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    Capítulo 046 – Bem me quer, mal me quer!

    O castelo tinha três grandes ambientes, sugeridos e influenciados por quem os rodeava. Quando somente os criados estavam andando pelas alas, o ambiente era um: relaxado, leve, risonho e despreocupado.

    Quando Ayel estava pelos corredores, o ambiente era outro: sério, tenso, e frio, ainda assim… Com o tempo, os criados pegaram uma intimidade com o bárbaro e, em passos curtos, têm ficado descontraído interagir com o Alvorada.

    Quando o conselho dos nobres estava em reunião, existia o terceiro ambiente: soberbo, elitista, distante e desigual. O momento em que estar no castelo se tornava um peso, isso abatia não somente os criados como também o próprio rei.

    A reunião seguia, enquanto os subalternos se esforçavam para continuar servindo todos os patriarcas.

    Boa parte deles sequer enxergava os empregados do castelo como humanos, necessariamente, isso era um defeito muito comum naqueles que eram muito abastados, o ouro valia muito mais que a carne e o sangue.

    — Senhores, sabemos que o Bosque das Folhas Densas é agora um território sem domínio.

    Bartolomeu Loregard iniciou o debate, ele era o primeiro dentre todos.

    Quando claramente em um impasse, o Loregard ou o Ikeda eram escolhidos para serem os mediadores, isso, pois nenhum dos dois era originalmente de Sihêon. Os Ikedas vinham do oeste e os Loregard do extremo norte.

    Os Loregard esses, eram um clã de mercadores hábeis originários de Althavair, detentores das principais rotas comerciais e as mais lucrativas do continente. Eram eles quem enviavam caravanas para além das muralhas de Sihêon.

    — A questão é, quem cabe controlá-lo? — Bartolomeu prosseguiu.

    Ivan Láparo sorriu, levantando-se.

    — O Bosque sempre esteve sob os cuidados de minha família antes da invasão goblinóide, pouco antes do descaso Verde-folha.

    O descaso Verde-folha, antes mesmo dos Láparos assumirem como patrulheiros oficiais e recepcionados agressivamente pelos goblins, o clã de Milo em tempos de outrora também conduzia controle naquele verde, mas sua soberba deixou visada a localização para as diversas criaturas, que poderiam ter sido aniquiladas, mas foram deixadas ao relento.

    O ataque contra os Láparos enquanto defendiam o bosque foi considerado uma tragédia do destino, a perda do bosque pelos Verde-folha fora considerada a mais pura negligência.

    Ele ajeitara suas vestes e então prosseguiu:

    — Fomos os guardiões daquela terra, lutamos e sangramos por ela. Agora que está livre, nada mais justo que retomemos nosso direito ancestral.

    Ao tomar partido numa reunião do conselho dos nobres, abriria indiretamente uma votação, mesmo que ninguém estivesse pensando nisso.

    Quando o patriarca Láparo decidiu puxar o bosque para o seu clã, ele se candidatou.

    Em disputas assim, o próprio conselho dos nobres se limitava a apenas duas opções: dois se voluntariam e o restante vota de acordo com seus próprios interesses políticos, a fim, obviamente, de conseguirem regalias por tal.

    Um lado estava decidido, restava saber quem entraria em conflito com os Láparos, quando um coçar de garganta atordoou os presentes.

    — Fala como se seu clã fosse o único a ter história naquele bosque. — retrucou o velho Milo Verde-folha — Estávamos lá antes mesmo de Sihêon erguer suas muralhas, como deseja falar das suas raízes ancestrais quando meus descendentes vieram dessa própria terra? Isso soa como uma fala encharcada de ganância, atrapalha o discernimento do conselho.

    — Então, agora é justamente você quem o vê como um ganancioso, Milo? Logo você! — riu Eric Belomonte, girando o vinho de sua própria criação na taça.

    — Se a bota também lhe servir, então calce-a como quiser. — Verde-folha encarou o homem dos cabelos negros.

    A rispidez e o sarcasmo eram pratos cheios em reuniões do conselho. Todos os nobres se sentiam deveras ameaçados quando alguém ousava diminuir parte de suas extensas e absurdas riquezas.

    — Se me lembro bem, seu clã sempre que possível cobrou tributos exorbitantes para entregar ervas e raízes, como se fossem moedas de ouro. Se a natureza é tão importante para você, por que a comercializa com tanta força?

    Dissera Eric, o patriarca do clã, que, por sua vez, governava sobre vastas vinhas que cobriam algumas terras férteis ao sul. O clã Belomonte tornara-se um sinônimo de refinamento e luxuosidade. Seus vinhos adornavam as mesas das melhores tavernas e a casa dos clãs mais abastados, inclusive a própria mesa do conselho dos nobres.

    — Evidentemente, se for de agrado aos Belomontes, pode haver taxa alguma. — argumentou Milo, encarando Eric, que ao escutar essa proposta, ergueu a taça e calou-se.

    O clima esquentara após um silêncio que durou alguns segundos, rompido pelo riso Láparo.

    — Se apenas por meio de suborno você deseja o apoio dos outros, por que não oferece a castidade de uma das suas filhas? — retrucou Ivan.

    O druida Verde-folha lançara um olhar frio e cortante para o patrulheiro que o enfrentava, entretanto, Akihiro Ikeda cortou a tensão com um sorriso.

    — Não sejamos tolos. Essa disputa não deve ser considerada a história, mas sim o futuro. E eu, como um mero observador desse jogo de intrigas, acredito que os Verde-folha consigam garantir um futuro um pouco mais próspero, com todo respeito aos Láparos.

    Ivan concordara com a cabeça, Akihiro falava com respeito, os Ikedas eram um clã cultural da nobreza, vindos de terras distantes do reino de Eikõ, conquistaram renome por meio das artes.

    Esses oestinos eram grandes poetas, músicos e escritores.

    — Futuro mais próspero? Não me faça rir. — bufou Branwen Lâmina-fria.

    — Algum problema, Branwen? — indagou Ikeda para o guerreiro grisalho.

    E o velho continuou.

    — Isso pareceu mais um discurso de um poeta, o que vejo é um monte de velhos xamãs incapazes de defender suas próprias terras!

    Força era uma das palavras que poderiam descrever os Lâmina-fria, clã de Kord. Guerreiros de elite, moldados desde a infância para o combate. Para a guerra.

    — Os Verde-folha perderam o direito ao bosque no instante em que permitiram que os monstros entrassem. Os Láparos eram patrulheiros e saberiam como manter a ordem, com suas espadas e flechas. É o que precisamos.

    O discurso de Branwen ecoou no silêncio da sala, recepcionado pela risada de Drake Less, que carregava um nome manchado, mas ainda assim tinha voz.

    — Exato! — Less respondeu — E se houver saqueadores? Se mercenários e bandidos enxergarem o bosque como uma terra sem dono? Confiaremos nós que alguns druidas cantarão para as árvores expulsarem os criminosos?

    O clã de Drake, outrora pirata, ergueu-se das águas salgadas para o castelo por conta da sua ascensão à nobreza. Titulo reconhecido por Mahfus III, mas não necessariamente por todos os outros habitantes, de qualquer forma, o ouro dos Less era útil, por mais que sujo.

    Milo escutara tudo, fechou seus olhos por um instante, ele suspirava. Talvez tentando retomar a calma antes de voltar a falar, então se levantou.

    — Nós Verde-folha perdemos o bosque porque os nobres preferiram proteger seus castelos a enviar reforços para defender as folhas densas. Então, abandonados à própria sorte!

    Os criados paralisaram de medo.

    — Todos tínhamos nossos próprios problemas, os Verde-folha não têm capacidade para cuidar do bosque? Então, sente-se e cale-se. — respondeu Lâmina-fria.

    — São vocês que agora querem nos culpar por algo que foi forjado pela omissão do conselho na totalidade. — concluiu Milo.

    — Admite então que não fora forte o suficiente para segurar essa ameaça ao bosque? Um administrador que não pode defender seus próprios domínios, não tem o direito de geri-los. — Dissera Ivan Láparo, sorrindo venenosamente, enquanto tomava uma taça de vinho Belomonte.

    Discussões calorosas.

    Todos os nobres desejavam, acima de tudo, um pouco mais de poder.

    Ayel repetia religiosamente que o que mais fazia com que ele odiasse o conselho dos nobres era essa gula por ouro, fama e influência.

    “Tudo isso para, no final, suas cabeças rolarem iguais às outras”

    Ele dizia enquanto afiava sua espada bastarda, assustando com razão os abastados que escutavam.

    Por mais que houvesse passado algumas horas, onde tudo poderia ser discutido e um pouco mais. A decisão ficara empatada, onde, de um lado, tanto os Ikedas quanto os Belomontes apoiavam Milo Verde-folha para conseguir tomar o controle do bosque, enquanto do outro lado, os Lâmina-fria e os Less apoiavam a promoção do clã Láparo, designando-os como defesa necessária para o Folhas Densas.

    Bartolomeu Loregard estava indeciso, tanto ele quanto possíveis nobres menores que não teriam força para participar dessa reunião. De qualquer forma, sem poder ser aquele que decidiria em nome do conselho todo, o patriarca do velho clã de Althavair ergueu-se, tentando colocar ordem naquela tensão que pairava no ar como um odor quente.

    — Meus nobres senhores, creio que estejamos cuidando dessa questão de uma forma deveras ríspida, até porque, o que realmente importa não é necessariamente quem irá possuir o bosque, mas sim que o tornará efetivamente lucrativo, sim?

    Ele olhara para os lados, visualizando uma possível ruptura na irmandade dos patriarcas, pois ninguém concordou com sua frase, ele então coçara a garganta para continuar.

    — Façamos que seja algo justo, vamos deixar que o rei decida!

    E que momento oportuno fora aquele, assim que Loregard finalizou sua frase, um guarda do nada adentrara de supetão no local, assustando todos enquanto gritava.

    — Ayel foi atacado! Anusha traiu o reino!


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