Capítulo 33 - O próximo passo
O anão, depois de muito se debater no chão, consegue voltar a se sentar. Quando o faz, fica atônito ao ver seu amigo com os olhos brilhando, encantado e hipnotizado, olhando para a demônio sem piscar.
“E você, é melhor ficar quietinho”, alerta a demônio, sem se desviar do rapaz. “E seu amigo vai ficar bem.”
Sem nenhuma opção, o anão respira fundo, permitindo que o ar passe pela mordaça que o impede de falar, e desiste de resistir, permanecendo em silêncio e encarando os dois com desgosto.
A visão do rapaz nesse estado deixa Rubi animada e esboçando um sorriso carregado de malícia. Esse sentimento… é diferente. Sinto que poderia fazer qualquer coisa com ele ou tirar dele o que eu quiser. Fácil como abrir o armário e pegar um biscoito, pondera, sentindo-se tentada por aquela sensação. Que tal se eu for logo para…
Lentamente, começa a erguer uma das mãos na direção dele, mas antes de tocá-lo, contrai os dedos, para o movimento, e respira fundo. Melhor não agora. Talvez eu tenha… me deixado levar um pouco, ela constata, calma, recuando a mão. É como da outra vez com o Zorvax. Depois de acertar o charme, fico um pouco… empolgada. Como se ele virasse uma presa pronta para a refeição…
O Bofur fica intrigado vendo o comportamento estranho da demônio de cabelo rosa. Internamente, questiona-se várias vezes o que ela planeja, sem conseguir compreender o intuito daquelas ações.
Pelo que as meninas me falaram das succubus, elas vão atrás de homens para comer a alma e drenar a energia deles, Rubi relembra. Eu até quero experimentar qual é a sensação do dreno… mas se eu fizer agora, ele provavelmente não vai conseguir falar nada depois. E, animada daquele jeito, eu ia acabar matando ele. Ela suspira, frustrada.
A demônio olha para o anão confuso, depois volta a encarar o rapaz estático. Os bandidos, tudo bem, mas matar esses caras aqui, não é algo que eu quero fazer, ela lamenta, cabisbaixa. Esse negócio de ser demônio podia vir com um manual. Depois eu resolvo o dreno. Vamos para a parte importante, as perguntas.
Rubi avança com o canivete em direção ao rosto do homem, enquanto o anão solta outro brado de preocupação. “Calma!”, ela repreende, lançando-lhe um olhar impaciente. “Você se estressa por qualquer coisa.” Com um movimento ágil e preciso, ela corta a mordaça do homem.
O jovem, com a boca finalmente livre, inspira profundamente, deixando escapar um suspiro de alívio enquanto seu corpo relaxa visivelmente.
“Pode conversar normalmente”, Rubi fala.
“O… obrigado, moça diaba”, ele agradece, genuinamente, com sua voz ofegante.
“Quem são vocês? E como foram capturados?”
“Eu sou… Couby. Aquele é o Bofur. Somos guardas, viemos patrulhar atrás desses bandidos e caímos em uma armadilha.”
Rubi esboça um sorriso irônico. “Ah, é? Pelo visto, vocês já estavam em uns maus bucados”, ela comenta, encarando o anão.
Bofur sente-se acanhado e completamente impotente. Seu olhar franzido assume um semblante derrotado.
“Foi culpa minha, Bofur”, diz Couby, envergonhado. “Me descuidei…”
O anão olha para seu amigo com muita pena. Sua expressão reflete uma mistura de preocupação e culpa.
Esses caras… não são pessoas ruins. Só deram azar de topar com esses bandidos, Rubi pensa, um pouco compadecida. Ao menos deram sorte de me encontrar… mais ou menos.
“Voltando aos negócios. Tem muita coisa por aqui, sabem o que tem nessa barraca? E como eles pretendiam carregar vocês e tantas coisas?”
Couby indica um dos sacos com o rosto. “Ali estão nossas armaduras e armas”, ele fala, depois aponta para os outros. “Vi a mulher pegar comida seca daqueles. Não sei como iam nos levar. Nossa charrete e nosso cavalo foram levados para alguma outra clareira.”
Devem ter uma carroça e cavalos escondidos em algum lugar do bosque. Essas coisas iam deixar o acampamento bem mais exposto, a demônio supõe.
Rubi revira as sacolas rapidamente, confirmando as informações de Couby. No entanto, nada chama sua atenção. Sem interesse em levar qualquer coisa, ela decide deixar tudo como está. Chuto que deixaram por aqui só o essencial e as coisas de valor na outra barraca, ela imagina. Talvez não tenha mais coisas para saquear por aqui.
“Sabem para onde iriam levar vocês?”
“Acho que… talvez…”, Couby começa a responder incerto, tentando se lembrar. “Falaram de alguma colina a um dia de viagem depois do bosque. Não sei se ajuda.”
Eu vou pra aqueles lados mesmo, então, vale a pena ficar de olho, Rubi avalia. Ao final, não vou precisar falar com o elfo. Achei que fosse ter que usar a única poção de cura que tenho para poder conversar com ele. Por falar nele…
“Enfim, aquele elfo lá fora me chamou de algo interessante. O que é esse tal Último do Oeste? Foi uma ofensa?”
“Não, dona diaba, ele é um demônio. O último que ficou por essas bandas, o único que não foi para o leste. Dizem que ele tomou uma região perto de Arbor e ataca quem se aproxima. Mas ouvi dizer que ele apareceu em Gramina há umas semanas.”
Espera, eu era o demônio em Gramina. Mas eu nunca estive em Arbor. Então, deve ser um demônio diferente, Rubi presume, estranhamente animada com a descoberta. Algo mais lhe passa pela cabeça, e ela vai até sua mochila, retirando o mapa que pegou dos bandidos.
Ela o desdobra na frente de Couby. “Seria mais ou menos por aqui?”, ela pergunta, indicando o local circulado em vermelho.
“Sim!’, responde Couby, com convicção. “É esse lugar aí mesmo.”
Já sei aonde vou em seguida, Rubi decide, contente. Vamos ver se consigo conversar com esse compatriota demônio. Ele pode me odiar, mas é minha melhor chance de aprender mais sobre minha própria raça. E o melhor de tudo, ele está sozinho, sem uma gangue de demônios pra tentar me matar.
Ela afaga a cabeça de Couby com um leve sorriso. “Bom trabalho, Couby”, elogia, satisfeita.
O jovem sorri, radiante com o reconhecimento, seus olhos brilham com alívio e gratidão.
Bem, acho que já tirei o que precisava dele. Não tenho mais perguntas, e o anão não me interessa…, pondera Rubi, lançando mais um olhar para Couby, ainda sob o efeito do encanto. Uma ideia atravessa-lhe a mente. Seria um desperdício sair daqui sem ao menos tentar usar o dreno de energia nele, não seria? Nunca se sabe quando terei a oportunidade de encantar alguém de novo… e dificilmente alguém seria voluntário para isso.
Rubi se abaixa diante de Couby, deslizando a mão suavemente pela bochecha dele. O jovem parece satisfeito, quase enlevado, ao sentir o toque macio da succubus.
Se eu não exagerar, não deve ser um problema, certo? ela se pergunta, intrigada pela curiosidade.
Bofur, desconfiado, solta um som baixo e grave, quase um rosnado.
“Calma”, ela responde, sem tirar os olhos de Couby. “Não vou machucá-lo.”
Eu acho…, completa em pensamento, incerta do que poderia acontecer.
Os dedos de Rubi começam a brilhar com um tom vermelho onde tocam o humano, e uma energia azul começa a emanar das bochechas de Couby, sendo absorvida pelos dedos da demônio. No momento em que a energia começa a fluir para dentro dela, Rubi sente uma onda quente e revigorante se espalhando pelo seu corpo, uma sensação nova e inesperadamente agradável que ela saboreia por um momento.
O anão, em desespero para ajudar o amigo, luta freneticamente contra as amarras, soltando grunhidos abafados pela mordaça. Apesar de suas tentativas parecerem inúteis, ele não desiste, forçando-se contra as cordas com todas as suas forças.
Depois de alguns segundos, Couby começa a exibir uma expressão de desconforto, sentindo-se um pouco tonto e com um leve incômodo onde a demônio o toca. Rubi percebe alguns gemidos de dor escapando dele e tira, quase relutantemente, a mão do rapaz.
Ela observa Couby atentamente, notando a confusão em seu olhar, mas os olhos ainda rosados indicam que o charme permanece. Acho que mais um pouco e ele sairia do charme, ela constata, aliviada. Até que… foi bom. Eu poderia me acostumar com isso.
Senti toda a mana que gastei lá fora ser recuperada. Talvez… Couby aguentasse um pouco mais…, Rubi pondera, novamente com seu olhar malicioso em cima do rapaz.
Ao fundo, Bofur continua a rosnar com fervor, lutando para romper as cordas que prendem seus braços e pernas.
“Já parei! Já parei!”, Rubi avisa, levantando as mãos em sinal de rendição, o rosto levemente corado de embaraço. “Ele está bem, então relaxa! Não precisa desse drama todo.”
Ela olha novamente para Couby e percebe como ele está pálido, ofegante e visivelmente exausto. E foi só o Drenar Energia básico. Se eu tivesse usado a versão de nível alto, com certeza ele teria morrido, ela reflete.
“Já consegui tudo o que queria”, ela diz, logo se levantando, indo até onde estão suas coisas. “Hora de ir embora.”
Bofur, desconfiado, mantém seu olhar fixo nela, franzindo a testa enquanto Rubi pega seu casaco e a mochila.
Em seguida, ela se aproxima de Couby e corta as cordas que o mantinham preso. Mesmo livre, ele permanece atordoado, sem forças para se levantar. Rubi coloca o canivete nas mãos do jovem. “Quando eu sair, conte até mil, depois vá lá fora e cuide do que sobrou dos bandidos. Garanta que não haja mais problemas”, ordena, com um ar distante. “Pode dar o fim que quiser, não me importo.”
Couby, mesmo aéreo, concorda, acenando a cabeça.
“E agora, sobre o Bofur… o que devo pedir?”, diz Rubi em um tom bastante dissimulado, um sorriso digno de um verdadeiro demônio.
O anão arregala os olhos, o suor escorrendo pela testa.
“Brincadeira”, ela ri suavemente, divertindo-se com o desconforto dele. “Depois que terminar com o bandido, corte a mordaça do anão, dê água e comida. Mas não faça nada que ele pedir. Amanhã de manhã, pode cortar as cordas.”
Couby concorda mais uma vez, sem dizer nada, enquanto Bofur finalmente relaxa, embora ainda confuso.
Só pra garantir que ninguém vai ter coragem de me seguir, ela pensa, satisfeita.
“Até mais, garotos”, despede-se Rubi, saindo da tenda e deixando o anão cheio de dúvidas.
Do lado de fora, ela escuta Couby começar a contagem, lenta e hesitante. Sem olhar para trás, Rubi se embrenha na floresta, desaparecendo entre as árvores e deixando o acampamento para trás.
Enquanto caminha entre as sombras, ela mostra-se pensativa. Foi… uma boa experiência. O charme é muito útil, mas depender dele para fazer as coisas é um pouco restritivo. Entendi o que a Helga falava sobre depender de magia, a demônio divaga.
E se as outras succubus sentem aquilo toda vez que drenam a energia de alguém, agora… as entendo um pouco melhor. Até diria que vale a pena o risco que elas correm. Um sentimento curioso se aflora nela. Como que eu pego uma alma? Será que é com o tal pacto demoníaco? E por que eu iria querer uma? … Será que o gosto é bom?
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