Capítulo 82: Preparação para o festival [1]
A semana continuou assim.
Toda noite, no mesmo horário, eu ia até a entrada da Academia, onde era levado para a caverna onde…
“Ugh.”
Suprimi um gemido e enrolei meu braço. Sangue escorria, tingindo o pano de vermelho.
“…..Por quanto tempo tenho que fazer isso?”
Olhei ao meu redor. Estava escuro, mas conseguia ver as dezenas de cadáveres espalhados pelo chão. Um cheiro pútrido pairava no ar, forçando-me a fazer caretas às vezes.
Apesar das muitas horas que passei neste lugar, ainda não conseguia me acostumar com o cheiro.
Era tão forte.
“Uff.”
Respirando fundo, suprimi a dor e me levantei. Olhando para meu relógio, suspirei e estendi a mão.
Fios finos, quase imperceptíveis, se espalharam a partir do meu antebraço, circulando cada dedo antes de se moverem para a área ao meu redor. Escondendo-se nas fendas e rochas espalhadas pelo local.
Era difícil enxergar na escuridão, mas estava me acostumando.
“Dez…”
Comecei a contar regressivamente.
“Nove… Oito… Sete… Seis… Cinco… Quatro…”
A cada dez minutos que passavam, um novo grupo de monstros aparecia.
“Três…”
Era o quinto grupo do dia.
“Dois…”
E o último grupo do dia.
“Um.”
Kiiii—! Kiiii—!
Uma cena a que eu já começava a me acostumar. Mais de uma dúzia de figuras apareceram no fundo da caverna. Suas silhuetas se misturavam perfeitamente com a escuridão, tornando difícil distingui-las.
Mas… isso não tinha importância.
Levantei levemente a mão direita.
Toc. Toc. Toc.
Passos leves e apressados.
‘Pequenos…’
O som revelava o tamanho das criaturas. Pela frequência e peso, não pareciam ser muito grandes.
“….”
Esperei.
Toc. Toc. Toc.
O som se aproximava.
Estavam a apenas alguns metros de mim. Sua velocidade aumentava. Mesmo assim, não fiz nada. Aguardei em silêncio que chegassem mais perto.
Clanc. Clanc.
Correntes envolveram minha mão esquerda enquanto a levava para frente.
O brilho roxo fraco ao redor do meu braço esquerdo oferecia uma breve visão do caminho à frente. Lá, pairou uma mandíbula colossal adornada com incontáveis fileiras de dentes curvados para dentro.
“Ah… Droga.”
Clanc—!
Assim que meus olhos pousaram na criatura, faíscas crepitaram no ar, iluminando sua forma para que eu pudesse vê-la melhor.
Kiiii—!
Ela mordeu as correntes com ferocidade, fazendo-me recuar instintivamente vários passos.
Antes que eu pudesse processar a chegada da primeira criatura, outra surgiu, piorando a situação já precária.
“Ugh…!”
Mal consegui mover a mão para fazê-la morder as correntes.
Clanc—!
Fui empurrado novamente vários metros para trás.
Quando consegui me estabilizar, usei os poucos segundos que tinha para observar melhor as criaturas.
Como esperado.
“Um rato…”
Malditos ratos.
Kii! Kiii—
Seus passos se aceleraram, e eu sabia que estava prestes a ser cercado. Não que eu não quisesse que isso acontecesse. Na verdade, estava esperando por isso, enquanto cerrava a mão direita.
Puchi!
Sangue jorrou para todos os lados enquanto as bestas gritavam de dor e os fios que eu havia preparado se manifestaram.
“Ahhh… Ahhh…”
Fiquei imediatamente sem fôlego no momento em que ativei os fios. No entanto, sabia que não podia parar.
Ainda não.
“Kh…”
Estendi a mão esquerda, fazendo as correntes se espalharem enquanto afastava os dois ratos agarrados a elas.
Kii! Kiii—
Seus olhos vermelhos me encaravam ferozmente enquanto se agachavam sobre as quatro patas, seus pelos eriçados em alerta.
No meio do caos, os outros roedores estavam mortos ou lutando para se reerguer.
Arranhados pelos fios, as criaturas, já enfraquecidas pela maldição de [Mãos da Enfermidade] entrelaçada com os fios, pareciam vacilar toda vez que tentavam se levantar.
“Tsc…”
Olhando para minha mão esquerda e vendo as marcas de sangue nela, cliquei a língua.
“….Ainda há muito trabalho a fazer.”
Avancei, levantei a mão direita e convoquei as correntes, que ficaram penduradas em meu punho.
Sentindo o perigo iminente, os dois roedores saltaram em minha direção com ferocidade.
Pena que eu era mais rápido.
Clanc—
Com um golpe rápido, acertei ambos os roedores, fazendo-os vacilar momentaneamente.
Sem hesitar, segui com outro golpe, transferindo suavemente as correntes para a mão esquerda, mantendo meu movimento fluido com passos cuidadosos.
Kiiiiik!
O que se seguiu ao golpe foi um grito agudo, seguido por um silêncio familiar pouco depois, enquanto eu respirava pesadamente.
“Ahhh… Ahhh…”
Tum.
Caí de joelhos e segurei meu peito. Minha visão estava embaçada, e mal conseguia me concentrar.
Apesar disso, não baixei a guarda e continuei olhando para os monstros no chão.
Nenhum deles se mexia, estando em pedaços ou imóveis.
Mesmo assim, continuei encarando-os.
“….”
O silêncio parecia sufocante, e eu engoli em seco.
‘Estão todos mortos, certo…?’
Pareciam estar.
Kiii—!
Mas a realidade era diferente dos meus pensamentos. Do nada, como se tivessem sido injetados com alguma droga estranha, um dos roedores se levantou abruptamente e saltou sobre mim com toda a força.
“….”
Eu estava preparado para essa situação.
Com um movimento casual da mão, o roedor se partiu em dois.
Tum.
“Ahhh…”
Só então suspirei aliviado e relaxei.
“….Já aprendi minha lição uma vez.”
Lembrei do primeiro dia de treinamento. Lembrei de quanto tinha sofrido. Esses malditos… Eles eram astutos.
Extremamente.
Se não fosse pelo fato de Delilah estar presente, temia que teria passado algumas semanas na enfermaria.
Ploc…! Ploc!
Virando a cabeça, olhei para meu braço esquerdo, que sangrava em dois pontos.
“Achei que tinha me protegido bem…”
No final, um dos monstros ainda conseguiu me morder.
Foi um pouco decepcionante, mas comparado à primeira vez, quando fui mordido por todo lado, estava me saindo consideravelmente melhor.
“Uff.”
Lentamente, recuperei o fôlego.
Finalmente tinha terminado por hoje. Me sentia cansado, e cada parte do meu corpo doía.
Recostando-me no chão duro, olhei fixamente para o teto da caverna. Estava escuro, mas conseguia vê-lo vagamente.
Ploc. Ploc.
Suavemente, a água escorria das rochas suspensas, seu ritmo calmo pontuado pelo rugido distante da cachoeira ecoando ao fundo.
Fechei os olhos e deixei os sons entrarem em minha mente.
Uma imagem se formou, e eu me deleitei com o som.
Naquele momento, deixei minha mente mergulhar profundamente em si mesma. Por apenas um breve instante…
Me senti em paz.
***
No dia seguinte.
Os preparativos para o festival estavam a todo vapor. Com apenas uma semana e alguns dias restantes, o campus estava extremamente movimentado.
“Aqui está. Certifique-se de praticar este roteiro. Eu o revisei para se adequar melhor a você. Se tiver alguma dúvida, sinta-se à vontade para perguntar.”
“…..”
Peguei o roteiro sem dizer nada.
Revisou para se adequar melhor a mim?
Que tipo de…
“Você já deve ter uma ideia de quem Azarias é ou era no roteiro. O conceito permanecerá o mesmo. Ele é um psicopata que anseia pela morte de suas vítimas, mas há uma reviravolta.”
A mulher, que se chamava Olga…? Não tinha certeza, mas me referi a ela como ‘escritora’, e ela começou a explicar o enredo e a ideia geral por trás do personagem que havia escrito.
Quanto mais ela explicava, mais eu me convencia.
‘….Não consigo fazer isso.’
Já era um milagre eu ter conseguido performar a primeira parte do roteiro, mas enquanto folheava o script, tinha dificuldade em visualizar as emoções e expressões do personagem.
Ele era…
Um psicopata completo. Alguém que matava por matar.
Ele ansiava pela emoção que vinha com a morte de suas vítimas.
‘Como vou interpretar isso?’
Enquanto percorria o roteiro, tentando me imaginar incorporando o personagem, encontrei uma barreira persistente que me impedia de mergulhar completamente na cena.
Apesar das tentativas repetidas de visualizar o cenário, eu não conseguia habitar autenticamente a persona do personagem ou transmitir eficazmente as emoções e ações escritas no roteiro.
“Você consegue fazer isso…?”
Ouvindo as palavras da escritora, apertei os lábios.
Eu conseguia?
A resposta simples era não. Eu não conseguia.
No entanto…
Eu ia fazer?
Essa resposta era óbvia.
“Sim.”
Pelos créditos, eu tinha que fazer.
“Ótimo. Mal posso esperar para ver sua performance.”
***
Dentro do Salão Leoni.
Estava uma correria. Com a data do festival se aproximando, os cadetes e a equipe estavam ocupados preparando todos os adereços e equipamentos no palco.
Como hoje seriam anunciados os cadetes que seriam extras na peça, havia uma atmosfera palpável de empolgação.
“…..Sim, terminei.”
Um desses cadetes ansiosos pela seleção era Aoife.
Ela havia se inscrito uma semana atrás, quando as audições estavam abertas. Seu papel era o de uma extra que deveria morrer no início da história.
Seu assassino era supostamente um psicopata aspirante.
Não era um papel importante, mas para ganhar créditos extras, ela estava disposta a aceitá-lo.
Seu plano de se tornar uma Guia falhara, e como não podia fazer isso, esta era a segunda melhor opção.
‘Preciso conseguir esse papel.’
“Você também está esperando seu resultado, Aoife?”
“Hm?”
Aoife virou a cabeça. Um homem alto com cabelos loiros claros e olhos castanhos apareceu em seu campo de visão. Ele usava um sorriso suave ao se dirigir a ela.
Pelo uniforme, parecia também ser um cadete. Um veterano, provavelmente.
“Ah, sim.”
Aoife acenou casualmente, sem demonstrar muito interesse.
Não, ela não tinha interesse. A única coisa em sua mente era a seleção.
‘Vou conseguir o papel, certo…?’
Lembrou-se das expressões dos juízes durante sua performance.
Foram geralmente positivas. Pelo menos, era o que ela achava.
“Haha, que legal. Eu também espero conseguir um papel. Quero ser Azarias. É um papel bem interessante. Acho que vou conseguir interpretá-lo perfeitamente.”
Ao seu lado, o veterano começou a tagarelar sobre si mesmo e o papel que escolhera.
“Na verdade, estou bastante confiante em conseguir o pa-“
“Se me dá licença…”
Sem olhar, Aoife começou a se afastar dele. Pelo caminho, inventou uma desculpa qualquer.
“Alguém está me chamando.”
Aoife saiu logo em seguida, deixando o veterano pendurado.
Ela não tinha tempo para conversas inúteis que só acabariam com ela descobrindo que ele se aproximara com segundas intenções.
Já passou por isso, já superou.
***
Enquanto Aoife saía, o olhar do veterano permaneceu em sua figura recuando, sua expressão gradualmente se contorcendo com uma emoção difícil de discernir.
Seu olho esquerdo estremeceu levemente, enquanto uma certa loucura ameaçava transbordar.
“Oh, não.”
Ele mal conseguiu se conter enquanto coçava o lado do pescoço.
Arranha. Arranha. Arranha.
“….Ainda não. Ainda não.”
Resmungou baixinho enquanto encarava o membro do coletivo que se aproximava. Presumivelmente a pessoa que anunciaria o resultado dos papéis.
Massageando o rosto, um sorriso caloroso gradualmente voltou a seu rosto.
Ainda não era hora.
Ele precisava ser paciente. Ele certamente conseguiria o papel. O mesmo valia para ela.
Dois papéis contrastantes, que marcavam o fim do começo de seus personagens. Tais eram seus papéis.
….O palco estava sendo preparado.
Pois ele realizaria o maior ato na maior mudança.
Um ato para surpreender a plateia.
Um que seria lembrado para sempre por todos.
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