Na manhã seguinte, Layos e Mark saíram da tenda. O sol já brilhava no céu, mas as estrelas ainda permaneciam visíveis, como se hesitassem em desaparecer. O acampamento estava movimentado, com várias pessoas circulando, conversando e organizando suas coisas.

    Eles seguiram até a área de alimentação, um espaço amplo e simples, com diversas mesas espalhadas pelo lugar. 

    Pequenas lâmpadas presas às paredes proporcionavam uma iluminação suave, e o ar carregava o cheiro fresco de madeira recém-limpa.

    Ambiente vivo, pessoas interagindo… mas para Layos e Mark, havia um silêncio que ninguém mais parecia notar.

    Os dois se sentaram em uma das mesas. Pouco depois, uma moça de cabelos alaranjados se aproximou, sua voz soando suave e despretensiosa:

    — O que vão querer?

    Layos olhou ao redor, observando o que as outras pessoas estavam comendo, e respondeu:

    — Vou querer uma sopa.

    Mark, com uma expressão de tédio, apenas girou a cabeça e disse:

    — Sei lá. Pode ser um pão com água.

    A atendente assentiu e seguiu para frente, desaparecendo no meio da multidão.

    Layos permaneceu em silêncio, mas uma inquietação crescia dentro dele. Enfrentar os desafios dali para frente sem Takeshi… era um pensamento que o incomodava mais do que ele queria admitir.

    Mark, por sua vez, reclinou-se na cadeira, jogando as pernas sobre a mesa sem se importar com os olhares ao redor. Ele então resmungou, desviando o olhar para os lados:

    — Esses caras só podem ser ricos.

    Layos ergueu uma sobrancelha.

    — Por que diz isso?

    Mark indicou o ambiente com um gesto vago da cabeça.

    — Olha em volta.

    Layos seguiu seu olhar e viu as pessoas conversando tranquilamente enquanto comiam. 

    Era um cenário comum, mas, quando prestou atenção, percebeu o que Mark estava insinuando.

    — É estranho… — Layos murmurou — compramos comida através das janelas, mas eles parecem ter dinheiro de sobra para alimentar tanta gente aqui.

    Mark bufou.

    — Exatamente. Algo nisso não faz sentido.

    Layos ponderou por um instante, mas então suspirou e deu de ombros.

    — Bom, vamos aproveitar enquanto temos comida na mesa.

    A mulher retornou com os pedidos e os serviu sem dizer uma palavra. Layos começou a comer devagar, saboreando cada colherada da sopa, sentindo o calor do caldo em contraste com o frio da manhã. 

    Já Mark, como sempre, não se importava com os detalhes—comia rápido, sem prestar atenção no gosto.

    O barulho do acampamento continuava ao redor deles, mas, para os dois, uma ausência pesava no ar. Algo que a comida não conseguia preencher.

    Assim que terminaram de comer, Layos e Mark ouviram um murmúrio próximo. Quando olharam, viram um homem magro ajoelhado no chão.

    Seu rosto estava pálido e os ossos saltavam sob a pele fina. Com a voz fraca e desesperada, ele implorou:

    — Por favor… eu preciso comer. Estou morrendo de fome aqui…

    Ele não estava pedindo para qualquer um. Seu apelo era direcionado a um homem montado em um cavalo branco. 

    A armadura do cavaleiro reluzia sob a luz do sol, polida e impecável, como se jamais tivesse sido tocada pelo caos daquele mundo. Seu brilho era quase hipnótico.

    O cavaleiro olhou para o homem ajoelhado sem qualquer emoção e, com uma voz firme, decretou:

    — Pegue suas coisas e saia daqui.

    O homem magro tremeu, seus olhos se encheram de lágrimas. Sem saber como reagir, ele apenas se levantou, cabisbaixo, e se afastou do acampamento, carregando consigo apenas o peso do desespero.

    Layos observou a cena, sentindo um arrepio percorrer sua espinha. Algo naquela frieza o incomodava profundamente.

    O cavaleiro então adentrou o refeitório, sua presença impondo silêncio ao ambiente. Ele ergueu a voz, autoritária e inquestionável:

    — Todos vocês, preparem-se. Partiremos para o próximo desafio.

    Sem hesitar, as pessoas se levantaram e começaram a se organizar. Layos e Mark notaram que muitos estavam bem equipados—armas afiadas, armaduras reforçadas, ferramentas especializadas. O murmúrio ansioso das pessoas preenchia o espaço.

    Entre a movimentação, Tsukiko, Luna e Igris se aproximaram deles. Igris, sempre direto, comentou:

    — Imagino que já tenham ouvido. Vocês vão enfrentar a primeira árvore agora.

    Layos e Mark trocaram olhares. Mark franziu a testa e perguntou, descrente:

    — Enfrentar? Como assim? No fim das contas… é só uma árvore.

    Luna ouviu aquilo e imediatamente demonstrou irritação.

    — Você é meio burro, né? As pessoas aqui falaram que um cara foi sozinho até ela. E sabe o que aconteceu? A árvore tem vida própria. Parece que matou ele… com telepatia.

    O semblante de Mark se contorceu em raiva.

    — Você, sua…

    Ele parou no meio da frase, cerrando os dentes. Em vez de continuar, sacou sua adaga e se virou para Layos.

    — Vamos logo. Pegue sua espada e vamos acabar com isso.

    Layos hesitou por um momento, depois assentiu. Ele se apressou até a tenda, onde pegou a espada de Takeshi, segurando-a com firmeza antes de retornar ao grupo.

    Todos estavam prontos, mas o medo era palpável no ar.

    O cavaleiro de cabelos azul-esverdeados puxou as rédeas de seu cavalo, avançando à frente do grupo. Atrás dele, várias pessoas o seguiam, carregando caixas de suprimentos e armas. 
    Outros cavaleiros em montarias brancas também lideravam a marcha.

    O desafio os aguardava, e ninguém sabia quantos voltariam.

    Eles caminharam por um longo tempo, sentindo o frio se intensificar a cada passo. A neve ficava mais espessa, cobrindo o chão e tornando a caminhada cada vez mais difícil. 

    O vento cortante fazia suas roupas balançarem, e o silêncio entre eles era preenchido apenas pelo som abafado de passos afundando na neve.

    Após horas de marcha silenciosa, eles finalmente alcançaram o topo de um pequeno monte coberto por neve espessa. O vento frio cortava seus rostos, mas nada os preparou para a visão que surgiu assim que ultrapassaram a elevação.

    Diante deles, erguia-se a árvore gigante — uma aberração da natureza. Seu tronco grotescamente retorcido se estendia até o céu, com mais de trinta metros de altura, parecendo uma cicatriz deixada no mundo. 

    A casca era escura, quase negra, marcada por veios pulsantes que emitiam um brilho vermelho sinistro, como se sangue corresse por dentro dela.

    Não havia flores, nem folhas. Apenas galhos secos que se contorciam como mãos tentando agarrar o céu, e raízes grossas que se espalhavam pelo solo congelado, movendo-se lentamente, como serpentes adormecidas. 

    A própria terra ao redor parecia corrompida, e o ar carregava uma eletricidade pesada, difícil de respirar.

    A visão daquela árvore não era apenas grandiosa — era opressora. Como se a presença dela fosse capaz de sufocar a esperança. 

    E ainda assim, era para lá que todos eles haviam sido guiados. Ali estava o coração da escuridão… e a batalha final se aproximava.

    O grupo parou, observando a criatura à sua frente. Foi então que Tsukiko, que havia permanecido em silêncio durante a caminhada, finalmente quebrou o silêncio, voltando-se para Layos e Mark:

    — Até agora vocês não falaram nada sobre suas habilidades. Ainda estou curiosa com isso.

    Mark, com uma expressão entediada, suspirou antes de responder:

    — Resumindo… eu posso controlar minha sombra. Também posso me tornar uma.

    Layos, por outro lado, ergueu o olhar para o céu cinzento antes de responder:

    — Bem… até agora só usei uma. Minha habilidade me permite desferir um soco muito forte.

    Tsukiko piscou, surpresa. Por um momento, tentou sorrir para disfarçar sua expressão, mas tudo o que conseguiu foi um olhar distante e melancólico. 

    Algo em sua reação parecia incompleto, como se estivesse escondendo um pensamento que preferia não compartilhar.

    Diante daquilo, uma janela roxa brilhante surgiu diante deles, emitindo um leve zumbido no ar gelado.

    『Faz um tempo que não apareço. O que aconteceu agora?』

    Mark estreitou os olhos para o brilho intenso e respondeu, sua voz carregada de desdém:

    — Bem, agora estamos indo para a primeira árvore da tarefa.

    A janela pulsou levemente antes de responder:

    『Ah… isso vai ser difícil. Desejo sorte para vocês.』

    Com um último brilho suave, a janela desapareceu, deixando apenas o silêncio e a leve sensação de estática no ar.

    Luna bufou, cruzando os braços.

    — Vamos logo. Parem de ficar conversando.
    Todos voltaram sua atenção para a frente. O homem de cabelos azul-esverdeados estava parado, sua expressão firme. Ele encarou a árvore à sua frente e ergueu a voz:

    — Vamos avançar. Aqueles que não têm habilidades de força, fiquem na defensiva!

    O frio pareceu se intensificar quando o grupo começou a se mover. O cheiro úmido da neve misturava-se com algo metálico no ar, como se houvesse ferrugem espalhada pelo ambiente. 

    O som dos passos afundando no chão fofo era abafado, mas a tensão no ar tornava cada movimento mais pesado.

    De repente, em um grito uníssono, todos ergueram suas espadas e avançaram contra a árvore.

    …..

    O silêncio dentro da nave era opressor, até que o chão se remexeu levemente. Um instante depois, uma mão emergiu da terra, rompendo a superfície com um som seco.

    — Ah, caramba… quase engoli terra — ele tossiu, cuspindo um pouco de poeira.

    Lentamente, o corpo inteiro emergiu, coberto de sujeira e resquícios da nave. Ele ficou de pé, sacudindo os braços e olhando ao redor.

    — Espera… eu fui enterrado mesmo? Cadê Layos e Mark?

    O acampamento ao redor estava vazio. Barracas rasgadas balançavam com o vento, e o cheiro de cinzas pairava no ar. Algo estava estranho.

    Foi então que ele ouviu.

    Vozes.

    Baixas, distantes, mas ainda assim presentes.

    Ele se moveu com cuidado, estreitando os olhos, tentando captar melhor o som. O que estava acontecendo ali?

    Takeshi permaneceu agachado entre as tendas, os músculos tensos enquanto ouvia a conversa.

    — Tá, tá, tá, eu sei que ele mandou a gente ficar aqui para vigiar os corpos… Mas só isso mesmo? — disse uma voz jovem, entediada.

    A resposta veio de um homem mais velho, sua voz grave e carregada de intenções sombrias:

    — Claro que não. Vamos abrir os corpos e usá-los.

    Um arrepio percorreu a espinha de Takeshi. Seus dedos tremeram contra a neve fria.

    — Ainda bem que aquele cara magro morreu — a voz do jovem carregava um tom de desprezo — nossa, ele era insuportável. Menos um pra incomodar.

    Os passos dos dois começaram a se aproximar. Takeshi olhou ao redor, buscando qualquer coisa que pudesse usar.

    “Droga… não tenho minha espada… Espera um pouco.”

    Ele abaixou-se e pegou um punhado de neve, prestes a usá-lo de alguma forma, mas foi interrompido quando o homem mais velho voltou a falar:

    — Precisamos desses corpos. O chefe vai aumentar sua Étervia com eles.

    O outro soltou uma risada seca.

    — Ha! Faz sentido. Assim vamos ter vantagem.
    Takeshi estreitou os olhos.

     “Étervia? O que diabos é isso?”

    O homem mais velho deu mais alguns passos, chegando perigosamente perto. Takeshi prendeu a respiração, o suor frio escorrendo por sua nuca.

    — Com isso, ele poderá subir para a Seleção 10 do Caminho da Erva.

    Então, um dos homens parou abruptamente. Ele olhou para um túmulo que estava aberto e disse:

    — Espera aí… Um corpo sumiu.

    O jovem olhou ao redor, franzindo a testa.

    — Isso significa que alguém está vivo… e está aqui.

    Takeshi não esperou. Ele soltou o ar que segurava e, em um instante, disparou para frente com uma explosão de velocidade. Seu punho se fechou e, antes que o homem velho pudesse reagir, um soco brutal atingiu seu rosto.

    O impacto ecoou pelo acampamento. O homem desabou no chão, inconsciente.

    O homem jovem arregalou os olhos, furioso ao ver o companheiro cair. Ele se preparou para atacar, gritando com raiva:

    — Seu merda!

    Com um movimento rápido, ele puxou o punho para trás e desferiu um soco, a força da sua ação fazendo o ar ao redor vibrar. A pressão do golpe fazia até a neve ao redor se deslocar ligeiramente.

    Takeshi não teve tempo de hesitar, apenas se abaixou rapidamente, se esquivando do soco que passou a centímetros de sua cabeça. A força do golpe fez com que o jovem perdesse o equilíbrio por um instante, dando a Takeshi a chance perfeita.

    Sem perder tempo, Takeshi avançou e, com um movimento preciso, desferiu um soco direto na barriga do homem. 

    O impacto foi brutal, o som do soco ecoando pelo campo silencioso. O jovem arqueou-se de dor, o ar sendo expulso de seus pulmões, antes de cair de joelhos no chão.

    Takeshi não deu chance para ele se recuperar. Ele rapidamente se posicionou atrás do homem, pronto para reagir a qualquer movimento. O jovem, ainda atordoado, tentou se levantar, mas sua respiração estava ofegante, e suas forças começavam a falhar.

    Takeshi estava ciente de que precisava acabar rápido com aquilo. Ele ficou em silêncio, observando os olhos do homem, que agora estavam cheios de raiva e medo.

    O homem se levantou, cambaleando, ainda tonto pela força do golpe anterior. Ele xingou entre os dentes, furioso:

    — Ah… você, seu desgraçado de merda!

    Sem mais palavras, o homem avançou, furioso, em direção a Takeshi. Mas Takeshi, sem hesitar, fez um movimento rápido. Ele correu até uma das tendas próximas, puxando um pano que estava por ali e o arremessando direto no rosto do homem.

    O pano cobriu os olhos do agressor, e ele tentou desesperadamente se livrar da obstrução, atirando o tecido para os lados. Mas, antes que o homem tivesse a chance de reagir, Takeshi já estava atrás dele. 

    Com a mesma velocidade com que se movia, ele desferiu um soco forte na lateral da cabeça do homem, acertando o ponto exato que o fez cair instantaneamente no chão, desmaiado.

    O silêncio retomou seu lugar no campo enquanto Takeshi se afastava, respirando fundo e observando a cena à sua volta. A luta acabara tão rápido quanto começara.

    Takeshi deu uma leve risada amarga, ainda surpreso consigo mesmo.

    — Até fiquei com medo… Como eu fiquei tão bom em luta? — ele tocou no corpo do homem jovem caído ao seu lado, como se ainda estivesse tentando entender o que havia acontecido.

    Sua mente logo se concentrou novamente, e ele murmurou para si mesmo, irritado:

    — Parece que tenho só alguns minutos. Eu ainda tenho aquela missão daquele homem… — a raiva cresceu dentro dele só de lembrar do que tinha acontecido antes.

    Ele se levantou, jogando o pano que usara para neutralizar o homem no chão, e olhou para os túmulos à sua frente.

    — Eh… parece que vou ter que cuidar disso. Seja lá quem for esse tal de chefe, eu não confio. 

    Suspirou profundamente, sentindo o peso da situação se acumular. Foi então que, de repente, raios azuis começaram a brilhar no ar, e a janela apareceu diante dele.

    『Como eu tô vivo? Como você está vivo?』

    Takeshi olhou fixamente para a tela brilhante, sem entender o que estava acontecendo, mas algo dentro dele dizia que não podia deixar essa questão sem resposta.

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