Capítulo 4- Uivos na Noite
Glartak acordou no meio da noite com um barulho seco. Algo se partindo.
Levantou-se assustado, o corpo ainda dolorido da correria do dia. Estava dormindo encolhido em um canto entre raízes grossas, um lugar seguro, ao menos por enquanto. O céu lá fora já estava escuro, e a luz da lua passava por entre as folhas. De imediato, notou que enxergava muito bem na escuridão. Lembrou que os goblins são criaturas noturnas — talvez fosse por isso. De repente, o som de galhos se quebrando ecoou pela floresta.
Levantou devagar, tentando não fazer barulho. Escutou o som de algo respirando… pesado… úmido.
Arrastou-se até uma abertura entre as árvores e, olhando com cuidado, viu o que pareciam ser… três lobos. Mas não eram como os que conhecia da Terra. A pelagem era escura como carvão, e os olhos brilhavam com um tom âmbar que lembrava brasas.
Eles estavam indo em direção ao pântano onde os javalis costumavam aparecer.
— Merda… — sussurrou para si mesmo.
As bestas estavam indo a caminho do resto do cadáver que havia deixado para trás do javali.
Ficou observando enquanto desapareciam entre a vegetação densa. Um deles parecia ser o líder. Era maior, tinha cicatrizes nas costas e uma orelha faltando. Os outros eram apenas um pouco menores e seguiam atrás. Moviam-se com precisão, como se já tivessem caçado juntos muitas vezes.
Predadores organizados.
Não era algo que ele queria enfrentar… não ainda.
— Eu realmente tenho que ser mais cuidadoso. O que acontece com essa floresta? Pra onde eu olho, tem algo que pode me matar…
Enquanto sussurrava, escutou uivos ao longe, provavelmente eram eles.
Voltou a deitar e respirou fundo. “Preciso de mais força.”
Seus status ainda estavam longe de lhe dar vantagem em combate direto. Caçar com armadilhas era a única forma que tinha de sobreviver, mas com esses predadores rondando por ali, ele era tão caçador quanto caça.
Tentou se concentrar. A lembrança da última luta ainda era recente. Cada escolha errada ali podia lhe custar a vida.
“Se eu conseguir caçar outro javali amanhã…” Enquanto pensava, adormeceu.
Na manhã seguinte, foi despertado pelos sons da floresta despertando com o sol. O canto abafado de pássaros e o farfalhar das folhas.
Levantou-se devagar, arrastou-se para fora e começou a caminhar em direção ao pântano dos javalis. Foi com atenção redobrada, pois a imagem dos lobos da noite anterior ainda era vívida em sua mente. “Se eu encontrar com um deles, com certeza vou morrer!”
Continuou caminhando e então viu a armadilha que havia montado no dia anterior. Do cadáver antes preso na armadilha, não sobrara nem os ossos. O que ele havia comido não foi quase nada comparado ao tamanho do javali, os lobos devoraram todo o resto.
— Bom, pelo menos não tenho que me preocupar em cavar outro buraco. Posso ainda reutilizar esse.
Passou boa parte da manhã afiando galhos, criando estacas mais resistentes. Posicionou os galhos novamente no fundo do buraco e tampou com folhas e ramos secos, tomando cuidado para esconder as bordas.
Foi até o local onde viu os javalis da última vez e esperou. Dessa vez, levou consigo algumas pedras afiadas e se escondeu melhor.
Depois de uma hora, dois deles apareceram. Um maior e outro menor. O menor parecia mais inquieto. Decidiu arriscar.
Jogou uma pedra perto para chamar atenção. O menor olhou e caminhou devagar.
Esperou ele se afastar do outro.
Quando o viu, soltou um som estranho, quase um rosnado. E então veio.
Correu.
Dessa vez com mais confiança. Seus pés sabiam exatamente onde pisar. O caminho até a armadilha estava gravado em sua mente.
As patas do javali batiam forte no solo atrás dele, mas manteve a dianteira. Não pensou, só correu.
O buraco estava logo à frente.
Saltou.
Ouviu o som do corpo pesado do javali se chocando com as estacas. Um urro de dor cortou a floresta.
Dessa vez, não esperou.
Catou uma pedra grande e desceu até a beirada. O javali estava preso, tentando sair, mas o ferimento era profundo. As estacas pegaram bem no flanco e no peito.
Arremessou a primeira pedra.
Depois outra.
E outra.
O sangue já tingia as folhas ao redor, e os grunhidos foram diminuindo até cessarem de vez.
Subiu o status:
Nome: Glartak
Raça: Goblin caçador
Habilidades:
Instinto de Emboscada
Arremesso Preciso
Exp: 761/1000
Suspirou, ofegante.
— Mais duzentos e poucos pontos… quase lá.
Começou a devorar a carne ainda quente, rasgando os pedaços com as mãos e os dentes.
O gosto metálico do sangue não o incomodava — na verdade, era quase prazeroso.
Talvez estivesse deixando de ser humano… e se tornando, de fato, parte daquele mundo cruel e primitivo.
Quando terminou, deixou o cadáver ali mesmo.
Não havia como carregá-lo de qualquer forma e nem razão para isso. Estava satisfeito — por enquanto.
De repente, uma ideia brotou em sua mente, simples mas que poderia dar certo.
— Talvez seja melhor ver se os lobos aparecem de novo para se alimentar do cadáver… — murmurou para si mesmo, olhando em volta com cautela.
A fome já não era um problema.
O medo… ainda era. Mas agora andava lado a lado com algo novo e crescente.
Instinto de sobrevivência.
Resolveu preparar uma nova armadilha, aproveitando a carcaça como isca.
Cavar outro buraco ao lado do primeiro foi exaustivo, mas ele conseguiu.
Fincou galhos afiados no fundo, como lanças improvisadas, cobriu com folhas secas e torceu para que o disfarce fosse convincente.
Depois de comer mais um pouco da carne restante, sentou-se para observar o resultado de seu trabalho.
— Pronto! É uma aposta. Se der certo, ponto pra mim.
No fim daquele dia, antes do sol desaparecer entre as copas das árvores, voltou ao seu abrigo improvisado.
A noite caiu, e com ela vieram os sons da floresta.
Uivos distantes interromperam o silêncio.
Sentiu um arrepio percorrer a espinha. Os lobos haviam novamente encontrado o javali.
— Que comam à vontade… Tomara que caiam na armadilha.
Deitou-se, encolhido, tentando ignorar sons ocasionais ao longe.
Fechou os olhos e, por fim, dormiu.
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