Capítulo 219: Névoa das Mil Ilusões [2]

“….O que você acha?”

Delilah olhou para cima. Fay, sentada com suas perninhas balançando sobre a cadeira, recostou-se e encarou Delilah.

Colocando sua caneta sobre a mesa, Delilah inclinou a cabeça.

“Achar sobre o quê?”

“Sobre ele.”

Não havia mais nada que ela precisasse dizer para Delilah entender.

Por ‘ele’, ela se referia a Julien. Desde que ele acordou novamente, ela começou a demonstrar interesse real nele.

Ela já estava interessada nele antes, mas atualmente, seu interesse estava no auge.

“Como ele fez isso…?”

Mesmo agora, Delilah podia ver Fay ainda pensando nele.

Mas não era como se ela não entendesse de onde Fay vinha. Desde que acordou daquele estado estranho… ele havia mudado. Era quase como se tivesse se tornado uma pessoa completamente diferente.

Ou pelo menos, era o que Delilah pensou no início.

‘Ele não mudou. Ele é o mesmo. É só que ele não tem escolha a não ser mudar.’

Essas foram as palavras que Fay lhe dissera no momento em que veio visitar Julien depois que ele acordou.

Delilah ainda conseguia se lembrar da expressão sombria e tensa que ela tinha naquele momento.

‘Eu não sei o que aconteceu, mas…’

A mão de Fay estava pressionada contra a têmpora de Julien enquanto ela olhava para ela.

‘….Não consigo mais lê-lo. Tudo que sinto é um fluxo interminável de emoções que me engolirão se eu mergulhar mais fundo em sua mente.’

“Delilah.”

“….Hm.”

Saindo de seus pensamentos, Delilah olhou para Fay, que a encarava com a cabeça inclinada.

“O que foi? Você parece perdida em seus próprios pensamentos.”

“Não, só estava pensando nas palavras que você me disse no passado.”

“Quais?”

“….As que você me disse depois de examiná-lo. Sobre como você seria engolida se mergulhasse mais fundo em sua mente.”

“Ah, isso.”

Fay sorriu sem jeito.

“Eu realmente não sei o que aconteceu. No momento em que ele acordou, vi algo que nunca tinha visto antes.”

Estendendo a mão para frente, ela olhou para ela.

“Mesmo agora, pensando naquele momento…”

Sua mão começou a tremer.

“Tudo que sinto são arrepios.”

Fay fechou os olhos.

“Seu controle sobre as emoções ainda é severamente deficiente, mas seu poder e intensidade… estão em um nível que não consigo medir. Ele pode até ter me superado nesse aspecto.”

“…..”

Delilah ouviu em silêncio.

Ela não estava muito surpresa com a revelação.

Pensando na expressão que Fay tinha naquela época, Delilah podia mais ou menos dizer que Julien havia alcançado um nível totalmente novo de Magia Emotiva.

Mas,

“É uma pena que o poder esteja consumindo ele,” Fay disse enquanto se recostava na cadeira.

Delilah fechou os olhos.

De fato, Julien estava sendo consumido por suas próprias emoções. Isso era algo que todos que estiveram presentes puderam ver.

Em certos momentos, ele começava a demonstrar extremos para cada emoção.

Levou vários dias para ele se estabilizar completamente, mas mesmo assim, ele ainda estava lutando para não surtar.

….Era por isso que não queriam que ele frequentasse as aulas.

Ele era simplesmente perigoso demais.

“Bem, não é como se a situação fosse completamente sem esperança.”

Fay falou enquanto tamborilava os dedos no braço da cadeira. Coçando o queixo, ela pensou por um momento antes de dizer:

“Na verdade, há um remédio especial que ele pode tomar para estabilizar sua condição. Eu queria pedir por ele, mas você sabe…”

Fay coçou a lateral da bochecha, e Delilah acenou.

Assim como ela, Fay também não tinha um bom relacionamento com a família real. Seu pedido provavelmente seria rejeitado sem pensar.

Especialmente porque o remédio era extremamente caro e raro.

Havia apenas uma maneira de Julien conseguir o remédio.

Vencer a Cúpula dos Quatro Impérios. Ou pelo menos, demonstrar talento suficiente para atrair a atenção da Família Real.

‘É possível.’

Delilah conhecia as capacidades de Julien.

Se fosse o Julien atual, então…

“Na verdade, não é como se essa fosse a única maneira de ele ser curado.”

Os pensamentos de Delilah foram abruptamente interrompidos por Fay, que falava sozinha.

“Não é como se ele precisasse do remédio para ser completamente curado. Há outras maneiras de ele suprimir a sobrecarga de emoções, mas elas vão levar muito mais tempo.”

Ouvindo de lado, Delilah inclinou a cabeça.

Como essa era a primeira vez que ela ouvia sobre isso?

“O quê?”

Como se pudesse ler seus pensamentos, Fay franziu a testa.

“Você está pensando por que eu nunca mencionei, né?”

“….”

“….É porque não é algo que ele possa fazer e provavelmente levará muito mais tempo.”

“Entendo.”

“O quê? Você não acredita em mim?”

Fay sentou-se ereta.

Sua postura ficou extremamente séria.

“Ele precisa se soltar.”

“….Se soltar?”

“Sim.”

Fay acenou com a cabeça seriamente.

“Se ele quiser se curar da outra maneira, precisa se abandonar completamente.”

***

Era uma situação inesperada.

Em um momento, tudo estava calmo e, no seguinte, os arredores mudaram.

Uma névoa densa cobriu o ambiente.

“O que está acontecendo?”

“Professor?”

“Não consigo ver nada.”

Os cadetes naturalmente ficaram confusos, mas não havia muito pânico para começar. Todos conseguiram manter a compostura, e a ordem foi rapidamente restabelecida.

Liderando todos estava Kaelion, que foi rápido em organizar a todos.

“Certifiquem-se de segurar a mão, ou algo, da pessoa ao seu lado. É para termos certeza de que não nos perderemos.”

Essa situação, embora inesperada, não era algo que o deixasse desnorteado.

Ele já estivera em situações muito piores e conseguiu manter a calma por causa disso.

“Assim que todos estiverem de mãos dadas, vou gritar um nome para confirmar que todos estão presentes.”

Olhando ao redor, ele segurou uma mão com a mão esquerda e estendeu a outra com a direita.

“Você…”

Mas sua expressão mudou levemente quando percebeu a quem a mão pertencia. Fechando os olhos, ele estava prestes a xingar silenciosamente quando percebeu que sua presença era uma coisa boa.

‘Certo, ele também é forte.’

Nesse caso, ele sentiu seu fardo aliviar um pouco.

“Vou começar com a patente mais baixa.”

Ele olhou ao redor para a névoa e gritou.

“Jeffrey!”

“….”

Suas palavras foram recebidas com silêncio.

Franzindo a testa, Kaelion gritou novamente.

“Jeffrey!”

“….”

Mas, novamente, ele foi recebido com silêncio.

Ele esperou mais alguns segundos antes de sentir seu coração afundar.

‘Não está bom.’

Ele estava prestes a gritar novamente quando piscou os olhos. Por algum motivo, seu lado esquerdo parecia leve…

Mas o qu—

“!?”

A expressão de Kaelion se distorceu quando olhou para sua mão esquerda.

Ele estava segurando uma mão, sim…

Mas era uma mão decepada.

Pinga..! Pinga.

Sangue escorria do toco, revelando o osso do braço dentro. A visão grotesca fez seu estômago revirar incontrolavelmente.

Virando a cabeça rapidamente para olhar para o lado direito, ele ficou aliviado ao ver que não havia problema ali.

“Quem estiver perto de mim diga algo…!”

“….”

Suas palavras foram recebidas com silêncio.

“….Não pode ser.”

Kaelion ainda não estava em pânico.

Olhando ao redor e vendo que não havia resposta, ele fechou os olhos e rapidamente aceitou a situação.

“Fomos separados.”

Ele virou-se para olhar para Julien.

“Você tem alguma ideia do que está acontecendo?”

“Não tenho.”

Julien respondeu com um aceno negativo.

Ele também parecia confuso com a situação, mas não havia traço de pânico em sua expressão. Ainda estava tão relaxado quanto Kaelion se lembrava.

….Ou estava?

Olhando mais de perto, ele podia ver suas pupilas tremendo levemente.

Não, não apenas suas pupilas.

Sua mão também.

‘Mas o que diabos…’

Xiu!¹

“….!”

Kaelion rapidamente se abaixou.

Ali, uma cabeça negra emergiu de trás dele, separando a névoa brevemente enquanto se estendia para agarrar o ar.

Torcendo o corpo, Kaelion apontou o dedo para a mão onde um pequeno círculo mágico se formou.

“Hieek—”

Um grito ecoou e uma mão foi decepada.

“Isso…”

Encaraando a mão, a expressão de Kaelion ficou séria.

“….Não consegui detectá-la até o último momento.”

Ele sentiu seu coração apertar com uma certa ansiedade. Isso nunca havia acontecido com ele antes, e, ao olhar ao redor, percebeu que todos os seus sentidos haviam começado a ficar embotados. Seja sua visão, olfato ou audição.

Todos haviam ficado tão fracos que ele mal conseguia se concentrar.

“Ah não.”

Ba… Baque!

Ele começou a ouvir o som de seu próprio coração.

Ele batia alto dentro de sua mente.

“O que está acontecendo?”

Apesar de tudo, ele ainda conseguiu se forçar a manter a calma. Respirando fundo algumas vezes, ele conjurou um pequeno escudo ao redor dele e de Julien.

“Isso deve impedir os inimigos de—!!”

A expressão de Kaelion mudou dramaticamente.

Ao virar a cabeça para olhar para Julien, seu sangue gelou. Em vez de Julien, uma mulher magra com olhos negros vazios e estrutura esquelética estava ali, segurando sua mão. Seu vestido branco e longo fluía como um sudário, aumentando a estranheza da situação.

“O-o quê…!?”

Pela primeira vez, ele começou a sentir indícios de pânico verdadeiro enquanto soltava a mão dela apressadamente.

Ou pelo menos tentou.

Ela não soltou.

“S-solta!”

Ele apontou a mão para ela.

Uma multitude de círculos mágicos se formou atrás dele enquanto o mana ao redor dos dois começou a ficar mais denso.

Ele estava prestes a liberar o feitiço quando uma mão fria e úmida surgiu por trás, envolvendo seu pescoço com força.

“Akh…!”

Os olhos de Kaelion se arregalaram.

Ao virar a cabeça, seu sangue gelou. Outra mulher havia aparecido, seus olhos sem vida perfurando-o com uma intensidade arrepiante.

Ela também…

Estava vestindo as mesmas roupas brancas que a garota à sua frente.

Suas roupas estavam esfarrapadas, mas Kaelion conseguia distinguir levemente um emblema dourado entre os trapos.

Sua curiosidade foi breve. Sem aviso, uma mão fria surgiu por trás dele, tapando sua boca, silenciando sua respiração com um aperto de pavor gelado.

“Hmm…! Hmm!”

Ele queria gritar, mas as palavras não saíam de sua boca.

Um súbito senso de desespero tomou conta de sua mente naquele momento enquanto todo seu corpo começava a ficar dormente.

A última coisa que viu antes de sua mente escurecer foi uma expressão envelhecida e encovada.

“….”

Seu mundo ficou em silêncio logo depois, quando ele desmaiou.

Skrrr… Skrr…

Levantando-se, as mulheres seguraram suas mãos e o arrastaram. Só para pararem pouco depois.

Quebra! Quebra!

Um estalo arrepiante ecoou pelo ar enquanto as cabeças das mulheres se torciam de maneira não natural, girando cento e oitenta graus. Seus olhos mortos e vazios se fixaram em uma certa figura atrás delas.

Enquanto seus olhos cor de avelã examinavam o grupo, os olhos de Julien pausaram em Kaelion.

“Então é aí que ele estava…”

Resmungando baixinho para si mesmo, os olhos de Julien começaram a se contrair.

Então, encarando as mulheres à sua frente, ele fechou os olhos.

“Certo…”

Ele levantou o pé.

“Posso muito bem testar a nova habilidade.”

E o pressionou contra o chão.

1. SIM, ENTRAIL ONOMATOPEIAS VOLTOU!!!![↩]