— Como vocês não perceberam? — exclamei, quase incrédulo. — Olhem para os sinais!

    Apontei para o chão, onde, para qualquer observador comum, não havia nada além de manchas de sangue e os vestígios evidentes de uma luta.

    — Bem, se você está dizendo isso, deve ter visto algo que justifique essa suposição, mas eu não consigo ver — respondeu o anão, sua voz carregada de uma hesitação cautelosa. Tanto Wian quanto sua irmã assentiram em silêncio, partilhando da mesma dúvida.

    — Mas isso não importa agora — retruquei, minha voz carregada de urgência. — Precisamos ir rápido. Ele está ferido, e vai procurar ajuda médica!

    Com essas palavras, virei-me e comecei a andar.

    — Ferido? Como você percebeu tudo isso? — perguntou Alessi, a descrença permeando sua voz.

    — Gotas de sangue sob a cama, distantes dos sinais de luta — respondi, com uma calma sombria. — Além disso, havia marcas no pé da cama, algo peculiar… difícil de descrever. Se tivesse que resumir, diria que eram dois retângulos arredondados, formados por sangue, separados por uma linha fina e limpa. A marca inconfundível de um dedo… com um anel.

    — E por que demorou tanto para dizer isso? — O chefe me lançou um olhar nem um pouco feliz, sua paciência claramente esgotada.

    — Não sei… — respondi, num tom quase indiferente. — Estava tentando entender se poderia ser algum tipo de magia, uma ilusão talvez. Mas isso agora não importa. O que importa é que precisamos ir para a periferia. Buscar um médico perto da cena do crime só atrairia mais atenção.

    — Passem na DIVIIP para pegar suprimentos antes — resmungou o anão, com um tom que não deixava espaço para discussão. — E isso é uma ordem.

    Seguimos para nos armar. Primeiro, ele mencionou que havia gasto parte de nosso primeiro salário para comprar bolsas mágicas — pequenas por fora, mas com um espaço interno vasto, quase infinito.

    Em seguida, fomos para a sala de armamentos, onde recebemos permissão para pegar qualquer arma branca, além de:  dois revólveres, dez munições mágicas e uma granada. 

    As coisas estavam prestes a ficar realmente sérias. Enquanto meus companheiros se ocupavam em escolher suas armas, eu abri um mapa, tentando decifrar… para onde ele poderia ter ido?

    Considerando que o crime ocorreu no meio da noite e só foi descoberto na manhã seguinte, ele teve algumas horas para fugir. No entanto, a porta estava trancada, conforme relatado pela camareira.

    Um ladrão ferido, em meio à fuga, não teria parado para trancar a porta, o que sugere que ele ficou preso ali durante toda a noite e só conseguiu sair ao amanhecer.

    Ferido, sangrando e fugindo de uma acusação que não poderia enfrentar, é provável que tenha escolhido um caminho menos frequentado, movendo-se para áreas cada vez mais desertas, mais afastadas, onde a chance de ser encontrado seria menor

    Ali, nas fronteiras onde a própria existência é uma pergunta sem resposta, não se questionará por que estar ferido. Há dois refúgios possíveis: os médicos do submundo, ou as instituições religiosas.

    Buscando templos ou santuários pouco movimentados que estejam fora das muralhas… temos 3 opções principais.

       “Ai, minha cabeça doi! Pensei demais.”

    — De todas as opções, por que esta? — a irmã de Wian Ravi perguntou enquanto estávamos a caminho.

    “Mir… como posso explicar? Não lembro o nome dela. O problema é que não posso simplesmente perguntar. Inventar um nome? Ravi? Talvez seja melhor assim. 

    — Simples, minha cara, eu chutei! — Mas, para ser franco, se há algo que faz sentido é que o templo de uma deusa chamada VIDA parece ser o refúgio ideal para quem está ferido.

    Nossas vestes oscilavam com o vento enquanto percorríamos aquelas ruas estreitas e sinuosas. Estávamos em busca de um fugitivo, que, após um confronto violento, havia se refugiado em algum canto sombrio dessa cidade. 

    O fugitivo, ferido e desesperado, sabia que não poderia se esconder por muito tempo, e buscou abrigo no templo da Deusa Vida, na esperança de encontrar cura e proteção.

    O templo erguia-se como um raro refúgio de tranquilidade e esperança em meio à vasta desolação que consumia a terra. No seu interior, sacerdotes devotados dedicavam-se a amparar os desamparados e a trazer alívio aos que sofriam.

    O templo estava cheio de pessoas deitadas em macas, a maioria delas doentes ou desnutridas. No entanto, havia um indivíduo em particular que se destacava: ele estava ferido, mas ainda conseguia se mover. 

    Não tinha certeza, mas ele mesmo fez questão de deixar tudo claro. Assim que nos viu, o sujeito, com roupas esfarrapadas e sujas, entrou em pânico, levantou-se de forma desajeitada e, sem pensar duas vezes, correu em direção à janela.

     Num ato desesperado, se lançou para fora, me assustando por um momento. Por sorte, estávamos no térreo, ou a situação poderia ter sido bem pior.

    Vou poupá-los da cena de perseguição.

    Depois de muito esforço e tempo desperdiçado, finalmente o alcançamos (inacreditável como ele corria, mesmo ferido)

    — Vamos, desembucha! O que aconteceu? Quem fez aquilo? Quem morreu? Quero explicações para ontem!

    Aparentemente, ele sabia de algo muito valioso pois seu corpo irrompeu em chamas bem na minha frente. Dei um pulo para trás, sentindo o calor repentino.

    — Merda! — gritei, tomado por uma mistura de surpresa, medo e raiva. Olhei ao redor rapidamente. — Estamos ferrados!

    Sim, tudo em tão pouco tempo, pegos por eles, como se soubessem que iríamos atrás, como se já conhecessem nossa existência.

    Agora, nem mesmo a pessoa que se contorce de dor, envolta em chamas, nos revelará algo, muito menos as criaturas que nos cercam, esses autômatos com suas formas aracnídeas, vinte deles, talvez mais, todos nos olhando com um desprezo silencioso.

    Não consegui enteder como ele incendiou, se fora atingido por algum projétil ou magia, mas sabia que um confronto direto seria suicídio. A desvantagem era clara: éramos poucos contra muitos, no chão, nas paredes, até mesmo nos telhados à nossa frente. E, por fim, o elemento surpresa estava do lado deles. 

    Eles já sabiam de nós, como se estivéssemos jogados, indefesos, nas palmas de suas mãos, prontos para sermos esmagados pela força inevitável do destino.

    Com poucas opções diante de nós, agarrei-me à única que parecia oferecer uma tênue possibilidade de sobrevivência. Minha mão, trêmula, mergulhou na bolsa ao meu lado, e com uma esperança frágil e quase ridícula, lancei a granada, como se atirasse o último vestígio de sanidade ao abismo.

    A granada voou pelo ar, e um sorriso insano se formou em meus lábios, como se o peso da loucura finalmente tivesse me tomado por completo. Ela caiu entre os autômatos, do outro lado da rua.

    BOOM!

    A explosão ressoou como um trovão que ecoa nas profundezas da alma. Fragmentos de metal e partes das criaturas foram lançados em todas as direções, enquanto os robôs eram despedaçados, reduzidos a sucata.

    A rua, agora envolta em fumaça e destroços, parecia um campo de batalha onde a insanidade se encontrava com a destruição

    Foi nesse dia que aprendi, da maneira mais amarga, que detonar uma bomba a curta distância raramente é uma decisão sensata. 

    Fui lançado pelo ar como uma marionete sem cordas, até que minhas costas encontraram o chão com uma força brutal, cinco metros adiante de onde eu estivera antes. A dor se espalhou pelo meu corpo.

    Desperdiçamos nossa única granada, ferimo-nos no processo, devastamos metade de uma rua, aterrorizamos os fieis no templo da deusa Vida e, no final, perdemos nossa única fonte de informações. 

    Perfeito! Nada como um belo fracasso para dar um gás na  autoestima que restava e afundar ainda mais o espírito em um abismo.

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