Capítulo 59 - No Campo do Ego

Com o rosto bem ferido por golpes anteriores, Koji encarava Leal, que mantinha a postura firme.

— Não lembra do Gawa? É sério que não liga mais para o código que você falou pra mim sobre não matar inocentes?

— Você não entende, Koji. Regras como essas  só servem quando a vida é simples. Sobreviver exige sacrifícios — Leal sorria com desdém.

— Isso é uma desculpa barata. Você sabe disso. Já viu o que acontece quando ignoramos o código. Tem ideia de quantos inocentes matou?

— Tsc! Tá na hora de usar a técnica…

Leal levantou a mão, e uma energia ao redor começou a tremular. Uma aura de poder se materializou quando ele se abaixou e tocou o chão com sua mão direita.

Instantaneamente, o solo de concreto da rua, começou a se quebrar ao mesmo tempo que parecia se reformular, e avançou agressivamente em direção ao Koji, que por sua vez, se jogou para a calçada da rua, local que não estava sendo alvo do ataque.

— Que técnica é essa, Spherea? — atentamente, Koji levantava-se e escorando-se na parede de uma residência.

— Tá me confundindo com uma torre de comunicação do aeroporto, é?

— Não vem com essa agora. Vai, me fala.

— Eu não preciso falar. Somente preste atenção no que ele está fazendo.

Inesperadamente, na calçada e a poucos metros à frente de Koji, Leal surgiu, sorrindo e dizendo — Eu quero ver se você vai durar mais ou menos que aquele o primeiro.

E em seguida, Leal tocou a palma de sua mão direita na parede de uma das residências na calçada. Automaticamente, usando da Recriação, para reconstruir a essência da casa, transformando-a em centenas de lanças de concreto — arremessando-as contra Koji.

— Merda! — o olhar de Koji estendeu-se, preocupado.

 Contudo, da mesma forma que a Recriação dava a vantagem ofensiva ao Leal, as Esferas davam a vantagem defensiva ao Koji. No exato momento, o poder de antecipação e bloqueio eficiente das Esferas surgiram, colocando-se na frente das lanças de concreto e travando-as.

— Essas esferas malditas! — Leal já estava com uma certa e rápida impaciência. 

O jovem portador cerrou os punhos — Talvez as coisas fiquem mais perigosas agora. Preciso de precaução — Assim, Koji ativou sua Energia Externa. Uma aura escura pulsou ao redor de seu corpo, e ele sentiu suas forças se renovarem.

— Aí está você, finalmente levando isso a sério! — Leal zombou, mas seu sorriso vacilou ao perceber o aumento de velocidade de Koji.

Em um piscar de olhos, Koji fechou a distância entre eles. Ele atacou com uma sequência de socos e chutes. Leal recuava, usando a Recriação para moldar paredes como escudos improvisados, que se quebravam com os golpes devastadores de Koji.

— Por que não para com isso e volta ao normal? — gritou Koji enquanto pressionava Leal.

— Por que não cala a boca? — Leal respondeu entre ofegos, desviando de um chute alto.

Koji não cedeu. Ele se jogou em um ataque frontal, desferindo um soco potenciado pela Energia Externa. Leal usou a Recriação para transformar o chão em uma armadilha de estacas, forçando Koji a saltar para a lateral.

— Tu não sabe o que é se tornar um portador! Não é uma decisão simples de tomar por qualquer coisa besta! — Koji retrucou.

Enfurecido, Leal ergueu as mãos novamente, reconstruindo uma estrutura próxima em uma gigantesca parede que avançou contra Koji. O impacto foi brutal, jogando-o contra o asfalto.

— Fácil para você falar, portador! Vocês têm poderes que os humanos jamais sonhariam em ter. Humanos são pequenos, frágeis, dependem de vocês, e na maioria das vezes vocês não estão lá para salvar ninguém!

Koji levantou, cuspindo sangue — Você não faz ideia do que é ser um portador. A responsabilidade… o peso de saber que, para cada um de nós que tenta fazer o bem, há outros que usam esses poderes para massacrar inocentes.

Leal zombou — E você acha que isso é diferente do que eu estou fazendo? Sobrevivência é o único código que importa agora, garoto.

“O que?” 

Um decepcionante pensamento e confissão reverberou na mente de Koji, que refletiu na sua expressão facial.

— Você mudou, Leal. — Koji disse com tristeza — O homem que eu conheci nunca diria isso.

— A resposta é simples. O homem que conheceu não existe mais.

As afirmações ou até mesmo o choque das palavras não atingiram Leal, muito menos mudaram o seu comportamento. Simplesmente não alterou nada.

O combate se intensificou novamente quando Leal atacou com ainda mais furor. As suas recriações se tornaram mais criativas e mortais — lanças, muralhas e armadilhas surgiam como extensões de seu próprio corpo. Koji mal conseguia acompanhar. A cada golpe recebido, seu corpo cedia mais ao cansaço.

Não havia muito para onde ir ou o que fazer. Koji precisava pensar em algo, pois ele encontrava-se na defensiva máxima ao depender das Esferas, que defendia-o dos ataques e ao mesmo tempo que ele não tentava algo ofensivo.

— Aumente a energia externa! — Spherea ordenou, com a voz clara na mente do jovem.

— Se eu usar mais, posso perder o controle! — Koji retrucou enquanto desviava por um triz de uma única lança que conseguiu passar das Esferas.

— Use 50%. Vai ser o suficiente para assustá-lo. Não passe disso, ou você está morto.

O que mais tinha para fazer? Koji somente assentiu. Ele concentrou seu corpo e sentiu o peso se esvair, enquanto uma leveza poderosa e confortável dominava-o. A aura escura intensificou-se, fazendo o ar ao redor vibrar. 

Leal percebeu a mudança e estreitou os olhos — Impressionante… mas isso não vai ser suficiente — Leal avançou com velocidade sobre-humana, natural de portador, tentando um golpe direto.

Koji desviou no último momento, agarrando o antebraço de Leal e girando-o com força. Em seguida, desferiu uma sequência de socos que atingiram o oponente no rosto e abdômen. 

Leal cambaleou para trás, cuspindo sangue — Eu vou acabar com você, Koji… 

Tocando o solo, Leal fez mais lanças emergirem do chão como serpentes afiadas, e muros se erguiam, tentando encurralar seu adversário.

 — Ele está ficando mais agressivo… — pensou Koji, enquanto suas Esferas bloqueavam as lanças que se aproximavam e desferiam contra-ataques rápidos que rachavam os muros que surgiam e tentavam encurralar Koji.

 — Vai ficar nessa para sempre? — gritou Leal, levemente ofegante e suando, ao mesmo tempo que moldava uma nova armadilha no chão — Sua resistência tem limite, assim como a minha. Qualquer um de nós pode cair agora!

— E é exatamente por isso que eu vou vencer! — Koji respondeu num tom decidido, desviando de um pilar que quase o esmagava — Porque você está lutando por algo que nem sabe, Leal. Eu luto por algo maior.

— Algo maior? 

Mordendo o lábio com raiva, Leal caminhou um pouco, tocou em um veículo capotado e disse — Chega de lanças. Eu quero acabar logo com isso…