o som contínuo de mais folhas se mexendo e de galhos estalando, denunciando a presença de alguma coisa em sua perseguição.

    Ele estava por aqui, pensa ele, agoniado, procurando desesperadamente por algo. 

    A criatura corre pela mata sem parar um único segundo, até chegar a uma região aberta, uma pequena clareira sem arbustos. 

    O ser deixa as sombras das folhas baixas e se revela uma raposa branca como a neve. Ela ostenta uma cauda longa, com pelagem felpuda que lembra algodão por todo o corpo, com linhas avermelhadas na ponta do nariz, da cauda e das patas.

    Enquanto corre, a raposa olha para todas as direções, seus olhos avermelhados checando cada moita próxima. Onde está aquele maldito porco?!, ela se questiona.

    À esquerda, um outro reboliço entre as folhas surge, agarrando instantaneamente a atenção dela. 

    Será que…?, a raposa se pergunta, com um filete de esperança no olhar.

    Mas logo o desespero toma conta novamente.

    Atrás de um tronco, um bico amarelado aparece no alto, a um pouco mais de dois metros do chão. O restante da cabeça, penosa e clara, de uma garra-branca logo aparece, encarando a raposa com a feição de um predador faminto.

    Uma quarta?!, ela se questiona, tomada pelo medo, sentindo uma sentença de morte aplicada sobre si. Por que tem tantas delas aqui?

    O farfalhar ao fundo se aproxima e a raposa já muda o rumo de seus passos, correndo na direção oposta à ave mais próxima. 

    A garra-branca começa lentamente a caminhar, ainda medindo o valor daquela presa.

    A raposa reage. As linhas vermelhas em seu corpo brilham por um instante. 

    Na frente da ave, uma segunda raposa branca, idêntica à primeira, aparece estática e sentada com o rabo enrolado. 

    A garra-branca para de caminhar e muda seu foco para a criatura mais próxima. De repente, ela começa a pisotear e a bicar o novo alvo, mas seus ataques atravessam aquele corpo branco como se ele não existisse, acertando o chão e levantando terra. 

    A raposa não perde tempo, aproveita a distração e volta a passar entre os arbustos, mas o balançar de folhas de seus perseguidores não diminui, pelo contrário, só aumenta.

    Não pode ser!, pensa a raposa, em negação.

    A distância entre ela e seus perseguidores, aos poucos, é reduzida. A raposa começa a ouvir as passadas abafadas no chão cada vez mais próximas.

    Ela aperta o passo, correndo com tudo o que tem.

    Então, ela avista algo que revive a esperança em semblante. À frente, um pouco à esquerda, atrás de um arbusto, um topo peludo e marrom anuncia a presença de um animal.

    O porco!, ela pensa, com ânimo.

    A raposa ruma na direção e salta por cima, pousando nas costas do javali. 

    O animal grunhe assustado e a raposa logo pula dele, voltando a correr para longe logo que cai no chão.

    Boa sorte, ela deseja, deixando o javali para trás.

    Instantes depois, um segundo grunhido ecoa, dessa vez mais desesperado, mas logo ele é ceifado pelo silêncio. Culminando em uma quietude palpável que faz a floresta parecer deserta. 

    Era eu ou você, porco, pensa a raposa.

    Ela para diante de uma árvore e, com destreza quase sobrenatural, ela pula e começa a escalar o tronco até um galho alto, onde ela sobe e se esconde na escuridão abaixo das folhas. 

    A criatura branca se senta e suspira aliviada. Essa foi quase. Por um momento, achei que teria que sair desse domínio, ela pensa, fechando os olhos. Por quanto tempo será que eu aguento lá fora atualmente?  

    A raposa relaxa, deitada e sentindo a brisa refrescar sua pelagem macia, balançando seus pelos uniformemente, quase como uma nuvem sendo levada pelo vento do céu.

    Não pensei que viver aqui fosse tão difícil… e muito menos que eu poderia acabar na dieta de alguém. Eu nem devo ter um gosto tão bom assim.

    Ela abre os olhos levemente, encarando o norte, com receio. 

    Aquelas aves estão cada dia mais perigosas. Não quero nem pensar como está o Senhor deles.

    Minutos se passam, a floresta se acalma, mas as aves no chão crocitam algumas vezes. O som ecoa pela região. Elas estão muito barulhentas hoje…, ela pensa, sem se incomodar muito.

    E, de repente, quando o céu já está parcialmente alaranjado, aproximando-se cada vez mais do anoitecer, o animal felpudo sente um calafrio que a faz tremer da ponta da cauda até as pontas das orelhas. 

    Ela se levanta com olhos arregalados. Magia sombria? Por aqui?, a criatura se questiona, em alerta. 

    A criatura branca olha para o sul, de onde percebe a fonte daquela sensação sinistra. São os elfos? Parece com a magia deles… mas o que eles fariam nessa terra? 

    Dúvida paira em suas pupilas, atrelada a um sentimento de curiosidade. Eu devia sair, mas… será que eles me ajudariam? Eles me devem… não é?

    Ela salta do galho para o chão, aterrissando com delicadeza. Já que não sobrou ninguém disposto. Acho que não faz mal pedir.

    A raposa aproxima-se com cautela e lentamente, sentindo a intensidade da magia sombria crescer a cada passo. Às vezes, ela escuta uma voz grave adiante, junto do som de uma luta feroz. 

    Quando está muito próxima, ela ouve outro crocitar. O estalo agudo perfura seus ouvidos, como garras arranhando por dentro da cabeça. Ela para, fecha os olhos e abafa as orelhas, sentindo um incômodo terrível.

    “É claro que você tinha que gritar!”, resmunga o dono da voz grave e sombria.

    Ninguém nessa floresta deve gostar das aves de sentido, ela pensa, atordoada.

    Quando se recupera, o cheiro acre de carne e penas queimadas penetra em suas narinas.

    Que estranho, ela pensa.

    A raposa volta a avançar e, cautelosamente, adentra em um arbusto que a encobre completamente. 

    Dali, avista uma ave cinzenta debatendo-se, uma espada cravada no peito. A lâmina está na mão de um colosso de pele sombria, riscada por linhas incandescentes e asas de morcego.

    Além de manter a arma cravada, com a outra mão, ele trava a cabeça do pássaro. Uma fina fumaça branca escapa entre os dois.

    A raposa franze o olhar, cética. Aquilo… não parece muito um elfo, ela constata. 

    Com um aperto, o colosso esmaga o crânio entre seus dedos, finalizando a ave. 

    Por que… tem mais gente com magia sombria aqui?, ela se pergunta, curiosa.


    Arte por:@AyatoYun

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