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    Capítulo 077 – Arco duplo!

    Em eras tão regressantes, antigas que competiam com as primeiras poeiras do tempo, existiu um período onde gigantes utilizavam os Rocas como animais domesticados…

    Diziam que, enquanto esses colossos mantivessem suas benevolências, ninguém precisaria temer. Pois eles proibiam suas bestas aladas de caçarem os aldeões e as plantações da época.

    Outros rumores correram diversas vezes, principalmente entre arcanos e bardos, onde outrora as penas dos colossais Rocas haviam sido utilizadas na forja de diversas relíquias de poderes inefáveis.

    Artefatos esses que sussurravam nas tavernas e salões de conselhos da época, conferidos para os mais ousados: a dádiva de voar, deixando-os tão livres quanto os velhos ventos que beijavam as montanhas.

    Yelena respirara fundo, aqueles cabelos loiros naquele momento estavam soltos em parte. Flutuavam ao vento como fios dourados sem controle. O seu olhar atingiu Joana, escondida entre os troncos.

    Mesmo a distância, a pequena garota sentiu a seriedade daquele olhar.

    — Se você nos ver cair… — Yelena gritara a todo pulmão — Vai correr de volta para o reino e avisar a guarda inteira, entendeu!?

    A pequena patrulheira, com o rosto banhado em tantas lágrimas, somente conseguiu assentir com a cabeça, mesmo com aquele nó gigantesco na sua garganta.

    Aquele Roca estava regressando em mais rugidos estridentes, estava preparando seu próximo ataque, aquelas garras brilhavam em contraste do céu.

    A fera então desceu novamente, em um misto de fúria com controle. Yelena firmou-se, suas flechas foram saraivadas contra o vento. Badaboom, ao seu lado, movera-se rapidamente com seus passos leves e silenciosos, posicionava-se para flanquear a besta.

    Os pares de olhos eram frios e resolutos.

    Indiferente, cada mergulho daquela besta maldita era um sopro que cheirava a morte, há cada esquiva, um milagre que parecia ser um presente do destino.

    O som das asas era de batidas poderosas e surdas, como trovões no meio do bosque.

    No meio daquele turbilhão, a pequena Joana testemunhava, em total agonia, uma clareira lotada de poeira e sangue.

    Mesmo que não conseguisse pôr em palavras o que sentia, ela estava descobrindo a verdadeira essência de ser uma verdadeira arqueira: não consistia somente em mirar e disparar, mas também em enfrentar monstros que eram tão magnânimos que consumiam o peito com tanto medo.

    Yelena em meio as suas esquivas estava deixando-se levar pelos seus pensamentos, estava crente que conseguiria acabar com essa ameaça ao lado de Badaboom, de quebra iria ensinar um pouco mais de combate de campo para a sua pupila, ao invés disso, pensamentos intrusivos negativos não deixavam de atingi-la.

    “Será que me precipitei? Será que eu deveria avisar o Ayel? O julguei tanto por ser descuidado e estou fazendo o mesmo?”

    A batalha, porém, apenas começara.

    O horizonte estava carregado, o que anunciava que a noite… Tal como o Roca, também desceria logo.

    A criatura abissal não cessara o seu assalto, o monstro alado havia descido em diversos novos rasantes, cada vez mais rente ao chão que a anterior.

    Os voos quebravam os galhos, arrancando-os, de forma que criava redemoinhos caóticos.

    — … — Badaboom bufara em cansaço, entre meios os rasantes, os cortes do vento mantinham linhas avermelhadas no seu rosto, que caia seu sangue quente.

    Yelena poderia ter respondido, mas assim que iria dizer sua opinião sobre a reclamação do calor da batalha para o seu companheiro, precisou se jogar agressivamente no chão para escapar das garras brilhantes.

    Os dois sentinelas esquivavam em movimentos desesperados, eram rolagens em cima das relvas úmidas enquanto o Roca brandia suas garras como foices e urrava com um ódio destruidor.

    Por três vezes, quase que eles foram levados.

    Na quarta investida, fora tão cerrada que as garras da ave roçaram o braço esquerdo de Yelena, abrindo uma ferida profunda, o sangue escorrera em fios quentes e rubros, chorando nos troncos das árvores e no seu arco com o impacto do golpe.

    O seu grito foi um pedido de socorro, desengonçado, esganiçado e desesperado.

    Na quinta descida, Badaboom acabou com uma batida do seu ombro no chão na tentativa de se esquivar, apenas não fora rápido o suficiente… Mesmo quem pudesse ter emitido qualquer som de dor, o seu corpo estremecera, e o seu olhar… Sempre silencioso, agora transmitia uma alma que sangrava internamente.

    O mudo tateou seu cinto com urgência, arrancara alguns frascos de vidro cor âmbar que guardava, pensou que quanto mais caísse, maiores as chances desses frascos quebrarem sem uso. Encarando a criatura com ódio, ele arremessara um dos frascos diretamente para Yelena, que segurou com perícia.

    Não precisou analisar muito.

    — Incendiar as flechas, sério? — bradara a loira, respirando com dificuldade, com o braço ferido trêmulo.

    Badaboom apenas meneou a cabeça, afirmando estar tão ofegante que seu corpo todo se movimentava com seu respirar decaído.

    — Bada… Não, só isso não vai adiantar. Tente queimar a criatura, eu irei mirar nos olhos dela… Viu o tamanho daqueles globos gigantescos de água? Vergonhoso termos errado todas essas vezes, não vai acontecer de novo!

    A líder da guarda real proferia enquanto o mudo suspirava, rosnava de volta para a sua superior, seria arriscado. Flechadas nos olhos? A forma mais básica de atingir um Roca, a ponto de as aves terem noção disso e sempre buscarem contra-ataques.

    Os olhos, que eram as únicas coisas aparentes naquele rosto, fixaram completamente na criatura, mesmo enquanto, com sua mão trêmula de adrenalina, embebia os óleos que sobravam na ponta das suas flechas.

    O Roca, lá do alto, circulava em gritos agudos e estridentes que ecoavam por toda a planície.

    Quando a criatura abissal iniciou finalmente seu próximo mergulho, Yelena havia se posicionado, com suas pernas firmes no chão encharcado, seus cabelos grudavam no rosto, misturando seu sangue com o suor.

    Badaboom ao seu lado erguera o arco com sua flecha emanando enxofre, estava pronto para atear.


    — Heey Bada… Hoje à noite, o Kord e o Claude me chamaram para beber um pouco no Melusina, eu confesso que nunca fui nesse lugar… Parece um ambiente porco, mas, de qualquer forma, quer ir?

    — …

    — Eu sei que vocês não conversam tanto… Mas eles se tornaram muito próximos de mim desde que virei a líder da guarda real, e estamos nos tornando amigos, mas ainda assim, não queria ir sozinha.

    — … — O sentinela deu de ombros, vocalizou com um pouco de desdém, como se estivesse fazendo pouco caso da situação.

    — Bada… — Yelena falou quase com um choro cântico, entonando com um sofrimento forçado. — Não me trate assim!

    Há muito esses dois se conheciam, quando Yelena começou a conversar com Badaboom, ele já estava sem a língua, ainda assim, por algum motivo, ela conseguia compreender o que ele pretendia dizer.

    Pela entonação dos grunhidos, talvez?

    De toda forma, Badaboom ficava completamente surpreso em como era mais fácil se comunicar com a Yelena do que qualquer outra pessoa no reino.

    Não durou muito e ele visualizou aquela loira inocente se tornar a líder da guarda real. A ascensão dela fora tão rápida que levou um tempo para absorver.

    Ela não tinha poderes para edificar o mudo na hierarquia sentinela, mas Aiden prometera que o mudo receberia um lugar especial.

    Mesmo que o bárbaro tivesse perecido antes de cumprir o que foi dito, o sentinela se orgulhava da sua amiga, mesmo que de longe.

    Nos poucos momentos em que ela chamava para que eles pudessem compartilhar a companhia um do outro, mesmo que para programas nem tão atrativos assim, eles cediam, pois a presença de um deixava o outro bem. Sempre.

    — … — Ele grunhiu, fingindo um pouco de animação.

    Mas assim que ele avistou Yelena comemorar sua resposta positiva, por mais que o manto escondesse sua boca, um sorriso sobressaiu.


    O monstro aproximava-se velozmente, estava tão próximo que o cheiro das penas úmidas invadia as narinas, bastante enjoativo e sufocante. Os olhos enormes do Roca, tão enormes e brilhantes e quase líquidos, pareciam refletir a dupla de sentinelas.

    Ambos respiraram fundo, o chão estremecia a cada batida de asas.

    Existiu um momento de silêncio, que antecedia o caos que poderia finalizar o embate.

    A pequena garota do cabelo cobre permanecera agachada, seu peito arfara enquanto segurava os soluços contidos. Aquele pequeno coraçãozinho batia com uma força tão estúpida que ela escutava o sangue pulsar mais forte nos ouvidos.

    Seus olhos arregalavam enquanto fixava seus olhos para a clareira onde seus superiores de arco batalhavam, ainda assim, ela mantinha uma coragem bestial. Pois, não desviou o olhar, mesmo tremendo, observava sua mestra Yelena.

    A flecha fora disparada.

    O projétil voou como uma luz repentina, uma linha tênue que cortou o ar com perfeição.

    Encontrou o olho esquerdo da criatura com uma precisão tão absurdamente exata que atingiu o centro da pupila.

    O grunhido do Roca irrompeu como um trovão tão alto e poderoso, que Joana cobriu instintivamente os ouvidos com ambas as mãos, enterrando sua cabeça nos joelhos.

    O som agudo, visceral, grotesco, reverberou pelos ossos, o chão tremeu como se fosse ruir.

    A ave monstruosa, que estava cega de um lado, perdera seu equilíbrio. Em movimentos desgovernados, avançara em linha reta, arrebentando árvores como se fossem gravetos.

    Badaboom rezou pela oportunidade e ela surgiu, atento e aproveitando a brecha, riscou com a lâmina da adaga contra o casco de ferro que estava preso na sua cintura, que gerou uma faísca vívida, incendiou sua seta.

    Encarou a criatura que estava prestes a cair, com a flecha em fogo vivo. Que iluminava seu rosto mascarado em tons alaranjados e fervorosos.

    — …


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