Capítulo 23: Ilusão (1)
Layos corria sozinho, o coração disparado enquanto o fogo consumia a nave ao seu redor. O calor sufocante tornava o ar pesado, cada respiração parecia um esforço. Ele não sabia ao certo para onde ir, apenas sabia que precisava continuar se movendo.
Então, ele viu.
Um vulto se aproximava rapidamente. Mas antes que Layos pudesse reagir, em um piscar de olhos, o corpo do homem foi cortado ao meio. O sangue se espalhou pelo chão em um instante grotesco.
Layos tentou se segurar, mas suas pernas falharam. Ele caiu de joelhos, sentindo o peso do momento esmagá-lo. O cheiro de carne queimada e ferro inundava seus sentidos. O calor do fogo misturado à cena brutal à sua frente o fez tremer.
Ele não conseguia respirar direito.
Seus olhos se arregalaram, e sem conseguir se conter, lágrimas começaram a escorrer por seu rosto. O medo e o desespero o consumiam. Sua espada caiu de suas mãos, batendo contra o chão com um som seco e distante.
Foi então que, em meio às chamas, uma figura surgiu.
Pequena, com a altura de uma criança. Seus cabelos loiros brilhavam sob a luz do fogo, mas seu rosto… seu rosto estava borrado, distorcido, como se a própria realidade recusasse a mostrá-lo completamente.
A figura riu.
— Sério mesmo? Nem consegue, né? Hahahahahaha!
A risada ressoou na mente de Layos, reverberando em seu crânio como um eco cruel. Cada palavra, cada som, parecia quebrá-lo ainda mais. Ele tentou se mover, mas seu corpo não respondia.
Os sons do ambiente começaram a desaparecer.
O fogo rugia ao redor, mas Layos já não o ouvia.
O barulho das explosões ao longe? Sumiram. Os passos das pessoas correndo para se salvar?
Desapareceram.
Restava apenas aquela voz.
E sua própria respiração trêmula.
Ele olhou em volta, mas Mark e Igris… não estavam mais ali. Eles haviam desaparecido, como se nunca tivessem estado com ele.
Layos estava sozinho. Com a sombra na sua frente. E o medo devorando seu peito.
Das chamas retorcidas, outra figura emergiu.
Seus cabelos eram negros como a escuridão da noite, caindo suavemente sobre um rosto impecável, belo e imponente.
Seus olhos, profundos e frios, pareciam perfurar a alma de Layos.
O coração de Layos parou por um instante.
Ele abriu a boca, mas as palavras quase não saíram. Apenas um sussurro fraco, trêmulo:
— Takeshi…
Takeshi ficou ao lado do ser de cabelos loiros, sua expressão inabalável, seu olhar carregado de desprezo.
— Você é fraco — disse ele, sua voz seca, cortante como uma lâmina fria — não consegue fazer nada sozinho. Você deveria estar morto. Seria melhor se fosse qualquer um, menos você.
Aquelas palavras atingiram Layos como punhais. Ele sentiu o peso esmagador da sentença, o peito apertando, a mente girando em espiral. Sua respiração ficou irregular.
Não… isso não podia estar acontecendo.
Mas a voz continuava ecoando, se multiplicando dentro de sua cabeça, se repetindo sem parar.
— Você deveria estar morto.
— Não consegue fazer nada sozinho.
— Você é fraco.
Ele sentiu as pernas vacilarem. As lágrimas caíram de seus olhos, mas ele nem sequer percebeu.
O ser de cabelos loiros, com um sorriso cruel, apontou para a espada caída no chão.
— Olhe para você… um fracasso completo. Tentou salvar ele e falhou. Tentou me salvar e falhou. Você não conseguiu nada.
— Não… não, não, não… Isso não é verdade… — murmurou Layos, balançando a cabeça freneticamente.
Seu corpo tremia. Sua mente lutava para encontrar uma saída daquele pesadelo.
E então…
Com um movimento brusco, ele se levantou.
O fogo ainda queimava ao redor. A presença sufocante dos dois seres o esmagava. Mas algo dentro dele rugiu. Algo que ele não compreendia.
Layos ergueu os olhos, encarando-os.
Layos tremia dos pés à cabeça.
Seu corpo estava exausto, mas ele correu. Correu sem rumo, sem pensar, apenas tentando escapar.
Mas as vozes continuavam.
— Você só consegue quando tem alguém ao seu lado, não é?
— Que patético…
As palavras ecoavam como marteladas, esmagando sua mente.
De repente, seus pés falharam. Ele tropeçou e caiu, afundando na neve fria. O ar congelante queimou sua pele, mas nada se comparava à dor dentro dele.
Foi então que a voz de Takeshi soou, carregada de angústia e acusação:
— Por que me abandonou, Layos? Por quê?
Layos engasgou. Seus dedos se crisparam contra a neve.
Ele não conseguia respirar. Não conseguia pensar.
Suas mãos tremiam enquanto subiam para seu próprio pescoço. Se ele simplesmente… apertasse um pouco mais… talvez toda aquela dor desaparecesse.
O calor crescia dentro dele, sufocante, opressor. O mundo ao seu redor ficou embaçado. Seu coração disparou como se tentasse escapar de seu próprio peito.
Era o fim.
Até que mãos firmes o puxaram da neve.
— O que diabos você pensa que está fazendo?! — uma voz irritada rasgou o silêncio.
Layos piscou, sua visão turva encontrando um rosto conhecido.
Igris.
A expressão dele era uma mistura de fúria e preocupação.
Só então Layos percebeu o que o cercava. Pessoas congeladas no lugar, seus olhos brancos como se tivessem sido esvaziados de toda vida. Círculos azuis pulsavam em volta delas, como se um feitiço invisível as tivesse aprisionado no tempo.
O terror em seu peito se misturou à confusão.
Ele olhou para Igris, sua voz saindo fraca, quebrada:
— Mas… eu sou fraco. Ele morreu porque eu não fui forte o suficiente.
Igris o segurou pelos ombros com mais força.
— Para com isso! Isso não foi culpa sua!
Layos engasgou, sua garganta apertada pelas lágrimas que tentavam sair.
— Mas… mas… mas…
PAH!
O tapa de Igris não foi forte, mas o choque o atingiu como um trovão.
— Sim, ele morreu — disse Igris, firme —, mas isso não foi culpa sua. Você acha que ele gostaria de ver você assim?
As palavras cravaram fundo, perfurando a barreira que Layos tinha erguido contra a realidade.
Ele sabia disso.
Sempre soube.
Mas aceitar… era como enfiar uma lâmina no próprio peito.
Layos abaixou a cabeça, sua respiração trêmula.
— Você não entende…
Igris cerrou os punhos, a raiva evidente em seus olhos. Mas por trás daquela expressão endurecida, havia algo mais profundo—algo que Layos reconheceu.
Dor.
Ela suspirou, soltando os ombros. Sua voz saiu mais calma, mas firme:
— Talvez eu realmente não entenda… Mas isso não importa agora. Você acha que ele ia querer ver você assim?
As palavras atingiram Layos como um choque elétrico.
Ele se lembrou do irmão, do jeito que sempre o protegia, da forma como sorria mesmo quando tudo estava uma bagunça.
Se lembrou de Takeshi, de como ele sempre seguia em frente, mesmo quando o mundo parecia querer derrubá-lo.
Eles jamais aceitariam vê-lo naquele estado.
Layos respirou fundo, fechando os olhos por um instante. A dor ainda estava lá, mas… algo mudou.
Seu coração ainda pesava, mas agora batia forte—não de medo, mas de determinação.
Ele abriu os olhos, seu olhar mais afiado, mais decidido.
— Você tem razão… — sua voz saiu firme, e ele ergueu a cabeça. — Eu não vou me afundar nisso.
Igris cruzou os braços, um pequeno sorriso puxando o canto dos lábios.
— Era isso que eu queria ouvir.
Layos se levantou, limpando a neve do corpo. O medo ainda sussurrava no fundo de sua mente, mas agora… ele tinha algo mais forte para enfrentá-lo.
Ele daria um passo à frente.
Por si mesmo.
E por aqueles que ainda estavam ao seu lado.
Layos olhou para trás, vendo as silhuetas de Takeshi e seu irmão. A visão deles fazia seu peito apertar—um misto de saudade e dor pelo fato de não estarem ali com ele.
Ele queria que ainda estivessem ao seu lado.
Mas… talvez, de alguma forma, ainda estivessem.
Ele respirou fundo, encarando-os uma última vez. Seu olhar carregava tristeza, mas também uma determinação recém-descoberta.
— Eu sou fraco, sim… — ele apertou os punhos, sentindo sua própria força crescer junto com as palavras —, mas vou provar que sou forte. Espero que vocês me apoiem.
As figuras de Takeshi e de seu irmão começaram a se dissolver, virando pó diante das chamas. Layos os observou desaparecerem sem desviar o olhar.
Não era um adeus.
Era um recomeço.
Ele soltou um longo suspiro e se virou para Igris, agora com uma postura mais firme.
— O que aconteceu depois que chegamos perto da árvore?
Igris sorriu ao ver Layos recuperado. Seu olhar tinha um brilho de satisfação.
— Parece que ela está usando ilusões para afetar as pessoas. Poucos conseguiram sair dela… e, para piorar, alguns monstros começaram a aparecer.
Layos olhou para frente, sentindo a adrenalina pulsar em suas veias.
— O que aconteceu com Mark e as meninas?
Dessa vez, ele não iria recuar.
Igris avançou alguns passos e respondeu com seriedade:
— Eles ainda não saíram da ilusão… Precisamos ajudá-los, mas primeiro temos que lidar com a árvore.
Layos apertou os punhos, sua determinação se solidificando.
— Vá até eles. Eu cuido da árvore.
Ele começou a caminhar, sem hesitar.
Igris o observou por um momento antes de sorrir de leve.
— Você realmente vai crescer muito…
Com isso, ele seguiu para a direita, na direção de Mark.
Mark estava parado, imóvel, os olhos completamente brancos. Seu corpo tremia levemente, como se estivesse preso em algo profundo demais para escapar.
Igris se aproximou e o chacoalhou.
— Mark!
Nenhuma resposta.
O rapaz apenas murmurava palavras desconexas, sua voz carregada de culpa e dor.
— Não… Eu não queria… Eu sei que matei vários… Mas não estava…
Igris sentiu um peso no peito ao ouvir aquilo. Ele baixou o olhar por um momento, refletindo.
— Parece que todos estão se perdendo…
Ele não sabia exatamente como havia escapado de sua própria ilusão, mas sabia o que o mantinha firme.
Seus irmãos.
Seus amigos.
Sua promessa de não ser consumido pelo ódio.
Ele apertou a cabeça, sentindo uma leve tontura. A ilusão tentava se infiltrar de novo.
— Não…
As sombras do passado o cercavam, sussurrando em sua mente.
— Você está se escondendo de novo, irmão.
Desde criança, ele sempre se escondia. Sempre fugia diante do perigo. O medo dominava suas escolhas.
— Vocês vão me dar algo para comer?
Layos, Mark, Takeshi… todos eles já haviam feito ele passar vergonha.
— Ei, irmão, por que você só fica lendo esse livro? Vamos logo cuidar do corpo das pessoas.
Igris sentiu as memórias se apertarem em sua mente como correntes invisíveis. Mas, em vez de sufocá-lo, elas traziam um novo entendimento.
Ele parou de correr e olhou ao redor. As pessoas ao seu redor estavam presas na ilusão, assim como Mark. Elas tremiam, murmuravam coisas sem sentido, presas em seus próprios pesadelos.
Ele suspirou fundo, sua voz saindo quase como um riso cansado.
— Eu sou mesmo um idiota… Irmãos, eu queria ver vocês de novo…
Mas eles não estavam ali. Eram apenas ecos do passado, sombras criadas por sua própria mente.
Dessa vez, no entanto, algo dentro dele mudou.
Ele ergueu a mão direita, sentindo uma energia familiar correr por seu corpo. Pela primeira vez, ele não fugia. Ele enfrentava.
— Certo… Talvez eu morra tentando, mas… que seja.
Uma corrente negra e translúcida começou a se formar em sua mão, crescendo e se expandindo conforme ele concentrava sua força. Sem hesitar, ele avançou.
Com um movimento preciso, lançou a corrente ao redor das pessoas presas na ilusão, envolvendo-as em um laço firme, mas cuidadoso. Usando toda sua força, puxou-as para um único ponto.
Ele não sabia se daria certo. Mas, dessa vez, não importava.
Ele estava lutando.
E não iria parar.
Luna começou a se mexer dentro da ilusão, seus olhos piscando enquanto a névoa em sua mente parecia se dissipar por um breve momento. Mas logo voltou a ficar opaca, como se estivesse presa em um ciclo interminável.
Igris não perdeu tempo e foi até Mark novamente. Ele se ajoelhou ao lado do amigo, observando seu rosto pálido e os murmúrios incoerentes que escapavam de seus lábios.
— Vamos lá, sem medo… — Igris murmurou, tentando conter a ansiedade. Ele respirou fundo e, num tom firme, disparou. — Mark, se estiver me escutando… você é um idiota!
O silêncio se espalhou ao redor deles. O ar parecia denso, pesado. Então, por um breve instante, Mark se mexeu.
Igris notou o pequeno movimento, mas antes que pudesse reagir, um calafrio percorreu sua espinha. Ele se virou lentamente e viu a sombra de algo se movendo.
Os monstros estavam se aproximando.
Eram as mesmas criaturas que atacou Takeshi só que com mais quantidade.
O coração de Igris acelerou, mas ele não permitiu que o medo o dominasse. Não agora.
Foi então que uma figura se colocou entre eles e as feras.
O homem de cabelos azul-esverdeado.
Ele estava montado em seu cavalo, sua postura imponente como sempre. Atrás dele, vinte guerreiros surgiram, suas espadas afiadas refletindo a luz do fogo ao redor.
Com um olhar frio, ele declarou:
— Eu deixo isso com você. Cuide deles.
E então, sem hesitar, ele avançou contra as criaturas.
Igris apertou os punhos, sentindo a responsabilidade pesar sobre seus ombros.
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