Capítulo 70 - Mudança de abordagem
Rubi, Byron e Brok caminham à noite, às margens de um rio que corta a grande floresta. O curso das águas profundas serpenteia constante e fluido, carregando consigo folhas e detritos.
A luz da lua, alta e brilhante no céu, se mistura ao rio, difundindo-se nas águas turvas, dando um aspecto bem luminoso ao local, sendo possível ver claramente o cenário da mata nas margens.
O rio flui para o sul, no sentido oposto ao qual o grupo avança, como se desafiasse seu progresso. Além do som constante da correnteza, o canto das corujas ecoa pela noite, criando uma melodia solitária e selvagem.
Brok e Byron caminham quase lado a lado, liderando o grupo, com o orc um passo à frente, ambos exibindo feições sérias. O diabo olha firmemente para o caminho à frente, suas mãos soltas com dedos fechados e os ombros levemente tensionados, enquanto Brok segura o cabo de seu machado com firmeza, seus olhos alertas e constantemente lançando olhares breves para Rubi, que os segue atrás.
A succubus, por sua vez, vai bem afastada dos outros dois, tanto física quanto mentalmente. Seus passos são lentos, quase mecânicos, ela aparenta estar distraída dos arredores, focada nos próprios pensamentos, exibindo um olhar baixo que reflete sua preocupação.
“Ela… vai ficar assim por quanto tempo?”, pergunta o orc, após olhar para trás mais uma vez, com suas pálpebras estreitando-se ao notar a expressão da succubus.
“Eu não sei”, responde o diabo, sem desviar seu foco. “Conseguimos muitas informações, então há muito o que considerar na nossa forma de agir daqui em diante.”
“E também… já estamos bem perto da terra do dragão e de Estoratora.”
“Creio que ela esteja ponderando exatamente sobre quais passos tomaremos diante dessa situação. Ainda mais levando em conta… a informação obtida pelo corvo.”
O orc, olhando para frente, exala uma respiração pesada, quase como um murmúrio que vem das profundezas.
Um pouco atrás, Rubi, perdida nos próprios pensamentos, acaba nem ouvindo a conversa. Mas a suposição de Byron se revela certa, pois ela divaga sobre aquela situação.
Dragão miserável… Era só uma olhadinha. Uma barreira de cipós não é exatamente o tipo de coisa que se espera num campo aberto… Odeio barreira, ela pensa, com uma leve aflição a corroendo por dentro. O maior problema é se ele sacou que tem alguém espiando ele…
Rubi interrompe seus pensamentos por um momento, olhando para o orc e o diabo à sua frente. Ainda que ele saiba de nós, desistir e recuar não é uma opção. Só precisamos fazer um ajuste na nossa abordagem.
A demônio para de andar, seu olhar firme mostra determinação. “Acho que já é o momento de mudarmos a nossa forma de aproximação”, ela comenta, chamando a atenção do diabo e do orc. O silêncio da noite parece se intensificar, como se a floresta toda aguardasse sua próxima palavra.
Os dois à frente param de andar na hora e imediatamente voltam a ela. Byron cruza os braços, seus olhos brilhantes fixos nela, enquanto Brok inclina a cabeça, aguardando a explicação.
“Se a senhorita julgar necessário, então é o que faremos”, Byron comenta, diligente.
“Qual o plano?”, o orc pergunta, direto e seco, ajustando o machado nas costas.
“A partir de agora, nós temos que trabalhar com três possíveis situações”, Rubi começa, aproximando-se de seus parceiros. “Na primeira, o dragão sacou que tem alguém de olho nele e vai se preparar.”
Byron se mostra preocupado, cruzando os braços enquanto analisa essa hipótese. “Isso seria bem ruim. Perderemos o elemento surpresa e possivelmente vamos ter que lidar com armadilhas e com os soldados.”
“Sim”, diz Rubi, concordando. “Pra mim, esse é o pior cenário possível.”
“… Uma guerra”, Brok complementa, sua voz grave ecoando na noite, os dedos apertando o cabo do machado com mais força.
“O exato oposto do que queremos”, constata Byron.
E seria pior ainda se ele de alguma forma descobrisse que foi um demônio que conjurou o corvo, Rubi pensa, os dedos tamborilando levemente no braço. Mas não tem como ele saber disso, tem? Um dragão teria uma habilidade roubada assim?
Rubi faz uma pausa, os olhos fixos no rio que serpenteia ao longe. “Enfim, a segunda situação é um pouco melhor, mas não muito”, ela continua, voltando-se para os outros. “Nela, o dragão descobriu que tem alguém de olho nele e, ao invés de lutar, foi embora. Não é tão ruim quanto a primeira, mas eu considero ruim também.”
“Creio que nesse cenário ainda haveria o risco de um possível retorno eventual, e com preparo”, Byron comenta, os olhos laranjas brilhando com cautela. “Os dragões são conhecidos por terem uma memória afiada, ainda mais quando se sentem ofendidos ou ameaçados.”
“Seria mais um combate adiado”, diz Rubi.
“Humm…”, bufa o orc, claramente irritado. “Isso significa que ele abandonaria a tribo de Estoratora.”
Pela forma como esse orc aí separou a tribo dele por aí, não sei nem se ele se importa com o povo dele, que dirá o dragão, Rubi reflete.
“E tem o terceiro cenário…”, ela continua. “É onde o dragão nem percebeu que o corvo que ele abateu era mágico e só seguiu com a vida normalmente.”
É bem otimista? É. Mas, na minha opinião, é a opção mais provável, Rubi pensa. Deve ter uma dezena de outros animais passando lá todo dia. Ele não deve ficar atento a todos eles.
“Considerando que não há muitos monstros nesta floresta que representem uma ameaça real para ele, esse nível de displicência não seria estranho”, diz o diabo, sua voz tranquila, mas carregada de análise.
“E… como vamos saber qual dessas situações é a nossa?”, Brok questiona, com seus olhos fixos em Rubi, aguardando uma resposta. “Vai usar outro daqueles pássaros?”
“Eu não posso. Seria arriscado demais”, a succubus responde, um pouco desgostosa com a situação.
“Só conseguiremos confirmar isso conferindo pessoalmente, não é?”, diz Byron, antes de Rubi responder.
“Sim. E essa é a parte principal da nossa mudança de abordagem”, diz Rubi. “Vamos trabalhar considerando o pior caso. Por isso, vai ser a partir desse ponto onde nos separamos.”
O diabo, intrigado, leva a mão ao queixo, ponderando. “Concordo que seria um bom momento. Vamos cobrir uma área maior e economizar algum tempo.”
O orc arregala os olhos, surpreso. “Separar?!”, ele questiona.
“Sim. Não é como se fôssemos arrumar briga antes de confirmarmos a nossa situação. E de qualquer forma, já era algo que eu vinha conversando com o Byron.”
O diabo lança um olhar severo ao orc. “Temos que começar a resolver a situação com os dois no menor espaço de tempo possível”, ele pontua.
“Como assim?”, Brok questiona, sem entender.
“É meio complicado explicar isso, mas…”, diz Rubi, olhando profundamente nos olhos dele. “Como eu e você temos uma magia meio que ligada. Se você morresse, eu saberia.”
“Certo…”, diz o orc com um aceno da cabeça. “Isso eu entendo.”
“Cogitamos se a mesma coisa pode acontecer com Estoratora e o dragão”, Byron explica.
“Isso é… possível?”, Brok pergunta, preocupado.
“É só uma teoria. Não sei como a magia do dragão funciona, mas se for como a minha, é bem provável”, ela responde, esboçando incerteza.
“Também não duvido que o contrário também ocorra”, o diabo acrescenta. “Se um morrer, o outro pode sentir.”
Brok cruza os braços, os músculos tensionados, enquanto reflete sobre a situação. “São muitos… detalhes.”
Byron analisa o panorama da situação em sua mente, os olhos estreitando-se enquanto pondera. “Pela informação que temos, podemos nos aproveitar das mudanças que eles estão fazendo e elaborar algo que nos dê uma vantagem sem nos arriscarmos muito.”
Apesar do momento tenso e confuso, o líder orc ainda acena com a cabeça, exibindo um olhar firme.
“Então é isso. Vamos elaborar um plano bom”, Rubi diz, sua voz firme e decidida, os olhos brilhando com determinação. “Dividir e conquistar.”
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