Índice de Capítulo

    O acampamento volta a ficar quieto nas sombras da floresta, acompanhado do farfalhar das folhas causadas pela brisa, junto ao som dos animais distantes na mata. 

    A demônio, de pé, na borda do acampamento, olha para as barracas e para os três bandidos feridos, cujos pertences estão jogados ao chão e manchas de sangue estão espalhadas por suas roupas escuras.

    Até que não ficou tão ruim, ela pensa com animosidade. Melhor isso do que ter que saquear de pedaços de carne espalhados no chão. 

    Em seguida, corre até um arbusto fora do acampamento e retira sua mochila do meio dele. Hora de ver o que eles têm de útil para mim, Rubi decide, empolgada, se encaminhando de volta. Vou começar por esses três. E pelo que ouvi do papo deles, tem gente amarrada nas barracas. 

    A demônio se dirige ao homem mais alto, caído próximo ao tronco. Esse aqui ficou bem mal, ela infere, vendo a grande mancha vermelha destacada no peito de seu traje escuro como a noite. Acho que resistência mágica não era o forte desse. E olha que eu tentei não ser letal.

    Ela suspira fundo, se abaixa e, das mãos dele, toma a rapieira que segura. Seu metal é um pouco fosco, mas não aparenta nenhuma trinca na lâmina. Não é lá essas coisas, ela analisa. Mas posso evitar quebrar a outra adaga que a Arielle me deu à toa. Ela embainha a arma e a prende em seu cinto. Depois, retira a bainha com a adaga que ela leva na cintura e a guarda em sua mochila. 

    Rubi vasculha o homem, tateando-o pela roupa, começando pelas pernas e subindo. Quando chega na região da ferida, nota algo estranho. Apesar de sentir o buraco da flecha na pele do homem, os tecidos escuros que o cobrem, estão intactos. 

    Isso não devia estar rasgado? Esse tecido deve ser mágico ou pelo menos encantado, ela imagina. Foi como contra a magia do Edric. Senti minha pele queimar, mas minha roupa ficou intacta. Então, coisas mágicas meio que cedem por um momento, depois voltam ao normal. Isso é interessante… 

    Ela continua o seque e no último bolso encontra uma pequena sacola com algumas moedas prateadas dentro. Dinheiro…, ela pensa, com desânimo. Como eu vou gastar dinheiro?! Onde eu vou achar uma loja que aceite demônios como clientes?

    Mesmo assim, Rubi pega o dinheiro, se levanta, olha para suas luvas sujas com terra e um pouco de sangue e depois para a mulher e o homem pálido. E ainda tem tanta coisa pra revistar…, ela lamenta suspirando. Seria mais fácil se os corpos deles sumissem no ar e ficassem só os itens no chão.

    Rubi se encaminha até a mulher e começa a vasculhar entre suas coisas. O primeiro objeto que lhe chama atenção é a espada curvada no chão. Aquela coisa é estranha, e acho que não sei usar aquilo direito, ela analisa. Talvez eu conseguisse vender… mas quem compraria de mim?! Melhor deixar lá

    Depois começa a tatear pelo corpo da mulher e logo confirma que as roupas dela são do mesmo tecido mágico do primeiro homem e que, mesmo com grandes ferimentos no ombro, sua roupa ainda está intacta. Igual ao outro, nenhuma marca rasgada, só as feridas, ela pontua, e também percebe que a mulher é bem mais firme e rígida do que o homem mais alto. Até que você aguentou bastante.

    Dentre os bolsos, Rubi encontra outra sacola com dinheiro. No pescoço da mulher, escondido sob as roupas, ela vê algo que claramente se destoa do visual sombrio, um colar com um pingente dourado em formato esférico.

    Os olhos amarelos da demônio brilham ao avistar a joia. Isso é lindo! ela pensa, erguendo o colar contra a luz com as duas mãos, admirando-o.

    Sem hesitar, Rubi coloca o colar delicadamente em seu próprio pescoço. “Desculpe, amiga, mas acho que você não vai mais precisar disso”, ela diz, observando a mulher caída.

    Por último, ela vai até Haldir e, assim como anteriormente, vasculha entre seus trajes. Rubi acha mais um saco de moedas e escondido na cintura, vê um canivete afiado. Esse não tinha muita coisa, ela pensa. Pra não dizer que não tinha nada.

    “Você tem que melhorar esse loot aí, colega”, ela adverte ao elfo inconsciente. “E se eu fosse um demônio vingativo que se irritasse quando não encontrasse nada? Se eu conseguir falar com você de novo, vamos ter que falar sobre isso aí.”

    Aliás, o que outro demônio faria no meu lugar? Sei lá, comeria eles?, Rubi se questiona, enquanto encara o homem à frente, ponderando, mas logo a ideia de se imaginar comendo uma pessoa lhe dá náuseas. Prefiro acreditar que isso é só lenda. É melhor eu ir logo verificar as barracas.

    A demônio vai até uma das tendas e, quando entra, vê que a barraca de tecido escuro é iluminada por um lampião. O chão é forrado com um tecido semelhante a um tapete, e sobre ele há três colchonetes simples e duas mochilas de couro escuro. Logo ela nota que a luz do interior da barraca não é visível do lado de fora.

    Esses caras são muito bons em se esconder, ein?, ela pensa, impressionada.

    A demônio começa a olhar na primeira mochila e percebe como ela é leve e a que a cor se mistura bastante ao traje dos bandidos. Dentro da mochila encontra um cantil de água, outro canivete, corda e comida seca. Só coisas de um acampamento normal, ela pontua. Eles falaram de uma base, devem deixar as coisas de valor lá. 

    Ela abre a mochila restante e encontra quase os mesmos itens da mochila anterior, porém, nesta há um mapa, o que chama bastante a atenção de Rubi. Isso sim tem valor, ela pensa, já retirando o papel para examinar.

    No mapa está representada a região entre três cidades, sendo elas Brevisherva, Arbor e Campes. Também estão indicadas as rotas principais que saem de cada uma delas, além de outros pontos de referência na região, como bosques e colinas. Rubi vê que há pontos circulados em tinta escura em algumas estradas e uma grande área circulada em vermelho em algum lugar ao bem norte do acampamento.

    Tem uma marca que passa por esse bosque, as outras devem ser os lugares onde estiveram, ela analisa, mas a região destacada grita por sua atenção. E essa marca vermelha? Será que é a base onde guardam as coisas de valor? 

    Rubi enrola o mapa e guarda-o, com bastante cuidado, em sua própria mochila, como se ele fosse um tesouro precioso. 

    Ela sai da primeira barraca e vai em direção à segunda. Deve ser nessa que estão as pessoas sequestradas, ela deduz, parada na entrada, hesitando um pouco em prosseguir. Provavelmente vão ficar com medo de mim, mas… não tem problema. 

    Ao adentrar, vê que, além de alguns sacos amarrados e jogados pela barraca, estão dois homens amarrados e amordaçados sentados no chão.

    Um é humano, jovem de cabelos castanhos, amarrado com uma corda nas mãos e nas pernas. O outro é um anão de barba escura, que está bem mais atado do que o humano, com suas amarras o deixando praticamente imóvel e uma mordaça que tampa completamente sua boca.

    Ao ver aquela figura de chifres e cabelo rosa entrar, o jovem fica assustado, tenta gritar, mas a venda em sua boca abafa completamente o som. O anão logo franze a testa, esboçando uma expressão de raiva, e, mesmo amordaçado, rosna para Rubi.

    O desânimo novamente atinge a demônio. Tinha que ser um anão, né?, ela se questiona, indignada. Tô tentando ser uma boa garota… demônio aqui. Mas se ele cuspir em mim igual ao outro, isso não vai acabar bem.

    Rubi coloca sua mochila no chão, pega um dos canivetes, retira seu casaco das costas e deixa-o sobre a mochila. Sem seu manto, sua cauda fica livre e começa a balançar lentamente.

    Já vou até assumir que o charme não vai funcionar com o anão, ela pontua, depois, segue até o rapaz de cabelos castanhos com o canivete em mãos. 

    A cada ação que a demônio executa, o jovem treme e quando ela se volta em sua direção, ele entra em desespero. 

    Ver o estado do jovem a deixa Rubi cética, quanto como prosseguir. Será que, com ele assustado assim, o charme vai funcionar? O cara lá fora estava com tanto medo quanto esse aqui e falhou, ela pondera. Mas quem sabe se eu não tentar uma outra abordagem?

    Ela se abaixa, dobrando seus joelhos no chão, deixando seus olhos no mesmo nível do jovem. “Olá”, diz ela, mostrando seu sorriso, cheio de dentes afiados. “Ouviu as coisas lá fora?”

    “Uhum”, ele responde, acenando com a cabeça e com a voz abafada.

    “Esse anão aqui é seu amigo?”

    “Uhum. Uhum.”

    O outro prisioneiro começa a emitir grunhidos abafados e pesados através da mordaça, olhando em direção ao jovem, como se estivesse advertindo-o sobre algo.

    Que carinha chato, ela pensa, um pouco incomodada, e dá um peteleco com sua cauda na testa franzida do anão, que sem equilíbrio, tomba para trás. 

    “Você fique quietinho”, ela adverte. 

    O anão, tombado, esbraveja furioso, debatendo-se no chão enquanto tenta se recompor. Rubi, achando a cena hilária, não consegue conter uma risadinha baixa, divertindo-se com a sua frustração. 

    Enquanto o anão continua em sua luta, a demônio se volta para o jovem. “Então… acabei com aqueles três lá fora e ainda estou decidindo quem por aqui é mais valoroso, vivo ou não tão vivo assim”, ela fala, em um tom calmo e intimidante. 

    O rapaz, assustado, ouve cada palavra atento, sentindo que sua vida depende delas. A forma como a criatura de chifres o encara com seus olhos amarelados enquanto balança sua cauda o faz sentir-se como um rato encurralado por uma leoa.

    “Pra mim, o seu amiguinho ali não gosta muito de mim, não parece que ele vai querer falar comigo. Então, depende de você. Você vai colaborar comigo, não vai?”

    Vamos ver se isso deixa ele mais receptivo, a demônio idealiza.

    O jovem fixa o olhar nos olhos de Rubi, sentindo a tensão a ponto de paralisar-se. O suor escorre pela sua testa enquanto ele acena com a cabeça de forma fervorosa, concordando com os termos dela.

    Excelente, a demônio pensa, seus olhos brilham em um tom rosa e, em seguida, os do homem também ficam no mesmo tom. Os músculos e os ombros dele relaxam, e sua respiração fica tranquila.

    Rubi sorri, satisfeita ao ver o efeito imediato de seu charme. “Assim está bem melhor”, ela murmura com um toque de diversão nos lábios.

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