Capítulo 54: Limite da loucura
Lucius sentiu uma pressão esmagadora percorrer todo o corpo, quase fazendo suas pernas cederem. O medo da cena diante dele era tão grande que seus músculos tremiam, mas, mesmo assim, ele se recusava a fechar os olhos.
Os sons secos dos socos ecoavam pelo espaço, acompanhados das palavras trocadas entre Takeshi e Sebastian, cada uma delas pesando como lâminas em sua mente.
Seu coração batia descompassado. Ele não desviou o olhar.
Sebastian, percebendo aquilo, estreitou os olhos. A raiva explodiu em sua voz.
— Eu disse para você fechar! — o tom, que antes era de um jovem comum, agora soava grotesco, profundo, carregado de fúria.
Lucius não obedeceu. Um suor frio deslizou pela lateral de seu rosto, escorrendo até o queixo. Sua garganta queimava, travada, como se tentasse sufocar as palavras que imploravam para sair. O peito ardia em desespero. Ainda assim, ele abriu a boca — a língua trêmula, mas a decisão firme de enfrentar aquele medo.
— Eu… não quero isso… você precisa entender…— a frase morreu antes de se completar.
Os olhos de Sebastian, tomados por uma fúria selvagem, lembravam os de uma fera prestes a devorar sua presa.
— Não tenta complicar as coisas… — rosnou, com as pupilas vibrando de ansiedade. — Isso aqui já é difícil o bastante. Agora feche os olhos.
Lucius permaneceu de olhos abertos, avançando três passos à frente. Ele, surpreso, sentiu os lábios esquentarem com a tensão, até que explodiu.
— Não! Eu já disse que não quero. Por que precisamos fazer isso? — sua voz denunciava um medo palpável. O suor escorria sem parar, à medida que imaginava o que Sebastian estava prestes a fazer.
Com um movimento firme, Sebastian avançou o pé esquerdo, pressionando o chão com força. Takeshi e Lucius tiveram a nítida impressão de que ele estava prestes a usar uma habilidade, mas…
— Ark! — um som abafado e distorcido ecoou, vindo do estranho objeto que Takeshi havia identificado como o corpo sem vida de Ethan.
Os três voltaram o olhar para aquilo. Tremia, se agitava, e o ar ao redor adquiria um tom avermelhado.
Até que, em certo momento, aquilo começou a girar lentamente, formando um movimento espiralado. A matéria sólida se desfez pouco a pouco, restando apenas um líquido azul que ondulava de forma inquieta. Esse líquido se contorceu, moldando braços, cabeça e pernas. Sua silhueta emitia um brilho fraco, quase apagado, até que, finalmente, tomou forma reconhecível.
— …Que isso… — murmurou Takeshi, sentindo a mente se embaralhar de confusão.
Aquela forma ultrapassava qualquer noção de humanidade.
O rosto era uma massa disforme, a pele cinzenta marcada por manchas escuras que pulsavam como se escondessem algo vivo por baixo.
O corpo tombou pesadamente contra o chão, mas dele se desprendia uma névoa azul-escura que envolvia a parte inferior, tornando impossível distinguir-lhe as pernas.
Os braços retorciam-se em ângulos antinaturais, cada movimento acompanhado por estalos secos, enquanto os olhos, duas espirais em constante torção, fitavam o vazio.
De repente, a criatura ergueu a cabeça e um som escapou de sua garganta.
— Aaaaaaaa! — um grito, ou algo que se assemelhava a um, distorcido ao ponto de parecer vir de outro lugar, como se a própria realidade estivesse sendo rasgada por aquela voz.
Os olhos de Sebastian tremiam. Suas pernas, quase sem controle, recuavam por instinto.
— Precisamos sair daqui agora e avisar os outros sobre isso! — exclamou, a voz carregada de desespero.
A criatura se ergueu. Sua barriga girava em movimentos grotescos, e, embora fosse apenas o próprio abdômen, parecia não ter limites de massa, como se se expandisse infinitamente.
Sebastian correu até Lucius, ofegante.
— O que diabos é isso, Sebastian? — perguntou Lucius, sentindo o peso da tensão tomar conta enquanto suas mãos começavam a suar.
A criatura girou os braços, que passaram a brilhar em diferentes cores — preto, vermelho e ciano — movimentando-se como ondas no mar.
“Melhor eu ir embora quando eles partirem” pensou Takeshi, dando quatro passos para trás. “Meu único medo, por enquanto, é meu olho. Minha visão ainda não se recuperou.”
— Isso… é um osso quebrando. Mas o nome real é: a Carapuça estilhaçada
“Osso quebrando… não era essa a nova punição da tarefa? Eu me lembro do sistema mencionando isso.”
O coração de Takeshi acelerou, enquanto uma pressão incômoda latejava em sua cabeça.
A surpresa o deixou paralisado, sem saber como reagir diante da visão de uma daquelas criaturas pela primeira vez.
Takeshi cogitava uma possibilidade inquietante.
“Esse ser é mesmo o Ethan? Se for… como ele conseguiu se tornar algo assim?”
Ele soltou um suspiro pesado, enquanto seus dentes batiam nervosos a cada nova pergunta sem resposta.
Lucius, por outro lado, parecia imperturbável. Seus tremores cessaram; as pernas firmaram-se no chão, e as mãos pararam de vacilar.
— Lucius… você está bem? — perguntou Sebastian, massageando a própria bochecha numa tentativa de aliviar a tensão.
— Ah, eu… só estou aguentando — a voz surpreendentemente estável. — Mas, por dentro, eu ainda estou com medo.
A criatura avançou lentamente, e sons de ruídos e gritos ecoaram pelo ambiente. A atmosfera lembrava um lugar assombrado, como se fosse habitado por fantasmas.
Takeshi engoliu em seco e recuou um passo, enquanto Lucius apenas o fitava de maneira enigmática, afiando o olhar de forma quase desconcertante.
Sebastian, por sua vez, ergueu os braços em posição de combate, embora o frio que percorria seu corpo denunciasse sua hesitação. Seus movimentos estavam lentos, vacilantes, e seus olhos insistiam em evitar o confronto direto, como se buscassem escapar daquele olhar perturbador.
— Melhor acabar com isso logo… talvez depois avisemos os outros — disse Lucius, a voz carregando uma hesitação estranha.
— Mas… acho melhor irmos embora daqui… esse—
— Ei, você. Vem ajudar a gente — Lucius olha para Takeshi.
Takeshi deu um passo para trás, os olhos estreitando.
— Sei que está pensando em dar o fora, mas… — Lucius passou o dedo pelo próprio pescoço, num gesto silencioso de morte — atrás daquela porta ainda tem pessoas. Já entendeu onde quero chegar.
“Desgraçado.”
Takeshi esboçou um sorriso de canto, os olhos tremendo de forma quase imperceptível.
— Ajuda a gente, e nada de ruim vai acontecer com você — disse Lucius, balançando a mão direita em um gesto firme.
Com passos lentos, Takeshi avançou até ficar a poucos centímetros deles. Sua voz soou calma, mas carregada de ameaça velada.
— Melhor avisar seu amigo para não tentar me matar… pelo menos não aqui.
Sebastian lançou um olhar torto, enquanto Lucius apenas balançava a cabeça.
— Então vamos cuidar dele agora — disse Lucius, apontando para a criatura.
— Olha, sei que estamos num momento complicado, mas… como conseguiu ficar tão tranquilo de repente?
Lucius deu um leve sorriso.
— Apenas segurei firme, nada além disso. Agora vamos…
Takeshi moveu levemente os lábios.
— …Bem… e quanto às minhas algemas?
— É melhor deixá-lo assim por enquanto.
— Melhor mesmo, para alguém como você, seu—
— Calma, Sebastian. Deixe essas provocações para outro momento.
“Esse desgraçado… Se eu não estivesse preso por essas algemas, eu ia cair na porrada!”— Takeshi cerrou os dentes quando olhava para Sebastian
Os braços da criatura se estenderam de forma abrupta. Sebastian e Lucius reagiram de imediato, desviando para o lado. Takeshi, um instante mais lento para compreender, também se lançou de lado.
Um arrepio percorreu todo o seu corpo quando percebeu o quão perto o ataque passara de atingi-lo — o braço quase rasgando seu abdômen.
Num movimento brusco, os membros da criatura retornaram ao corpo. Ela girou a cabeça lentamente, em um gesto inquietante.
— Como aquilo morre? — Takeshi perguntou, pressionando a mão contra o abdômen.
— Apenas com golpes na nuca ou na cabeça. O resto do corpo… é melhor evitar — respondeu Sebastian, com certa hesitação, revirando os olhos.
De repente, o monstro saltou em direção a Sebastian. Ele conseguiu se mover para o lado no último instante, e o impacto da criatura contra o chão levantou uma nuvem densa de poeira.
Lucius correu em seguida, prendeu a respiração e, com um salto ágil, posicionou-se atrás da criatura.
Ele lançou o punho para trás, mas, antes que pudesse completar o movimento, o braço esquerdo da criatura girou de lado, quase esmagando sua cabeça. No entanto, Sebastian interveio a tempo, evitando o golpe fatal.
— Faça algo útil, pelo menos! — Sebastian exclamou, lançando um olhar severo para Takeshi.
O braço dele tremia enquanto segurava a mão distorcida. Num instante, Lucius recuou apressado, e Sebastian, libertando a própria mão, também se afastou com rapidez.
Takeshi avançou em disparada.
— Ele está fugindo? — Sebastian cerrou os punhos.
A criatura girou o corpo por completo e lançou o braço como um projétil. A respiração de Takeshi acelerou; ele correu até um pilar, contornou-o em um movimento rápido e fez com que a mão da criatura se enrolasse ao redor da estrutura.
O braço travou, desacelerando o movimento, mas ainda assim conseguiu se mover com esforço.
Takeshi correu em direção ao outro pilar; nesse instante, o braço ficou preso logo após completar a volta e se enrolou firmemente. Ele o segurou com força, tentando resistir.
Ao perceber a brecha, Sebastian não hesitou e avançou rapidamente contra a criatura.
No meio do ataque, Sebastian foi atingido por algo invisível, sendo arremessado alguns passos para trás.
De repente, uma névoa em tons azulados e negros tomou forma no ar. Dentro dela, delineou-se a figura de uma perna descendo em sua direção antes de desaparecer novamente, engolida pelo véu obscuro.
— Tome cuidado com as pernas… — alertou Lucius, surgindo logo atrás dele. — Parece que ele esconde elas na névoa.
Takeshi continuava segurando a mão, mas ela tremia e se debatia com força.
“Só acho que isso vai demorar muito!”
A mão insistia em se mover sozinha, tentando se desenrolar como se tivesse vontade própria. Takeshi, irritado, às vezes batia nela, tentando forçá-la a parar. O incômodo crescia, tornando-se cada vez mais evidente.
Até que, em um breve instante, a mão parou de se debater.
“Parou.”
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