Capítulo 36 — Sorriso [3]

“Ugh…”

Esfreguei meus olhos. Eles estavam um pouco inchados agora. Eu não esperava que minhas memórias me afetassem assim. Ou talvez eu esperasse…

Ainda assim…

“Nada.”

Não houve reação de Delilah quando usei minha habilidade. Mesmo colocando tudo nela, ela permaneceu impassível e inalterada.

Foi um pouco decepcionante, mas compreensível.

Ela era a mais próxima do Zênite. Para ela não ser afetada por mim não foi uma surpresa. Decepcionante, mas esperado.

‘Será que algum dia conseguirei afetar alguém como ela…?’

Emoções podem afetar qualquer pessoa, independentemente de seu nível e força. Isso eu sabia. Infelizmente, quanto mais forte alguém é, mais poderosa é sua mente.

Torna-se muito mais difícil afetar as emoções de alguém assim.

E o fato de ela parecer desprotegida quando usei meu feitiço e ainda assim não ser afetada diz muito sobre sua resistência mental.

“Haaa…”

A realidade da minha situação ficou mais evidente para mim.

Eu ainda tenho um longo caminho pela frente.

*

Nas duas semanas que estive no instituto, nunca realmente prestei muita atenção ao meu entorno.

Foi com esses pensamentos que olhei ao redor pela primeira vez. Era bonito. O lugar parecia deslumbrante, com vegetação por toda parte e edifícios intricadamente projetados que pareciam não combinar com esse “cenário”.

Cadetes caminhavam pelo campus, conversando entre si e aproveitando a vida.

Havia também uma cena estranha à distância. Um homem de meia-idade com um bigode espesso e óculos redondos estava sentado em um banco de pedra, jogando damas sozinho.

“Que tipo de…”

Sim. Ele estava sozinho, mas…

Ainda parecia estar se divertindo.

…..Eu me senti um pouco invejoso ao observar a cena.

Se minhas circunstâncias fossem um pouco diferentes, talvez eu tivesse aproveitado meu tempo aqui de maneira mais completa, mas…

‘Não posso.’

Havia coisas que eu precisava priorizar.

Eu precisava manter minha mentalidade consistente.

“Hm?”

Enquanto caminhava pelo campus, parei de repente. À distância, uma cena em particular chamou minha atenção. Quatro cadetes estavam circulando em volta de uma única pessoa.

‘É ela…’

Eu a reconheci instantaneamente.

Com seus longos cabelos platinados, expressão azeda e olhos vermelhos, ela se destacava facilmente.

Era uma das cadetes mais bem classificadas.

Kiera Mylne.

‘Por que ela está…?’

***

“Pense na nossa oferta. Se você se juntar a nós, teremos mais poder sobre o primeiro ano. Você poderá fazer o que quiser… Até fumar.”

A oferta parecia bastante tentadora.

Fumar… Fumar…

“Hmm.”

Sim.

“….Vou ter que recusar.”

“Hm?”

“O que você…?”

Kiera vasculhou os bolsos e tirou um cigarro, que rapidamente acendeu com o dedo.

Sopro!

Ela então soprou a fumaça na direção das quatro pessoas ao seu redor.

“Akh!”

“O que você está…!”

Kiera sorriu ao ver as expressões deles.

“Eu posso fumar de qualquer jeito. Que diabos eu me importo em me juntar a uma facção? É chato.”

Eles estavam perturbando ela há mais ou menos uma semana. Algo sobre se juntar à facção deles. Cada vez que ela recusava. No entanto, a persistência deles nunca cessava. Estava começando a irritá-la.

“Se vocês não têm nada melhor para fazer, por que não fazem algo mais produtivo, como respirar água? Confie em mim. Vocês me fariam um favor.”

Os rostos dos quatro cadetes ao redor dela ficaram vermelhos. Eles pareciam sem saber o que dizer, o que Kiera achou hilário, enquanto batia na coxa.

“Pfttt, vocês deveriam ver as caras de vocês. É ridículo pra caralho.”

E começou a rir sozinha.

“Kakaka.”

Só que… Sua risada não era das mais agradáveis de se ouvir. Eventualmente, porém, os quatro cadetes saíram do transe.

Um cadete alto com cabelo loiro cortado em estilo tigela e bochechas fundas deu um passo à frente. Ele franziu a testa enquanto olhava para Kiera.

Era óbvio, pela linguagem corporal deles, todos estavam desconfiados dela. Provavelmente por isso não haviam recorrido a qualquer violência ou ameaças.

“…..Vou perguntar de novo, você quer se juntar à nossa facção ou não? Será muito benéfico para você a longo prazo. Nós faremos de você a vice-líder, se quiser. Anders está determinado a tê-la em nosso grupo. Se você disser a palav—”

Sopro.

A fumaça soprou em seu rosto, forçando-o a parar no meio da frase.

Quando ele olhou para cima, viu um dedo do meio apontado para seu rosto.

“Por favor… Caiam fora.”

“Ah…”

O cadete abriu a boca e depois a fechou, rangendo os dentes.

“Você vai—”

“Você aí.”

Uma voz fria cortou o ambiente, e todas as cabeças se viraram.

“Quem…!”

As expressões de todos presentes ficaram tensas ao avistar a figura que se aproximava. Um simples olhar em seus olhos os compeliu a desviar o olhar, achando a intensidade neles avassaladora.

Com seu uniforme bem cuidado e expressão intimidadora, os quatro cadetes lutaram para se manterem compostos.

Ele era um enigma e alguém com quem ninguém queria se associar.

Tok.

Ele parou em frente ao cadete. Seu olhar desceu para encontrar os olhos dele.

“….Vocês são os que eu tenho ouvido falar?”

Até sua voz soava intimidadora.

“Sim?”

“Aquela coisa de facção.”

“Ah…”

O cadete engoliu em seco. Ele achou difícil se manter composto sob o olhar intenso de Julien.

Ele ainda conseguiu forçar um pequeno aceno.

“Sim.”

“…..Entendo.”

Julien calmamente fechou os olhos antes de murmurar.

“Seu líder, ou quem estiver no comando…”

“….!”

Todos os quatro cadetes olharam para Julien com os olhos arregalados. Ele não ligou para o olhar deles e continuou de forma direta.

“Faça-o me encontrar amanhã.”

Suas palavras…

Pareciam mais uma ordem do que um pedido.

“Falarei com ele amanhã.”

Era como se eles não tivessem o direito de recusar. E foi a intensidade com que ele os olhou que os fez incapazes de refutar, forçando-os a acenar calmamente antes de sair.

“…..”

Só quando eles saíram é que o silêncio caiu sobre o ambiente.

Kiera, que estava observando o tempo todo, franziu a testa e soprou a fumaça para longe.

Sopro

“O que foi isso? Você estava tentando me ajudar ou algo assim?”

Julien virou a cabeça, e seus olhos se encontraram.

‘É aquela expressão de novo…’

Aquela cheia de pena enquanto ele olhava para ela. Kiera cerrou os dentes em silêncio. Por que você está me olhando assim…? Justo quando ela estava prestes a dizer algo, ele a interrompeu.

“Eu não fiz isso por você.”

Julien disse, sua voz soando bastante baixa.

“…..Estou apenas assumindo a responsabilidade por uma vez. Prefiro lidar com isso agora do que esperar até que fique mais difícil de resolver.”

Ele olhou para ela mais uma vez, seus olhos caindo sobre o cigarro em sua mão.

Kiera franziu a testa, esperando que ele fizesse algo semelhante à última vez.

“O quê?”

Mas…

“Pare de fumar.”

Para sua surpresa, ele não insistiu no assunto e se virou para sair.

“…..Não é bom para você.”

Suas costas desapareceram lentamente de sua vista.

Olhando para ele, Kiera olhou para sua mão, onde estava o cigarro, e murmurou:

“Você acha que eu não sei?”

***

Já era noite quando Aoife terminou sua saída à biblioteca. Normalmente, ela não teria passado tanto tempo lá, mas, pensando na situação anterior, ela não teve escolha a não ser ficar.

…..Se ela tivesse saído no humor em que estava, temia que pudesse acabar matando alguém por acidente.

A lua pendia no céu noturno, iluminando o mundo abaixo.

Perdida em seus pensamentos, Aoife seguiu o caminho de volta ao dormitório. Era um caminho bonito.

A calçada de paralelepípedos era cercada por todos os tipos de flores, enquanto uma brisa suave varria o ar.

Era estranhamente agradável.

“….”

E então, uma figura apareceu à distância. Ele parecia suado e exausto.

“Leon…?”

Sua identidade ficou clara quando ele parou sob a luz de um poste. Como não ficaria, quando sua aparência se destacava tanto?

“Hm?”

Ele virou a cabeça, finalmente percebendo-a.

“Aoife?”

“….Você está voltando do treino?”

“Ah, sim.”

Leon acenou com a cabeça. Então, abaixando o olhar e focando nos livros em suas mãos, ele inclinou a cabeça.

“Biblioteca?”

“Sim.”

“Tão tarde?”

“Poderia perguntar o mesmo de você.”

“Certo…”

Leon coçou o lado da cabeça. Olhando para os livros, ele hesitou em perguntar.

“Precisa de ajuda?”

“Não.”

Uma recusa direta.

“Eu consigo carregar isso sozinha.”

Eram só tipo, um… dois… três…. oito livros?

“Oh.”

Embora ele não mostrasse em seu rosto, ele parecia um pouco duvidoso. Mas ele ainda assim recuou e limpou o suor da testa.

Aoife calmamente acelerou o passo para alcançá-lo, quando…

“Oh.”

Baque.

Um dos livros caiu por causa de sua falta de cuidado. Ou melhor, ela simplesmente não estava prestando atenção. Com seus reflexos, ela poderia facilmente ter evitado tal situação.

“Eu pego.”

Leon se ofereceu para ajudar e se abaixou para pegar o livro.

“Um livro em inglês…?”

“Uh? Ah, sim…”

Era um dos livros que Julien havia deixado em sua mesa. Ela estava curiosa sobre ele. Para ele ser tão bom em inglês, certamente havia uma razão. Portanto, depois de pensar sobre isso, ela decidiu pegar aquele livro.

Embora não gostasse particularmente dele, ela tinha que admitir que ele era competente. Seu objetivo era se tornar a melhor.

Portanto, ela precisava aprender coisas com os melhores.

“Língua difícil.”

Leon olhou casualmente para a capa do livro, seus olhos apertando levemente enquanto tentava decifrar o significado do título. Só para seu corpo inteiro congelar no segundo seguinte.

“Leon…?”

Percebendo uma mudança em seu comportamento, Aoife inclinou a cabeça. O que há de errado com ele?

“….Onde você conseguiu isso?”

Sua voz saiu calma. Estranhamente calma.

“Onde eu consegui isso? Eu peguei na biblioteca…”

“Ah. Entendi.”

Ele acenou calmamente.

Então, ele o devolveu a ela.

“Queime isso.”

“….?”

Isso era uma piada?

Aoife pensou isso no início, mas quando olhou para o rosto dele, não pôde deixar de ficar surpresa.

Ele parecia sério. Quase desesperado.

“Só…”

Seus olhos tremiam. Ele parecia abalado.

A estupefata Aoife estreitou os olhos e olhou cuidadosamente para Leon.

‘O que é…’

“…..Nunca dê isso para o Julien.”

“Sim?”

Mais uma vez, Aoife ficou surpresa.

Mas eu peguei isso com ele…

“Nunca.”

Ele enfatizou antes de se desculpar e sair, deixando-a parada, boquiaberta. Enquanto ele saía, ela acabou ouvindo seus murmúrios: “Livro amaldiçoado…”

“Que tipo de situação é essa…?”

Aoife franziu a testa e finalmente prestou atenção no livro. Ela não havia prestado atenção no título antes, já que só o pegou por pegá, mas agora estava intrigada.

Que tipo de livro poderia deixar Leon tão abalado?

Seus olhos se estreitaram enquanto ela traduzia o título.

“….!”

Logo, o título ficou claro para ela. E sua expressão mudou.

: | 145 Piadas que vão te fazer rolar no chão de tanto rir.¹

Era um livro de piadas.

“Que tipo de—”

1. NUNCA DÊ MESMO[↩]