Capítulo 51 - Problemas nas Terras Livres
Do lado de fora do acampamento, é possível ver a entrada do acampamento se abrindo. A pesada porta, feita de troncos de árvore, range ao ser arrastada pelo chão, ranger esse que é acompanhado dos urros dos três orcs que, internamente, fazem esforço para movê-la.
Quando ela para de se mover, aqueles três ainda permanecem segurando-a pelas alças, aguardando a passagem de seu líder.
Os orcs trocam olhares apreensivos, perante a saída de Brok. “Vai mesmo sozinho?”, um deles pergunta.
Com o olhar fixo na floresta adiante, Brok exibe uma expressão determinada. “Não… vou longe”, o chefe responde. “Preciso checar algo.” Ele deixa o acampamento rumo à mata quieta, seguido pelo rilhar da porta atrás dele novamente sendo selada.
O guerreiro verde, com o machado em mãos, segue em linha reta, desviando-se apenas para contornar as árvores e suas raízes, sem um destino claro. Seus olhos vasculham os arredores com cautela, mas, embora não encontre vestígios de ninguém, a sensação de estar sob vigilância, que o vem corroendo, se intensifica.
Por mais que esse sentimento seja incômodo a ele, Brok sabe que isso é um sinal de que aqueles que ele procura estão mais próximos. E seus instintos não falham, não demora muito e ele avista, sentados sobre um tronco caído à frente, as duas figuras de chifres e cauda inconfundíveis, Byron e Rubi, o aguardando.
Rubi mostra-se contente ao ver Brok. “Até que foi rápido”, diz ela, com entusiasmo.
Byron está com um semblante curioso, ao mesmo tempo que analisa o ambiente ao seu redor. “Este lugar realmente é… calmo”, ele comenta, surpreso. “Ainda não encontrou nenhum monstro pela região?”
Rubi fecha os olhos por um momento, concentrando-se. “Nadinha”, ela responde. “E um dos corvos já até passou pelo riacho.”
“Impressionante”, o diabo comenta. “Mesmo aqui ainda sendo tecnicamente território da borda da floresta, não esperava que pudesse ser tão… tão…”
“Normal?”, acrescenta a diaba.
“De fato.”
Conforme o orc se aproxima dos demônios, ele vê, aos pés de Byron, o corpo de uma garra-branca sem cabeça.
“Essa é a mesma que…”, ele começa a questionar.
“Sim”, o diabo responde, já antecipando a pergunta. “A mesma que iria te matar. A senhorita Rubi pediu para trazer.”
O orc olha para o corpo sem cabeça por um longo momento, sua testa franzindo enquanto absorve a informação. Então, ele volta sua atenção até a demônio de cabelo rosa. “Por quê?”, ele pergunta, sem entender.
“Seria um desperdício deixá-la lá, não?”, ela questiona. “E vocês podem tirar mais proveito dela do que a gente.”
“Eu… aceito”, diz Brok, curvando a cabeça. “Elas não são muito comuns por aqui…”
“Brok, se me permite perguntar…”, diz Byron, curioso. “Pelo que a senhorita Rubi me informou, você é o líder daquela tribo?”
“Eu consegui ver que o pessoal lá te respeita bastante”, Rubi comenta, gentilmente.
O orc mostra-se inicialmente receoso, e, antes de responder, solta uma respiração pesada. “Eu sou o chefe dos Crek’Thra”, ele fala com a última palavra soando seca, quase como um outro idioma. “Mas eu não assumi com um duelo.”
Ele ser o líder facilita bastante as coisas pra gente. E esse nome de tribo combina bem com o dele, Rubi analisa, contente. Porém, a última parte a deixa um pouco confusa. Mas…
“O que você quer dizer com duelo?”, ela questiona.
“Orcs normalmente trocam a liderança com um duelo”, Byron responde. “É quase como um rito de passagem.” Depois, ele volta seu olhar ao orc. “Mas você não teve como fazer isso.”
Brok abaixa a cabeça, seu semblante endurecido pela lembrança. “Nosso chefe morreu em um duelo por nossa terra antiga”, diz ele, com sua voz grave. “Tivemos que vir para cá depois disso.”
Byron observa em silêncio por um instante antes de retomar o foco. “Se não me engano, mais cedo, você afirmou que aquela outra tribo expulsou as outras do centro”, comenta o diabo. “Estou correto?”
O orc confirma, acenando com a cabeça. “Só há uma tribo por lá agora”, ele afirma.
Já to vendo o problema da coisa…, pensa a demônio de cabelos rosa, com uma pontada de receio, enquanto antecipa as complicações que podem surgir.
“Se tem menos tribos no centro…”, diz Byron, refletindo. “Há menos orcs segurando monstros por lá.”
“Deve ser por isso que tinha tantas dessas coisas longe do centro”, Rubi conclui. “O Estoracola não consegue segurá-las.”
Brok bufa pesadamente. “Por mais que odeie ele, Estoratora e sua tribo são fortes. Conquistaram a terra que têm em duelos”, diz ele, contradizendo-os em relutância. “Lidar com as garras-brancas… não devia ser problema para ele e o dragão.”
“Aos olhos dos orcs, isso pode parecer uma demonstração de poder”, comenta Byron, em um tom analítico, quase como um professor. “Contudo, aos meus olhos, isso está mais para um simples feito de força do que para uma estratégia bem planejada.”
“E o que isso quer dizer?”, Brok questiona, não compreendendo o ponto de Byron.
Rubi cruza os braços, com uma expressão séria. “Não importa o quão forte você seja, nunca se pode subestimar os números dos seus inimigos”, ela explica. “Também não se pode mudar algo que já funciona de um jeito há muito tempo sem estar preparado para as consequências.”
“Foi assim que o senhor do abismo encontrou sua ruína”, Byron acrescenta, concordando.
Brok se espanta com a análise profunda dos diabos. “Nunca… pensei assim”, diz ele, estupefato.
“É só analisar um pouco. Se fosse você no lugar do Estora…tora, faria a mesma coisa que ele?”, questiona a demônio de cabelos rosa, olhando profundamente nos olhos do orc.
O orc fica introspectivo, refletindo. “Olhando agora, se eu tivesse força como a dele…”, ele responde. “Eu tomaria os melhores pontos para mim, mas não mandaria as outras tribos embora.”
“Viu só?”, Rubi pontua.
“Com uma boa análise, não é difícil ver que foi uma decisão ruim”, Byron comenta, em um tom severo.
“Não deveriam ter garras-brancas tão perto do rio…”, Brok acrescenta, pensativo. “Não agora.”
O diabo se levanta e dá um passo na direção do orc. “O que houve com os monstros que normalmente estariam por aqui?”, ele pergunta.
“Aqui vivem cães de terra. Nessa época, os cães fortes aqui são poucos. Nós caçamos os que viviam nesse pedaço e os outros dessa terra ainda não vêm tão longe para caçar.”
Byron fica alguns segundos quieto, refletindo sobre aquela informação. “Senhorita Rubi, isso corrobora exatamente o que você mencionou”, ele diz, com um toque de admiração ao finalizar sua análise.
Brok se volta a demônio. “Como assim?”, ele questiona.
“Deixa eu adivinhar”, começa Rubi, com um sorriso confiante. “Em algum momento, os cães de terra voltam a ficar mais fortes e numerosos, e começam a caçar por aqui novamente. Então, vocês se mudam para outro lugar mais calmo. Ou, se algum outro monstro, como as garras-brancas, começar a sair de seu território e invadir o de vocês com muita frequência, vocês também se mudam, não é?”
Brok hesita por um momento antes de assentir. “…Sim”, responde ele. “Como sabe disso?”
Bingo!, Rubi pensa, satisfeita.
“O problema daqui vai muito além do que a invasão das garras-brancas”, o diabo acrescenta.
Brok fica preocupado com aquela afirmação e começa a ligar os pontos. “Isso tem a ver com o plano de vocês?”, o orc pergunta.
Rubi exibe um olhar seguro. “Eu vou te contar uma história sobre o mundo de onde eu vim, e você vai entender o real problema das Terras Livres”, diz ela, com a voz firme.

Mais uma vez, quero agradecer a todos pelo apoio. Essa imagem ai, seria uma das capas que foi cogitada para a novel. Não pretendo trocar de capa por enquanto, mas segue essa que eu também acho bem legal.
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