Capítulo 467: Bebida [5]
“Quem…!?”
A cabeça de Ivan se virou bruscamente, sua mana pulsando para fora enquanto todo o seu corpo se tensionava, preparado para uma luta. Os pelos em sua nuca se arrepiaram, e seu punho se cerrou com força.
Um desconhecido senso de pavor apertou seu coração.
Quando ele olhou para trás, sua expressão mudou ao perceber que não havia ninguém atrás dele.
“…Uh?”
Suas sobrancelhas se franziram.
‘Eu estava imaginando coisas?’
Não, como poderia ser? Ivan era paranoico, mas não era delirante. Ele entendia que algo sinistro estava acontecendo.
Estava influenciando sua mente e linha de pensamento.
Talvez tudo o que estava acontecendo com ele fosse resultado dessa influência.
“Sim, essa é a única explicação.”
Ivan cerrou os dentes e virou a cabeça para frente, sua respiração presa no peito ao avistar uma figura diante dele. Sentada à sua frente, tão familiar como sempre, estava Clara — sua assistente. Com seus cabelos castanhos e óculos de aros ovais, ela era uma presença que ele conhecia muito bem.
Seus olhos tremeram ao vê-la, mas ele rapidamente se recompôs.
“Quem é você?”
Seu tom era neutro, e era possível sentir a temperatura do ambiente cair.
Engolindo em seco, Ivan encarou Clara, que sentava à sua frente. Com um simples sorriso no rosto, ela riu.
“Você já sabe quem eu sou, mas isso não é importante.”
“Não importa…?”
“Sim, não é.”
Clara empurrou a bebida para frente.
“Você devia beber.”
O rosto de Ivan congelou por um instante, mas então tudo se encaixou. Todas as peças do quebra-cabeça se juntaram, e ele finalmente entendeu o que estava acontecendo com ele.
“Hah, esse é o seu objetivo? Me fazer beber?”
Um sorriso irônico surgiu nos traços de Ivan. O medo e hesitação anteriores desapareceram de seu rosto enquanto ele se sentava. Ao mesmo tempo, começou a se preparar para capturar a figura à sua frente.
Ele sabia que ela não estava fisicamente ali, mas talvez pudesse descobrir algo se jogasse bem suas cartas.
Foi por isso que decidiu continuar a conversa.
“Fazer você beber?”
Recostando-se na cadeira, Clara cruzou os braços e as pernas. Todo o seu comportamento e maneirismos eram completamente diferentes da Clara que Ivan conhecia. Apesar de saber que ela estava morta, aquilo ainda o perturbava.
“Você pode mudar sua aparência?”
“Minha aparência?”
“Sim, eu sei que você não é ela. Ela está morta.”
“Morto por você.”
Crack
A mandíbula de Ivan se apertou, e Clara riu. Apoiando a mão no rosto, seus traços se distorceram. Com um leve ‘crack’, suas feições mudaram. Seu nariz cresceu, seu queixo se afiou e suas sobrancelhas engrossaram. Em instantes, Ivan sentiu como se estivesse olhando para seu próprio reflexo.
Não havia falhas na aparência, e sua expressão se tornou tensa.
“Que tal assim?”
“Volte ao normal.”
Clara riu, seus traços voltando ao que eram antes.
Só então Ivan relaxou um pouco. Mas, ao mesmo tempo, seu coração se apertou. Um certo título ecoou em sua mente, e ele sentiu sua boca secar: ‘Aquele que caminha entre nós’.
“Bem, aparências à parte. Eu realmente estava tentando fazer você beber.”
“…?”
Pausando, Ivan olhou para Clara antes de seus lábios se curvarem.
‘Como esperado.’
Sendo tão óbvio em suas intenções, como ele não acharia a situação engraçada?
Como Ivan sabia das intenções dele, estava ainda mais certo em sua decisão de não beber.
No momento em que bebesse, seria o momento em que perderia.
Ele não ia perder.
Clara permaneceu imperturbável pelo sorriso de Ivan enquanto se inclinava para frente, abrindo a tampa da caixa de madeira para revelar a garrafa de vinho dentro. Com um movimento suave, ela a abriu, e um aroma rico e frutado encheu o ar. Como se fosse combinado, duas taças de vidro apareceram do nada.
Em um movimento rápido, ela encheu ambas e pegou uma para si. Aproximando a taça dos lábios, ela perguntou gentilmente:
“Por que você acha que as pessoas bebem?”
“…Porque é agradável.”
“Agradável?”
Tomando um gole, um leve sorriso surgiu nos lábios de Clara.
“Sim, pode-se dizer que essa é uma das razões. Algumas pessoas realmente bebem por prazer, mas…”
Colocando a taça de volta, Clara olhou diretamente para Ivan.
Seus olhos pareciam perfurar a alma dele, forçando um calafrio a percorrer seu corpo.
“…a maioria bebe para esquecer.”
Os olhos de Ivan se estreitaram, seu coração se apertando um pouco.
“Sim, há isso.”
“Você costumava beber para esquecer?”
“Onde você quer chegar com isso?”
A voz de Ivan subiu involuntariamente, o mana ao seu redor pulsando com mais intensidade. Vendo isso, Clara levantou ambas as mãos.
“Uau, acalme-se. Não precisa ficar bravo. Não estou tentando antagonizá-lo. Só quero conhecê-lo melhor.”
“Ah, besteira. Você acha que não sei que tipo de escória você é? Seja lá o que estiver tentando fazer, sei que não é nada bom. Não vou cair no seu jogo.”
“Haha, sinto muito que você pense assim.”
Clara não pareceu nem um pouco incomodada pelas palavras de Ivan. Na verdade, ela estava se deleitando com a cena. Porque… das seis esferas coloridas escondidas dentro do corpo de Ivan, a vermelha começou a crescer.
“Eu só estava falando sem pensar. Se não quer falar sobre seu passado, não precisamos. Não importa mesmo, certo? Tenho certeza que você bebia para esquecer todas as coisas horríveis que deve ter vivido. Mas agora que está no topo, não está mais preso pelas mesmas coisas que o faziam beber. Você está livre. Você é quem faz os outros passarem pelo que você passou, não é?”
“O quê?”
Que tipo de absurdo era esse? Ele fazer os outros passarem pelo que ele passou?
Era verdade que ele estava livre, mas nunca forçou ninguém a fazer algo que não quisesse.
“Aposto que os que o forçaram a se tornar o que você é também pensavam assim. ‘Eu nunca o forcei a fazer nada que ele não quisesse. Ele fez tudo por vontade própria.'”
Ivan levantou a cabeça, seus olhos tremendo.
“O que você disse? Como você sabe o que estou pens—”
“As coisas que os outros ‘forçaram’ você a fazer não eram realmente coisas que você foi forçado a fazer, não é? Se quisesse, poderia ter desistido, certo?”
“Não, isso… Haa…”
A respiração de Ivan ficou mais pesada sem que ele percebesse.
“Você bebia não porque queria esquecer o que os outros o faziam fazer, mas porque queria esquecer que estava disposto a matar todas aquelas crianças e famílias para se tornar um monarca.”
“Não, isso não é verdade. Eu fiz isso porque, se eu não fizesse, outro faria. Se fosse eu, pelo menos poderia minimizar as perdas. Agora que estou no topo, ninguém pode me forçar a fazer essas coisas de novo. Estou livre. Posso fazer o que quiser.”
“Livre?”
Os cantos dos lábios de Clara se curvaram ainda mais.
Uma expressão visível de diversão surgiu em seu rosto.
“O quê? O que há de tão engraçado?”
“Nada, nada.”
Balançando a cabeça, Clara tomou outro gole. A esfera vermelha no peito de Ivan cresceu mais uma vez, e sua voz ecoou pela sala.
“O que é?! O que há de tão engraçado?!”
As janelas tremeram com a intensidade e volume de sua voz.
Franzindo os lábios, Clara afastou a taça e balançou a cabeça.
“Eu ri porque você acha que está livre.”
“O quê…? Eu estou livre. Do que você está…?”
“Quando foi a última vez que você teve um tempo para si mesmo?”
“I-isso.”
Ivan gaguejou ao tentar pensar em uma resposta. No entanto, foi com desânimo que percebeu que sua mente estava em branco. Tentou se lembrar da última vez que tivera um tempo só para si, mas não conseguiu.
Tempo para si mesmo… Quando foi a última vez?
Quanto mais ele pensava, mais sua mente ficava vazia.
“Então não consegue lembrar.”
Erguendo a cabeça, Ivan notou que o sorriso de Clara estava ainda mais largo. Agora alcançava suas bochechas. Era assustador, e quase o fez querer atacá-la ali mesmo.
E, no entanto, no momento em que esses pensamentos surgiram, desapareceram tão rápido quanto vieram.
Era como se…
Suas emoções estivessem sendo cuidadosamente controladas, de modo que, quando sua raiva e medo chegavam ao ápice, eram suprimidos o suficiente para impedi-lo de agir.
Ivan entendia isso, mas não podia fazer nada.
Ele…
“Você diz que está livre, mas está mesmo? Trabalha o dia todo, sem tempo para si. Não tem esposa. Não tem filhos. Sua vida é vazia. Não, não é bem vazia.”
Clara baixou o olhar para as mãos dele.
Seguindo sua linha de visão, Ivan também olhou para baixo, e sua expressão mudou drasticamente.
“O quê…?”
Olhando para suas mãos, tudo o que via era uma mancha infinita de sangue. Algo que sentia que não podia lavar, e dentro do sangue, via rostos. Todos familiares. De crianças a mulheres, e criminosos que havia matado.
Todos estendiam as mãos para ele, implorando por piedade.
‘Socorro!’
‘P-por que está fazendo isso conosco?’
‘Seu monstro…!’
A respiração de Ivan ficou extremamente acelerada.
Ao mesmo tempo, a voz de Clara continuou a ecoar em seu ouvido como um sussurro suave.
“Você pode não estar mais matando, mas o sangue que seus subordinados derramam está em suas mãos. O que você os faz fazer é o que seus antigos chefes faziam com você. Você buscou liberdade, mas só chegou ao topo da gaiola que tentava escalar. Na verdade, está mais preso do que nunca.”
“Não, isso não…”
“Não é verdade?”
Os ouvidos de Ivan formigaram ao ouvir uma risadinha suave.
“Acha que não é verdade? Olhe ao seu redor.”
Levantando a cabeça com rigidez, Ivan sentiu seus pulmões se apertarem. Tudo o que via era seu escritório. Nada havia mudado, mas de repente, o lugar parecia menor do que nunca.
“Com que frequência você sai daqui? Quanto do mundo exterior você viu além desta sala nos últimos anos? Este lugar…”
Pisca!
Com um piscar de olhos, Clara apareceu bem à sua frente, uma taça na mão.
“…É a sua gaiola.”
Ivan balançou a cabeça, querendo negar, mas olhando ao redor, as paredes pareciam se fechar ao seu redor. Ele sabia que era uma ilusão, mas ao mesmo tempo, parecia tão real.
Do batimento acelerado de seu coração ao sussurro suave em seus ouvidos.
Tudo parecia tão… vívido.
“Que vida. Eu também gostaria de esquecer. Então… por que se impedir?”
Estendendo a mão, o sorriso de Clara alcançou suas bochechas, parecendo assustadoramente largo.
“Beba.”
Deixe-se esquecer.

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