Capítulo 61 - Negue a Si Mesmo
Koji abriu os olhos repentinamente, o que foi estranho, porque ele tinha certeza de que não deveria mais estar vivo. Sua última memória era um momento de dor intensa e um silêncio avassalador que parecia sugar toda a sua existência. Ele esperava o fim — ou talvez o nada. No entanto, ali estava ele, vivo e desperto.
Ele se ergueu lentamente e sentiu a força de um vento extremamente forte que assobiava ao seu redor. À sua frente, uma paisagem imponente se estendia. Ele estava na beira de uma montanha colossal, com um penhasco que mergulhava em um abismo tão profundo que o chão não podia ser visto. O céu estava coberto por nuvens densas e escuras, que quase transformavam o dia em noite.
— Onde estou? — Koji passou as mãos pelo corpo, procurando algum ferimento, mas não encontrou nada — Eu… morri? Isso é o que vem depois?
Tentando recuperar algum controle, ele começou a caminhar, avançando contra o vento que insistia em empurrá-lo para trás. No entanto, algo chamou sua atenção.
Um pouco mais à frente, na trilha íngreme, uma figura apareceu. Era um homem, vestido com roupas longas e brancas que esvoaçavam no vento, embora ele parecesse completamente alheio à força das rajadas.
— Outro perdido? — pensou Koji.
A estranha figura começou a caminhar mais devagar, como se esperasse por ele. Quando Koji finalmente se aproximou, o homem parou e virou-se lentamente, revelando um rosto sereno e olhos que pareciam brilhar internamente. Por um momento, Koji não conseguiu encontrar palavras.
— Você parece perdido — disse o homem com uma voz calma, mas poderosa.
Koji cruzou os braços em uma tentativa de esconder sua vulnerabilidade — Eu nem sei onde estou.
O homem inclinou a cabeça levemente — Este lugar é o começo… ou talvez o fim. Depende de como você escolhe enxergar.
— Certamente é o fim. Eu morri. Tenho certeza disso. Mas esse lugar, não faço ideia. Você… conhece bem aqui?
O homem sorriu levemente, o que fez Koji, ligeiramente se apresentar antes de prosseguir — Ah, é. O nome primeiro. Eu sou Koji. Meu nome é Koji. E você?
O homem não respondeu imediatamente. Em vez disso, deu alguns passos para mais perto, parando a uma distância que parecia quase intimidante, com olhos que hipnotizavam.
— Meu nome é Yeshu’a. E eu estou aqui para guiá-lo.
— Yeshu’a? — Koji sentiu seu coração disparar. O nome era familiar, mas sua mente se recusava a aceitar o que isso poderia significar — Isso deve ser uma alucinação.
— Aceite-me como seu guia.
— Guiar pra onde? — perguntou Koji, tentando manter um tom desafiador.
Yeshu’a sorriu levemente, mas havia uma tristeza oculta em seu olhar — Para onde sua alma precisa ir.
Koji riu nervosamente — Você realmente gosta de falar por enigmas, não é? Por que não fala diretamente? O que está acontecendo aqui? E por que você parece… diferente?
Yeshu’a cruzou os braços sobre o peito, considerando as perguntas de Koji cuidadosamente.
— Você se lembra de sua vida, Koji?
A pergunta pegou Koji de surpresa. Ele piscou algumas vezes, sentindo um nó formar-se em sua garganta.
— Claro que lembro. Quer dizer, acho que lembro. Era normal… até não ser mais.
— E agora você está aqui — disse Yeshu’a, apontando para a vastidão ao redor — Você acha que isso é acaso?
Koji balançou a cabeça — Eu não sei o que pensar.
Yeshu’a deu um passo para mais perto e estendeu a mão. Por um breve instante, Koji viu algo que fez seu coração parar: um furo perfeito no centro da palma do homem.
— Você… tá ferido?
Yeshu’a olhou para a própria mão e depois de volta para Koji — É uma marca que tenho.
Koji recuou um passo, seu coração batia tão rápido que assustava — É uma marca de prego. Você realmente é…
Yeshu’a não respondeu imediatamente. Ele simplesmente permaneceu parado, deixando Koji lidar com a revelação.
— Yeshu’a… Cristo… — Koji sentiu suas pernas fraquejarem.
— Você certamente teria compreendido isso com mais rapidez, caso eu estivesse falando em parábolas e em uma linguagem extremamente perfeita, né? — abrindo um sorriso natural e que parecia abraçar emocionalmente qualquer um, Yeshu’a riu.
Koji tentou organizar seus pensamentos — Eu… eu não sou religioso. Eu não sou um humano. Não sou alguém comum que morreu…
— Não se preocupe. Se você está aqui, agora, é porque tinha que estar aqui — Ele fez uma pausa e finalizou — Eu te escolhi.
— Me escolheu? Eu sou um portador! Minha alma tá presa a um demônio. Eu tenho um pacto!
— Eu conheço o peso dos pecados que carrega, Koji. Mas escute bem: o sacrifício que fiz foi para todos. Não importa quem você era ou o que fez. Minha graça é suficiente para libertar até o mais perdido.
— Mas eu tenho um pacto e usei isso pra lutar.
— Porque eu não vejo você como as trevas o moldaram. Não foi você que escolheu ter o pacto ou entregar sua alma ao mal, mas sim seu pai. Eu vejo o propósito para o qual foi criado. Cada batalha que enfrentou, cada escolha que fez, levou você a este momento. Você não entendeu ainda?
Koji engoliu em seco, o peso das palavras de Yeshu’a caia sobre ele como uma avalanche.
— Eu… não entendo. Como? Eu sou um portador. Minha alma tá condenada… desde o dia que meu pai fez meu pacto…
— Eu te conheço. Conheço sua dor. Não precisa se culpar por algo que não fez, pois até nos dias escuros, eu estive com você todos os dias.
Ensinando-os a guardar todas as coisas que eu vos tenho mandado; e eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos. Amém.
Mateus 28:20
— Não…
Yeshu’a levantou uma mão, e o vento que antes parecia ameaçar engolir tudo ao redor cessou instantaneamente.
— Koji, você não é perfeito. Isso não é um absurdo, mas ainda há tempo para sua redenção. Ela vem do reconhecimento de quem você é e do desejo de ser o oposto do mal que carrega. Você foi escolhido, não porque é perfeito, mas porque é capaz de carregar a minha luz mesmo nas trevas mais profundas.
Koji sentiu suas pernas vacilarem, mas permaneceu de pé, encarando Yeshu’a com olhos cheios de confusão e medo — Você fala como se eu tivesse escolha. Mas eu não tenho. O pacto… ele é eterno. Não há como escapar.
Yeshu’a ergueu a mão marcada pelo furo na palma e tocou o peito de Koji.
— O pacto que você carrega é pesado, sim. Mas o meu sacrifício é maior. Não há pacto, trevas ou corrente que não possa ser quebrada por aquilo que fiz por todos vocês.
Koji sentiu um calor intenso irradiar do ponto onde a mão de Yeshu’a tocava. Era uma sensação estranha, como se algo dentro dele estivesse sendo desfeito e reconstruído ao mesmo tempo.
Ele ofegou e sua visão embaçou por um momento — Isso é doloroso…
— É a dor de ser liberto, Koji. As correntes que te prendiam estão se rompendo, mas isso exige que você abandone aquilo que conhecia como verdade.
Koji caiu de joelhos — Eu não sei como fazer isso…
Yeshu’a sorriu — É por isso que estou aqui. Eu sou a luz do mundo. Eu venci o mundo.
“Eu sou a luz do mundo. Quem me segue, nunca andará em trevas, mas terá a luz da vida”.
João 8:12
“Neste mundo vocês terão aflições; contudo, tenham ânimo! Eu venci o mundo”
João 16:33
— E o que você quer que eu faça? O que significa ser escolhido?
Yeshu’a estendeu a mão para ajudar Koji a se erguer.
— Significa que você será um mensageiro. Alguém que leva a esperança onde só há desespero. Que luta não por si mesmo, mas pelos outros, justos e injustos. Que nega a si mesmo para que os outros possam ver a minha luz que irá radiar de você, para aqueles que me buscam me encontrarem, especialmente em você, Koji.
Com um suspiro pesado, Koji agarrou a mão de Yeshu’a e se levantou — E como eu faço isso? Como eu carrego essa responsabilidade?
Yeshu’a colocou uma mão no ombro de Koji e falou.
— Aceite que sua vida não é mais sua, mas sim minha, seu Senhor e Salvador. Que sua luta agora é por um propósito maior.
E continuou.
— Você é o mensageiro da luz que virá ao mundo pela segunda vez. Que você seja a minha luz para aqueles que estão nas trevas, uma ponte entre os mundos, e um guerreiro da paz, mesmo entre os que não a merecem.
Não era um peso físico, mas uma responsabilidade que parecia moldar sua alma. Ele olhou para Yeshu’a, sem palavras, mas com uma determinação que começava a surgir em seu olhar.
Yeshu’a deu um passo para trás, sorrindo tranquilamente para Koji.
— Acorde e quebre o gelo, pois você e a garota estão salvos.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.