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    Em uma extensa clareira, cercada por inúmeras árvores de tamanhos variados, o céu livre de nuvens permite que o sol ilumine várias pedras espalhadas no centro daquele local. 

    As rochas de constituição e dimensões variadas apresentam padrões esculpidos e marcações entalhadas indicando que ali, na verdade, são as ruínas de alguma cidade. A maioria se encontra espalhada pelo chão, porém uma parte amontoada em pilhas aleatórias ou em construções mais altas, parcialmente demolidas e notavelmente afetadas pelo tempo.

    Algo que se destaca naquele lugar é o emaranhado de vinhas longas e verdes com folhas pequenas esparramadas por toda a clareira. Aquela estranha vegetação forma uma rede intrincada, envolvendo pedras, ruínas e estendendo-se até os troncos das árvores ao redor.

    Enrolados entre elas, há ossos e animais mortos. Os corpos, sem vida e em decomposição, encontram-se especialmente na borda, sendo a maioria de grandes lobos e aves de penugem branca e pernas bem desenvolvidas. 

    No centro de tudo, há uma torre alta, construída com pedras de tonalidades e texturas variadas, formando um curioso mosaico. Apesar de sua aparência distinta, ela está tão desgastada quanto as demais construções. Em sua base há um grande buraco, de onde aparenta ser o ponto onde todas as vinhas convergem. 

    Atrelado a tudo isso, a clareira é um lugar bem quieto, a estranha ausência do som de animais, junto do cenário hostil e degradado, confere um aspecto bem desolado àquelas ruínas. 

    Em dado momento, o silêncio é rompido pelo som de passos firmes vindo da floresta. O eco das pisadas ressoa entre as pedras espalhadas pela borda, destacando-se naquele ambiente quieto.

    Então, um orc emerge por entre os troncos, sua figura imponente avançando pelas ruínas contrasta brutalmente com o local morto.

    Ele é grande e musculoso, destacando-se em particular pelos ombros largos e seus braços longos. Possui cabelos curtos e castanhos, um rosto com pinturas tribais negras e em sua boca os dois caninos inferiores se sobrepõem os lábios.

    O guerreiro usa um peitoral e um saiote de couro espesso, decorados com uma pintura verde e cercados por pedaços de pelagem cinzenta. Em seu ombro esquerdo, uma ombreira de metal com espinhos é fixada por uma cinta de couro. Presas à sua cintura, uma machadinha de cada lado completa o conjunto.

    Caminhando pela clareira em direção ao centro, ele mantém uma postura firme e uma feição séria, jogando olhares alerta aos arredores. Suas passadas são calculadas, evitando cuidadosamente as vinhas que se espalham pelo solo e seu trajeto segue as áreas menos cobertas por aquelas plantas incomuns, como se soubesse algo que os outros não sabem.

    Em certo ponto do trajeto, um de seus passos provoca um estalo seco. Ele para imediatamente, olha para o chão e percebe, quebrado sob seus pés, um crânio com um enorme bico.

    “Hummm”, ele murmura, com um tom grave e um olhar descontente. 

    Já chegaram muitas até aqui…, ele analisa em pensamento.

    Depois da breve reflexão, ele volta a andar com cautela e se encaminha até a torre no meio.

    Ele para diante do buraco na parte da construção e lá se prostra, flexionando um joelho, deixando um punho sobre o chão e abaixando a cabeça, num gesto de respeito.

    “Eu… estou aqui… meu lorde”, ele diz, com a cabeça baixa, sua voz baixa e áspera como uma lixa. 

    De dentro da fissura, é possível ouvir o som de algo grande se movendo. A pouca luz que se infiltra na torre permite ver uma sombra imensa deslizando pela penumbra, distorcendo-se nas paredes de pedra.

    Conforme a figura se move, uma leve neblina verde começa a ser emanada para fora e se espalha pelo chão próximo à torre. Ele exala um aroma enjoativo e sufocante, como uma mistura de terra molhada e decomposição vegetal, com um toque de algo químico e corrosivo.

    O orc se mostra incomodado com aquilo, sentindo suas narinas arderem.

    Depois de um tempo, uma respiração sinistra também é ouvida. “Ah, é você, Estoratora”, diz uma voz vinda de dentro da torre. Ela possui um timbre pesado, ao mesmo tempo em que é suave e passa um ar requintado. “O que veio fazer em minha moradia?” Conforme as palavras saem, novas lufadas da névoa verde escapam ao ambiente.

    “Vim avisar ao senhor… o tempo de conquista está acabando”, Estoratora responde. “Mais garras-brancas vão vir.”

    O lugar fica momentaneamente em um silêncio inquietante, até uma vinha começar a se mover, arrastar da escuridão a cabeça decepada de uma ave, posicionando-a na entrada.

    “Eu percebi um aumento no número dessas coisinhas vindo me visitar”, diz a voz na escuridão, passando a sensação de incômodo. “Quando te contatei da primeira vez… você me disse que eu teria mais tempo por aqui.”

    A vinha, como um braço sinuoso, faz a cabeça rolar pelo chão, deixando um rastro de sangue por onde passa, até parar no punho do orc. Uma gota de suor frio desliza pela testa de Estoratora, traindo seu nervosismo.

    O orc ergue sua cabeça. “Isso… nunca aconteceu antes!”, ele se explica, sem perder tempo. “Esse ano, o tempo de conquista foi menor. Eu já mandei meus homens cuidarem das que estão espalhadas… mas elas são muitas. E eu…”

    “Não preciso das suas desculpas”, interrompe a voz suave em um tom severo. O orc se cala e abaixa o olhar. “Se essas criaturas aparecem mesmo com sua tribo fazendo algum tipo de… contenção, esse lugar não deve durar muito tempo antes de ser invadido por dezenas daquelas coisas.”

    “A paz aqui deve durar por mais quinze noites. Na minha tribo também está assim. Já estamos nos mudando para outro lugar.”

    “Hummmm”, diz a voz, mostrando interesse. “E vocês já têm um novo lugar?”

    “Sim. Vamos para outro posto antigo.”

    “Verificou as terras das outras aldeias que eu mandei você enxotar daqui como eu pedi?”

    “Sim. Não há nada fora do comum lá, só… alguns animais selvagens.”

    “Ótimo”, diz a voz nas sombras, contente. “Ao menos, você me trouxe uma boa notícia hoje.”

    “O que… devo fazer agora?”

    “Mande alguns dos seus orcs cuidar desses animais em uma área dessas. De preferência uma com árvores altas e perto da água”, a voz ordena casualmente. “Estou pensando em fazer um novo covil em um lugar mais calmo. Eu já sabia que meu ninho aqui não duraria para sempre.”

    “É… claro, meu lorde!”, diz Estoratora, sem questionar. “Vou mandar meus homens cuidarem disso assim que eu voltar.”

    A figura oculta nas sombras ri alto, uma risada aberta acompanhada de sua voz profunda que acaba soando bastante sinistra. “Você é um bom soldado, Estoratora”, ele elogia. “E agora… o seu pagamento. Faça como de costume.”

    O orc imediatamente ergue a cabeça, ostentando um olhar surpreso e um sorriso empolgado. “Eu aceito!”, ele diz, sem hesitar. Ele pega um de seus machado na cintura e faz um corte na palma de uma de suas mãos, deixando um pouco de sangue escorrer. Depois, ele estende o braço na direção da escuridão, aguardando pelo seu prêmio. 

    Do buraco, emerge uma cabeça verde, longa e angular, com linhas afiadas, revelando que o dono da voz é um dragão. Com dois grandes chifres curvados para trás, lembrando galhos retorcidos de uma árvore antiga. Seus dentes, afiados e ligeiramente curvados, combinam com a mandíbula inferior inclinada para baixo, formando um sorriso sinistro e ameaçador.

    Seu longo pescoço, coberto por escamas em tons que variam do esmeralda ao verde-oliva, move-se de forma sinuosa, semelhante a uma serpente.

    O dragão se posiciona exatamente sobre a mão de Estoratora. “Faça bom uso do meu poder”, diz, enquanto abre a boca, deixando escorrer de uma de suas presas afiadas um líquido verde e espesso, que emite uma leve fumaça verde.

    A gota despenca, cai na palma do orc e é absorvida pela ferida. Estoratora sente aquilo arder e, aos poucos, aquela sensação se estende por todo seu corpo, fazendo cada fibra dos seus músculos queimar. Porém, por mais que doa, ele sorri, satisfeito como se aquilo fosse bom. 

    “Eu vou fazer… lorde Naganadeliumos.”

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