Capítulo 96: Phecda [3]

“…..São eles?”

Ao entrar em uma certa sala, Delilah olhou ao redor antes de fixar seu olhar nos corpos estirados no chão. Eles não estavam mortos, mas pelos hematomas em seus corpos, estavam claramente desmaiados.

“Você detectou algo?”

“Sim.”

Levantando-se, um homem de cabelos loiros e olhos verdes, o Dr. Gabel Wright, esfregou preguiçosamente os cabelos.

“Não há vestígios de qualquer feitiço usado neles.”

Apertando os dedos, que estavam cobertos por uma luva azul, ele os friccionou.

“Acredito que pó de Xyron foi usado. É um alucinógeno bem fraco que pode transformar pessoas em zumbis sem mente por algumas horas.”

O Dr. Gabel ergueu o olhar para encontrar o de Delilah.

“…..Claro, quando digo fraco, quero dizer que não afeta aqueles que atingiram um certo nível de força. Diria acima do Tier 3.”

Dr. Gabel continuou, dando a Delilah uma descrição mais detalhada do efeito da droga.

No final, sua avaliação foi:

“É bom que tenham resolvido antes que saíssem. De qualquer forma, isso não foi um acidente. Isso já deve ser óbvio para você. Embora não saiba quem, não acho que o objetivo deles fosse grande. Minha melhor aposta é que estavam dando um aviso ou testando algo.”

Resmungando para si mesmo enquanto apertava o queixo com a mão, ele franziu a testa.

“…..Mas posso estar pensando demais. É que me custa acreditar que tentariam algo grande, considerando que o pó de Xyron só os transforma em pessoas sem mente que mal conseguem pensar por si mesmas. Até o mago mais fraco poderia lidar com eles.”

Parada ao lado, Delilah não disse nada e apenas ouviu a análise do médico.

Mas, se alguém prestasse atenção, notaria um leve sorriso no canto de seus lábios.

‘Finalmente.’

Eles fizeram uma jogada.

Ela estava esperando há bastante tempo, e a aposta provou ser certa.

A organização que ela caçava há anos e tinha dificuldade em encontrar finalmente saiu de suas tocas. No centro disso tudo estava um jovem cadete que ela havia tomado como assistente.

Embora provavelmente soubessem que ela estava de olho nele, também deviam estar planejando usá-lo para monitorar seus movimentos.

Delilah estava bem com isso.

Era um jogo de paciência, e Delilah confiava em sua paciência.

Quer fosse ela quem os fizesse escorregar, ou ela quem escorregasse, Delilah estava disposta a apostar.

Porque…

Ela tinha essa confiança em sua força.

“Então, como eu dizia, devemos levar um tempo para investigar a situação adequadamente. Acredito que se a notícia vazar—”

Clank—

Interrompendo as palavras do médico, a porta da sala se abriu e uma figura entrou.

Imediatamente, a atmosfera da sala mudou. Não era opressiva, mas havia uma certa aura de nobreza que fazia alguém querer se curvar diante dela.

Virando a cabeça, Delilah encarou o homem.

Suas pupilas amarelas se destacaram para ela enquanto ele retribuía seu olhar com um sorriso.

“Terminei do meu lado.”

Fechando a porta atrás de si, ele entrou e escaneou a sala, parando brevemente seu olhar nos quatro cadetes no chão.

“Pó de Xyron, certo?”

“Uh?”

Surpreso, o médico olhou para ele. Atlas riu em resposta.

“Os que chegaram ao palco também foram afetados pelo pó.”

“Eles foram…?”

A revelação repentina deixou o médico atônito, piscando os olhos repetidamente.

“Haha, sim. Você provavelmente não percebeu, mas todos nós notamos durante a peça. Recebi várias perguntas me questionando se algo havia acontecido. Tive que dizer que era tudo parte do ato e uma nova forma de atuação ‘método’.”

“…..Isso é verdade?”

Virando a cabeça, o médico encarou Delilah, que piscou os olhos uma vez antes de acenar.

“Sim.”

“Ah, isso…!”

“Não precisa se preocupar.”

Atlas tranquilizou em um tom calmo.

“Eles estão sendo cuidados por outros. No momento, não sabem o que aconteceu com eles. Um cadete talentoso notou que algo estava errado durante a peça e os levou para serem observados.”

“É mesmo?”

“Sim.”

Delilah observou toda a troca de lado.

O tempo todo, seu olhar pairava sobre Atlas. Ele era um enigma para ela.

Como membro da família Megrail, e de alto escalão, um que poderia competir pelo trono, ele escolheu trabalhar em Haven.

Era uma escolha que não fazia sentido.

Embora muitos pensassem o mesmo sobre ela, ela também deixara suas ambições bem claras.

‘Não temos muito tempo.’

A velocidade com que a Dimensão Espelho se expandia aumentava rapidamente a cada ano, e Delilah sabia que não demoraria até o mundo inteiro ser engolido.

Por isso, ela escolheu trabalhar em Haven.

Com sua força, queria ajudar a nutrir a próxima geração.

Também por causa de sua ambição, ela ficara do lado oposto da família Megrail.

Suas leis tirânicas que atrofiavam o crescimento da geração mais jovem eram algo que ela queria eliminar a todo custo.

Para que sobrevivessem no futuro…

Ela não tinha escolha a não ser se opor a eles.

E por isso mesmo, Delilah tratava Atlas com extrema cautela. Ele estava aqui para monitorá-la, ou tinha outro objetivo?

“Hm?”

Como se sentisse seu olhar, ele virou a cabeça e seus olhares se encontraram.

“Ah, certo. Você quer saber sobre Julien, não é? Conversei com ele como te disse antes.”

“…..”

“Ele está bem. Não há ferimentos nele. Disse que ficou um pouco assustado com a situação, mas mal percebeu porque estava tão imerso em seu papel. Pensando bem, ele fez um trabalho maravilhoso.”

“…..”

“De qualquer forma, não precisa se preocupar com ele. Ele não parece estar envolvido nisso.”

“…..Entendo.”

Delilah acenou silenciosamente. Mantendo sua compostura habitual, deu uma última olhada nos corpos no chão antes de sair da sala.

Ela se sentia desconfortável na presença de Atlas.

Mesmo sendo mais fraco que ela, ele transmitia uma sensação desagradável.

Passando por ele, ouviu algumas palavras de despedida.

“Ouvi dizer que ele é seu assistente. Cuide bem dele. Ele é muito talentoso.”

Foram as últimas palavras que ouviu antes de sair.

Ao sair, seus lábios se abriram levemente enquanto murmurava baixinho.

“Eu sei.”

***

O Festival era um evento com muitas atrações. Em particular, a peça e a experiência de combate dos cadetes.

Infelizmente, devido a algumas circunstâncias, a Academia adiou para o próximo mês. Embora alguns convidados tenham ficado irritados, não havia nada que pudessem fazer.

….E assim, o festival chegou ao fim.

“Haaa….”

Estava escuro lá fora, e eu me sentei em um banco. Recostado, olhei para o céu noturno. Estava cheio de estrelas, e a lua brilhava intensamente.

A visão sempre me tirava o fôlego.

Nos últimos momentos de minha vida, a única coisa que lembro de ter visto foram as luzes do teto do meu antigo quarto.

O ar que respirava agora parecia refrescante. Um contraste gritante com o ar abafado do meu antigo apartamento.

Todos os dias, eu reservava alguns momentos para apreciar o que antes dava como garantido. Era estranho, mas perder tudo me fez entender o quanto as pequenas coisas eram importantes.

“…..Um pensamento idiota.”

“O que é?”

Uma figura apareceu ao meu lado de repente. Quando virei a cabeça, vi Leon em pé na outra extremidade do banco.

Com as mãos nos bolsos, ele também olhava para a lua.

“Lidei com aqueles que provavelmente te causariam problemas.”

“Oh.”

“….”

“….”

Ele virou a cabeça.

“Uma palavra de agradecimento?”

Inclinei a cabeça.

“Você não é meu cavaleiro?”

“Sou.”

“Ok.”

“…..”

“O quê?”

“…..Estou pensando em me demitir.”

“Que pena. Não vou pagar sua rescisão.”

“…..”

“…..”

Nenhum de nós disse mais nada, e o silêncio nos envolveu. Achei que continuaria assim até um de nós falar de novo, mas, estranhamente, o silêncio foi quebrado por Leon, que cobriu a boca com a mão.

“Pftt.”

“….?”

Esse cara…

“Você está rindo?”

Por algum motivo, meus lábios se curvaram levemente em um sorriso.

Havia algo em Leon segurando o riso que era contagioso. Balançando a cabeça, olhei para o céu novamente.

Foi Leon quem falou primeiro.

“Você é diferente dele.”

“Eu sei.”

Ficou claro para mim depois da última conversa.

“…..Sabe o que ele me disse da última vez que falei que ia sair?”

“O que ele disse?”

“Nada, ele só me deu um tapa.”

“…”

Piscando, olhei para Leon.

“Eu devia ter feito isso também?”

“Pode tentar.”

“Hmm…”

Pensei por um bom segundo antes de balançar a cabeça.

“Não curto essas coisas.”

Definitivamente não era porque eu tinha medo que ele revidasse.

Encara-me por um breve momento, Leon balançou a cabeça e se recostou no banco. Enquanto seu sorriso desaparecia, ele começou a falar.

“Você sente falta?”

“Sinto falta…?”

Falta do quê?

“De casa.”

“Ah…”

Casa… Certo, eu tinha uma. Ou tinha?

Pensando bem, nunca tive um lar de verdade. Não era rico o suficiente para ter um. Só consegui alugar um pequeno apartamento enquanto pagava os estudos do meu irmão.

A realidade era que eu não tinha um lar.

Mas mesmo assim.

“Sinto.”

Porque meu lar era onde meu irmão mais novo estivesse.

“…..É mesmo?”

Virei para olhar Leon.

“E você?”

Fazia tempo que eu o conhecia, mas, na verdade, mal sabia algo sobre ele. Além de ser meu cavaleiro, ele era um completo enigma para mim.

Estava um pouco curioso.

“Você sente falta da sua casa?”

“…..”

No início, Leon não disse nada. Achei que tinha tocado em um ponto sensível, mas quando estava prestes a falar de novo, ele falou por cima.

“Não me lembro.”

“….?”

“Eu a vejo às vezes. Quando durmo.”

“Nos seus sonhos?”

“….Sim.”

Leon acenou.

“Minha memória mais antiga é de quando entrei para a casa dos Evenus quando era jovem. Acho que tinha dez ou doze anos. Já faz tempo.”

“Foi assim que conheceu Julien?”

“Sim.”

Franzindo a testa, Leon continuou:

“Ele era bem mais tranquilo naquela época. Sorria muito e era muito talentoso. Era o orgulho da família.”

“Então…?”

A voz de Leon mudou, ficando mais baixa.

“…..Ele mudou.”

Certo. Isso eu esperava.

“Não foi uma mudança rápida. Aconteceu aos poucos. Ao longo dos anos. Já te disse, mas ele sorria muito. Em algum momento, parou de sorrir e se tornou uma pessoa completamente diferente.”

Com uma risada sutil, Leon balançou a cabeça.

“…..E logo quando eu estava me acostumando com seu novo eu, ele mudou de novo.”

Virou a cabeça, e nossos olhos se encontraram.

“Você apareceu.”

“Ah.”

Sim, apareci.

Abri a boca para responder, mas a fechei um momento depois. No fim, não sabia muito bem como responder a isso.

“Não se preocupe.”

Por fim, Leon balançou a cabeça e se levantou.

“Não estou interessado em tentar trazer o Julien antigo de volta. Ele provavelmente já se foi. Talvez seja melhor assim.”

Passando a mão pelos cabelos, deu uma última olhada em minha direção.

“Não esperava que nossa conversa fosse parar aqui. Originalmente, só queria te contar sobre a situação dos cadetes que você lidou. No fim, acabei falando de mim mesmo. Vou indo.”

Ele estava prestes a sair quando seus passos pararam.

Pela inclinação de sua cabeça, parecia estar lutando para dizer algo, até que, por fim, baixou a cabeça e murmurou.

“…..Foi uma ótima atuação.”

“Hm?”

E então ele foi embora de verdade.

Ele acabou de…

“Ha.”

Olhando para suas costas, que lentamente desapareciam de minha vista, balançei a cabeça e olhei para o céu.

Foi nesse momento que meu peito latejou levemente. As emoções da atuação ainda ecoavam em minha mente.

Não estavam tão fortes, mas claramente estavam lá.

“Emoções, hein.”

Acho que…

Estava começando a entendê-las, aos poucos.

***

Volume [1] – Fim

Um volume bem curto, mas foi o volume introdutório da história. Para entender os personagens e o sistema de poder antes que a história possa fluir mais suavemente.

O próximo volume será um pouco diferente.