Capítulo 51 - "Sigam-me"
O garoto, de olhos arregalados, segurava firmemente a pistola contra o peito, enquanto o suor escorria pela testa encardida. Ele não parecia ter mais que doze anos, o rosto magro e sujo, e o corpo franzino envolto em roupas rasgadas e sujas.
— Vai pra onde, garoto? — Saik perguntou, encarando-o de maneira superiora e intimidadora.
E o menino, amedrontado e tremendo de nervoso, disse para os quatro — Vocês… não estão com eles?
— Eles quem? O Conclave? — Saik olhou confuso para o Koji, que se aproximou e falou firmemente para o garoto — Por que você pegou a arma do meu amigo?
— O que… o que vocês querem comigo? — a voz do garoto tremia ligeiramente.
Nahome cruzou os braços, tentando não transparecer a raiva — Eu não sei o que quer com a arma, só quero que devolva a minha arma. E talvez algumas respostas também, se não for pedir demais.
— Por que você fez isso, hein? — Tovah estreitou os olhos, analisando o menino — E quem é você?
O garoto olhou para os quatro, respirando com dificuldade, mas sem recuar. Ele parecia ainda mais nervoso e olhava ansiosamente para pontos específicos, como se tentasse calcular uma rota de fuga.
— Eu só… só achei que… Vocês têm dinheiro, têm tudo! E eu só queria alguma coisa para mim, tá legal? — ele disse num tom quase inaudível.
— E você achou que roubar uma pistola ia te dar “alguma coisa”? — Tovah subiu o tom.
— Vocês não acham que estão exagerando no tom? — disse Saik, para os agentes.
O garoto abaixou o olhar e apertou os lábios — Vocês não sabem o que tá acontecendo aqui. Acham que podem chegar na cidade, olhar e entender tudo, mas não é assim. A gente vive aqui todo dia. Vocês são só mais um grupo de gente grande querendo impor coisas.
Koji deu um passo à frente, abaixando um pouco o tom — Calma aí, moleque. Ninguém aqui quer impor nada a ninguém. Estamos tentando entender o que está acontecendo e, ao que parece, você sabe mais do que a gente.
O garoto hesitou, mas após alguns segundos de silêncio ele finalmente soltou um suspiro derrotado.
— Vocês… não são do Conclave, né? — ele perguntou, de forma mais suave.
Nahome trocou um olhar com os outros, levantou a sobrancelha e perguntou — Como assim “do Conclave”? Você sabe algo sobre eles?
O menino assentiu, finalmente baixando a mão que segurava a pistola e devolvendo-a a Nahome, embora com relutância.
— Eles estão na cidade, mas… tem mais coisa por trás. Eles não só querem controlar aqui; querem controlar a gente, eles não são do bem, são terroristas — Ele passou a mão pelo cabelo liso e grande, que caiu sobre os olhos — Vocês acham que essa execução em massa foi só pra mostrar poder? Foi pra assustar quem tá aqui, pra ninguém se rebelar.
Tovah se abaixou até a altura do garoto — E você, por que não está como aquele pessoal do galpão?
Com olhar de cansaço, o garoto olhou para Tovah, e respondeu — Sei que sou o único que escapou. Eles têm drones, soldados, eles têm… pessoas na cidade, vivendo entre nós, como se fossem moradores normais. Mas são do Conclave. Tem gente que some do nada, e quando volta… volta diferente, com um olhar vazio.
Koji e Saik se entreolharam, e Saik murmurou, pensativo — Controladores infiltrados. Eles praticamente copiaram o que fizeram em Primavera do Leste. Mas aqui parece que está pior, parece que há mais peões e drones do que gente comum nessa cidade.
Nahome apertou a pistola, agora de volta ao seu suporte, e observou o menino — Como conseguiu escapar até agora deles?
O menino deu um sorriso amargo — Eu sou um dos “invisíveis”. Quem vai se importar com um garoto de rua? Para eles, eu vou morrer de fome há algumas semanas. Mas mesmo que tentem me achar, sei me esconder, conheço cada canto da cidade e sei onde eles não olham. Mas não sei até quando vai dar pra fugir.
— Eles vão te deixar pra morrer de fome? — perguntou Tovah, levantando-se após ficar um tempo agachado.
E o garoto respondeu num tom cabisbaixo — Sim. Eu tenho sorte de não ser puro, por isso eu sou inútil para eles.
A palavra ‘puro’ reverberou na memória de Saik, que lembrou do que ouviu da ‘L’, mulher que esteve com ele no subsolo de Campo Verde — Puro? O Conclave não te usou para ritos e feitiços por você ser impuro, não foi?
— Sim.
— Que ritos e feitiços são esses, Saik? — Koji aproximou-se de Saik, confuso.
Os agentes somente observavam o assunto não pertencente a humanos, enquanto Saik disse para Koji.
— Lá em Campo Verde, estive com uma mulher que se chamava somente de ‘L’, e ela me ajudou. Tinha uma garotinha sendo usada para a aplicação do rito que transformou centenas de civis de lá em zumbis, e certamente o garoto aí sabe disso.
O menino ficou, nitidamente, triste e para baixo quando respondeu — Sei sim. O Conclave capturou a minha… irmã.
— Ah… — Saik logo virou-se, bagunçando o cabelo com as mãos, em um gesto de confusão, e continuou — O negócio aqui tá complicado. Não é possível… Eles usaram uma menina em Campo Verde, e agora aqui também.
O silêncio pairou por um instante entre os quatro e o garoto. Koji cruzou os braços, suspirando — Olha, garoto, qual seu nome?
— Davi.
Extremamente pensativo, Nahome falou — Certo, Davi. Você pode nos ajudar? E em troca, nós ajudamos você salvando a sua irmã do Conclave.
Davi hesitou, mas por fim, pareceu relaxar um pouco — Vocês estão ferrados se pensam que só vão chegar e mudar tudo. Mas… talvez. Se vocês realmente estiverem dispostos a lutar contra eles, eu posso mostrar onde eles estão escondidos.
Saik concordou, e a decisão de confiar naquele menino parecia óbvia para todos ali. Eles sabiam que estavam lidando com algo maior do que haviam imaginado, e com o auxílio de Davi, talvez pudessem ter uma chance real contra o Conclave e seus planos.
Davi suspirou levemente, indicando um beco próximo — Sigam-me.
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