Capítulo 12- O Preço da Fraqueza
Era a primeira vez que Glartak entrava em um ninho goblin desde que chegou àquele mundo. A cena era lamentável. A caverna era escura e o cheiro terrível, já que o ar não circulava direito. O odor de sangue ferroso permanecia no ar. Enquanto caminhava mais ao fundo na escuridão, o único som que se ouvia eram os passos pesados de Primal ecoando logo atrás.
“Os goblins enxergam muito bem na escuridão. Talvez por isso escolham esse tipo de lugar. O único problema é que não é um lar, e sim uma prisão. Com uma só entrada e saída pelo mesmo lugar, em qualquer ataque não há para onde correr”, pensou enquanto andava.
Continuou caminhando, ainda sentindo o ombro dolorido por conta da luta contra o brutamontes, mas sabia que, com sua habilidade, um dia de descanso resolveria. Ao entrar mais ao fundo, foi recebido por uma visão que o fez cerrar os punhos com tanta força que suas unhas perfuraram a pele, fazendo o sangue escorrer entre os dedos.
A caverna, que antes era um ninho, agora era um verdadeiro cativeiro. Cordas prendiam vários goblins. Eles estavam amarrados pelos pulsos e tornozelos. O cheiro de urina e sangue coagulado impregnava o ambiente. Havia goblins com olhos sem vida, sem nem mesmo o instinto visível em seus semblantes. Outros estavam encolhidos em cantos escuros, tremendo, olhos esbugalhados de terror, com os corpos cobertos de hematomas e queimaduras.
No centro da caverna, três goblins fêmeas chamaram a atenção de Glartak. Estavam separadas dos demais, amarradas com cordas mais espessas e presas por coleiras de couro. Eram menores que os machos, com cerca de um metro e dez centímetros, mas possuíam traços mais delicados e olhos mais vivos, ainda que marcados pelo sofrimento. A primeira tinha a pele de um verde-musgo profundo e o rosto atravessado por uma cicatriz que ia da sobrancelha até o queixo. A segunda, com pele mais clara e olhos dourados, estava com parte do corpo coberta por marcas de chicote, mas seu olhar era desafiador, como se se recusasse a quebrar. A terceira era a menor das três, com olhos grandes e negros como obsidianas e orelhas caídas, abraçando os próprios joelhos.
Glartak as observou por um instante, com olhos frios, mas que continham uma certa compaixão. A dor delas era evidente, mas, dentro de si, sua mente já trabalhava. “Fêmeas goblins… A reprodução será essencial, visto que a grande maioria foi morta.”
Seus pensamentos vinham como ondas. Ele não tinha tempo para sentir piedade diante da situação. Precisava planejar o que faria dali em diante e como lidaria com as novas informações.
Primal jogou o jovem prisioneiro desacordado em um canto da caverna com um baque seco. O garoto rolou pelo chão de pedra, a poeira e o sangue cobrindo sua pele pálida. Glartak mal lhe deu atenção.
— Solte todos — ordenou.
Primal respondeu apenas com um grunhido, indo até o primeiro goblin amarrado e cortando as amarras com as garras.
Glartak ajoelhou-se diante de um dos goblins caídos. Seu corpo estava magro, desidratado, e sua pele esverdeada era quase cinza de tanto sangue seco. Cortou as cordas com suas unhas e, com cuidado, ajudou-o a se erguer. Repetiu o processo com os demais, inclusive com as três fêmeas. Estas o encararam com desconfiança, mas não resistiram à libertação.
Depois que os sobreviventes foram soltos, os corpos dos goblins mortos, tanto dentro quanto fora da caverna, foram reunidos em uma pilha do lado de fora, numa parte rochosa onde não havia vegetação. Primal carregava os cadáveres com uma mistura de sentimentos. Glartak estava ao lado, ajudando, com a mente ainda planejando o que fazer.
Quando todos foram empilhados, Glartak ateou fogo com uma tocha que pegou do peito de um do goblin que estava amarrado. As chamas subiram, e o cheiro de carne queimada misturou-se ao vento. Os goblins sobreviventes foram deixados todos na caverna.
Glartak permaneceu quieto diante da fogueira de corpos, seus olhos refletindo o fogo.
— Mais irão voltar, Primal. Vão voltar com o mesmo objetivo. Hoje matamos eles, os pegamos de surpresa sem que eles esperassem por isso, mas na próxima podemos não estar prontos…
Primal olhou para ele, em silêncio.
— Leve aquela fêmea com marcas de chicote. Ela não tem o olhar quebrado. E leve mais um goblin. Ensine-os a evoluir. Ensine-os a caçar, a lutar. Quero que evoluam. Precisamos de mais do que corpos. Precisamos de mentes. Mais que dois de uma vez, para você sozinho, irão morrer.
— Entendido — respondeu Primal. Sua voz era grave, mas clara.
Glartak assentiu.
— Começaremos com esses dois.
As chamas estalavam, e o fogo iluminava seu rosto. Primal saiu rapidamente para cumprir sua tarefa.
Glartak entrou novamente na caverna. O jovem ainda estava lá, desacordado. Os goblins não o haviam devorado, apesar da fome — talvez por medo ou por estarem em choque.
Goblins eram monstros que agiam por puro instinto. Geralmente andavam em grupos de até cinco e atacavam o que vissem pela frente, armados com pedras ou pedaços de madeira. Se não dessem conta, corriam covardemente.
— Acorda! — disse Glartak, dando um chute forte na barriga do menino ainda desmaiado.
O som foi de um estalo surdo. — “URGH!” — O ar foi expulso dos pulmões do garoto como se tivesse sido sugado à força, ao mesmo tempo em que seu corpo se dobrava pela dor do impacto.
Seus olhos se abriram de repente, arregalados, como se estivesse se afogando e tivesse acabado de emergir. Cuspiu saliva, engasgando e se contorcendo, tentando desesperadamente recuperar o fôlego.
— “Hgggk—!”
As mãos agarraram o chão, unhas arrastando na terra como se isso fosse ajudá-lo a se firmar na realidade. O choque da dor e do súbito ganho de consciência era paralisante. Um som quase animal escapou de sua garganta — meio gemido, meio soluço — enquanto se virava de lado, tentando proteger o estômago com os braços.
Seus olhos tremiam, perdidos entre o desespero e a confusão. Ele mal conseguia falar.
— “P-por quê…?” — sussurrou, sem conseguir erguer a cabeça.
Glartak o encarou com olhos frios que não demonstravam nenhuma emoção e disse:
— Você tem as respostas para perguntas que eu tenho.
O garoto tremia visivelmente de medo. Ainda sentindo a dor do chute que o tirou da inconsciência, tentou se sentar enquanto se arrastava, mas…
SMACK.
Um tapa certeiro e seco estalou contra o rosto do garoto, fazendo sua cabeça chacoalhar algumas vezes.
— Não tenho tempo pra enrolação e estou sem paciência, garoto!
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