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    O orc fica atônito com aquelas palavras. “O mundo?”, ele questiona, tentando compreender se elas carregam um significado literal.

    Por um momento, o silêncio envolve aquele trecho da floresta como um manto, interrompido apenas pelo farfalhar suave das folhas. O sol, que se encaminha para o anoitecer, ilumina os três com sua luz de cor laranja penetrando por entre as árvores no formato de feixes.

    Byron, perante o assunto, assume uma postura firme. “A senhorita Rubi, não é natural daqui”, ele confirma, usando um tom de reverência sutil em sua voz. “O que ele está prestes a lhe contar, é o conhecimento de outro mundo, e é melhor que se mantenha entre nós.” Enquanto adverte, o diabo olha para o orc com uma rigidez palpável.

    Brok compreende a seriedade daquilo. “…Entendo” diz ele, abaixando a cabeça, depois volta a atenção para Rubi. “Como era lá?”

    “Bem, lá não era tão diferente daqui… em alguns aspectos”, ela começa, enquanto os olhos de Brok brilham de curiosidade. “Era um mundo grande e tinham vários lugares pra se aventurar e caçar. O objetivo de todo mundo era ficar forte pra poder explorar e dominar o que quisesse.” Durante sua fala, um ar nostálgico resvala em sua voz. 

    “Havia seres muito poderosos?”, o orc pergunta, fascinado. 

    “Sim”, a demônio responde. 

    Byron, mantendo seu tom firme, deixa escapar um leve sorriso. “Aparentemente, a maioria desses seres poderosos eram diabos”, o diabo acrescenta. “Um detalhe que eu achei interessante.”

    Tinha outras raças jogáveis também, mas tinha que ter pelo menos um personagem de nível alto pra desbloquear, ela reflete. Era muito trabalhoso recomeçar do zero num personagem novo, mas, vendo o que aconteceu comigo, talvez eu tivesse evitado uma penca de problemas se eu fosse de alguma outra raça.

    O orc momentaneamente sente um calafrio percorrendo sua espinha. “Um mundo cheio de diabos…”, ele divaga. “Havia orcs também?”

    Rubi se vê pega de surpresa pela pergunta e mostra-se hesitante. “… É. Tinham alguns”, ela responde, um pouco evasiva.

    Orc não era uma raça jogável e os que tinham pelo mapa eram, na maioria, só mobs de nível baixo, ela relembra. Não é como se tivessem orcs fortes por lá.

    “Enfim, voltando a parte importante”, Rubi continua, rapidamente mudando o assunto. “Tinha uma cidade chamada Loren que ficava no continente principal. Ao redor dela havia vários lugares de nascimento de monstros, animais grandes e masmorras ao redor dela.” 

    “Dado o objetivo daquele mundo, na teoria, ela deveria ser um bom lugar para caçar”, Byron pontua. “Mas, na prática, aparentemente não foi assim.”

    “Qual era o problema?”, Brok pergunta.

    “A localização. Pra começar, ela ficava bem afastada do centro do continente, levava muito tempo para chegar lá. E, além disso, no trajeto dela, já havia criaturas e desafios de nível bem mais alto que os da cidade de Loren. Então, quem não tinha força para passar por esses lugares, não chegava na cidade e quem já era forte, não tinha motivos para ir até lá.”

    “Se me permite dizer, num mundo onde todos correm para ficar mais fortes, aos meus olhos, essa cidade era efetivamente inútil”, Byron pontua. “Ir até lá seria um desperdício de recursos e tempo.”

    Brok reflete por alguns segundos. “A cidade ficou abandonada”, ele conclui.

    “Sim. Ninguém ia lá, pelo menos por um bom tempo”, Rubi continua. “Por algum motivo, um grupo de diabos de nível relativamente alto quis ir até Loren, e quando eles chegaram muito perto, eles morr… foram derrotados, e tiveram que voltar pra cidade mais próxima. Lá anunciaram pra todo mundo que Loren estava inacessível porque tinha muitos monstros fortes ao redor de lá.”

    “Esses diabos eram fracos?”, o orc pergunta.

    “Até que não”, Rubi responde. “Eles conseguiram passar no caminho até lá sem problemas, então, as criaturas de Loren não deveriam ter tido esse problema. Outros jogad… diabos, duvidaram deles, foram lá ver e também foram derrotados. Além de ter muitas feras, eles estavam bem mais fortes do que deviam.”

    O orc estranha algo naquela história. “Isso parece…”, ele comenta, analisando.

    Byron, ao ver a reação de Brok, esboça um leve riso, carregado de confiança. “Soa bastante familiar, não é?”, infere ele.

    “E não é só isso”, diz Rubi. “Eles juntaram alguns grupos para tentar limpar o local e até conseguiram fazer isso de um lado e liberar o acesso até a cidade, mas em pouco tempo o número de criaturas voltou a crescer e a cidade ficou inacessível para aquelas pessoas de novo.”

    Brok arregala os olhos, como se uma epifania o tivesse atingido. “Isso é exatamente como aqui!”, ele exclama, surpreso. Seu grito ecoa por entre os troncos até se dissipar floresta adentro.

    “Sim”, Rubi responde, casualmente. “Não importava de que lado aqueles grupos tentassem, o problema voltava. Acharam que tinha algum problema ali e começaram a discutir sobre o que estava acontecendo por lá.”

    A reclamação de que isso era um bug nos fóruns foi muita grande, ela pensa. 

    O orc fica com a cabeça baixa, receoso. “Se mesmo em um mundo de seres poderosos, uma cidade foi perdida…”, ele pondera, lamentando. “Então, aqui é mesmo uma terra condenada.”

    “Mas ainda não foi o fim da história”, o diabo afirma, renovando a esperança de Brok. 

    “No final, resolveram aquilo quando a notícia chegou aos ouvidos de alguns que tinham maior nível naquela época”, diz Rubi. “Dentre eles, eu estava junto.”

    “Quando me contou antes, eu fiquei com uma dúvida”, fala Byron. “Haviam muitos diabos poderosos com você?”

    A demônio de cabelo rosa, para um momento, divagando sobre aquela época. “Para aquele tempo, até que sim”, ela responde. “Um grupo com dez. Não havia muita gente daquele nível no continente. E pelo menos dois daquele grupo viraram Lordes, mais tarde.”

    “Impressionante”, Byron comenta.

    “Mas… qual o problema?”, Brok pergunta, afoito, sobre a resolução.

    Rubi volta sua atenção a ele. “Sim”, ela responde, com um sorriso. “No meu mundo, existia um efeito chamado Enxame. Ele acontece de vez em quando naturalmente em alguns terrenos específicos. Quando ele está ativo, o número e a força natural dos monstros e dos animais na área aumentam muito, assim como as chances de surgirem versões mais raras deles.”

    O orc escuta a explicação atentamente. “Então… era isso o que acontecia…”, ele murmura, absorvendo a revelação com um misto de surpresa e compreensão.

    “Não era só esse o problema de Loren”, Rubi infere. “De novo, a localização da cidade era o problema.”

    “Por quê?”, o orc indaga, percebendo que há ainda mais naquilo.

    “Ao que parece, esse efeito não chega a ser necessariamente tão problemático quando acontece em outros lugares”, o diabo pontua. “O caso dessa cidade foi algo excepcional.”

    “Sim. Ele é mais comum em masmorras”, Rubi acrescenta. “O problema de Loren é que havia muitos pontos de Enxame ao redor dela. E como ninguém ia lá para limpá-los, todos ficaram completamente infestados. E os grupos tentaram limpar o lugar primeiro, fizeram da maneira errada. Eles até conseguiram se livrar de uma parte da infestação, mas enquanto faziam o mesmo em outras partes, os lugares por onde passavam aos poucos ficavam infestados novamente. Ao final de tudo, ficava a mesma coisa.”

    Isso acontecia em questão de algumas horas. Mas era com respawns automáticos, ainda não sei como isso funciona na prática, com monstros de verdade tendo que se reproduzir, Rubi pensa. Mas, pelo que deu pra sacar, aqui acontece em questão de meses. Quase como temporadas de caça.

    “É como nós fazemos…”, diz orc, com o semblante pensativo. 

    Byron, próximo a Brok, caminha calmamente ao redor do orc, com as mãos nas costas. “E como resultado de séculos fazendo isso, os orcs das Terras-livres se adaptaram muito bem à essa floresta perigosa”, o diabo ressalta, contemplativo. “Um feito notável, mas olhando agora, não creio que venham bons resultados a vocês recentemente.” As palavras de Byron, entoam quase como uma provocação velada.

    O orc olha Rubi com uma expressão determinada, como se tivesse tomado uma decisão. “Você me diz que resolveu o problema na sua terra”, ele fala, com sua voz grave e firme. “Como fizeram?” 

    O silêncio natural da floresta volta a tomar conta do lugar. Rubi, sentada na raiz, mostra-se muito contente com a reação de Brok. “Nós matamos tudo”, ela responde, concisa e fria. “Fomos em cada bosque, planície, caverna e masmorra ao redor de Loren e não deixamos passar nada vivo. No meu mundo, existe uma palavra para o que fizemos lá naquele dia, Overkill.”

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