Capítulo 55 - Teste de Fogo
O orc subitamente abre os olhos, assustado, ao mesmo tempo em que inspira profundamente, preenchendo seus pulmões com ar. Seus sentidos estão retornando de forma desorientada, como se tudo estivesse se ativando de uma vez e de maneira aguçada, sobrecarregando-o com sinais que ele tem dificuldade para processar.
Aos poucos, as coisas começam a se estabilizar e ele já começa a sentir o chão frio úmido da floresta sob a palma de suas mãos e seus pés. A brisa refrescante sobre seu rosto.
Com a visão turva, ele pisca os olhos repetidas vezes, ainda um pouco aéreo, enquanto volta a ouvir o farfalhar de folhas da floresta junto a uma conversa abafada ao redor.
“Até que ele acordou rápido”, comenta a voz que ele identifica como sendo de Rubi.
“Não creio que ele tenha acordado completamente ainda”, responde outra voz que surge em sequência, que ele reconhece como sendo de Byron.
Ele vê uma imagem borrada de uma mão diante dele, que logo começa estalar os dedos. Em poucos segundos, ele recupera os sentidos.
A primeira coisa que ele percebe é que a mão diante dele, pertence a Byron e que logo atrás dele está a demônio de cabelo rosa.
Rubi se aproxima de Brok. “Como se sente?”, ela pergunta.
Antes de responder, o orc leva a mão ao peito, confirmando que aquela sensação estranha já não está mais lá. “O que… foi aquilo?”, ele pergunta, ofegante.
“Foi a conclusão do seu pacto”, Byron responde, estendendo a mão, em um gesto amigável, querendo ajudar o orc a se levantar. “Dado o que eu vi, não penso que qualquer orc teria sobrevivido ao processo.”
Brok, não perdendo tempo, segura a mão do diabo com firmeza e começa a se levantar.
Rubi observa, atentamente, o movimento do orc. Será que deu certo mesmo?, ela se questiona. Ele não parece diferente.
O diabo nota uma força considerável no aperto do orc, seus dedos apertados sob a pressão inesperada, que Brok faz aparentemente sem perceber. Byron acaba esboçando um sorriso, visivelmente satisfeito.
Inicialmente, Brok se demonstra um pouco sem destreza, ainda tonto, porém se ergue sem tombar.
“Você não estava nada bem antes. O que você sentiu?”, a demônio pergunta, olhando para Brok com curiosidade.
O orc reflete por alguns instantes. “Depois que eu aceitei… não vi mais nada. Me senti longe de tudo, até de…mim”, ele responde. “Meu corpo ficou frio como a noite e depois queimou como fogo.”
“Normalmente, o processo é um pouco mais rápido, e esses efeitos não teriam se estendido dessa forma. Talvez sua alma tenha ficado exposta por muito tempo”, Byron comenta, jogando um olhar discreto a Rubi, o que a deixa um pouco sem graça.
Acho que essa parte é culpa minha. Não pude evitar ficar admirando, a demônio pensa. Aquilo que eu peguei na mão parecia tão… precioso. E tive certeza de que era quando comi.
“Agora… já passou”, diz o orc, seguro. “Não sinto mais aquilo.”
Rubi não consegue deixar de olhar para Brok sem deixar de esboçar um leve sinal de intriga. Agora já era, né? Eu comi a alma dele. Seja lá para onde vão os orcs quando morrem, ele não vai ter isso, ela divaga, suspirando ao final. Só espero que isso valha tanto a pena para ele quanto valeu pra mim.
“Se sente diferente?”, ela pergunta, inclinando a cabeça ligeiramente. “Mais forte?”
Brok, antes de responder, olha para sua mão direita e aperta o punho, percebendo a tensão nos músculos renovados. “Me sinto… leve”, ele diz, flexionando um braço repetidas vezes.
“Isso é bom de ouvir”, Byron comenta. “Porém, creio que devemos isso à prova com um pequeno teste mais prático. Não concorda, Brok?” Ele aponta a mão com a palma virada para cima, em um gesto cortês, na direção do orc. Sua expressão carrega um sorriso interessado e suas palavras claramente buscam persuadir.
Brok não responde de imediato. Ele permanece quieto, encarando o próprio punho que se fecha com força, sentindo os músculos tensos, enquanto pondera sobre a oferta do diabo. “…Sim”, ele diz, finalmente, com sua voz grave e decidida.
Rubi percebe o sorriso preocupantemente perspicaz do diabo, e já fica apreensiva, compreendendo as implicações daquilo. Espera, eles vão lutar?, ela se pergunta. O Byron já quer tentar matá-lo de novo?
“Não precisam lutar”, diz ela, tentando acalmá-los. “Ele pode só tentar levantar uma pedra ou quebrar alguma coisa, não?”
O diabo olha para Rubi. “Eu concordo, senhorita Rubi. De fato, ele poderia. Porém, eu gostaria de testar em primeira mão a força que ele adquiriu”, ele responde, de forma diligente.
Brok, assim como Byron, se volta para a diaba, porém, não fala nada, apenas permanece quieto aguardando pela opinião dela.
Rubi se encontra encurralada pelos olhares daqueles dois. Não acho que tenha como eu convencê-los, ela pensa e dá um longo suspiro, derrotada. Mas confesso que também estou curiosa.
“Se vocês querem, eu não vou impedir”, ela diz, cedendo. Depois se afasta daqueles dois, dando espaço para que façam o teste. “Só não se matem à toa, certo?”, ela pede, sentando-se em uma das raízes para observar.
Até que uma pipoca ia bem agora, ela pensa. Quero ver o que o Byron vai aprontar.
Byron, em sequência, volta sua atenção ao orc. Ele ergue a mão esquerda com o dedo indicador levantado. “Um golpe de mãos limpas. Deve ser o bastante para mensurar as suas habilidades”, ele diz.
Perante os termos, Brok solta uma bufada de ar pelas narinas e consente silenciosamente, acenando com a cabeça. Com um movimento ágil, ele enfia o machado que segura no chão, deixando-o de mãos livres.
Byron esboça um olhar confiante enquanto uma chama surge em seu peito e rapidamente se alastra, encobrindo seu corpo por completo.
O orc, sem entender o propósito daquilo, observa a labareda se expandir e tomar a forma de um grande ser.
Brok arregala os olhos ao ver surgir das chamas um demônio vermelho alado, com quase o dobro da sua altura, ainda exibindo a mesma expressão confiante de Byron. Mesmo a alguns metros de distância, o calor emanado pelo diabo faz o chão úmido, sob seus pés, secar rapidamente, enquanto pequenas brasas caem de suas asas incandescentes, queimando algumas folhas ao redor.
O orc volta sua atenção para Rubi. “Então… essa é a verdadeira forma de vocês…”, ele comenta, impressionado.
A cauda da succubus se agita em um movimento brusco. “O quê?!” exclama ela, visivelmente surpresa. “Não, não! Só o Byron faz isso, é um poder de Behemoth. Eu sou sempre assim!”
O grande diabo dá um passo na direção do orc. “Quando você estiver pronto, pode começar”, ele diz, com sua voz grave e bastante sinistra aos ouvidos de Brok.
O orc se concentra por alguns instantes, afastando a mão direita e lentamente fechando seus dedos tensionados, sendo possível ouvir os estalos secos de suas juntas. Eu… posso, ele pensa, liberando uma última expiração pesada antes de correr com o punho erguido na direção do diabo.
Byron, antecipando o golpe, flexiona os joelhos e abre os braços, assumindo uma postura firme, preparando-se para absorver um golpe massivo.
Quando o orc fica muito próximo ao diabo ele salta, elevando-se para tentar golpear a cabeça. Agora, ao nível do diabo, encara-o bem nos olhos e desfere o soco com força.
O diabo se defende colocando a palma da mão esquerda à frente, tentando bloquear.
O impacto dos dois gera o som de um estalo seco e poderoso o bastante para ecoar entre as árvores ao redor.
Byron sente a pressão do golpe, brasas incandescentes escapam de suas asas, espalhando-se ao redor dos dois. Seu corpo treme e se flexiona para trás, porém, ainda assim, algo o faz esboçar um sorriso inesperado enquanto bloqueia o soco com sucesso e repele o orc para trás.
Brok, empurrado pelo diabo, cai de pé, deslizando pelo chão alguns centímetros, sem perder o equilíbrio e terminando em uma postura firme. Um leve cheiro de pele queimada invade suas narinas e ele sente um incômodo na mão direita. E ao olhar para ela, vê, na parte de cima de seus dedos, marcas de queimaduras e bolhas.
Por um momento, pareceu que… poderia atacar sem me queimar, ele reflete, encarando a ferida em suas mãos.
O diabo, com um brilho de satisfação nos olhos, deixa sua postura de combate, se cobrindo em chamas e retornando à sua forma cavalheiresca usual. “Foi um excelente golpe”, ele elogia, fazendo um comprimento formal com os braços. “Peço desculpas se lhe feri no processo, porém, havia algo que eu precisava testar. E agora sei que não foi apenas força que a senhorita Rubi lhe conferiu.”
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