Capítulo 92: Um mundo sem cor [1]
A cena tirou o fôlego da plateia.
Da atuação realista de Aoife como uma jovem desesperada até o homem que ficava a alguns passos dela.
[Haaa… Haaa… Não, por favor…]
A voz de Aoife soava clara e suave. Os tremores sutis em seu tom, somados ao leve tremor de seu corpo, criavam uma representação extremamente realista.
Sua atuação era tão imersiva que a plateia se sentou ereta em suas cadeiras.
Mas, embora sua atuação fosse fenomenal, o homem diante dela era o verdadeiro centro da peça.
Parado a alguns metros de distância, ele emanava uma aura opressiva.
Dentro do mundo cinza, apenas ele capturava os olhos de todos.
[…..]
Só de estar ali, parecia que toda a sala estava em suas mãos, lentamente apertando suas gargantas.
Tok—
O som suave de seus passos quebrou o silêncio que dominava o teatro, fazendo alguns espectadores se encolherem.
O mesmo aconteceu com Aoife, que recuou, suas costas pressionando a parede atrás dela.
[O-o que você está fazendo….!?]
Representando desespero, os olhos de Aoife tremiam.
[…..]
Novamente, não houve resposta.
A única coisa que a plateia podia ver era a loucura em seu olhar.
Tok—
A cada passo que ele dava, o ambiente ficava mais tenso.
Tok—
Por algum motivo…
Tok—
A cada passo que ele dava…
Tok—
A plateia sentia seus corações acelerarem junto.
[…..]
Ele finalmente parou diante de Aoife, que parecia ter perdido as palavras. O medo a dominara completamente.
Foi então que Julien, não, Azarias, finalmente abriu a boca para falar.
[…..A base de toda obra-prima é um grande começo.]
Assim como nos testes, suas palavras fluíam suavemente, entregues em um tom calmo e uniforme.
No entanto, sob a calma, havia um traço de loucura, sutilmente velado, mas perceptível no leve tremor que acompanhava certas palavras.
Isso arrepiava a plateia.
Aoife também sentiu o mesmo ao olhar para Azarias, sentindo todo vestígio de Julien desaparecer nele. Ela realmente estava… diante de um psicopata.
‘Ah, isso…’
O fato de ela achar tão difícil falar era a prova perfeita disso.
Ele era simplesmente…
Esmagador.
[Todos os artistas desejam criar suas próprias obras-primas. Eu não sou diferente.]
Seu rosto mudou sutilmente enquanto olhava em volta.
Parecia estar falando com alguém. Emily? A plateia?
[Quero criar uma obra-prima. Uma peça que será sinônimo do meu nome.]
…Ou consigo mesmo?
Baixando a cabeça, ele olhou para as mãos.
Elas tremiam. No silêncio que se seguiu às suas últimas palavras, ele ergueu a cabeça para encarar Aoife, que de repente perdeu o fôlego.
Como podia…
[….E assim, o primeiro traço dessa obra-prima será a sua própria vida.]
Pela primeira vez desde o início, sua expressão se transformou completamente.
Seu peito começou a subir rapidamente, enquanto o tremor em suas mãos se intensificava.
De onde estavam sentados, a plateia podia sentir exatamente o que ele sentia.
“Êxtase.”
Delilah murmurou sem perceber.
Antes que soubesse, ela também havia sido absorvida pela peça. Normalmente, esse tipo de coisa a entediava. Quem diria?
‘É interessante…’
Não apenas a atuação, mas a história. Mesmo agora, ela não entendia o motivo por trás das ações de Azarias.
Era claro que ele era um psicopata, mas até psicopatas tinham objetivos e motivações.
Ela tinha certeza de que Azarias tinha suas próprias razões.
Mas qual era exatamente sua motivação?
Prazer?
[Akh…! Akh!]
A cena da morte veio logo em seguida.
Com ambas as mãos no pescoço de Aoife, ele apertou. Muitos na plateia desviaram o olhar.
Não havia muito barulho, mas a imagem falava por si.
[Ukh… Soco-rro!]
A luta continuou enquanto Aoife agitava as mãos e arranhava os braços de Julien. Mesmo assim, sua resistência era inútil.
[Kh! Akh!!]
Aos poucos, seus movimentos desaceleraram, e seu rosto ficou roxo.
A cena era de partir o coração. Especialmente pelo desespero absoluto em seu rosto.
Até que…
Ela caiu mole.
[…..]
Azarias permaneceu imóvel, suas mãos ainda em seu pescoço, sem dizer uma palavra.
Finalmente, ele a soltou.
Baque.
E ela desabou no chão.
[Haaa…. Haa….]
O som de sua respiração ofegante ecoou enquanto ele ficava em silêncio, a cabeça baixa, encarando o corpo sem vida.
Ficou claro para a plateia que sua respiração não era ofegante por cansaço, mas por algo mais…
Loucura.
Uma loucura nítida, prestes a consumi-lo.
E então…
Clank. Clank. Clank.
Passos apressados ecoaram. De repente, várias figuras apareceram no fim do beco.
Quatro, cinco?
Vestindo armaduras, pareciam cavaleiros.
No exato momento em que apareceram, Julien virou a cabeça e os encarou. Não, ele estava sorrindo…? Os cantos de seus lábios se ergueram levemente, tremendo, até que ele soltou uma risada suave.
[Então, chegaram.]
Era uma risada que continha tanto desdém quanto zombaria. A plateia inclinou a cabeça, questionando.
‘Ele os esperava?’
‘….O que está acontecendo? Por que parece que ele já sabia que viriam?’
De repente, o olhar de Azarias ficou vazio, e a loucura que ameaçava transbordar começou a escapar.
Era uma visão que gelou os ouvintes.
Imediatamente, um dos cavaleiros investiu contra ele, brandindo sua espada.
Clank—!
O som metálico alto ecoou quando a lâmina atingiu o chão duro.
‘O que está acontecendo?’
A plateia ficou pasma com o barulho. Por um momento, acharam que o golpe era real.
Mas, na verdade, o cavaleiro realmente golpeara.
‘…..Começou.’
O único não surpreso era Julien, que encarou os cavaleiros com frieza. Olhando para eles, percebeu algo errado em seus olhares. Eram vazios, distantes.
‘Eles vieram por ela.’
Era óbvio que o alvo era Aoife, caída atrás dele.
Shiiing—!
Desembainhando uma adaga escondida, Julien enfrentou os cavaleiros.
Enquanto isso, um sorriso genuíno surgiu em seus lábios. Não era falso. Vinha de dentro dele.
[Ha-]
Ele apontou a adaga e sussurrou suas falas.
[….Um complemento à minha obra-prima.]
Fios quase imperceptíveis saíram de seu antebraço, rastejando pelo chão em direção aos cavaleiros.
Com seus sentidos entorpecidos, Julien conseguiu envolver seus tornozelos e braços com os fios.
O processo levou segundos, e logo os cavaleiros correram para ele.
[Hahaha!]
Uma risada escapou dos lábios de Julien enquanto ele dava um passo para trás, evitando um golpe.
Swoosh—!
Ele se abaixou, desviando do próximo.
Seus movimentos eram fluidos, quase perfeitos, enquanto ele esquivava de todos os ataques com graça.
Observando a cena, alguns espectadores apertaram os braços de suas cadeiras. A coreografia era espetacular, com os golpes quase o atingindo.
Se ao menos soubessem que tudo estava sendo orquestrado por Julien.
Puxando os fios no momento certo, ele alterava o curso dos ataques, controlando tudo como quis.
Apenas alguns na plateia perceberam isso, franzindo a testa.
Swoosh—!
Desviando de outro golpe, os lábios de Julien tremeram quando ficou cara a cara com um cavaleiro. Ele brandiu a adaga, e…
Puchi!
Jorrou sangue.
De repente, um vermelho vivo rompeu a monotonia cinza, criando um contraste chocante.
Olhando para isso, os lábios de Azarias tremeram ainda mais. Uma onda estranha de excitação percorria sua mente. Mais… Ele queria mais. A loucura que o consumia distorceu seu rosto.
Puchi! Puchi!
[Mais….!]
Vermelho respingou no mundo cinza.
Em sua loucura, Azarias parecia ter se perdido, enquanto continuava a esfaquear. Sua expressão era de puro prazer, como uma criança brincando.
Corta. Corta. Corta—!
“Isso…”
Incapazes de suportar a cena, alguns espectadores cobriram a boca, e sussurros surgiram.
“Ele não está realmente matando eles, está?”
“Não pode ser…”
“Mas por que parece tão real?”
A plateia não foi a única a achar isso real. Os escritores e organizadores também pareciam perdidos na atuação.
“Isso… Tem certeza que é atuação?”
“Aquilo.”
Olga olhava para o palco em transe. Embora sentisse algo errado, não conseguia desviar os olhos de Azarias.
Ele estava…
“Perfeito.”
A cena estava…
“Perfeita.”
Tudo estava…
“Perfeito.”
Não havia outras palavras para descrever o que via. Capturar perfeitamente a loucura e o êxtase que ele sentia… Era simplesmente perfeito.
Apenas os mais poderosos perceberam algo errado, franzindo a testa.
“É algum novo método de atuação?”
Eles sabiam que os cortes eram reais.
Delilah também percebeu, examinando Julien. Ele parecia perdido em sua loucura, manipulando os cavaleiros com seus fios.
Não era a primeira vez que os via, mas a forma inteligente como os usava a impressionou.
Que poder interessante…
“….Deve estar tudo bem.”
Ninguém reagiu porque os cortes não pareciam letais. Eram superficiais.
[Hahaha!]
A cada golpe, ele mergulhava mais fundo na loucura. O mundo cinza gradualmente se tingia de vermelho.
Era uma visão perturbadora.
Especialmente quando…
Baque. Baque. Baque.
[Haa…]
Ficou difícil dizer se ele ainda atuava.
Parado no centro do beco, sua cabeça baixou, e o mundo congelou.
O tempo todo… Outra pessoa estivera presente.
Era Joseph, que observara tudo de onde estava. A presença de Julien fora tão avassaladora que quase todos o esqueceram.
[…..]
Um silêncio pesado e sufocante se seguiu.
Com seu olhar fixo em Azarias, a voz rouca do detetive quebrou o silêncio.
[…Era você.]
Cli Cla—
As luzes se apagaram em seguida.
Ficaram assim por alguns segundos antes de voltarem.
Quando retornaram, o cenário havia mudado. O mundo não era mais cinza, e Azarias havia sumido.
Joseph estava de volta à floricultura.
A visão terminara.
Parado no meio da loja, ele ficou em silêncio por alguns segundos.
[Haa.]
Respirando fundo, seu corpo tremia. Era claro para a plateia que ele fora afetado pelo que vira.
Eles entendiam seu sentimento.
O que tinham acabado de ver…
Era difícil de digerir.
Mas não acabara. Agora que encontrara o culpado, ele precisava ir.
[….Tenho que ir.]
Embora dissesse isso, ele não se movia.
Ficou claro para todos que seu corpo se recusava a obedecer. O medo dominara sua mente.
[Preciso ir.]
Só quando repetiu as palavras várias vezes é que ele saiu da loja e voltou para a casa familiar.
Ao chegar à porta, surpreendeu-se ao vê-la aberta.
[Elbert.]
Chamou seu assistente, mas não obteve resposta.
Respirando fundo, ele entrou. Precisava agir calmamente. Azarias não sabia que ele o conhecia.
Ou assim pensava…
[Ah…]
Entrando na casa, Joseph parou, seu corpo congelando.
Não apenas ele. Toda a plateia também paralisou ao ver o homem no centro, um corpo imóvel a seus pés.
Enrolando as mangas casualmente, Julien olhou diretamente para Joseph, não, para a plateia, e sorriu.
[….Finalmente chegou.]
O ato final começou.
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